AO GOSTO RITMADO
Dinheiro
Precisamos de dinheiro para viver,
Não de viver para o dinheiro.
E tudo muito mal irá correr
Se o segundo é o meu carreiro.
Merecemos
Só merecemos a vida
Se ela empenho permanente concita
Naquilo em que, com fé descomedida,
Se acredita.
Vantagem
Há uma vantagem nos berros
Que ocorrem da vida nos processos:
Aprendemos muito mais com os erros
Que com os sucessos.
Obstáculo
O modo como se desvia
O obstáculo que nos invade
É que nos traz qualidade
Ao dia-a-dia.
Arrogância
No campo de batalha, o disfarce
Da arrogância, afinal,
Pode revelar-se
Fatal.
Divórcio
Um divórcio não é,
Continua por todos os cantos da vida espalhado
Como um espinho espetado
Num pé.
Lago
A vida é um lago sujeito às monções
De todos os motivos
E cada morte provoca ondulações
Nos vivos.
Familiar
A familiar mitologia
Tem para nós mais profundidade
Do que há-de ter algum dia
A verdade.
Recear
O poder, o poder exercitar
Implica sempre o cutelo
De recear
O momento de perdê-lo.
Folha
O amante amado
É uma folha ao vento
Soprada fielmente no rumo tomado
Pelo par, momento a momento.
Melhor
Para uma situação
Desconhecida
É quantas vezes a confusão
A melhor saída!
Astrónomo
É um astrónomo cada homem:
Sabendo que têm algo com que se consomem
E que ele nunca entende bem nas sequelas,
Ama as estrelas.
Histórias
As histórias que peneiras
Que fáceis são!
Porém, as verdadeiras,
Não...
Agarrar
Há tanta coisa boa
Que efeito não vai surtir!
Não se consegue agarrar uma pessoa
Que não percebe que está a cair...
Sonham
Os que sonham acordados de dia
Descobrem muitos loiros, muita palma e muito açoite
Que escapam em demasia
Aos que só sonham adormecidos de noite.
Valor
O valor das pessoas
Não é dos diplomas com que te iludes,
Menos ainda da grossura das broas,
Mora nas atitudes.
Sinal
Com um sinal sempre presente
O dogma nacionalista nos ferra:
Quanto mais baixa a patente,
Pior a guerra.
Olho
Lealdade?
Decerto.
Mas a vida requer a sagacidade
Dum olho sempre aberto.
Desmorona
Quando o grande líder não existe,
Nada se alcança,
Tudo se desmorona até onde o olhar aviste,
Até a esperança.
Adora
Todo o coroado
Adora ser temido
Mas tem no sentido
Um dia ser adorado.
Honra
Sem honra na pegada,
Um homem,
Por mais glórias que se lhe somem,
Não vale nada.
Embora
O poder, embora o saúdes,
Tem perfume e pestilência.
Por vezes, a maior das virtudes
É a desobediência.
Jamais
Ou tens alegria, ou tens poder.
Ambos juntos, não.
O conquistador é de se temer.
De se amar, jamais, então.
Voz
Se alguém tem voz como descobrimos
Quando, preso na toca,
Nunca lhe permitimos
Que abra a boca?
Herói
Herói é quem outrem ajudar
Com as próprias competências
Sem ligar
Às adversas para ele consequências.
Mal
Dizem mal de quem temem,
Que doutro modo, se calhar,
Por mais que no mar da vida remem,
Àquele não o logram vergar.
Iluminar
Quanto mais iluminar a luz da tocha
Mais fará que as sombras nos iludam:
O futuro não é o que anda gravado na rocha,
Os eventos mudam.
Glória
Ouvimo-lo doutrem, vemo-lo ocorrer com fulgor
E nada nos prepara para a nossa vez:
A glória do primeiro amor
É muito maior, falhado embora o entremez.
Todos
Todos estamos a morrer,
Uns mais que outros, porém.
Porque só destes dizer
Que a morte aí vem?
Bocadinho
Tantos de que não nos conseguimos lembrar!
O passado, uns vagos pós...
Como se apenas pudéramos ficar
Com um bocadinho minúsculo de nós.
Mudança
Apenas mais uma mudança na pegada
Da quotidiana sorte,
A morte, afinal, não é nada
Porque não há morte.
Momento
No dia da vitória, lá
No momento celebrado,
Ninguém andará
Cansado.
Mistério
A vida configura
Um
mistério singular:
Mesmo na gruta mais escura
Acaba sempre por germinar.
Porta
O céu não tem reclamos,
É abrir a porta duma casa ao crepúsculo
E encontrar dentro, no infinito do espaço minúsculo,
Todos aqueles a quem amamos.
Sabedoria
A sabedoria medita
O credo,
A ignorância suscita
O medo.
Espaços
Quem vive em espaços limitados
Sem lhes desbravar as aberturas de cena
Terá por todos os lados
A mente pequena.
Aponta
Simulando como que a medo,
É sempre o mais mal comportado
Que aponta o dedo
Ao acusado.
Adora
Baste-te a paz
E a luz alegre do chamiço:
Quem adora o que faz
Raro lucra com isso.
Formosura
A formosura persuade
Com força tão descomedida
Que chega a despertar a caridade
Adormecida.
Risco
Bom é que no risco te não metas,
Mesmo em fraternais repúblicas,
E mais ainda nas ocasiões secretas
Que nas públicas.
Grandezas
Deixa-te de grandezas, que, em suma,
Para o que à grandeza ceda,
Não há nenhuma
Que não ameace queda.
Serena
Mágico esmero
Me serena o dúbio cenho:
Tenho sempre o que quero
Se me contento do que tenho.
Actos
Não quero juras
Nem promessas,
Apenas o que em teus actos apuras
No direito e às avessas.
Âmago
No âmago da pele
Cuida o ladrão
Que todos como ele
São.
Sabe
O que se sabe sentir sabe-se dizer
Mas quantas vezes o que padece,
De tanto sofrer,
Emudece!
Paga
Quando há míngua
Na forja,
O que diz a língua
Paga-o a gorja.
Dádivas
As dádivas de quem dá,
Mesmo nas mais negras cenas,
São o que quebrantará
As penas.
Bomba
A mercê feita ao valido
É sempre a bomba que coso
Ao coração combalido
Do invejoso.
Servir
O bem servir do servo
Move a vontade do senhor
Com todo o acervo
De o bem dispor.
Jura
A bom pagador
Pouco a jura lhe doeria,
Que lhe não dói o penhor
De nenhuma garantia.
Tento
O maior dano
Do destino humano
Vem da míngua
Do tento na língua.
Lenço
Num lenço somem
Logo os tédios da clausura:
O lenço dum homem
Cheira a aventura.
Redor
Com amor, concito
Quanto em redor é grácil:
Com amor tudo é mais fácil
E bonito.
Toque
Quando os outros andam sempre errados
E eu nem uma vez sequer,
É o meu toque de finados:
Ando abusando do poder...
Endireitar
Não é fácil da vida
Endireitar a cena.
Toda a pena, porém, medida
Vai valer a pena.
Capacita
Premiados
São os que acolhem:
O Infinito não escolhe os capacitados,
Capacita os que o escolhem.
Encontro
Quando me encontro com meu imo,
Sinto que, num golpe de asa,
Voltei para casa,
De minha íntima cumeeira no esplendor do cimo.
Abrir
Com meu
Imo conectar-me
É mais que fascinar-me,
- É abrir uma fresta do Céu.
Fundura
Ir à fundura mais alta de mim
É para devir independente:
- Como chegar dos fins ao Fim
Da vida no tumulto da corrente?
Enganes
Não te enganes com outra qualquer
Rua:
Teu imo ajuda-te a escolher
Mas a escolha final é tua.
Experienciar
Experienciar o caminho
É o que à terra vim fazer.
Aí é que finalmente adivinho
Vir deveras a ser.
Autêntico
Como operar a ligação
A meu autêntico Eu?
- A intuição
É o palpite do Céu.
Eco
Um eco que reténs
Daqui para acolá,
A vida só te dá
O que já tens.
Fruto
Os eventos que irei atrair
Amanhã, quando tanto me foge,
Serão fruto das escolhas que prosseguir
Hoje.
Focados
Focados a resolver cada problema,
Falta-nos tempo para encontrar a nova escolha
Em virtude de cujo lema
Um porvir de libertação cada qual por fim recolha.
Procura
Não procures as respostas,
Procura as perguntas,
Que, uma vez postas,
As respostas virão por si àquelas juntas.
Prefiro
Prefiro o inimigo declarado
Ao inimigo
A que convém ter-se passado
Por amigo.
Fracassar
Não é nenhum sigilo:
Toda a gente passa a vida a fracassar.
O mais difícil não é admiti-lo,
É aceitar.
Voz
Que é poesia
Senão
A voz de magia
Do coração?
Loucura
Há um louco
De loucura comedida:
Nas aulas estuda pouco,
Estuda muito na vida.
Devagarinho
Não temas as pegadas pequenas
Por devagarinho avançar.
Teme apenas
Parado ficar.
Exterminar
Podemos exterminar às mancheias
Os porta-vozes da verdade.
Mas podemos exterminar-lhes, com igual à-vontade,
As ideias?
Hábito
O hábito tem manias:
Destrói em prosa
A mais maravilhosa
Das magias.
Acende
A política acende em toda a parte
Dos ideais o chamiço;
Depois pô-los em prática é arte
De compromisso.
Ainda
A ciência é ainda e será sempre uma candeia
Que tremula, em levas,
Numa enorme caverna cheia
De trevas.
Difícil
Sempre algo podemos fazer,
A mais difícil seja embora a vida,
De modo a ser
Bem sucedida.
Sentou-se
Dou fé
De que estou apaixonado:
Doutro sentou-se ela ao pé
E eis-me para aqui transtornado.
Comida
A melhor comida - descubro, sumário,
Com alívio -
É um íntimo acto diário
De convívio.
Matrizes
Amor e amizade:
As matrizes
De tudo o que nos grade
Para nos tornar felizes.
Sozinha
Juntos:
Palavra de tal casta
Que, para todos os assuntos,
Sozinha basta.
Pontinha
Tu e eu,
Entre vivos e defuntos
Somos a pontinha de céu
Por podermos estar juntos.
Transmitem
Tu e saudade
Transmitem, decerto,
A necessidade
De um do outro estarmos perto.
Sabor
Nada na vida se alcança
Sem sentir na boca o credo,
Como fiança,
Dum leve sabor a medo.
Quando
Quando alguém destroçado vemos
No seu pior
É que de estar nós temos
No melhor.
Nunca
Não é uma derrota sem saída
Nem é uma quimera:
A vida
Apenas nunca é o que se espera.
Alcance
Aceita os eventos tal como forem,
Lida com eles como são,
Sem os desejar diferentes, ao se porem
Ao alcance da mão.
Base
Aceitar
É a base de cada dia:
O que não puder mudar
Alicerça tudo quanto principia.
Reconheço
Quanto mais me sinto reconhecido,
Mais reconheço as bênçãos de Deus,
À medida que lido
Com o que vou encontrando ao correr dos passos meus.
Simples
O amor demonstrar
Tão simples pode ser
Como ouvir e dizer
O que sentimos a nosso par.
Repleta
Todos somos almas numa viagem
Repleta de bem e mal
E mais parecidos, em qualquer triagem,
Do que julgaremos, na mistura final.
Segredos
Este é o cadinho
Dos segredos de recurso:
Deus sempre nos ajuda no caminho
E nunca nos desvia do percurso.
Batalha
Uma batalha é uma estopada:
Quando estamos lá no meio,
É muito feio;
Cinco minutos à frente, não ocorre nada.
Lembre
Pode haver entre nós muita quezília
Mas, se nenhuma me lembre,
É que, uma vez família,
Família para sempre.
Acreditam
O problema mais bicudo
Que nunca logramos desurdir:
Todos acreditam em tudo
Desde que seja o que querem ouvir.
Casais
Todos casais felizes, todos, só veria
Pelas terras mais várias
A maioria
Das pessoas solitárias.
Antanho
A glória
É de antanho o culminar do apuro.
Quem não tem memória
Não tem futuro.
Rasgando
Rasgando no tempo enevoado
Um postigo,
Um homem deve considerar-se afortunado
Mesmo se só tiver um amigo.
Descante
Por mais que de qualquer bardo
Ao descante contrário te dobres,
O dinheiro é um fardo
Que pesa mais nos pobres.
Consolo
Pode ser grácil,
Pode ser relevante,
Todavia, o consolo fácil
Nunca é reconfortante.
Funerais
Os funerais não são arquivos
Dos mortos que se vão,
Os funerais são
Para os vivos.
Sofrimento
O sofrimento que se nos gruda
E nos tem à trela,
Não nos muda,
Antes revela.
Ponderados
Ponderados contras e prós,
Esta é a linha de fundo:
O mundo não foi feito para nós,
Mas nós para o mundo.
Centro
No centro pusemos tanto o nosso berço
Que mal dá para vislumbrar
Que podemos tanto magoar o Universo
Como o podemos ajudar.
Preciso
É muito bom falar
Mas é preciso, a seguir,
Se algo queremos mudar,
Agir.
Trás
Se olhas para os teus troféus
Na hora de andar por entre a gente,
Olhas para trás os feitos teus,
Não vês a concorrência em frente.
Livro
Um livro que não ensine
Nada,
Afinal ensina: define
Como uma história não deve ser contada.
Ameaçam-vos
Críticos, cínicos e quem semeia o medo:
Ameaçam-vos, sem disfarce,
Os dispostos a cair, não importa o credo,
Por terem aprendido a levantar-se.
Sorte
A sorte não existe.
O sortudo
É o que procura o despiste
Da boa fortuna em tudo.
Erguer
Não há sorte,
Há energia.
Naquela, hoje é a antecâmara da morte;
Nesta, ando aqui a erguer um novo dia.
Corre
Nada corre tão bem como esperamos,
Nada corre tão mal como tememos.
Optimistas, nada por garantido tomamos,
Tudo tem de ser conquistado, se o queremos.
Adversidade
Quando a adversidade nos impõe maiores
Embargos,
Temos de nos tornar melhores,
Não mais amargos.