QUADRAS DO DEVER
Combate
Combate quanto quiseres
Mas fá-lo como se um dia
Um aliado, enfim, fizeres
De quem hoje se odiaria.
Enganar
Sempre é preciso correr
De nos enganar o risco
Ou então nunca irei ser,
De aprisionado no aprisco.
Carreiros
Fora dos carreiros que achas
Percorridos, lerdas prosas,
São as verdadeiras marchas
As marchas aventurosas.
Negro
A frase menos humana,
Tinta de negro feitiço,
Que só noite em nós emana:
“Não, não pode dizer isso!”
Flauta
É uma lâmina um espelho
Quando em raiva for quebrado
E um pau vira, embora velho,
Em flauta se for amado.
Metas
Metas para toda a vida?!
E a alegria de viver?
Uma por dia: a medida
De o todo um dia ocorrer.
Andar
Se quiser andar depressa,
Então sozinho há-de andar.
Se chegar longe é o que peça,
Companhia é de levar.
Limpos
O teu dia sempre acama
Com o que deveras és:
Deita-te na tua cama
Sempre com limpos os pés.
Sim
Sempre que é viável, “sim”
Diga então sem hesitar.
Nunca o “não” vai ser afim
De algum dia nos mudar.
Importantes
Mais importantes que tudo
São as pessoas, dramática
Seja embora em erro agudo
Delas a pobre gramática.
Graças
Na vida, dentre as mil traças,
Há linha à tua medida.
Quem se esqueceu de dar graças
Adormeceu para a vida.
Enfrentar
Porque disposto a lutar
Estou, mostrá-lo consigo
Quando consigo enfrentar
Aquele que é meu amigo.
Terror
Medo de não fazer nada
Ante o terror de fazer
Algo mal feito, em jornada,
Força o trabalho a correr.
Espião
Um espião portas adentro
Vale mais, chegada a hora
Em que na luta me centro,
Que um exército lá fora.
Devedores
Quando há demais devedores
A nos saudar dos pascigos,
É fácil, com tais humores,
Gerar muitos inimigos.
Justiça
Pertence a justiça ao rei?
Não! É o rei que lhe pertence:
Para exprimi-la na lei,
Levar a que em tudo vence.
Carril
Um carril é mais barato
Do que um canhão e o que lance,
Além de maior impacto,
Tem muito maior alcance.
Medo
Medo senti-lo-ás gelado,
De ti pende o que ele colha:
O medo é sempre um estado,
A covardia, uma escolha.
Conhecer
É começar a mudar
Conhecer sempre mais fundo:
Quem percebe como estar
Começa a mudar o mundo.
Leitor
O criminoso não teme
Um escritor que o descreva.
Quem da mão lhe tira o leme
É a luz do leitor na treva.
Besoiro
O rico é sempre o besoiro
Pontuando o labor no aterro.
Contudo, nem sempre o oiro,
Afinal, manda no ferro.
Miúdo
Cuidado com o miúdo
Se mais miúdo há-de ser!
Quando já se perdeu tudo
Não se tem nada a perder...
Força
Há quem só respeite a força,
Não usa medidas meias.
Há só uma força que o torça,
Será força mas de ideias.
Sinceridade
Sinceridade é virtude
Tão forte que é subversiva:
Tudo em que tocar activa
De modo que tudo mude.
Intriga
A intriga no escuro vende,
Que com nada o escuro briga.
A claridade é que tende
A enfraquecer toda a intriga.
Inteligente
O que for inteligente
Não aprecia elogio
Num deslumbramento assente
Do que é preso por um fio.
Ego
De teu ego sempre foge,
Abre-te ao sol da manhã.
Recorda que o pavão de hoje
É espanador amanhã.
Abismo
Cuidado com o que cismo,
Não vá tocar-me, por fim!
Se olho demais para o abismo,
Finda o abismo a olhar-me a mim.
Solidão
Se podes, tens de estender
Muito humilde tua mão.
Todo o lugar de poder
É lugar de solidão.
Exige
Aquele que não se exige
Aquilo de que é incapaz
Não faz quanto então o enrije
Nem do capaz já se faz.
Vínculo
Que o vínculo à terra-mãe
Não feche ao mundo o portão,
Senão os laços devêm,
Afinal, uma prisão.
Mérito
O mérito, o que estatui
Traído é por cada qual,
Que pouco o mérito influi
No destino social.
Diploma
Um diploma conta mais,
Se estrato social não rima
Com a chave dos portais,
Que casar com rica prima.
Cor
Nem tudo é duma só cor
Em tudo o que a vida houver.
Quando me entregar à dor,
Já esbanjei todo o prazer.
Imaginar
Quando só restar um dia,
A imaginação arteira
Imaginar pode a via
De dar-me uma vida inteira.
Escapa
A vida muito nos tapa
Da vida mil e um escolhos:
Como fácil nos escapa
O que diante anda dos olhos!
Cova
Não há cova tão profunda
Que, se amor de Deus a invade,
Não a ultrapasse o que a inunda
Em toda a profundidade.
Problema
Quão mais penso no problema
Maior ele me parece,
Menor me sinto, por lema,
- E o resto do mundo esquece.
Antes
Antes de devir senhor
Da natura e dominá-la,
Dominar-se é o que é de impor:
Senhor de si é o que a abala.
Ideia
A nossa ideia de Deus
Tem de ser despedaçada:
É o que ele faz desde os céus
E nunca entendemos nada.
Culto
O culto que a Deus importa,
A liturgia devida
Não tem de edifício porta,
- É transmudar sempre a vida.
Viável
É viável vivermos juntos
Respeitando e promovendo
A comunhão de conjuntos
Originais florescendo.
Silêncio
Vigilante nas ameias
É que mostro quanto valho:
O silêncio gera ideias
Que nos dão muito trabalho.
Interesse
No interesse do poder
Quando em causa é posto em liça,
Primeiro o que irá morrer
É o primado da justiça.
Gozo
O poder, se é por seu gozo,
Não entrega nada à sorte:
Libertará o criminoso,
Leva o inocente à morte.
Incluir
O que quiser incluir
Todos, de eficazes modos,
O que ao fim vai conseguir
Excluído é ser de todos.
Fundo
À escolha com que me crismo
Não lhe encontro fundo a par:
Mesmo no mais fundo abismo
Podemos sempre gritar.
Gosto
O poder de dominar
É que tudo mata um dia.
O gosto de partilhar
É que nos traz alegria.
Sentido
Qualquer sentido da vida
Vai requerer integrar
Numa só família unida
Todo o excluído que achar.
Rumo
É de transformar quenquer,
No rumo que quer seguir,
A vontade de poder
No desejo de servir.
Religa
Religião que se preza
Religa todas as calhas,
Não coloca alguns à mesa
E os mais a apanhar migalhas.
Perturbar
Quem para não perturbar
Vem ao mundo, não merece
Nem paciência, nem, a par,
A honra que se lhe tece.
Dúvida
A dúvida que interroga
É saúde em todo o lado:
É o que a caminhar advoga
De ir em frente com cuidado.
Ameia
Uma fé mais outra ameia,
Cada qual sendo a Verdade?
- Ora, mudar de cadeia
Não é ter a liberdade.
Lógica
A lógica da riqueza
Que quanto mais tem mais quer
É que os céus de inferno lesa:
- Mata até quem não tiver.
Incarnação
Ao cuidar ou ofender
Um ser humano qualquer
Cuido ou ofendo o produto
Da incarnação do Absoluto.
Preceito
Deve ser, com fúria e gozo,
Violado sem remissão
O preceito religioso
Que impede a libertação.
Idolatria
Tendemos à idolatria:
Prendemos Deus na cadeia
De alguns conceitos e um dia
Creio Infindo o que só ameia.
Cegos
Se não mudarmos a vida,
Continuaremos bem cegos
Mas a cuidar, em seguida,
Que vemos todos os pegos.
Perigo
Onde o perigo aumentar,
Deve aumentar a recusa
Daquilo que se antolhar
O que fatalmente abusa.
Cegos
Mesmo quando os cegos vêem,
Àquele que não quer ver
Nada haverá que fazer:
Os olhos vêem, não crêem.
Hierarquizado
Há muito que é posto a par
E é de ser hierarquizado:
É melhor iluminar
Que ser um iluminado.
Atenta
Atenta contra a razão
Só crer sem interpretar,
O bom senso cai ao chão
Sem asas para voar.
Mudo
Ninguém pode ser cristão
E manter-se surdo e mudo
Aos gritos do coração
Do presente a que me grudo.
Primeiro
Quem quiser ser o primeiro
Terá, de todos os modos,
(Tem de ser o derradeiro)
De pôr-se a servir a todos.
Verdadeira
Religião que é verdadeira
Não faz questão de ritual:
Dos pobres trata da jeira,
Converte o rico ao final.
Ritual
Liberta-te do ritual,
Vislumbra aonde ele aponta:
Entreverás o sinal
Da sombra de Deus na ponta.
Integrar
Integrar no coração
Todos de todos os modos
Sem excluídos então
É de Deus fruir dos bodos.
Primado
O destino universal
Dos bens há-de ter primado.
O particular é um mal
Se inverter este legado.
Apagar
Mui poucos com quase tudo
E muitos com quase nada...
- Qual o deus a que me grudo
Para apagar tal pegada?
Sagrado
O sagrado é perigoso
Se sempre se não converte:
O deveras religioso
Busca perpétuo o que acerte.
Intolerância
Sempre em nome do melhor
Conclamar a intolerância
Vai sempre dar no pior,
Seja qual for dela a instância.
Recanto
Jamais é de retornar
A um recanto onde a memória
Gosta feliz de aninhar
Feliz evento de glória.
Mentira
Pesa-nos sempre a mentira,
Mesmo quando nos parece
A princípio que não fira
Com fogo algum qualquer messe.
Agora
Todos de tempo precisam
Para lidar com o agora
Antes que fuja o que visam
Tornado um então de outrora.
Medo
Fazer pensar doutra forma?
Tanta força tem o credo
Que o que se logra, por norma,
É fazer crescer o medo.
Pessoas
Precisamos de pessoas,
De muitas, numa enxurrada.
Sem os mais, tu que é que ecoas?
Não és nem nós somos nada.
Buraco
Ao buraco interior
O trabalho trará glórias:
Fica preenchido um ror,
Já não se enche de memórias.
Ponderado
Pouco importa o bom intuito,
Há que ser mui ponderado.
A vida complica e muito
Se pensarmos com cuidado.
Atropelados
Mesmo no caminho certo
Seremos atropelados
Se, em vez do passo desperto,
Ficarmos ali parados.
Vê
Quem aos cinquenta vê o mundo
Como aos vinte o viu na lida
Desperdiçou, infecundo,
Trinta dos anos da vida.
Presos
São os mais inspiradores
Para o que na vida obrar
Os presos de desfavores
Que nunca logro ajudar.
Nódoa
Sempre a nódoa do falhanço,
Pecador regenerado...
Do que então eu não me canso
De novo é de ter tentado.
Combate
Quem combate a tirania
Nem sempre o faz de verdade:
Nem todos tomam por guia
Combater por liberdade.
Apoia
Apoia quem te rodeia
A aperfeiçoar-se então
Sem lhe exigir, volta e meia,
Que ele seja a perfeição.
Cruz
Uma cruz, quando abraçada,
É mais fácil de levar,
Quando for de a suportar,
Do que se for arrastada.
Caminho
A verdade singular
Do caminho da razão:
O diverso é salutar
E a intolerância, não.
Diverge
Ter a certeza absoluta,
Sagrado dogma, é que ilude:
Deixa fora da disputa
De quem diverge a virtude.
Joga
Sê feliz com quanto acartas,
Joga com o teu recorte
Todo o baralho de cartas
Que em vida te coube em sorte.
Limonada
Se a vida te dá limões
Em vez da doçura amada,
Larga os queixumes que opões,
Faz da vida limonada.
Chave
Preze embora a tradição,
Chave de sobreviver
É acompanhar sempre o chão
Do tempo, tal como vier.
Iminência
Do dinheiro a pertinência,
Toda a busca de poder,
Que sentido irão fazer
Ante da morte a iminência?
Perdoar
Embora mal o pareça,
Ao pôr as cartas na mesa
Meça a lesão o que meça,
- Perdoar não é fraqueza.
Mudar
Se mudar a vida inteira
É a sina que nos sacuda,
É de ir mudando a maneira
Como a mudança nos muda.
Tudo
Quando tudo muda, às vezes,
O melhor, se não me iludo,
Para evitar mais reveses,
Então será mudar tudo.
Fado
A mudança que nos muda
Tudo quanto em nós alcança
É fado que se nos gruda.
- Resta mudar a mudança!
Une-te
Une-te a outra pessoa,
Que, quando te unes aí,
Desatas os nós à toa,
Que te unes, no fundo, a ti.
Sair
Aquele que pretender
Deixar de andar por aí,
Para entrar em si sequer
Terá de sair de si.
Olhar
Quem a si pretenda aqui
Descobrir tem de poder
Deixar de olhar para si
Para a si próprio se ver.
Foges
Todo o mal com que te vi
Neste trajecto ele mora:
Quando não entras em ti,
Foges de ti para fora.
Rotina
A rotina agarro, enfim,
Como meu seguro porto...
E a vida começa ao fim
De meu pátio de conforto.
Acabado
Pode ter-te transtornado
A muda, como um tropeço.
O que quer que haja acabado
É também sempre um começo.
Drástico
Pouco importa o que perdeu,
Que de drástico mudou:
A vida retoma o fio,
Mais alto pode ir no voo.
Criá-la
Não é evitar a mudança
Que é uma atitude de vida,
É criá-la que me alcança
A muda à minha medida.
Dor
O que me provoca a dor
A mudança nunca é,
Mas a forma como for
Perante ela pondo o pé.
Lado
Podes não mudar o fado
De tudo o que andar mudando,
Mas muda então o teu lado:
- Que estás daquilo pensando?
Significado
Nada tem significado.
Significado é o que dou
A tudo, por todo o lado,
Por todo o lado onde vou.
Encarar
Como mudar a maneira
De encarar qualquer mudança,
De modo a mudar à beira
De mim quanto a muda alcança?
Inimigo
O meu maior inimigo
É aquele a que mais me apego
E onde busco em norma abrigo:
- Há-de ser sempre o meu ego.
Castigo
Dos castigos o castigo
É viver atado às mós:
Conheço o meu inimigo,
O inimigo somos nós.
Sobreviver
Sobreviver é decerto
Uma fasquia da vida.
Mesmo no maior aperto
Há sempre qualquer saída.
Espontâneo
Ao reagir espontâneo
Nem verei as vinhas que empo.
Reagir é instantâneo,
Já responder leva tempo.
Enorme
Se a mudança for enorme,
Os medos não são corteses,
Tudo vai do que conforme,
Do que pense duas vezes.
Escudo
Repare a que é que se gruda
Quando pára atrás do escudo
Porque, quando tudo muda,
É preciso mudar tudo.
Alteia
A mudança já me alteia,
Em mim já não sou quem vi
Quando mudo minha ideia
Sobre o que é mudança em si.
Livra
A vida que se fizer
É que livra do degredo.
Não temos nada a temer
A não ser o próprio medo.
Anuncia
O que a mudança anuncia
É a vida ter intenção
De continuar na via
De ser charrua no chão.
Mudar
A muda vem-nos mudar
E o que fim tal muda alcança
É findar eu, em lugar,
A mudar toda a mudança.
Novo
Quero mudar o futuro
Para ser o meu passado
Ou aquilo que inauguro
Tão novo é que nem tem lado?
Ouve
Com quem é que fala Deus
Não é questão que me aprouve.
A questão, perante os céus,
É sempre a de quem é que ouve.
Desejo
Sempre é o desejo que acende
O motor da criação,
Não a cautela que prende,
Ao agir, o pé e a mão.
Segue
Segue o que fundo deseja
Teu íntimo em tua vida,
Pensamento em acto almeja,
Cria teu mundo à medida.
Poder
Se tudo é pelo melhor,
Todo o desfecho, perfeito,
Fio do amanhã o que for,
- É o meu poder que ali estreito.
Vão
O que pensa o coração
É aquilo que o homem é:
Não pense, portanto, em vão,
Senão porá o vão de pé.
Rosto
Se vir sempre tudo bem,
O amanhã mais tenebroso
Muda o rosto com que vem,
É amanhã maravilhoso.
Fora
Quando, ao que ocorrer agora,
Deste agora penso mal,
O mal veio-lhe de fora,
Minha impressão digital.
Entrada
Eu à mudança, de entrada,
Não vou fazer grossa vista.
Não é que não faça nada,
É só que lhe não resista.
Resistir
Para caminhar tranquilo
Importa ver no que insiste:
Não resista porque aquilo
A que resistir persiste.
Modo
O modo como conduz
A vivência do presente
É o modo como produz
O porvir ali à frente.
Bisturi
É muito bom entenderes
Do Cosmos o bisturi:
Por vezes o que tu queres
Não é o melhor para ti.
Colher
Colher os dados da vida
É questão de silenciar
A mente e ouvir em seguida
Que é que tem alma a contar.
Aviada
O problema da moral
É que é sempre mal aviada:
Maneira certa, afinal,
Não há de fazermos nada.
Criação
Toda a mudança futura
Há-de ser de criação,
Não muro que me inaugura
Da resistência a função.
Funcionar
Quando ocorre uma mudança
É de algo não funcionar
E tu buscas, frança a frança,
Tal erro modificar.
Mal
Se desejas mal a alguém
Recairá sobre ti.
Aquilo que trepa além
Terá de cair dali.
Feliz
Se é de ser feliz um ano,
Então ganha a lotaria.
Se o resto da vida é o plano,
Ama o labor de teu dia.
Lamentar
Não podendo adivinhar
O futuro que teremos,
Passo a vida a lamentar
Perder o que não perdemos.
Torcido
Um homem em ânsias arde,
De ver perdido o porvir?
- As flores vão nascer tarde,
Mas em breve irão florir.
Progressão
Há muito na progressão
De homem a ser engendrado:
É de ter sempre em tenção
Esperar o inesperado.
Sucesso
Sucesso que não é escasso,
Que ao próprio enche de pasmo:
Ir de fracasso em fracasso
Sem perder o entusiasmo.
Critério
Ir fazendo o que é possível
Não é o critério primário.
Mais além o que é exigível
É atingir o necessário.
Arrependimentos
Não quer arrependimentos
O Espírito mas, na escolha,
Mais vida com mais aumentos
Na vida a mais que eu recolha.
Incombinável
É uma dupla incombinável
A de ter medo e ter fé:
Se me entrego ao inefável,
Que medo fica de pé?
Projecto
Vê que é que te põe feliz,
Que podes fazer melhor,
Que é feliz doutrem matriz...
- É teu projecto a dar flor.
Fatigar
Não faz mal fatigar Deus
Orando até à exaustão.
Lá dos altos coruchéus
Ele adora ouvir o chão.
Negatividade
Quando não nos protegemos
É que a negatividade
Alimentamos e vemos
Crescer por toda a cidade.
Medo
A nossa resposta ao medo
Com mais medo é que é problema.
Veloz me liberto e acedo
Se o optimismo é meu lema.
Seguro
Se alguém é seguro ali
É de despojar-se pleno,
Não quer coisas para si
Porque é o que o torna pequeno.
Doutrem
Nada melhor do que ler
Sobre doutrem os problemas
Para por fim esquecer
Os próprios, por mais que os temas.
Rota
Antes de amarrar o estai,
Traça a rota ao desjejum.
Quem não sabe aonde vai
Não chega a lado nenhum.
Borla
Há quem viva a vida à borla
Sem fender a própria ilha.
Mas de só só escapa à orla
Trocando a borla em partilha.
Momento
Só tens neste instante o assento,
Depois no outro de que acercas.
Vive, pois, cada momento,
Este teu tempo não percas.
Apoio
Ser pai não é ser o apoio
De apoiar todos em tudo,
Mas, se o pouco mudo em joio,
O apoio em veneno mudo.
Frente
Ainda tenho coragem
De seguir constante em frente,
Nem sabia que viagem
Ter alternativamente.
Adiante
Cometemos muitos erros,
Arcamos com consequências...
E em frente, que, em frente, os cerros
Do além mostram excelências!
Apronta
Bem longe do coração
Enterra de ontem o afã.
Logo apronta tua mão
Para abraçar o amanhã.
Respeito
Respeito quem reconheça
Os erros sem ter abalos,
Sobretudo se começa
Sem mais demora a emendá-los.
Malvisto
Trata tu de ser benquisto,
Que mal tempo há para eleitos
E aquele que for malvisto
Terá todos os defeitos.
Bem
Todo o bem que puderes tu pratica
E então pratica-o sempre que puderes
E em quantos o puderes multiplica,
Que o tempo te replica o que fizeres.
Poucas
Procura dominar poucas questões,
Porém bem e nos mais breves instantes.
Que as questões que domines sem fundões
Sejam também as mais determinantes.
Juntos
Quando, inimigos, juntos navegamos
No mesmo temporal que nos desfaz,
Atravessar devemos, servos e amos,
O rio em trégua unidos sempre em paz.
Livre
Sem haver troca livre das ideias
Num bem sólido Estado de Direito,
A inovação se escoa nas areias,
Definha a iniciativa murcha a eito.
Censurar
Será o nacionalismo muitas vezes,
No totalitarismo dum Estado,
De censurar difícil mais que as teses
Do dissidente mais fundamentado.
Error
Dizer que cometemos um error
Por muitos é tomado por fraqueza,
Quando da força pode ser vigor,
Maturidade em quem demais nos preza.
Extremista
Um extremista ao que exorte
Não é à mente desperta,
Ninguém atravessa a porta
Se a porta não for aberta.
Medo
Não devemos jamais negociar
Forçados, a tremer, por qualquer medo,
Mas nunca deveremos, nunca, a par,
Medo de negociar ter como credo.
Retrovisor
Deixa o passado e seus frondosos ramos
Só de teu pé no apoio que operar.
Avançar é difícil quando estamos
Pelo retrovisor fixos a olhar.
Acérrimo
Até o mais acérrimo inimigo
Consegue superar a diferença
Para trabalhar junto, se ao abrigo
Dum bem maior na igual comum pertença.
Lesões
Quem as lesões do passado
Não conseguir abolir,
Passa-lhe o futuro ao lado
Sem lhe lograr aderir.
Cobras
Cuidado com as cobras letais no quintal,
À espera de que mordam somente os vizinhos.
Se mal vos precatais, quando derdes por tal,
Envenenados fostes já pelos caminhos.
Dia
Se não tem onde se acoite,
Nunca deixe de sonhar.
Por longa que seja a noite,
Finda a manhã por chegar.
Momento
Há um momento em que olhamos para a frente
E entendemos que temos de parar
A luta a se vingar de antigamente
Para o porvir poder-se edificar.
Inesperado
Vivemos com o imprevisto
Sempre, sempre lado a lado.
Para reduzir-lhe o quisto,
Sempre espera o inesperado.
Principia
O trabalho principia
Se o terror de algo mal feito
Cede ao medo que teria
De nada fazer de jeito.
Preservar
Se a tua liberdade preservar
Quiseres, então poupa a opressão
Ao inimigo teu: é sempre a par
Que os actos nos convencem de que há chão.
Melhorar-me
Se quero um mundo melhor,
Então há que melhorar-me
E o primeiro a me propor
É que inteiro me desarme.
Inimigo
O verdadeiro inimigo
É o inimigo interior.
O exterior não tem perigo,
A muda àquele ao me impor.
Interesse
No meu melhor interesse
Deverei fazer aquilo
Que garanta a toda a messe
Aloirar a um sol tranquilo.
Mordem
Como os dias mordem,
Cada hora um prego,
Que em nós haja ordem,
Nunca, pois, sossego.
Juntar
Temos de juntar palavras
Às muitas que nos juntaram
Ou silêncios onde lavras
O que os sonhos semearam.
Sabor
Aquilo que apanhaste
Ao sabor do acaso, na tarde serena,
Aquilo que não forçaste
É que vale a pena.
Controlo
Sem controlo do que sinto,
Só poderei controlar
A resposta ao que, no plinto,
A emoção me desfiar.
Esperas
Quando esperas o pior,
Tanto podes ter razão
Como agradável, então,
Ter a surpresa maior.
Rumor
O rumor apropriado
Numa apropriada orelha
Pode fazer um finado
Do rei que ali aconselha.
Escraviza
Aquele que se escraviza,
Escravo do coração,
Então a morte até giza
A quem livre o queira então.
Liberta
Ninguém liberta ninguém,
Que a liberdade é de dentro
Que inteiramente provém,
Nunca fora encontra o centro.
Assumo
Se me assumo sonhador,
Sonho devém realidade,
Que mais não seja em pendor
Que, inclinando o mundo, o invade.