TRILHOS DE SONHO
Todo
Todo o amor mente,
Que o Todo não é credível:
Todo o amor, todo, é fisicamente
Impossível.
Proposta
Uma proposta tentadora
Tem o calor
Que define, na hora,
O amor.
Epiderme
A epiderme
De apaixonado andar
É esquecer-me
De pensar.
Arcano
O decano dos arcanos:
A idade não
É de medi-la em anos,
- Medimo-la em paixão.
Tristeza
A tristeza duma criança,
Tenha embora todos os bolos,
É ver que jamais alcança
Quem lhe festeje os golos.
Nuvens
Quando amamos, as faixas
São tão celestiais
Que até as nuvens ficam baixas
Demais.
Agora
Se para amar houver mais,
Quero-o agora,
Não vá, pela demora,
Devir tarde demais.
Mais
Mais que do mundo todas as escolas,
Que dos livros do mundo toda a sina,
Que da vida a dureza das esmolas,
- O amor ensina.
Propor
Na vida
Só vale a pena propor
O que mais me agrade e agrida:
- O amor.
Merece
Único alvo
A propor
Que merece ser salvo:
- O amor.
Viver
Amor é deixar de ver
O que é estar vivo
E passar, assertivo,
A ver o que é viver.
Tenta
O amor inventa
Aquilo com que me acerto e me iludo.
- O amor tenta
Tudo.
Léu
Como o amor
Me põe ao léu,
De que vale me opor?
A derrota já ocorreu...
Perdido
Se “estou perdido!” nunca gritaste
Com terror,
Então decerto te enganaste:
- Não é amor.
Motor
O motor,
Se te moves um bocado,
Quando em ti tudo anda parado,
Então é o amor.
Tempo
Quando o tempo de quem amas
É sempre, com fervor,
Proclamas
Saber a amor.
Basta
Basta estender
A tua mão
Para todo o amor aí caber:
- Tua mão sou eu então.
Dilata
O que os corpos dilata
Não é o calor,
A dilatar o que os desata
É o amor.
Demais
Tudo tem medida e peso
Da terra nos quintais.
Apenas o amor que prezo
É demais.
Adejo
Mais que um adejo
De asa,
O amor faz de cada beijo
Uma casa.
Inferior
Se, por superior que sejas
Te vês sempre inferior
Quando pelo Infinito adejas,
Então é amor.
Sair
Como sair donde se tem tudo,
De entrada,
E a gente se sente, sobretudo,
Nada?
Desencontros
As amizades estão lá,
Para sempre existem,
Mas os desencontros, aqui ou acolá,
Enganam: é que, mesmo inocentes, persistem.
Sai
O que um lar arrasa
Quando cai:
- Quando a mentira entra em casa,
O resto sai.
Par
Da vida na caminhada,
Sem par ao lado,
Toda a mulher apaixonada
É um abraço desempregado.
Amigo
O grande amigo é também
O que entende os sinais
Quando a amizade que tem
Fica a mais.
Compreender
Felicidade,
Compreender o outro para assim
Poder de verdade
Amar-me a mim.
Sempre
Dás-me para sempre felicidade
Sempre que de felicidade eu precisar
- É do amor a identidade
Singular.
Cota
O amor tem uma cota
Alta e baixa por igual:
É derrota
Mas é derrota imortal.
Congrega
Do graúdo ao miúdo,
Tudo se congrega no íntimo fulgor.
Quando se conluia tudo,
Então é amor.
Palhaço
Quando não passo,
Pese embora meu valor,
Dum palhaço,
É o amor.
Lar
No lar
Do porvir
Tentar
É a antecâmara de conseguir.
Corpo
Um corpo é o que resta,
Apagado o lume do calor,
Dejecto do que presta:
- Ao corpo só resiste o amor.
Silêncio
Convence-o,
Ao ensurdecedor
Silêncio,
- Senão não é amor.
Música
Amar
É música a sós
A germinar
Em nós.
Precisa
Se de braços teu laço precisa,
Não é um abraço
Que viabiliza,
É um fracasso.
Procurar
Mais difícil que procurar
Quem auguras
É saber ser encontrado, singular,
Por quem procuras.
Encontrar
Alguém que não existe nem há-de existir
Ando a procurar.
Isto não me irá, porém, inibir
De, no desencontro, encontrar.
Maior
O amor maior é o de quem se separa,
No disfarce
Que melhor o simulara,
Sem ter de separar-se.
Único
De escândalo não há temor
Algum:
Ou é único o amor
Ou não é nenhum.
Ai
Fazer de Deus dói,
Tão sozinho perante o adorador.
Ai?! Então foi,
Então é o amor.
Loucura
Se é loucura
De mim tudo à flor,
Não tem cura:
- É o amor.
Somos
Ontem era eu, eras tu,
Agora somos nós, sem pavor
Do tabu:
- É o amor.
Segundo
Cada segundo do dia
Elevar
De para-sempre à categoria
É amar.
Nadas
Uma cadeia de nadas
Em tudo transmudar
Pelas jornadas
É amar.
Assenta
Um sofrimento
Que nos assenta perfeito,
Eis o momento
Dum amor do peito.
Sofrendo
Vai sofrendo, sofrendo,
Sempre da alegria num pendor
Em que morre vivendo:
- É o amor.
Borla
Mesmo a elevada quantia
É quase de borla
E nem repararia?
- É do amor a orla.
Procura
Vou à procura de Deus,
Tudo acalenta o fervor
De trepar aos céus...
- É o amor.
Abraço
Um abraço real,
Na demora,
Aperta muito mais, fatal,
Por dentro que por fora.
Ajoelhe
Ante o fulgor do infinito
“Ajoelhe, por favor!”
É o grito.
E é o amor.
Apenas
Um corpo com outro corpo é apenas isso que temos.
Apenas. Não merece palmas.
Todo o prazer vem das almas,
Do que sentimos por dentro do que fazemos.
Sinal
Sou o mais feliz do mundo
E o mais triste, por igual?
- É o sinal
Do amor fecundo.
Garrafa
Abrir uma garrafa de champanhe
Como um tiro na cabeça, de estupor,
- É o perfil que sempre em nós ganhe
O amor.
Reflectes
Se reflectes como amas e desamas,
Quando e porquê,
Então é
Porque já não amas.
Sem
Permanecer
Sem amar
É apenas estar, aguentar,
Até ver...
Linguagem
Todos os que amam falam,
Bem feita a triagem
Do que mutuamente doem e regalam,
Falam a mesma linguagem.
Escorregar
No precipício final a escorregar,
Espero que estejas aí a bulir
Para me agarrar
Quando eu cair.
Alguém
Se alguém eu for que ama alguém,
Quando tal alguém me morre,
Fica o vazio que advém
Por onde o eu-ferida me escorre.
Agora
Sem demora, sem demora
E tudo com toda a cor.
Se só pode ser agora,
Então é amor.
Corre
Se o que te percorre
É o ardor
Dum “vá, corre!”,
- Então é amor.
Tudo
Não digo nada
Mas faço tudo – é o rumor
Da chegada
Do amor.
Monstro
Ninguém imagina
O monstro que eu for,
- É a sina que me destina
O amor.
Já
Não é nunca já
Mas sempre agora
- Eis como estará
O amor na demora.
Jeito
Não sei se o devia ter feito
Mas fiz,
- É do amor o jeito
Feliz.
Custos
Tem custos
E custos elevados:
Os amores não são justos,
Por mal de meus pecados.
Assim
Quero-o assim,
Por bizarro que seja o teor
Que manda em mim:
- É o amor.
Redor
Todos somos
O que estiver em nosso redor,
De que dispomos e não dispomos?
- É o amor.
Dor
Jamais é por engano
A dor
(Como se doer não fora humano!)
- É amor.
Desde
Desde o dia em que te vi
Desataram-se-nos do mundo todos os nós,
Só nós ficamos aqui,
Só nós.
Cada
Cada vez menos eu,
Cada vez mais tu,
Eis como em mim cresceu
Meu eu sem tabu.
Temo
Temo que o mundo
Não esteja pronto para te entender:
É o amor fundo
A ser.
Dimensão
Quando aqueles a quem amas
Não têm dimensão para o acolher,
São do amor as chamas
A ferver.
Requer
Tudo o que faço
Te requer a ti,
É do amor o laço
Em frenesi.
Crer
Amar é crer, casmurro,
Em tudo o que quem se ama for:
Se é burro, é burro,
Se é sonhador, é sonhador.
Luta
O amor é poder de luta,
Ninguém luta mais que quem ama.
Da vida na disputa,
Lição de vida em toda a trama.
Decreta
Tem da eternidade o recorte
E o fulgor.
Se não decreta a morte,
Não é amor.
Longe
Há que bem fundo descer
Para bem longe chegar
- É o amor a crescer
Ao fermentar.
Parece
Se para sempre não parece que irá durar
Sem deixar de parecer
Que para sempre vai acabar,
Então amor não há-de ser.
Chegou
O amor chegou:
A floresta floresceu,
O mar acalmou
- E a vida aconteceu.
Ínfimo
Existo e não existo
No mais ínfimo pormenor,
Ninguém logra explicar isto...
- É o amor.
Fugir
Assim vale a pena fugir
De ti, de mim, do mundo em redor,
Sem ter para onde ir?
- É amor.
Alta
Mesmo quando tudo em alta
Em mim andar e em redor,
O teu corpo faz-me falta,
- É o amor.
Resignado
À justa
Sofro, resignado, qualquer dor.
É (mas custa...)
O amor.
Fugir
Amas quem amas para fugir
À precisão, à dor.
Todos os actos são fugas, a se escapulir,
São cobardes, mas... que bom sabor!
Tem
Se tem de ser,
Então tem muito valor:
Acaba de acontecer
Amor.
Destruidor
Não desistir de procurar
O que não aquece nem arrefece
É o maior destruidor dum lar
Que o planeta conhece.
Retorno
Amar é o retorno à meninice,
Descobrir novas vivências e folguedos,
Em perene traquinice,
E até novos brinquedos.
Indecifrável
Se é indecifrável e enche por completo
O fervor
De que vem repleto,
Então é amor.
Amado
Se não és o ser
Mais amado que a terra conhece em todo o lado,
Então nem és sequer
Amado.
Está
Dói,
Basta, porém, saber que está.
Sempre o amor assim foi,
É e será.
Antes
“Mexe-te, antes
Que se desvaneça!”
- Eis os garantes
De que o amor aconteça.
Ontem
Se até planear o ontem
Viável for,
Então com ele contem,
- É o amor.
Respiração
Se é pela respiração dele
Que te manténs a respirar
Através de toda a pele
- Então é o amor a amar.
Privilégio
Viver a vida é um privilégio
E é um privilégio quando se ama.
Quando não se ama é um sacrilégio
O privilégio de saltar cada dia da cama.
Rumo
Amor é, do perto
Ao longe, fecundo,
Todo o mundo
No rumo certo.
Quesito
Nem o céu é tão bonito
Nem o inferno, tão quente
Em nenhum quesito
Dum amor presente.
Cem
Cem por cento és falível
(Verdade que nunca falha)
- E é do amor a incrível
Falha.
Faca
Isolda e Tristão, Romeu e Julieta,
Inês e Pedro...
Há uma faca que entre eles se espeta:
O amor onde medro.
Amputado
Se te dói o que não tens,
Amputado fingidor,
Toda a dor que em ti reténs
É o amor.
Vivo
Se ainda te deixa vivo
Depois de toda a dor
A que nem se esquiva, esquivo,
- É o amor.
Perna
Se até arrancares uma perna, de paixão
É um acto de ardor,
Então
É amor.
Respirar
Enquanto, ao respirar,
Algo está mal
- É do amor o sinal,
Ao entrar.
Calçada
Se não dói como deve ser,
Não presta para nada
- É o amor a correr
As pedras da calçada.
Conta
Vamos fazer de conta
Que não sabes de nada
- Do amor é a ponta
Da chegada.
Muito
Tem de doer muito
Para findar de vez
- Foi sempre o intuito
De que o amor se fez.
Penhor
- Não te estou a entender!
É o primeiro penhor
Do que há-se ser
Um amor.
Quão
Quão mais longe estiveres,
Mais perto do começo
- É amor, ao seres
Teu próprio tropeço.
Sugestão
Quando toda a sugestão
Perde o valor
Porque não existe outra opção,
- Então é amor.
Resultado
Se menos que uma vitória
Nenhum resultado for,
Então, glória:
- É o amor!
Actividade
Se é a única actividade mantida
A que podes, com pundonor,
Chamar vida,
Então é amor.
Ganhar
Se só pudermos ganhar,
Quer à neve, quer ao calor,
Não há que duvidar:
- É amor.
Multidão
Se meu lar é no meio da multidão
Com o drapejar do calor
Em cada tição,
Então é amor.
Vida
“És a pessoa da minha vida”
Ecoa
“És a vida da minha pessoa”
Em ti contida.
Apertam
Mãos que apertam o medo,
Dissolvem a ansiedade ao calor,
- É o credo
Do amor.
Resto
O resto é um corpo a respirar,
Estendido ao suor
- É o mapa linear
Do amor.
Resultados
Resultados definitivos,
Só lá para o fim da noite
- São segredos activos
Que o amor acoite.
Impeçam
Aquilo que não permite
Que te impeçam de ser feliz
É do amor palpite
De raiz.
Lado
O amor não vai dar a lado nenhum, por isso
Vai a todo o lado
No chamiço
Incendiado.
Inconsequente
Todo o amor é inconsequente
E não é por isto que, por excelência,
É o que mais tem congruente
Consequência.
Esfera
Se até não é o que cuidavas que era
E continua sendo o que sempre foi,
É da esfera
Do amor: dói.
Imagem
Uma imagem
Que só tem a imagem dele:
É a viagem
A que só o amor impele.
Mundo
Colocar o mundo no lugar de ti,
Sendo tu o mundo inteiro
Aqui,
É o amor: primeiro sempre e derradeiro.
Impede
És o que me impede de morrer
Quando
Não deixas de ser
O que me vai matando.
Mancha
Se não admite
Uma única mancha,
É o amor no limite
Que em teu peito se engancha.
Mãos
Se até as mãos recordam
Quem é amado ao amador,
Todos os recantos em nós concordam:
É o amor.
Pertença
Se a felicidade de teu par
Não é pertença tua,
Aí, singular,
É o amor que actua.
Contigo
Se caminha contigo,
Mesmo quando estás sozinho,
Mais que teu abrigo,
É o amor teu caminho.
Nega
Se não nega aquilo que és
Enquanto afirma o fulgor
Que em ti negas cada vez,
- Então não é amor.
Ainda
“Ainda não estou pronto para te amar”
Ouvirás talvez.
Podes ouvir mais verdadeiro, a par:
“Estou pronto para te amar outra vez.”
Abraço
Se um abraço te faz sentir
Que até a morte já passou, na dor
A refluir,
Então é amor.
Bala
Se nem uma bala o mata,
No furor
Que o maltrata,
Então é amor.
Esquecer
Se te faz esquecer,
Na euforia do calor,
Que até podes morrer,
Então é amor.
Certeza
Se até aquilo em que não crês
É certeza para ti,
Então, durante o entremez,
O amor anda por ali.
Pena
A pena irrita,
Fere com dor.
Se até a pena te excita,
Então é amor.
Orgulho
Se de maneira alguma
O orgulho o admite,
Então é o amor que, em suma,
O concite.
Agradeces
Se o que nem sabes agradeces,
Seja lá o que for,
Então em ti não esqueces:
Mora o amor.
Menos
Se cada vez mais
O entendes tu menos,
São do amor sinais
E acenos.
Fala-te
Fala-te alguém
Com calor,
Como se te conhecera bem?
- É o amor.
Ocorreu
Algo ocorreu
Com a estranheza do fervor?
- Aconteceu
Amor.
Sendo
Se não entendes
O que anda ocorrendo,
Para onde pendes?
- É o amor sendo...
Entender
Um amor que logro entender
É tudo o que for
Para quenquer
Menos amor.
Rendes
Se o não entendes
Nem consegues entender,
Então o que em ti rendes
É o amor a ser.
Resto
Se tudo o resto, sem valor,
É tempo perdido,
Então é amor
Vivido.
Desilusão
Se nem o medo da desilusão
A ilusão lhe retira,
É o amor então
Em mira.
Coma
Todos os amores estão
Em estado de coma
E só reviverão
Se em cada dia nova vida se lhes soma.
Amizade
Em amizade
De raiz
Se mede o que grade
A riqueza dum país.
Lugar
Se todo o lugar o vir com a pele
Minha e tua num único andor,
A procissão que me impele
É o amor.
Parte
Se é parte dum destino comum
Perenemente a propor
O desjejum,
Então é amor.
Passos
Se todos os passos te aproximam
De alguém,
As flores que o encimam
São amor que advém.
Perdoar
Perdoar, no lar maninho,
Limpa os canos, decidido.
Quem não perdoa vai a caminho
De ficar entupido.
Capaz
Quem não é capaz
De ajoelhar
É incapaz
De amar.
Intenso
Um amor intenso
Pode não ser intensivo.
Vai resistindo, não muda, denso,
Até que a máquina desliga o morto-vivo.
Mesmo
Se de teu par a felicidade
Está no mesmo lugar da tua,
É amor de verdade
Que em ti actua.
Mata
Como dizer a quem nos mata
Que o amamos (deste amar
Que nos maltrata)
Nem que a morte nos separe?
Cemitério
Se até um cemitério
Romântico for,
Não é um refrigério,
- É um amor.
Tudo
Se, quando nada tens,
Te abraça, contudo,
Então não há reféns:
- Tens tudo.
Maneira
Se maneira não houver
De o dizer doutra maneira,
Então há-de ser
O amor à beira.
Trambolhões
Se não te obriga a dar trambolhões,
Do serão ao calor,
Embora não tenha senões,
Não é amor.
Ninguém
Se não há mais ninguém,
O fulgor
Que ali se mantém
É amor.
Intenção
Se é com intenção,
É fingido o fulgor.
Então,
Não é amor.
Primeira
Dito embora milhões de vezes,
Milhões de vezes feito, charrua ao chão,
O amor, apesar dos reveses,
É sempre em primeira mão.
Importa
Se é o que importa
No meio de seja o que for,
Então, esta porta
É o amor.
Nem
Nem eu nem tu,
Apenas o nós plural, com todo o teor
E sem tabu,
- Então é o amor.
Queres
Se não queres voluntariamente,
Com o que és de melhor e de pior,
Ser feliz com toda a gente,
- Então não é amor.
Emergência
Se não é uma emergência,
Seja lá o que for,
Então, com evidência,
Não é amor.
Manténs
Se manténs o mesmo estado
Hoje e sempre, com pundonor,
Então andas enganado:
- Não é amor.
Contra
Se até contra o impossível
Logras argumentar com valor,
Não é incrível,
É amor.
Falecer
Quem falecer de amor
Jamais soube o que amor é.
De amor só se morre no horror
Que, ainda por cima, nos mantém de pé.
Especializa
Quem ama é que se especializa
Em tudo o que enrije,
Na trama que dia fora lhe desliza
Pelo que o amor exige.
Lençóis
Quando se ama, o que ocorre
É que é debaixo dos lençóis, jucundo,
Que se percorre
O mundo.
Universal
Se é a verdade universal de tua vida,
Seja lá isto o que for,
Ninguém duvida,
É amor.
Bom-dia
Se até um bom-dia
É de amor declaração,
De ti apenas é amor o que irradia
Então.
Vivo
Se estar vivo
É de amor vos germinardes,
Então é amor: festivo
E sem alardes.
Levas
Se levas o destino que te leva,
Enquanto ainda a caminho,
É amor, na treva,
De mansinho.
Rodar
Se a terra ainda deixa de rodar
Quando te beija com fervor,
Então ainda é lugar
De amor.
Vezes
Se jamais olhas alguém
Vezes bastantes,
É o amor que tem
Lonjuras a mais antes.
Sobrevive
Nenhum amor sobrevive
Sem vísceras nem pele:
Se “estás bem?” é a pele que arquive,
“Amo-te!” são as vísceras por que se impele.
Resposta
Se “estás bem?” não obtém resposta
Mesmo de frágil palor,
Qualquer que seja a aposta,
Não é amor.
Sentido
Se o mundo fazer sentido
Fizer com fulgor,
Então o ali vivido
É amor.
Sumo
O amor tem sumo
Com sabor,
Se não é um rumo,
Não é amor.
Amo-te
Se “amo-te” não tem resposta,
Sem da rotina ser o rumor,
A mesa posta
Não é a do amor.
Mata
Se a possibilidade de teu par morrer
Te mata de horror,
O que te ata
É amor.
Monossílabo
Se é monossílabo toda a palavra
Que diz o que sentes no interior,
O fogo que em ti lavra
É amor.
Salvação
Quando, em todos os abraços,
De salvação cada um for,
Então há laços,
É amor.
Passado
Se ao passado não cura
Da dor,
Então não é a figura
Do amor.
Estar
Se basta estar
Sem impor
Sequer o lugar,
Então é amor.
Única
Se tu és a peça única
Que sempre requer o par,
Inconsútil túnica,
Então é amar.
Só
Só quem ama consegue,
Prisioneiro do fulgor
Que o persegue,
Ver o amor.
Sais
Se entras liberdade
E sais fervor
Que te invade,
Então é amor.
Dias
Se é do outro pelos dias
Que os teus teces com vigor,
Então não são fantasias,
É amor.
Entretido
Se entretido demais não te deixa
Para poder viver ao sabor,
Então a tua deixa
Não é amor.
Prisão
Se até uma prisão te faria
Feliz, ao se te impor,
Então não é do teu dia,
É do amor.
Voo
Se te faz ver-te como jamais te viste,
Feito voo de condor,
Não és tu que existes no que em ti existe,
É amor.
Visam
Pelo que visam no que são,
Todos os amores
Então
São superiores.
Fala
Se quando te fala te ouves a falar,
Tu que nem és falador,
Então és lugar
De amor.
Imaculado
Se mesmo sangrando é imaculado,
Tal o fervor,
Não há chaga do lado,
Há amor.
Interrompe
Se interrompe tudo o resto
Com um murro sem pudor,
Só pode ser um apresto
De amor.
Continuar
Como continuar a vida
Quando uns olhos te deixam fixo na parada?
Como pedir um caminho, em seguida,
Se encontras um destino à chegada?
Nós
Para irmos para nós
Por onde vamos?
Em que lugar, com que avós,
Onde o nó do nós para onde caminhamos?
Errado
Se tens tudo para dar errado
E, contudo, é do mundo o melhor
E mais acertado,
Então é amor.
Ambos
Nós ambos e a parede entre
É tudo de que temos precisado
Para que tudo gradualmente se nos adentre,
Um silêncio partilhado.
Vida
A vida que faltava,
A liberdade com um corpo a se propor,
Alguém que nem sonhava,
- É mesmo o amor.
Melhor
Se crês que em teu parceiro
Tudo é o melhor
No fundo mais fundo e derradeiro,
Então é amor.
Língua
Se apenas aquela língua terna,
De palavras até sem rumor,
É materna,
Então é amor.
Deserto
Se mesmo a meio do deserto
Te encosta à parede, senhor,
Então é, desperto,
O amor.
Segues
Se o segues mesmo ignorando
O teor
Do que se andar passando,
Então é amor.
Vais
Vou para onde vais,
Que, mesmo que vá para outro lado,
Não deixarei de ir ancorado
Ao teu cais.
Caminhar
Quando se amar,
Até a forma extrema
De caminhar
É poema.
Tudo
Amor é o que faz haver
Tudo
O que todas as vidas, a miúdo,
Têm de ter.
Procurar
O que te ensinar
Com ardor
A procurar
É amor.
Longe
Se é sempre demasiado longe
Onde não estiver
E tu, embora na multidão, um monge,
- É o amor a ser.
Tentar
Chegar
E, com ardor,
Tentar,
- Eis o amor.
Nada
Se, com a mão cheia de nada,
Tens tudo o que preciso for
Para tudo comprar duma assentada,
Então é amor.
Bastante
Se não é o bastante
Para meter nojo, com falso pudor,
A quem passou adiante,
Então não é amor.
Acréscimo
Temos o bastante para não ter nada,
O resto só por acréscimo,
Estamos prontos para a estrada
- É do amor o préstimo.
Meio
Se a meio caminho admite começar,
Meio sol-pôr,
Então, seja o que for que aí andar,
Não é amor.
Tocáveis
Se nem os corpos são tocáveis,
De tão interior
Em afectos inefáveis,
Então é amor.
Incerto
Se, embora incerto,
Te deixa seguro e senhor,
Mais longe ou mais perto,
É sempre amor.
Grande
Se é grande demais para o tamanho
Do melhor entendedor,
Então é amanho
Do amor.
Céu
Todo o amor se ama no céu.
Se pés na terra vem propor,
Rasgou o véu:
Não é amor.
Satisfaz-te
Satisfaz-te e nunca te impede
De mais te impor
E mais te concede e a mais procede...
- É o amor.
Silêncios
Se até as palavras
São silêncios no brando rumor
Das lavras,
É o amor.
Pequeno
Se faz Deus sentir-se pequeno,
Tal o esplendor
Sereno,
Então é amor.
Nova
Se uma nova verdade te leva a inventar
Maior, melhor,
Então, singular,
É o amor.
Arder
Se já deixou de arder,
Amor já deixou de ser.
Por mais que a garra tenha sido adunca,
Não foi amor nunca.
Pareces
Se de repente tu nem tu pareces,
Do súbito palor
Com que me apareces,
Então é amor.
Arroste
Se te faz voltar ao que nunca foste
No interior
Que contigo arroste,
Então é amor.
Tropeças
“Nunca mais apareças,
Mas volta sempre, por favor!”
- Se nisto tropeças
É amor.
Volta
Se volta sempre embora nunca mais apareça,
A dor
Que meça
É amor.
Faço
Se aqui me faço
Do teor
Com que me enlaço,
Então é amor.
Cabe
Se o que foste ali não cabe,
Não tem o sabor
A que hoje sabe,
Então é amor.
Intocável
Se é intocável,
De sacrário com pendor
Inefável,
É amor.
Acordar
Se te faz acordar para o que és,
Com subtil candor,
A arrepiar-te da cabeça aos pés,
É amor.
Fincando
Amor é o que, aqui
Se fincando,
Te tira de ti
A ti te levando.
Perfeição
A perfeição no amor,
Perene revisão de conduta,
Jamais se poderá propor
Como absoluta.
Perdão
Se pedes que te peçam perdão
Por favor,
Pelo que nem sabes se é perdoável, então
É amor.
Risco
Só quem ama corre o risco de morrer.
Os mais, por mais absortos,
Apenas o risco poderão correr
De continuar mortos.
Queda
Se mesmo em queda te obriga a avançar
Com o mesmo verdor,
Então, lapidar,
É o amor.
Raro
Se é raro a consciência
Lograr chegar à boca,
Então é do amor a excelência
A sair da toca.
Treva
Se na fuga à treva
É um archote de calor,
Se só vais para onde te leva,
É amor,
Fizer
Se até dum não fizer um sim,
Seja em que domínio for,
Assim
É amor.
Resiste
Se nem a consciência lhe resiste,
Perdido o vigor,
O que ali assiste
É amor.
Letra
Quando uma letra basta para o definir
E é um íntimo alvor,
Então, o que nos leva a ir
É o amor.
Interrompe
Se não interrompe até
O que ainda nem começou,
Então não é
Amor que ali soou.
Ouves
Se, quando ouves “acabou”,
“Acabei-me“ for
O que entendes que soou,
Então é amor.
Escravizado
Se até mesmo escravizado
Te sentes um rei, senhor,
Então, em todo o costado,
É amor.
Quebra
Se te quebra todo
Largando-te no pendor
Que afinal é o do teu modo,
Então é amor.
Conflito
Se até o conflito pacifica
No dinamismo do calor
Que ambos funde no que os multiplica,
Então é amor.
Silêncio
Quando até no silêncio ouvimos,
Inconfundível rumor
Da fundura dos cimos,
É amor.
Gota
Se te abarrota
Um ror
Com apenas uma gota,
É amor.
Contudo
Nada
Em redor
E, contudo, tudo é estrada
- É o amor.
Muro
Quando até o muro que separa
É trampolim de unir o saltador
Com o par que se lhe depara,
Então é amor.
Salões
Quando em salões contíguos estais
E estais no mesmo salão,
Numa lonjura mais perto que jamais,
É o amor então.
Pisadura
Quando a pisadura, mais que no pisado
Dói no pisador,
A ferida do lado
É do amor.
Louco
Se chamarem-te louco te elogia
Sem rancor
Nem ironia,
Então é amor.
Mexe
Se nada mexe em ti
Por mais que tudo mexa em redor,
Então, aí,
É o amor.
Hora
Quando a toda a hora a vida te espera
E o poente é um alvor
De quimera,
Então é o amor.
Sentes
Se, por mais guerra que haja, te sentes em paz;
Se, por mais paz que haja, te sentes em guerra;
A contradição o que a faz
É o amor que te ferra.
Segundos
Quando poucos segundos valem
Uma vida inteira
E dela inteira falem,
É o amor à tua cabeceira.
Sonho
Olhos abertos a encontrar o sonho,
Seja lá por onde for,
E do Universo inteiro disponho,
- Então é o amor.
Babar
Se te não faz babar,
Do interior
Fogo pingar,
Então não é amor.
Braço
Quando nenhum braço
Se vem contrapor
A um abraço,
Então é amor.
Acordar
Se te faz acordar
Com fervor
Sem deixar de te fazer sonhar,
É amor.
Quase
Se parece que está quase a acabar,
Sempre quase em sol-pôr
E quase sem luar,
Então é amor.
Urgente
Se quase te matou
E é urgente salvar-lhe a vida
Que se encravou,
É o amor em lida.
Evita
Se não evita a morte
Com fervor,
Desta sorte
Não é amor.
Principiou
Se tudo por “ haja-o-que-houver”
Principiou por se propor,
Então há-de ser
Amor.
Agora
Se tem de ser agora,
No calor
Da hora,
Então é amor.
Daqui
Se pode ser daqui a pouco,
Quando o verdor
Já ficou mouco,
Então não é amor.
Rede
Estar numa zona sem rede
Com o suor
De toda a sede,
Então é amor.
Piroso
Se não é piroso, não te deixa inapto,
Se não causa, a contrapor,
Enjoos em quem te vir mentecapto,
Então não é amor.
Descoberto
Se inteiramente a descoberto
Te finda a pôr,
Então, livro aberto,
É amor.
És
Se doutrem és
Como jamais de ti foste, sem error,
Então, sem mais talvez,
É amor.
Execrável
Se do mundo o mais execrável
Não deixa de se impor
Como do mundo o mais amável,
Então é amor.
Mentir
Se te é irresistível
Mesmo a mentir,
Não é incrível,
É o amor a fluir.
Aldraba
O amor, sem definição,
Não aldraba:
É um lugar que não
Acaba.
Nome
Um nome
E é o que há de mais excitante no mundo!
Mais que de amor a fome
Que é que haverá de mais fecundo?
Recuperado
Embora de vez perdido,
Está sempre a tempo de ser recuperado:
O amor tem sentido,
Não fado.
Tom
O amor contém
Este tom:
Só o que lhe convém
É bom.
Imbatível
O imbatível
Dentro de nós,
Incoercível,
São do amor os cipós.
Mania
O apaixonado
Tem a mania pateta
De que o dia
É poeta.
Vem
Se souberes donde vem,
Tenha embora o valor
Que tem,
Não é amor.
Desocupado
Se está desocupado,
Mesmo um recanto em teu redor
Ignorado,
Não é amor.
Frente
Quando o outro à tua frente
Vais antepor,
Então, automaticamente,
É amor.
Nenhuma
Se nenhuma filosofia
Lhe explica sentido nem sabor,
Nem nenhuma sabedoria,
Então é amor.
Ouvir
Se te impede de ouvir
Seja lá o que for
Que dali não vejas provir,
Então é amor.
Deprimente
O amor é deprimente
Para o que o não tem no horto
E dele viver ausente:
Se te deprime, estás morto.
Nunca
Se amas um país, nunca amaste:
Num naco de terra o amor colocar
É não merecer que baste
Por cima da terra andar.
Preferir
Se te leva a preferir
A realidade cerzir ao sonho, mesmo o maior,
Então, por ti além a ir,
É o amor.
Tudo
Entra com tudo fechado,
Ganha lugar com tudo cheio,
Então todo o lado
É de amor o meio.
Livre
Se te sentes mais livre, sempre mais,
Quão mais preso a teu par isto for,
Então não são ais,
É amor.
Começo
Se é um bom começo
E sempre um bom começo seja lá o que for,
Então qualquer tropeço
É amor.
Acaba
Mais que o que nunca acaba,
O amor, a par,
Para o que não menoscaba,
Vive sempre a começar.
Mata
Um amor largado à sorte
E com bravata
É como a morte:
Um dia mata.
Relacionamento
Um relacionamento,
Ao se erigir,
É, a todo o momento,
Construir, construir, construir...
Ponto
Se em ponto de não-retorno
Ainda não for,
Por belo que seja o contorno,
Não é amor.
Alvo
Amar alguém é ficar
Nas mãos de toda a gente,
Alvo fácil que, ao amar,
Sou, indigente.
Queda
Se precisa duma queda
Para se erguer superior,
Ceda o que ceda,
Não é amor.
Como
Se não sabes como nem porquê,
Seja lá o que for
Que em ti toma pé,
Então é amor.
Certeza
Se apenas avanças na certeza
De que o rumo te não vão impor,
A tua empresa,
Então, não é amor.
Pesa
Se não pesa demais,
Chumbo ao calor
Da bigorna dos ideais,
Então não é amor.
Apenas
Apenas o amor
É tema que jamais se encerra:
Engloba-te, funda-te, faz-te, de pés na terra
E a cabeça na infinidade do alvor.
Encontra
O amor ninguém encontra
E não tem cura:
Tendo eternamente um contra
Apenas a vida inteira se procura.
Acreditar
Amar é acreditar
Que basta amor, por mais furtivo,
Para sustentar
Um ser vivo.
Notícia
Quando amamos,
Toda a notícia, mesmo à toa,
Que não seja a do fim do amor que respiramos,
É boa.
Acabe
Por mais que te enalteça e gabe,
Se a toda a hora não tens temor
De que acabe,
Então não é amor.
Dor
Quando amamos, de quem amamos a dor
Não é, já que em nós a sentimos.
Se nos impede de ser, presos aos limos,
Então é amor.
Poema
Quando amamos, até a prosa,
Independentemente do tema
Que glosa,
É poema.
Agradecer
Amar é agradecer
Algo, mais dele o contrário,
Com o mesmo parecer
Sumário.
Abraçar
Quando amo,
Nenhum gesto de abraçar,
Entre as vidas um tramo,
Consegue acabar.
Oferece
Se o que te oferece quem amas com fervor
Não te arrebata,
Então não é amor
O que te mata.
Presente
Amar é o presente perfeito sempre ver,
Ao reparar
Em todo o presente que vier
De quem se amar.
Abraçar
Amar é abraçar sempre o mesmo abraço
E no mesmo abraço presente
Viver sempre o traço
Dum abraço diferente.
Menino
Se te sentes um menino
Ao sabor
Do destino,
Então é amor.
Inéditos
Por mais que os créditos
Corram iguais de mão na mão,
Amar é ver inéditos
Em cada repetição.
Modula
O amor modula as artes
E o modo:
Amar é saborear as partes
Sem destruir o todo.
Apenas
Quando apenas amor tens
E acreditas, contudo,
Que tens tudo,
Então é amor em seus aléns.
Diz
Se o que diz a ti te diz
Como se tiveras dez anos,
Então é amor de raiz
Por trás dos panos.
Fichas
Se todas as fichas, sem mais nada conexo,
Vem pôr
No sexo,
Então não é amor.
Espaço
Se deixa espaço para mais,
É dos pequenos:
Sinais
De amor a menos.
Casal
Casal feliz é o casal
Que de sonhos mantém um ror.
Se não sonhar, ideal,
Não é amor.
Suficiente
Se não for suficiente
O pé ao pôr
No patamar da frente,
Então não é amor.
Rotina
Quando alguém ama, tudo inclina
Para o pendor desejável:
Até a rotina
Devém amável.
Exalte
Amar é, sobretudo,
Quanto exalte:
É sentir que está ali tudo,
Por mais que tudo falte.
Beijo
Sem pejo,
Em brasa,
O amor faz de cada beijo
Uma casa.
Fazíamos
Enquanto só amor fazíamos,
A decepção maior
É que ambos críamos
Que éramos amor.
Prazer
Só prazer, não,
Nem mares dele, nem rios:
É que aquilo em que o prazer é bom
É em cobrir vazios.
Pior
Pior que a morte
Mais atroz
Só matar um amor bem forte
Dentro de nós.
Segundo
Amar
É, de cada segundo
Um para-sempre elaborar,
Fecundo.
Resto
O resto são estruturas de entretenimento,
Quando muito, caminhos, a grosso e a fino
No mapa do momento...
- Só o amor é o destino.
Feita
Qualquer alma é feita de amor.
Ou amas todo e todo és amado
Ou, se tal não for,
Amor não há em nenhum lado.
Amas
Se amas e és amado,
Então tens o que mais ninguém,
Em mais nenhum lado,
Tem.
Jovens
São jovens demais
Para saberem, sobretudo,
Que nenhum amor jamais
Consegue tudo.
Saber
Amar,
Mais que uma aposta,
É apenas precisar
De saber que se gosta.
Pouco
Mouco
Na estrada,
O amor, se sabe a pouco,
Então não sabe a nada.
Inesquecível
Amar é esquecer,
De tão vulnerável, intangível.
Por isso é que não deixa de ser
Inesquecível.
Curto
Do vulcão o surto
É tal surto de fervor,
Que todo o poema é curto
Para o amor.
Idade
O amor jamais há-de ter
Qualquer idade:
É fazer
Eternidade.
Indigna
Se toda a palavra estiver a mais,
Indigna do fulgor
Com que brilhais,
Então é amor.
Génio
O amor
Descobriu, lapidar,
Que o génio maior
É o que sabe amar.
Duração
Não é na duração
Que o amor se mede ou persuade,
É na gestão
Da profundidade.
Pronto
Se não sabes, de repente,
O que é o amor, hás-de então estar
Pronto, finalmente,
Para amar.
Suporte
Qualquer suporte, por mais agudo,
Outros requer por seu norte.
O sexo suporta tudo
Menos ser o único suporte.
Cura
O amor procura, procura
A cura, com ardor.
Se tem cura,
Não é amor.
Risco
Se o que fazes
O ponderas como um risco,
Então teus gestos, por mais capazes,
Não têm de amor um cisco.
Magoar
Quando de magoar
Capaz não for
Ao te excitar,
Então não é amor.
Banal
Se quem amas te parece banal,
Apesar das heróicas famas,
Então, afinal,
Não é quem amas.
Pulsar
Aqueces,
É o amor a pulsar
Quando te esqueces
De pensar.
Estai
O amor é o meio,
Da mastreação o estai.
Importa-me lá saber donde veio!
Importa-me é saber para onde vai.
Vazios
O prazer é bom a encobrir vazios,
O prazer esconde.
Depois cuidas amar quem te apraz em teus estios
E só amas o prazer que te responde.
Capaz
Afinal não é amor
Quando, afinal, és capaz de pensar
Com todo o teor
Junto de quem cuidavas amar.
Mesmo
Mesmo quando lesa,
Mesmo quando há dor,
Se o amor pesa,
Então não é amor.
Dilata
O que os corpos dilata
Não é o calor.
Não é fogo de oiro nem de prata,
É o do amor.
Apraz
No amor tudo apraz
No que se der.
Quando amamos, tudo o que dermos o que faz
É receber.
Sóis
Quando amamos, todos os sóis
Habitam o instante,
Todos os antes e os depois
São durante.
Sim
Quando amamos, as lavras
Arroteiam-se num tal confim
Que todas as palavras
Dizem sim.
Conexo
Todos os amores deviam amar
Como se fora tão conexo
O par
Que todo o corpo é um sexo.
Lágrima
Quando amamos, a lágrima que dum escapara
E corre
Do outro pela cara
Escorre.
Mel
Quando amamos,
Todas a luas, mesmo as de papel
Que recortamos,
São luas-de-mel.
Casa
Quando amamos, por uma janela ao lado
Se espreita:
O corpo amado
É a casa perfeita.
Nó
Quando amamos, atado o nó
Das ilusões,
Os dois corpos são um só
Parque de diversões.
Descubro
Descubro o teu corpo tal se descobrira
Deus, além.
A felicidade é o rosto que melhor confira
O aspecto que Deus tem.
Conquistar
Com gestos corteses
Que é que talhamos?
Amar é conquistar todas as vezes
O que já todas as vezes conquistámos.
Fé
Quando se ama, com fé
Tanto na paz como no conflito,
“Amo-te” é dito
Com olhos de quem vê.
Inteiramente
Querer ser inteiramente
O que hoje és tem o perfil
De seres integralmente
Imbecil.
Visto
Quando amamos, mesmo sem antolhos,
É isto:
Só o que está diante dos olhos
É pequeno demais para ser visto.
Traço
Quando amamos e nada o distorça,
O traço
Dum abraço
É sempre com força.
Olho-te
Olho-te e reparo
Que as palavras que eu acolho,
Quando fundo as aclaro,
Moram dentro, afinal, do que em ti olho.
Casamento
Quando amamos, aos régios
Aprestos afeitos,
No casamento não adquirimos direitos,
Ofertam-nos privilégios.
Papel
Quando amamos, casamento
Não é papel assinado, num prurido
De momento:
- É papel sentido.
Falamos
Falamos de amor
Deste jeito:
Quando for
Sem precisar de ser feito.
Teste
É amor que ajuíza
Que preste
Quando não precisa
De teste.
Pele
É amor em tua pele
Aí,
Quando até chegares a ele
Nunca soubeste de ti.
Manifesto
O amor é um manifesto
De realidades
Quando o resto
São impossibilidades.
Cabo
O amor
É o coração
A dar cabo do melhor
Da razão.
Memorável
O amor
O que tem de memorável
É que jamais dele o teor
É aconselhável.
Basta
Quando basta existir, como se de lei
Com o favor,
Para quenquer se sentir rei,
Então é amor.
Parte
Falamos de amor
Quando uma parte é de tal modo
Que é uma amostra do teor
De todo o todo.
Liberdade
Quando só há liberdade
Por dentro desta prisão
Que tão meiga nos persuade,
É amor então.
Pele
Quando é só ele,
Quando é só ela,
É amor na pele
Que toda se arrepela.
Maneira
Se doutra maneira
Não pode ser nem supor
Para a vida inteira,
Então é amor.
Dividido
Quando dividido,
É tão grande o amor
Que em cada bocado repartido
É maior.
Tamanha
O amor é de grandeza tamanha
Que escolhe sempre bem os píncaros visados
Da montanha
Até de olhos fechados.
Senti
Tanto em mim te senti
Que te sinto até meu confim.
Cada dia sem ti
É um dia sem mim.
Feliz
Quando alguém está feliz
Para ver feliz quem ama,
Então é amor da raiz
Até à rama.
Lareiras
Já vi mais de cem lareiras e nem uma
Me aqueceu o coração.
Tu não tens lareira nenhuma
E o calor que me vem de tua mão!
Desperta
Amar,
No que nos desperta,
É deixar sempre, deixar
Uma porta entreaberta.
Mistério
O mistério jamais o resolvi,
Fica sempre após:
O sentido da vida é de mim para ti
Eternamente a caminho de nós.
Antes
Antes de ti, doente,
Doíam-me as costas tanto, tanto!
Agora, no presente,
Apenas tu me dois. E quanto!
Minuto
Dá-me um minuto, um qualquer
Mas de verdade,
Para eu te conhecer
Desde toda a eternidade.
Percorri
Percorri mundo, muito mundo,
A gosto e contragosto,
E não há paisagem fértil nem porto mais fecundo
Que o teu rosto.
Curta
A vida é curta demais
Para perdermos energias
Com o que não envolva mais
Do amor as fantasias.
Elegância
A elegância,
Quando apareces,
É aquela instância
Em que aconteces.
Leva
Que aconteceu
A quem ama?
- Leva para a cama
Quem só pode levar para o céu!
Juntos
Não há intimidade maior,
A avivar as chamas,
Que olharmos juntos, amor,
Para o que mais amas.
Mundos
O amor são dois mundos que se unem
Sem fazerem ideia, a seguir,
Mal se coadunem,
De como se hão-de unir.
Nunca
Haja o que houver,
Nunca deixamos
De ser
O que amamos.
Tema
Da poesia o tema
Nunca o vi a nu
Senão no poema
Que és tu!
Preparado
O amor é andar preparado
Perenemente desde já
Para aquilo que sabemos pelo fado
Que nunca ocorrerá.
Procura
Ando pela vida, sem engodos,
À procura de ti, no real e fantasias,
E ainda bem que te encontro todos
Os dias.
Ratoeira
Há uma ratoeira
Com o engodo de Deus
Quando teus olhos, à minha beira,
Cegam os meus.
Melhor
Tento o melhor para me amares
Ou amares mais,
Que a um homem só de que servem patamares,
Embora geniais?
Dentro
Ninguém sabe o que é perder,
Meu dentro a se esvaziar,
Enquanto pai e mãe tiver
Para abraçar.
Perder-te
Perder-te mudou tudo,
Da vida na resma,
E tudo continua, contudo,
Na mesma.
Casas
As casas
Não servem para morar,
Que têm asas:
- Servem para amar.
Procurarem
Amar é o estado
De procurarem mais os dois
Mesmo depois
De já terem encontrado.
Caminhos
Ama-me por caminhos
Inviáveis
Como se fôssemos, sozinhos,
Intermináveis.
Contigo
Vida além contigo embarco:
Antes um navio afundado
Que um barco
Que não vai a nenhum lado.
Quedas
Há motivos fúteis,
Este, porém, é singular:
Todas as quedas são úteis
Se me puderes levantar.
Sempre
A bisturi
A eternidade me grava:
Quando te conheci
Desde sempre que te amava.
Basta
Basta acenares
Mesmo um gesto distraído
Para todos os lugares
Fazerem sentido.
Vales
Vales minha vida toda e, afinal,
Apesar do mundo inteiro que envolve,
Não equilibra a balança comercial
Nem o défice resolve.
Perante
Perante ti, afinal,
Fico mudo:
Desde quando um mais um é igual
A tudo?
Contradição
A contradição a que ágil
Me grudo:
O amor é tão frágil, tão frágil
Que resiste a tudo.
Mais
Do amor a montra
Dos sinais
É que se encontra
À procura de mais.
Acorda
O amor, quando nos morda,
Cortês,
Sempre nos acorda
Pela primeira vez.
Guarda
O amor guarda um credo
Dele na ermida:
O segredo
Da vida.
Resiste
Ou o desenvolvimento existe
Ou não.
Nenhuma relação resiste
À perfeição.
Inviável
Um amor já não existe,
Inviável,
Quando o antes e o depois dele persiste
Imutável.
Cadilho
Há sempre um filho a mais
Quando um casal tem por cadilho
(Não se unindo ambos enquanto tais)
Um filho.
Doer
Se não puder doer, não é amor.
Pode até nem doer, nem agora nem nunca,
Mas tem tal poder ao dispor
Que as vísceras de ameaça nos junca.
Dor
Sem dor
Uma relação
Não é a relação que é de supor,
É mera representação.
Quanto
Quanto terei de ouvir,
Em que maldito confim,
Para conseguir
Não te ouvir em mim?
Olhar
Quando me olhas com teu olhar
Sereno,
O mar
Parece tão pequeno!
Sem
Um homem normal,
Sem amor algum,
Parecendo que não, afinal,
Não é homem nenhum.
Algo
Como é que algo tão pequeno
Como dois corpos irá sustentar
Algo tão grande como o aceno
Do “para sempre” de nosso olhar?
Mais
Que mais que um corpo sou
Só sei ao reparar
Quando vens em teu voo
Para me acordar.
Aquém
Grande artista é quem
No íntimo clama
Que anda sempre aquém
Daquilo que ama.
Tamanho
O dia pleno
É o dia em que descobri
Que sou pequeno
Para o tamanho de ti.
Acesas
Acesas as chamas,
A vida resume-se a ver
Quem amas
Viver.
Distância
Amar à distância,
Só quando não se ama.
Até a lonjura dum beijo enche de ânsia
E, por ser demais, reclama.
Tamanho
O tamanho de teus braços minto
Traço a traço.
Há que apertar o interior do que sinto
Para medir um abraço.
Convence
O amor convence que a vida,
Sendo nela tudo restrito,
Tem a medida
Do infinito.
Deixar
O amor pode muito bem consistir
Em corar
Um pouco e deixar
Prosseguir.
Falariam
Falariam de tudo,
Ele sério, ela tímida, ambos excitados.
Contudo,
Só falariam de amor em mil e um traslados.
Mudaria
Um dia mudaria o mundo com uma só palavra.
Até que chegou
A hora e o lugar da lavra:
“Amo-te.” E mudou!
Adulto
Como obter dum apaixonado
Um adulto, com que instância,
Se o amor é termos retornado
À infância?
Duas
A vantagem de amar duas mulheres
É o perigo de um dia, acalmado o pó,
Por mágica coincidência que nem entenderes,
Ambas se encontrarem numa só.
Silêncios
Os silêncios apenas temo
Quando, alertado,
Parado o remo,
Não te ouço calada a meu lado.
Pouco
Todos os sonhos sabem a pouco,
Famintos, só osso e peles,
Quando não te sonho, louco,
Dentro deles.
Falta-nos
Falta-nos tanto em tanto espaço!
Contudo
Basta um abraço
Para termos tudo.
Apaixonado
Apaixonado
É quem está
Viciado
No que quem ama lhe dá.
Certinho
Antes dois loucos a voar
Pela imensidão
Que um certinho a palmilhar
O chão.
Bom
O bom de contigo estar
Em guerra neste cerco
É que, mesmo quando perco,
Saímos ambos a ganhar.
Avó
À tua avó, pioneiro,
Diz-lhe devagar
Que ela é um campo inteiro
Por semear.
Eles
Amaram,
Procurando a mútua suavidade das peles.
Casaram
E foram eles para sempre, eles.
Infelicidade
Quem ama suporta
A própria infelicidade,
Nunca a infelicidade à porta
De quem ele ama de verdade.
Casal
Um casal que tem tudo para dar errado,
Se tem amor, decerto
Tem o que é requerido em qualquer lado
Para dar certo.
Procura
Ando o dia inteiro à procura de ti,
Atarefado,
Quando te tenho aqui
Ao meu lado.
Abrir
Amar não encegueira,
Apesar dos escolhos:
É da incapacidade ficar à beira
De abrir os olhos.
Confim
O amor tem um confim
Para além do que podemos imaginar:
Deita-te em mim
E faz-me acordar!
Balada
O amor é uma linda
Balada de amanhecer:
Quero-te pelo que és e mais ainda
Pelo que me levas a ser.
Acordo
Acordo contigo
E, por trás do véu
O abrigo
É como quem acorda para o céu.
Quando
Alguém por amar acama
E arrefece.
É quando se ama
Que a vida acontece.
Sempre
Ama-me para sempre. Porém,
Ama-me sobretudo
Sempre, mais que a miúdo,
Como imediatamente também.
Dor
Dor de parto dura à hora,
A de não ter filhos, em contrapartida,
Demora
Toda a vida.
Engano
Sem falar causa tal dano
A formosura a miúdo!
É um engano
Mudo.
Credo
O credo
Que mais nos obriga a seja o que for
Não é o medo,
É o amor.
Lisonja
A mulher aprecia a lisonja
Sem receio
De apagá-la a esponja
De incrível ser o galanteio.
Forte
Um homem forte
Há-de obrigatoriamente ter,
Agulha de seu norte,
Uma forte mulher.
Reuniões
As reuniões que mudam o mundo
Requerem apenas duas pessoas:
A que ama e a que é amada. E o fecundo
Vice-versa na estrada aonde voas.