Só
aparentemente, porém: é aqui que nasce o sentido do número sete como diferente
do seis que o antecede – o Cosmos, na experiência da Terra, não se estrutura
apenas na base de ciclos de seis, mas contém nele o germe do número seguinte, o
sete, que se não deixa apreender à primeira, se mantém como que escondido,
virtual. Daí o estatuto diferente e sagrado do domingo ou sábado: é a área dum
mistério cósmico, uma ligeira assimetria que nele existe e se manifesta quando
se observa com muita precisão e subtileza, senão escapa-nos.
Foi isto que levou à escrita do primeiro capítulo do Génesis na Bíblia e na
Tora (cerca de 500 a. C.), consagrando os seis dias da criação e o sétimo para
descanso do Criador. É a mesma ligeiríssima assimetria da descoberta
astronómica de que há uma variação minúscula no comprimento de onda do ruído de
fundo do Cosmos, vestígio arcaico, hoje ainda detectável, da explosão primitiva
do Big-Bang: este pequeno nada que constitui excepção ao resto é que permitiu a
formação dos biliões e biliões de Galáxias, dos triliões e triliões de astros
do imenso Universo onde a Terra é um vago grão de pó. Doutro modo, toda a massa
cósmica seria homogénea e nada se teria conseguido diferenciar. Quer dizer: nem
nós sequer poderíamos alguma vez ter existido. Nem, perante o determinismo
universal, sermos esta ínfima gota de liberdade, semente doutro mundo: a nossa
vida interior com o livre arbítrio que nos marca. Somos directamente o fruto do
que há de estranho, de irregular por trás do número sete: ele anota, na base
seis, a desviância criadora que é um princípio universal, o
estruturador-gerador radical do Universo inteiro, tal como existe.
A génese aritmética do sete confirma o mesmo sentido. Tudo começa com o
arquétipo três: nele assenta milenarmente a Trindade Divina, bem como a noção
da mudança histórica, como de qualquer transformação, desenvolvimento ou evolução,
mesmo individuais – a conjuntura que impera (Pai), aquela em que pode
transmudar- -se (Filho) e o movimento dinâmico que leva duma à outra
(Espírito), o que constitui o modelo formal de toda a dialéctica,
plurissecularmente (tese – antítese – síntese; afirmação – negação – negação da
negação…). Ora, o três resulta da soma do um (o uno original, indiferenciado)
com o dois (o primeiro múltiplo, símbolo de todos os mais, de toda a
diferenciação e individualização humana e cósmica). Juntos os dois, o uno e o
múltiplo, temos o Todo sem qualquer fronteira, o Infinito: o três simboliza a
Infinidade porque é tudo, por isso identifica-se a Deus (a Trindade).
O ciclo de toda a mudança, porém, como o da nossa própria transformação
pessoal, é interminável: após cada ciclo de três momentos ocorrem outros três e
assim permanentemente, ao infinito. Ora, a primeira soma de dois ciclos (que
simboliza todo o encadeamento) dá-nos o número seis. O sinal de que os elos não
terminam aí, de que se prolongam indefinidamente e, eventualmente, na
infinidade se acabarão por consumar de alguma forma misteriosa, é o que
significa o número sete, o primeiro do infinito prolongamento, o primeiro do
Infinito: a porta da Eternidade. O sete significa a esperança da consumação em
plenitude, aponta o Céu, é o Além realizado já nos que ainda vão a caminho,
através dum Universo em expansão.
As Humaníadas estruturam-se em catorze vezes catorze partes: são duas
vezes o sete, em cada bloco. Falta o terceiro sete, aparentemente, para o
arquétipo três aqui também se verificar. Só que ele, a marca do Infinito
consumado, ainda aqui é virtual: está apenas em gérmen, na germinação das vidas
que queiram servir-se das Humaníadas para inspirar-se nos itinerários
que inaugurarem. Mas virtualmente é presente já também numa propriedade dos
números do poliedro com que aleatoriamente quenquer pode fazer a escolha do
poema-mensagem do dia, nas duas primeiras etapas (referidas atrás em o “Livro
das Mutações” – I Ching).
O poliedro das catorze faces deve ser construído a partir dum cubo, o arquétipo
geométrico da Kaaba, o monumento sagrado de Meca, de referência para todo o
mundo muçulmano.
1 – Constrói-se primeiro um cubo, com as seis faces (de novo duas vezes o
número três) numeradas de tal modo que a face superior tenha o número 1 e
aquela em que poisa, o 6; a que fica de frente para o observador tenha o 2 e a
oposta, o 5; a que fica à esquerda do dois deverá ter o número 3, a da direita,
o 4; deste modo, a soma das faces opostas será sete, o número arquetípico de
referência, e a disposição relativa delas será, nos números baixos, a do
movimento aparente do Sol no hemisfério norte e dos ponteiros do relógio que o
reproduz, enquanto os números mais altos se disporão no sentido inverso, em
conformidade com a rotação real da Terra, verdade milenarmente oculta e muito
tardiamente descoberta.
2 – Seguidamente cortam-se os oito vértices do cubo pelo meio das faces de cada
quadrado, resultando daqui oito triângulos (de novo o número três, agora o dos
lados destas faces, a figura geométrica da Trindade e do Olho Divino), a
enquadrarem os seis quadrados do cubo original (agora de tamanho reduzido pelo
corte); seis quadrados mais oito triângulos dão as catorze faces do poliedro.
3 – A numeração das faces triangulares deverá ser feita, pelas mesmas razões
reportadas em 1, da seguinte forma: pousando o poliedro com o n.º 1 virado para
cima e o dois de frente para o observador, os números 7, 8, 9 e 10 devem ser
atribuídos, a começar pelo triângulo da esquerda, segundo o movimento dos
ponteiros do relógio; os triângulos que se opõem a cada um destes (em que o
poliedro repousa quando cada face triangular fica para cima) terão,
respectivamente, os números 14, 13, 12 e 11, de modo que a soma das duas faces
contrapostas, a visível e a oculta, dê sempre 21.
E eis
como encontramos o terceiro sete (3x7=21), o do desafio do Infinito ao tempo da
finitude, o da nossa semente de germinar eternidade.