POEMAS IRREGULARES
Maior
A maior parte
Dos problemas que há no mundo
É de não termos arte,
Cada qual com os mais, de ser facundo:
- Não sabemos conversar.
Os esforços são enormes,
A boa vontade, a melhor,
Mas não encontramos termos conformes,
Se calhar,
Ou trepou demais a dor...
A raiva é emoção
De preguiçoso.
Paciência, lógica e razão,
É verdade que dão
Menos gozo,
- Mas abrem-nos o portão.
Mundo
Meio mundo, meio mundo de gente
Vive doente
Da vontade frustrada
De ter alguém
Que se interesse um tudo-nada,
Nem sequer tanto por aí além,
Por ele.
Mas não: arrancam-lhe a pele
E nem dão por nada!
Viste-o alguma vez em carne viva, viste?
Pois, para ti nem existe!...
Mudar
Nada vai mudar, pois não?
Mas tu podes mudar.
Então?
Em vez de desistir, tentar...
Não muda o resultado?
Como o podes afirmar
Sem ter tentado?
Sabes lá que vento
Se erguerá de teu fermento!
Podes nem o ver,
Mas ele fica mundo fora a correr.
Cuidamos
A família...
Cuidamos que a podemos domesticar,
Quezília a quezília,
Vigília a vigília,
E no fim, gastas as apostas,
É como ela for apenas aceitar
Ou virar-lhe as costas.
Correnteza
Nós cuidamos bem dos nossos,
Que uns dos outros tratamos.
E os desconhecidos com que topamos
São os destroços
Com que na correnteza da vida deparamos
E que ao acaso deixamos
Cair nos fossos
Dos fundões que ignoramos.
A não ser quando algum deles começa
Um campo de golfe em nossa cabeça...
Esmagar
Pecado
Não é o que de hábito se pensa.
É esmagar a vida doutrem aqui ao lado,
Por trás embora duma beata sentença,
É abandonar à sorte os feridos por aí,
No caminho atrás de ti.
O mais é conversa
Que ao vento se esvai,
Com que a gente, afinal, se dispersa
E trai.
Fundo
No fundo do pior canalha
Brilha uma centelha de força e de beleza.
Quando tudo o mais se lhe despreza,
Isto é que fará que tudo valha.
Amor verdadeiro
É acolher o ser humano,
Não quando belo e fascinante parceiro,
Mas quando é de podridão e frangalhos
De esgoto um cano
A enojar-me os soalhos.
Aí é que por trás vejo
Se ouço ou não o concerto do realejo.
Silêncio
O silêncio de Deus...
O silêncio perante o massacre dos profetas,
Todos os anos, séculos, milénios,
O assassínio de todos os Cristos, de todos os seus...
A morte dos estafetas,
Dos génios
Dos Céus,
A sistemática perseguição
Até à final destruição.
E o silêncio de Deus...
Mas depois,
Lento e lento,
Eis no coração o fermento:
Por cada morto nascem dois,
Crescem milhões...
Deus nunca fala:
Estala
O íntimo do coração
Que abala
Na fundura da emoção.
De repente faz-se luz
Então
No sentido que O traduz.
E a iluminação
De novo arrasta
O mundo que bovinamente pasta,
Parado,
No remanso de qualquer prado.
E eis consumado o ciclo eterno
Do caminho do céu através do inferno.
Pelo meio anda a rede organizada
Dos surdos e cegos
Que teimam em suster a caminhada
Nos trilhos dos pegos
Que outrora transpôs nossa passada,
Sem repararem onde a estrada
Doravante está naqueles regos
Inundada.
Milénios fora
O equívoco igualmente mora
E demora, demora...
O judeu, de povo eleito
Para fermentar uma Humanidade única
A partir do Deus único a que presta preito,
Ao invés incha o peito
E puxa de tais galões,
Numa eterna guerra púnica,
A considerar-se aparte, acima de todas as nações.
E eis como, não só contra Cristo
Mas contra quantos dentro e fora denunciam isto,
Rasga no Sinédrio a túnica
De todas as excomunhões.
Eloim até lhe fez o jeito
De o espalhar pelo mundo,
Mas o fermento, em vez de o entender, fechou-se num conceito,
De tão milenarmente encaixotado,
Infecundo
Em todo o lado.
E continua a não entender o sentido:
Quer um Estado,
Em vez de ser fermento na massa difundido,
Humildemente
Ignorado,
Eventualmente,
Mas a puxar o planeta através do céu estrelado:
Um planeta a unificar-se,
Irmanado,
Sem disfarce
Amorizado.
E o cristão,
Convidado
A encaminhar o mundo inteiro à ressurreição,
Não,
Acabou desnorteado.
Em vez dum mundo irmão
Com tudo, bens e vida, em comunhão,
Faz o traslado,
Dos paramentos à celebração,
Da teologia à rotineira oração,
Do que algum dia, nalgum lado,
Deu, no entender
Do instituído poder,
Algum benéfico resultado.
Ora, como o poder gera corrupção,
O pretenso benéfico
É maléfico
Então:
Eis como despreza
Povos, cultura e tradições,
A fé que em cada humano preza
Abanar corações
Mundo além,
Eis como ao Espírito fecha a porta
Que do imo de cada qual o exorta,
Ao invés mantendo tudo refém
Dos frutos murchos da ancestral estéril horta.
Amar a Deus sobre todas as coisas
É amar o próximo como a ti mesmo,
Não é do templo cumprir a escrita das loisas,
Abandonando o mundo a esmo.
Não há como amar a Deus
Sem os mais, toda a família humana: são os teus!
Tudo, todos os varais
São, evidentemente,
Meros sinais:
Abandoná-los ou mantê-los é indiferente,
Tudo depende do efeito
A que o uso der ou não jeito.
Do templo os vendilhões
Têm de ser perenemente expulsos,
Gerações atrás de gerações,
Senão atam-nos os pulsos.
Aquele cristão alienado
Entende como um renegado
O que no chão pisou imagens,
Hóstias, repudiou credos, profanou templos...
- Como inadiáveis exemplos
Para salvar, em casos concretos, humanos personagens.
É isto, porém, que Cristo faria
Sem hesitar nenhum dia:
Entre homem e sábado, é o homem que conta,
Não aquela coisa tonta.
Cristo foi morto por exigir as bem-aventuranças,
Não por não ligar do templo às andanças.
Por isso foi ressuscitado:
Por viver todo do outro lado.
E o Islão
A querer impor,
De armas na mão,
O mundial império do terror?
Que Alá nos proteja!
Em nome dele o assassinato,
A violação,
A escravatura, o crime organizado em acto...
- Tudo por mor da inveja
Do mundo desenvolvido que se almeja
Mas cada qual recusa, pacato,
Em todos os degraus de gradual libertação
Que o têm vindo a arrancar do chão:
Libertação do labor,
Libertação da mulher,
Libertação de pensar e de expor,
Libertação de reunir-me e manifestar-me com quenquer,
Libertação de escolher governador...
E pretendem que Alá preza
A violadora luxúria
E a extorquida riqueza...
- Que incúria, Deus meu, que incúria!
E Maomé que pretendia,
Com todos os deuses reunidos num só,
Que a Humanidade unificaria,
Em vez de, divididos entre eles, nos reduzirmos a pó!
O silêncio de Deus...
Tudo, afinal, nos fala
Na infinita desgraça e na infinita gala
Dos Universos que são seus.
O problema é pormos em pausa
Os nossos ouvidos:
É que são sempre outros os sentidos
Em causa...
- Quando decidiremos
Que são estes os que finalmente atendemos?
Portas
As portas para o mundo
De teu íntimo mais profundo
São poucas mas preciosas.
Se tens uma cicatriz
Aí dentro
Bem no centro,
É uma porta de que gozas
De raiz.
Se ouves uma história antiga
Que te toca,
É uma porta para a toca
Que te abriga.
Se amas o céu, ondas do mar,
É uma porta a convidar.
Se a vida queres de fundura
Plenamente cheia,
Mais sã em tudo o que depura,
É já uma porta a abrir-se-te meia.
Caminhar
Dentro e fora de nós há predadores.
Sem o estado de alerta,
Como caminhar das pegadas senhores
Rumo à festa,
Pela trilha aberta
Em nossa própria floresta,
Sem findarmos, por todos os lados,
A ser devorados?
Pergunta
A pergunta bem formulada
É que roda a chave secreta
Que me abre a porta para a recta
Da estrada
Que conduz à descoberta procurada.
A pergunta-chave
É que abre a porta, de repente,
Removendo qualquer entrave,
Para, ao fim, tornar-me consciente.
Danos
Sofro danos, se aprisionado,
Convencido a manter-me ingénuo
Ou submisso.
Resta-me, todavia,
Energia
Nalgum lado
Para acender, estrénuo,
O chamiço
Que vencerá o captor,
Fugirá dele
Ou o neutralizará, dele senhor,
Ou lhe despedaça a pele,
Estraçalhando-o em nacos
Que aproveito a tapar os meus buracos.
- E, de repente, tudo o que era destrutivo
Devém, vida fora, construtivo.
Longes
A cultura,
Conforme a profundidade,
Cura
E cura em qualquer idade.
Portanto, o predador
Gritará: “Cultura?! Não senhor!”
Contra ele nosso alcance
Depende da lonjura
A que a cultura
Nos lance.
Quão mais os longes houver iluminado
Mais a toda a hora
Finda o predador dominado
De nós dentro e fora.
Pode sempre, porém, ser cultura mal usada.
Então, após,
O predador corta-nos a estrada
Dentro e fora de nós.
Por mais, todavia, que se camufle por entre os ramos,
É nisto que, afinal, sempre o desmascaramos.
Pesadelo
Quando em sonhos um pesadelo me aterra
De emoção em todos os tons,
É que nova porta me descerra
Para os meus dons.
Só atento
Ao meu camuflado
Tormento
Não perderei o momento
De ser gradualmente libertado:
Ele aponta-me o crivo
Das sementes por que vivo.
Beira
Levamo-los até à beira do abismo
E pedimos-lhes para voarem.
- Tenho medo! – tremem ante o cataclismo,
O que leva a que parem.
-Voem! – insistimos.
Não se movem, fincados nos limos.
Então nós os empurramos
E ei-los a voarem sobre todos os ramos.
É o caminho
Certo
De qualquer homem-passarinho
Que não finde a morrer perto.
Quantas
Quantas vezes, para ser fiel a mim,
Dos outros me afasto
E quantas me perco o rasto
Por respeitá-los, enfim!
Qualquer harmonia provém de ir
No que não me trair
Criando a ponte
Onde outrem também encontre o horizonte.
Acolher
Ser forte
Não são músculos nem flexões,
É acolher a numinosidade que transporte
De meu imo nos fundões
Sem fugir,
Vivendo minha natureza selvagem
A alimentar e abrir
Caminho
Na viagem
Rumo a meu integral ninho.
Intuição
E coração
A atapetar
O chão
Por onde a razão
Caminhar.
O fruto
Desperto
É um passo mais perto
Do Absoluto.
Grande
Sem fogo,
O grande pensamento, a grande ideia,
A expectativa por que se anseia
Findam desde logo
Crus
E nossos peitos
Nus,
Definitivamente insatisfeitos.
Ao contrário,
O que for feito com ardor
Agradará e alimentará o sacrário
De toda a vida interior.
Envelhecer
Conhecer demais
Pode envelhecer muito cedo:
Encantado pelos sinais,
Ao maravilhamento cedo
Ou, sem mais fresta de luz em nenhum lado,
Findo parado,
Ali aprisionado.
Um ou outro rumo
São de morte, em resumo.
- Ora, é a vida
Que ali me teria de dar guarida.
Fácil
É mais fácil libertar-me da luz
E pôr-me a dormir.
Com ela tudo claro se traduz
Em cada pendor que bulir,
Do desfigurado
Ao divino,
Com todo o intermédio trabalhado
Em meu destino.
Mas com ela é que vislumbro
Por trás, no imo do próprio canalha,
A luz da candeia a tremeluzir na cimalha
Com que me deslumbro.
Ela é que me discrimina,
Em mim e nos mais,
Dos lodaçais
A água divina.
Implicam
Relacionamentos
Deveras
Implicam primárias
Esperas
Tanto de surpreendentes nascimentos
Como de mortes necessárias.
Um tempo partilhado
De pontos fracos e fortes,
De princípios e fins,
De vidas e mortes,
- Cria um amor dedicado
Sem fronteiras nem confins,
Um amor com um elo
Forjado
Sem paralelo,
Só então deveras
Aquilo que esperas.
Guincha
O amor
Não sabe que não sabe.
E o pior
É que em si não cabe.
Como o morcego
Guincha de alegria
E é de cego
A euforia.
Ingénuo e faminto,
Sempre no amor
A mim me minto,
Mas é nele que, ganhando cor,
Me pinto.
Permanecer
Amar é permanecer ao lado,
Emergir dum mundo de fantasia
Para um mundo fanado
Mas onde é viável,
Dia a dia,
Um amor sustentável,
Cara a cara, osso com osso,
Todo feito de dedicação.
É ficar no fundo do poço
Quando tudo me grita: “Foge à inundação!”
Atraído
Ingenuidade é não conhecer nada
E ser atraído pelo bem.
Inocência é conhecer tudo, de entrada,
E, tudo medido,
Ser também
Pelo bem
Atraído.
Perdeu
Uma vida só vivida
À defesa
É por mor duma ferida.
Vê o que perdeu da vida
Só por andar ali presa:
O amor da vida perdeu,
De si próprio e dos mais,
Secou do rio os caudais,
Não espelham mais o céu.
Muitos
Amar,
Entre festins
E tropeços,
É abraçar
Para, a seguir,
Resistir
A muitos e muitos fins
E muitos e muitos começos
Que entrelaçarão
Sempre a mesma relação.
Ciclos
Nos navios surtos
Na maré que escorre
Tudo nasce e morre
Em ciclos mais ou menos curtos.
O desejo de alguém
Por proximidade ou afastamento
Alterna num vaivém:
Cura o aborrecimento
Com uma nova tarefa;
A cumplicidade
A solidão ceifa;
E a solidão há-de
Curar, fiável,
Quem se sentir desconfortável...
Quem ignorar esta dança,
Durante as águas paradas
Gasta o dinheiro da abastança,
Corre perigos nas jornadas,
Faz escolhas imprudentes,
Perde os parceiros presentes...
É o desvalor
Do tonto:
Nem para a vida nem para o amor
Anda pronto.
Caminho
O caminho do coração
Mais que do coração é caminho:
É o cadinho
Da criação.
Sobreproteger não leva a nada,
A nada leva o egoísmo,
Agrilhoar, gritar... – que vazia parada
À borda do abismo!
Só logramos criar
Deixando partir,
O coração a entregar
Ao negrume esperançoso do porvir.
Almas
As almas querem ver.
A cultura a que cada uma se apega
Requer
Que seja cega.
Quer falar
Mas o dono da estrada
Mantém-na pressionada
A se calar.
Como conciliar isto?
Insisto?...
Desisto?...
Ou desato a correr porta fora,
Que a vida é curta e tudo isto me demora?
- Terei de ir mundo além
À procura do mundo que convém,
A encher-me, desde o fundo
Dum novo mundo.
Termo-la
Há gente sempre pronta,
Sem reparar que gato não nada
Nem galinha mergulha em águas,
A termo-la nós por tonta.
Ora, se nenhuma daquelas é sua estrada,
Para quê meter-se em mágoas
Por sua conta?
Seja, pois, o seu próprio caminho
Nem que o seu
Seja procurar o céu
Sozinho.
Natureza
A natureza selvagem,
Nossa fronteira interior,
Promete que, em nossa viagem
Da vida em redor,
Sempre o Inverno gera
A Primavera.
Quer dentro de minha casa,
Quer no mundo, mesmo quando algo o arrasa.
E qualquer ponto intermédio
Tem inelutavelmente o mesmo remédio.
Pragas
Os de ideias curtas
Julgam que os inconformistas
São pragas surtas
Da comunidade nas rotineiras pistas.
Porém,
Milénios além,
Ser diferente
Nunca significou para ninguém
Ficar à margem da gente.
Ao invés, é alguém
Que trará, certamente,
Um contributo virginal
À cultura universal.
Ninguém pode, portanto, dar ouvidos
À cobardia dos preconcebidos.
Momento
Teu bom momento é a floresta,
A natureza selvagem,
A vida interior que a besta
Ao mundo assesta,
A inefável grandeza da imagem
Em verso
Do Universo.
O momento, porém, de tua família
É limpar migalhas
E dobrar toalhas...
- Como vai ser tua vigília?
Rebelde
Quem ao íntimo não liga
Em sua rebelde triagem
Briga
Por persistência na humana viagem:
- Que todos eternamente contem
Com o dia de hoje igual ao de ontem!
Ora, a perenidade das coisas
É onde ninguém nem tu repoisas.
Lançar
O corpo é a plataforma
De lançar o foguetão
Do espírito que o conforma,
A partir do chão.
Na cápsula se elevando,
Qualquer alma contempla o exterior,
A noite de estrelas em bando,
E fica deslumbrada do fulgor.
- É no corpo que me permito
Elevar-me ao Infinito.
Socalcos
Há sempre vidas menores,
Do trilho nos socalcos escalavrados,
Para que somos atraídos com favores
Ou empurrados.
Para o caminho certo descobrir
É preciso, ao lado,
Discernir
Qual o errado.
Batemos
Quando batemos no fundo,
Aí é o lugar das raízes,
Terreno de cultivo que inundo
Com as sementes de minhas matrizes.
Embora doloroso,
Posso semeá-lo de novo
Com qualquer semente do gozo
Que aprovo.
É o melhor terreno
Para devir pleno.
Depois
Depois da fome
Vem o temor de que volte.
É o que leva a que tudo se tome
(E tudo se come),
Cada furo do cinto se solte...
É assim na fome de comida,
Na de liberdade,
Na de interioridade
Vivida,
Na dum amor fanado,
Na dum imo amarfanhado...
Por isto qualquer revolução
Individual ou colectiva
Descamba numa traição,
Que tudo àquele desvio motiva.
Tão fundo isto impregna a natureza
Que até o predador animal
Preza
Seguir rumo tal:
O faminto lobo, aberta a porta,
Mata para além do que o estômago comporta.
- E quantas vezes o excesso
Nos mata da libertação o processo!
Retorno
Intervalo, interrupção
Para férias
Não se compararão,
Sendo embora escolhas sérias,
Com o alegre bater de asa
Do retorno a casa.
A tranquilidade não
Tem a ver com solidão,
É a conquista de verdade
De minha autenticidade.
Equilibra-o
Não cuides apenas
Em outrem ajudar,
Equilibra-o com cenas,
Humildes embora e pequenas,
Do retorno ao lar.
É apenas no imo
Que recolhes os mapas do cimo.
Frenética
Da vida na frenética correria
É urgente reencontrar
A via
Do retorno ao lar:
Apaladar um poema,
Deitar um pôr-do-sol,
Acordar um arrebol,
Cantarolar um tema...
Até com um vizinho
Conversar um bocadinho...
O que importa é não perder-se
Do mundo pelos pastos
Até ver-se
De rastos.
Que importa
Que o mundo fique irritado?
Ele é que vive errado:
Aqui até lhe abrimos uma porta!...
Anfíbios
Como os anfíbios somos:
Podemos viver em terra
Até à colheita dos pomos,
Mas aí a sede nos ferra
E temos de mergulhar
Na profundeza do mar,
A beber desde o interior consciente
Até aos abismos do inconsciente.
Senão não há como nos equilibrar
E morreremos
Da secura nos extremos.
Único
Um único acto criativo
Potencialmente
Pode alimentar um continente.
Pode, furtivo,
Levar uma torrente
Que medra
A trespassar a pedra.
Quem
O tocou,
De escravo de nada
Logo se tornou,
Da vida na jornada,
Em alguém:
Um marco na estrada
A apontar além.
Vias
Que medo!
As águas são profundas,
A noite, escura
E o caminho, muito longo...
Credo!
Mas são as vias fecundas
Que apura
O toque do gongo
Da criatividade:
- Ali é que o outro mundo me invade!
Nutrir-nos
Como as árvores e as plantas,
Queremos nutrir-nos de arrebol.
Só que, para ocorrer aquilo com que te encantas,
Tem de haver sol.
Ora, se te manténs virado
Para o ocaso
Do passado
E não mudas,
Só terás morte, a prazo,
Pouco importam os sonhos com que te iludas.
Quantos
Por quantos cortados narizes,
Rasgadas varizes,
Na dor e no pranto
Nos marcam da vida cada recanto,
Somos o clã das cicatrizes.
Mas somos fortes,
Resistimos
Sem desnortes
- E aqui vimos!
Utilidade
Em toda a morte há uma inutilidade
Que utilidade se revela
Quando escolhemos a estrela
De nosso caminho,
No cadinho
De qualquer idade.
A sabedoria vamo-la adquirindo
À medida em que vem vindo
No trilho de nossa pegada,
Ao correr da estrada
Com determinação e deleite
Aceite.
Em tudo o que vive,
A perda gera, afinal,
Quando dela me não esquive,
Um ganho real.
É só seguir em frente,
Que, no termo do caminho,
Me acolherá o carinho
Da misteriosa família inteligente
Que habita a fundura de meu inconsciente.
Tu
Tu é que decides o caminho.
Eu sou velho.
Aqui, sozinho,
Resta-me mostrar-te, adivinho,
O caminho
Que aconselho.
Que isto não te enerve:
Antes do derradeiro destrambelho,
É para isto que serve
Um velho.
Grandiosos
Os grandiosos não nascem grandes.
Atingem a grandeza
Que acaso demandes
Aproveitando com presteza,
Em todas as idades,
As oportunidades.
Não medem suor nem sacrifício.
Só depois
Vislumbram arrebóis
De benefício.
Dever
O dever dum restaurador
É chegar e partir sem ser visto,
Da própria presença sem vestígio maior
Que isto:
Um quadro devolvido, real,
À glória original.
No quadro da vida
Todos somos, afinal,
Um restaurador sem identidade definida.
Decisão
Qualquer decisão tua
Poderá mudar o mundo.
A melhor vida é a que actua
Do rio pelo fundo
Sem ninguém, na superfície ao reparar,
A poder notar.
Se livre quiseres viver
Pelo meio do entulho,
Vive sem fazer
Muito barulho.
Libertar-me
Nunca o passado
Poderá ser alterado,
Mas a identificação
Dos eventos
De tormentos
E a determinação
De libertar-me da dor, auguro
Que pode mudar o meu futuro.
Falo com alguém
Dos acontecimentos
Donde a dor provém,
Ou, na falta,
Falo comigo sozinho em voz alta,
Ou escrevo uma carta cujo lema
É desabafar do tema...
Identifico a fonte dos sofrimentos,
Meio
Caminho andado
Para livrar-me do bloqueio
Que me tem acorrentado.
E um pouco mais de amor resgato
Na singeleza do acto.
Outro porvir
Dali vem a seguir.
Amizade
A amizade torna-me compassivo,
Ciente de minha imperfeição.
Aprendo a dar oportunidades, então,
A outrem, assertivo.
A amizade é o que me conquista
O segredo rúnico
De meu traslado:
O meu ponto de vista,
Além de não ser único,
Pode estar errado.
Pior
A pior solidão:
A dos rodeados de amigos
Mas que nunca jogam o escudo ao chão,
Nunca escancaram os postigos
Do que são.
É o mais triste:
Recusam a amizade que os assiste.
Fogo
O fogo da raiva é deflagrado
Por insignificâncias:
Alguém que nos há ignorado,
Um apelo de inesperadas instâncias,
A notícia dum jornal...
- E tudo um problema devém sem igual!
Ora, o fogo da raiva alimentado
Mantém cada qual
Por dentro aprisionado.
De fora jamais pode, afinal,
Ser libertado.
Fugir
Um pai,
Para fugir ao antigo autoritarismo,
Cai
No pantanoso abismo
Dum filho que vai
Impor-lhe o seu próprio autoritarismo.
Trocou de senhor:
Não mudou para melhor.
O ditador agora
É quem com ele mora.
Em casa
É a ditadura todo o dia,
Em vez da quentura da brasa
De aprender democracia.
Tudo porque não impôs, na devida idade,
A norma sensata da familiar autoridade.
Confunda
Há quem confunda euforia
Que é solitária e contra,
Com alegria
Que com todo o mundo se encontra
E que, de arte com magia,
Todo o mundo põe na montra.
Esta é o cósmico abraço
Que nem naquela encontra traço.
Estima
Auto-estima
Sem estima pelos demais
Com olhar para o umbigo se anima,
De além-fronteiras sem sinais.
Dos olhos dos outros no brilho
Não vislumbra a salsa e o tomilho
Do sabor
Dum mundo melhor.
Guerreiro
O guerreiro tem medo e muito.
Mas, depois de o respeitar,
Descobre em quem se apoiar,
Para o vencer. Nada é fortuito.
Ora, dos filhos guerreiros
E seu credo
Os pais são os primeiros
Guardadores do medo.
Brincar
Brincar ajuda a aprender:
Quem não souber brincar
Finda a não saber
Pensar.
Brincar resolve problemas,
Cria parcerias,
Constrói o enredo dos temas
Com as magias
Até
De quem ele próprio é,
Na jornada,
E mais nada.
No limite de tudo isso
Casa com vontade
O compromisso
Com a liberdade.
Torna
Brincar
Torna um estranho
Num familiar,
Com isto de ganho:
Obriga a partilhar
Com quem jamais se brincou.
É a alegria que apanho
Só porque me dou.
Traz medos e riscos?
É o desafio
De os enfrentar e vencer fora dos apriscos,
Da vida alimentando o largo rio.
Voando
Brincar
Até rende
Que com tal se aprende
A perguntar.
Torna o distraído atento
Ao desvelamento
E ao atento logo o distrai,
Que pelos céus fora voando vai.
Requer
Criança a crescer saudável
Requer brincadeira
Livre, imparável,
Voando por cima de toda a rameira.
Com cabeça, corpo e alma,
Ali toda inteira,
Até que a fadiga tudo acalma
Na travesseira.
Dos pais a tutela
Não é guia,
É a luz duma estrela
A iluminar a fantasia.
Parece
Quando tudo o que é vivo
Parece ameaçador,
Perigoso,
Então de tudo me esquivo,
Com horror,
- E mato o gozo.
Uma criança no recreio?
Que receio!
Mas é uma escola de vida
Mutuamente partilhada...
Ora, então, em que medida
Afinal bloqueio
A estrada?
Esqueceu
Há quem se esqueceu da infância,
Quem criança nunca foi,
Vivendo em ânsia
Que dói.
Se calhar
Não sabe brincar.
Afirmam que as crianças são cruéis,
Com brincadeiras parvas,
Barulhentos selando anéis
De agressão meras larvas.
Mas é tudo uma asneira:
Têm apenas saudade
Da brincadeira
Que nunca tiveram em nenhuma idade.
Risco
O maior risco de brincar
É crescer fora da infância,
Com pais e mestres a comandar,
Do crescimento com a ganância,
Como se crescer um ror
Fora crescer melhor.
Nem vislumbram que brincar
É o património imaterial
Da humanidade ideal.
Requerer
A vida é cada vez mais complicada,
A requerer mais escolhas.
Mas bem trabalhada,
Porém,
É o momento
De que recolhas
Também
O melhor crescimento.
É um mundo de oportunidades
Para quem não repita apenas gestos nem mentalidades.
Rosto
Tolerância à frustração,
Capacidade de sofrer
O rosto são
De quem aprende a crescer.
A primeira dificuldade
É que levar-me há-de
A começar a conhecer.
Criança que não sofre,
Estiola,
Refechada no cofre.
Pela vertente da vida rebola,
Ao acaso,
Um ninguém a prazo.
Sem
Ninguém aprende
Sempre com boas notas,
Sem erros nem derrotas.
Aprendizagem de tal vertente
Não rende,
Mente.
É o fracasso ultrapassado
Que me abre a porta para o outro lado.
Aí é que deveras a vida
Nos convida.
Pai
O pai correcto
É distraidamente atento
Do filho ao projecto
E atentamente distraído
Do lento
Desenvolvimento
De tudo o que é crescido.
O mais, não sendo um zero,
É definitivamente um exagero.
Educar
Educar é imprevisível
E dá trabalho.
Tudo quanto valho
Me é exigível
Em dedicação,
Perseverança e determinação.
E muita humildade,
Que, embora com cabeça e coração,
Hei-de errar com a melhor boa-vontade.
Progenitor ser
É, das crianças a par,
Nunca parar
De crescer.
Estragando-lhes
Crianças: garantir-lhes o futuro
Estragando-lhes o presente?!
São robôs então que inauguro,
Ninguém é singular, diferente.
Ora, ser gente
É ser único no apuro,
Irredutivelmente.
Escola
A escola não é o emprego
Onde calho
E onde nem sequer trabalho
Em sossego.
Deveria ser o lugar
De costurar
Competências e desejos
Com a utopia
Da alegria
Da criança e do adolescente,
Na vida aos beijos
Permanentemente.
A escola não é a ganância
Do lucro da empresa
Que, no fundo, mata a infância
Que na realidade despreza.
Aceitar
Aceitar sem duvidar
É crendice,
Aprender sem criticar
É palermice.
Um aluno reflectido
Que só reflecte o sistema
É sentinela sem sentido,
Não abre a porta, por lema.
Ora, de portas fechadas,
Há só vidas adiadas.
Ideias
Conhecimento
São ideias em movimento,
Não o enfim consumado ideal
De que a escola parece o fanal.
As ideias
Só engravidam, cheias
Se umas com outras tagarelam
E não paradas à esquina onde enregelam.
Nem que seja à esquina da escola
Que, afinal, nisto as imola.
Escuta
A escola não dá razão
Porque escuta muito pouco.
Trocou pela mente o coração,
O louco.
Então nunca leva ao colo,
Dá uma côdea sem miolo.
Nunca leva às cavalitas,
Que é de quem adora fitas.
Não há nela integralidade,
É do frio a unicidade:
Fogo de autenticidade
Esfria dela na opacidade.
Em lugar de transparência,
É humana falsidade
Dela a maior escorrência.
Em vez de espontaneidade,
Tudo nela é calculismo...
- Como escapar ao abismo
Injectando, lento e lento,
Por ela além, sentimento?
Prisão
Da prisão em que me mantém,
A culpa é solitária.
Na responsabilidade a que me atém,
A culpabilidade é solidária.
A culpa leva ao bode expiatório.
A culpabilidade une em parceria,
Sob o mesmo envoltório,
Aqueles com quem tudo mudaria.
Descontrair
A família
É que a descontrair nos há-de ajudar,
Como, na quezília,
Ajuda a descontrolar.
O melhor do mau feitio,
Após,
É o que desvio
Para quem mais gostar de nós.
Nossa ética consciência
Daí vem,
De detestarmos magoar quem
Nos amar por excelência.
Suporte
Há quem não suporte compreender
Doutrem a maldade
Que em si não tolera ter.
E há quem não suporte noutrem a bondade
Que jamais parece ser
Capaz de promover.
Quem não reconhece a própria maldade
Só vê vulnerabilidade,
Nunca sente o alicerce
Que à humildade
Guia
Onde se exerce
A sabedoria.
Bata
A escola mui desmotiva:
Torna morta
Qualquer criança viva
Que lhe bata à porta!
E continua a crer que é um singular
Serviço a prestar!
Queixa-se de que há só hiperactivos
Por todos os lados...
Entraram nela vivos,
Saem desmotivados:
São almas castradas,
De asas quebradas...
- Como acreditar em tais crivos?
Vêm
Notoriedade
E protagonismo
Vêm da singularidade,
De excepção ao catecismo.
O contrário
É apenas do rebanho o trote primário.
Nunca as novas leiras
Este anda a descobrir além-fronteiras.
Sucesso
Sucesso na profissão,
Se é ganhar muito dinheiro,
Muito depressa, então
O cume cimeiro
Deste acto
É ser de todo insensato:
Mortos os afectos,
A vida inteira falhou.
Em tudo se enganou
Quem correu só a coberto de tais tectos.
Germina
Germina o desejo
Pelo que despertou curiosidade,
De beleza um beijo
Por entre a vulgaridade:
De repente, alguém
Rasga uma avenida
Por uma nesga de saber além
Onde um infinito Além convida,
Límpido e fascinante,
Um passo adiante...
Depois é o trabalho
A corresponder, fascinado,
De desafios ao baralho
Que tudo aquilo houver mobilizado.
- Eis a alavanca
Donde a motivação arranca.
Melhor
Os pais
Querem o melhor dos filhos
Mas por trilhos
Tais
Que nunca lhes dão oportunidade
De serem melhores todos os dias
De verdade
E não por fantasias.
Retiram-lhes a dor e o desafio:
- Do rumo a ter não encontram mais o fio!
Crescer
Quem confundir
Crescer de verdade
Com a verdade iludir,
Vai-se apenas distrair
E agitar pela cidade.
Vai confundir euforia
Com a felicidade
Que não fruirá nenhum dia.
Ora, a verdade é que a verdade
Tudo simplificaria.
Rasgam
Escola e família rasgam portas
Para o futuro.
O modo, porém, como te comportas,
Apuro
Que teus filhos convence de que, tarde ou cedo,
Terão de se divorciar
De todo o credo
Em que cada um apostar.
Nesta contradição
O sim da vida mudamos em não.
Atraso
Tudo é um atraso de vida,
O futuro é descartável?
Então, qualquer ida
É indesejável.
O que é bom
Ou é fácil, rápido e sem trabalho
Ou então
Cai do galho?
Tudo terão de ser boas notas,
Sem erros nem derrotas?
O que importa é a empregabilidade,
Não a paixão?
Eis como vamos dando cabo de nossa idade:
É com esta inversão.
Ora, da felicidade o sumário
É o contrário.
A paixão
Não é dum golpe de sorte
Ou dum momento de inspiração
Mas trabalho, humildade e perseverança
Rumo a um norte
Que de vez jamais se alcança.
Por aqui não indo,
Então,
Ninguém pode seguir o coração
E a vida vai caindo, caindo, caindo...
Até se esborrachar no chão.
É quem liga
Paixão, criatividade e arrojo
Que da vida se destaca na briga
E nunca da vida é um despojo.
Colar
Colar a vida
À facilidade
Não é a verdade,
É uma mentira induzida.
Do fácil a procura
É o que mais trabalho dá,
Mais atenção e carinho,
Que da nova síntese a figura,
Acolá,
Não é magia de adivinho.
A vida é difícil deveras.
Não desculpa o desmazelo
Dos que, pelas eras,
De torná-la fácil desprezaram o apelo.
Paciência,
Determinação,
Eis a ciência
De o porvir nos vir à mão.
O aventureiro
Que vai à procura do mundo
Encontra no trabalho certeiro
O entrosamento profundo
De todos os seus pedaços.
- E é o que leva a vida a ter-lhe os traços.
Juntar
Juntar conhecimentos
Em pilha
Nunca de realidade traz elementos
À vasilha.
Primeiro compreendemos o real como todo,
Depois os compartimentos
Que o articulam no respectivo modo.
Ao ligar e religar
É que desenvolvemos o poder
De conhecer
E pensar.
Alicerce
O imaginário, as histórias,
Poder de síntese e de abstrair
São as ferramentas de ir
Da mente às vitórias.
Não é o alicerce matemático,
É o pendor audiovisual
E o verbal
Que erguem todo o edifício prático.
Se me fico pelo alicerce,
O edifício corto cerce.
Ensino
No ensino, em lugar da unicidade
Urge a pluralidade
Na aprendizagem.
Em lugar de uniformizar,
Urge singularizar
Cada singular viagem.
Educar não é prevenir,
Há-de servir
Para criar meios de aprender sem dor.
Conhecer é uma alegria,
Pelos indivíduos cheia de amor
Enquanto o futuro cria.
Adequada
A escola adequada à vida
Colocaria problemas,
Não os lemas
Com que lida.
Conversa enquanto se pensa
Para resolvê-los, tensa
De admiração,
Ao iluminar a escuridão.
Até a criança nela
Não fecharia de vez
A janela
A nenhum de seus porquês.
Tornar
Como tornar mais simples a vida
À criança?
Ensinando-a a pensar,
A conviver e a falar,
Comedida,
Enquanto a gente a lança,
Na peneira dos temas,
A resolver problemas.
Humilde
A ser humilde aprender.
Aprender a suportar
A dor,
Reagindo com pundonor
Ao que a mim me fustigar.
Aprender a perder.
A não desistir à primeira,
Aprendendo a esperar,
Pelo sonho com minha mão tecedeira
A lutar.
Mundo
O mundo com que emparceiro
A criança, na busca do gozo,
É batoteiro
E mentiroso.
Não ajuda nada
A criança:
É qualquer dia arrastada
Na levada
De mais eventos que a alcança.
Em vez de lhe facilitar a vida,
Porque não adestrá-la para os desafios
Com atavios
À medida?
Goste
Há quem goste de nós
Pelo que lhe demos no passado,
Não pelo que de admirável, após,
Auguro
Dar-lhe no traslado
Do futuro.
Ora, o conhecimento é a estrada sã
Para amanhã.
O prisioneiro do hoje
É quem já dos demais foge,
De vez perdido
O sentido.
Hesitações
Ante as hesitações da criança,
Quanto mais a sossega
Mais alcança
Assustá-la na refrega.
O medo é de enfrentá-lo,
Nunca se faz,
Ao driblá-lo,
Ineficaz.
Escrita
São memórias
De que me inundo,
São glórias
Com que me fecundo:
Quem não escuta histórias
Não lê o mundo.
Não interpreta
Quando lê:
Pára no trilho ao pé da seta,
Adiante não vê.
Traz
Ler traz cá para dentro
Outros pontos de vista,
Outros sentimentos onde me centro,
Outros personagens à conquista,
Outros enredos
Onde sem risco exorcizo os medos...
- Fico doutro mundo
Quando na leitura me afundo.
Mais
Mais informação
É mais sabedoria?
Mais escola
É melhor escola algum dia?
Não,
Que a quantidade
A qualidade
Imola.
É mera fantasia.
O verdadeiro rumo
Requer que se atenda ao sumo.
Manterem
A escola não democratiza
Nem a mobilidade social
Concretiza.
Afinal,
Pouco mais é que a camuflagem
Para as classes sociais manterem a triagem.
Na desigualdade de circunstâncias
Desdobram-se eternamente as discrepâncias.
Excelente
Excelente na vida não é não errar,
É aprender
Com o erro.
Singular
Cerro
Onde trepar,
Não é para quenquer.
É, porém, o viso altaneiro
De que, enquanto humano, me abeiro.
Quanto
Quanto mais desafiante,
Mais plural e complexa nossa vida,
Mais lapidamos adiante
Ou largamos erodida
Qualquer alma de família
Que nos conclame à vigília.
À melhoria do lar ou me fecho ou me abro.
Se me fecho, é o descalabro:
Não nos abrirmos ao que mais nos afaga,
É o que mais o estraga
E nos ameaça no chão
Em final solidão.
Alma
Ter família será ter alma comum,
O que nenhum
Material quantificável
Lerá como identificável.
Realidade imaterial
Que germina em aconchego e alegria pessoal,
À fundura de mim se me aplica
Como aquilo que dali me identifica.
Conflito
Uma família saudável
É conflito e discussão,
Não homogeneidade, viável
Só com alguém numa prisão.
Tudo é escolha e compromisso
Entre todos todo o dia,
Pelo bem superior que isso,
Vinculando, cria.
É o trabalho de ligar
Toda a gente
Mutuamente
A se dar.
Nunca
Os pais nunca são a verdade
Quando lutam por ela, com tenacidade,
Até mesmo ao perder.
Quando desistem,
Como pais vão morrendo
E, assim sendo,
Não existem.
Fazer as pazes
É debater
E compreender
Argumentos capazes
Até que, através disso,
Cheguem todos ao compromisso.
Se outra via coroas,
Não terás
Paz,
Irás afastar mais as pessoas.
Rumo
A família não se faz
Sem passado nem futuro,
Vem de trás
E corre rumo ao que auguro.
Partir do zero
É a ficção dum desespero.
Por mais que seja desejável ou exigível,
É impossível.
Possível
Ser bons pais
Sendo maus filhos?
São sinais
De que vai haver sarilhos.
Não é possível nem sequer
Família ser.
Ninguém é feliz
Anulando relações
Com um traço de giz,
Como meras ilusões.
Felicidade é um estado
Onde tudo é tão ligado
Que redunda em sabedoria
Na comunhão de quem confia
As diferenças de cada um
À vontade comum
De mais e mais se ligarem
À medida que caminharem.
Ansiamos
Família não é lugar
Onde se mora,
É onde ansiamos por chegar
A vida inteira, a toda a hora.
É peregrinação, em perene caminhada,
Nunca um ponto de chegada,
Mágica e fascinante utopia
A encher-nos e ao mundo de magia.
Guardião
O guardião do espírito de família
É um ancoradoiro
E um peregrino,
Em perene vigília
Para acolher os pesquisadores de oiro
No cais
E indicar-lhes o destino
E os sinais.
Ao amor ninguém chega
Sem lutar por valores
E sem os partilhar na refrega
Dos suores.
Há conflito, escolha
E comprometimento.
E o gesto que tudo acolha
E recolha,
Momento a momento.
O amor é uma canseira
A vida inteira,
Mas mil por um entrega
A quem dele se encarrega.
Nervos
A mãe acalenta,
O pai tem nervos de aço,
Por isso são quem tenta
Que o filho jogue o laço
Ao mundo,
Com um empurrãozinho fecundo.
Para tanto
Não podem os pais às nuvens chegar
Nem os céus arranhar,
Senão ao filho dar-lhe-á sempre um quebranto.
Pés na terra,
Sonho no espaço,
Ou nenhum filho logrará trepar à serra,
A abranger o mundo no abraço.
Robustece
O minúsculo
De que a criança deu tento
É que nos robustece o músculo
Do encantamento.
É o privilégio de estranhar,
O despropósito
Doutro ângulo de olhar,
De espantar
Um inesgotável depósito,
- É apanhar o jeito
De, no mundo, a outro mundo prestar preito.
Pequenos
Pequenos nadas
Revolvem-nos o coração.
Não valem um tostão,
Moedas falseadas?
Mas todos valem pelo que são:
O que neles apreço
E meço,
Então,
Fica acima, além e fora de qualquer preço.
O coração
Não tem balança em nenhum balcão.
Contam
Os avós contam histórias,
Não como um direito
Mas como um dever
De avivar memórias
A eito,
Da vida ao correr.
No fundo não contam
A tragédia nem a glória,
É a nós que nos apontam:
Os avós são a nossa história,
Das aventuras nos tomos
Contam-nos quem somos.
A cada medo dando um tecto,
A cada gigante baixando um furo,
Tornam cada neto
Mais amigo do futuro.
Sabem
Os pais
Saberão sempre mais
Que os filhos.
Por eles decidirão,
Então,
Para evitar mais sarilhos.
Por isso não irão ceder
Aos argumentos da oposição
Que contra eles se erguer.
Com mais responsabilidades,
Terão sempre mais direitos.
Não precisam de preitos
Mas de capacidades
Para serem sábios, justos e bondosos,
Para os sonhos e utopias
Iluminarem, fogosos,
Os dias.
Pejados
Os bons pais
Andam pejados de contradições.
Questão é como vais
Geri-las quando te impões.
Quem vive disposto a aprender
É impossível não se contradizer.
Mas também não poderá ser dogmático
Teórico nem prático.
É o requisito
Implícito numa caminhada ao infinito.
Mapa
O mapa do tesoiro
Para o filho ser melhor
Acalenta guardar em si cada progenitor,
Com o íntimo agoiro
De ser cada um deles o Ali-Babá da montanha
Que esconde, discreta, quanto à vida ganha.
Quando um filho diz: “Grande pai! Mãezinha linda!”,
Derretem-se os corações mais ainda:
É logo Natal,
Por mais que a vida corra mal.
Leva-me
“Ele leva-me ao limite!”
Mas, em vez de mostrar músculo à criança,
Capitula e desiste do palpite,
Em vez de definir onde o limite
Se alcança?
Repetido e repetido este desquite,
Toda a vida é insegurança.
- Quem cura então a ansiedade
Que a todos invade?
Assumirem
Pais a vacilar
Sem se assumirem como a lei
Do lar...
Dos pais deles ou quiçá da grei
Tanto o erro querem evitar
Que vivem com os filhos
Através de trocadilhos,
A lutarem contra o erro
De que sofreram a pisadura de ferro,
Ignorando a singularidade
De cada filho de verdade.
Com os erros ancestrais às costas,
Não são mais autoridade,
Encaram a realidade
Retalhada às postas
E o ímpeto generoso dum filho nenhuma regra
Doravante integra:
O que entra e sai são mal-entendidos
Com o passado confundidos.
Ora, o filho, de tão perenemente colado
Ao passado,
Acaba, num pesadelo,
A revivê-lo:
É um tiranete impertinente,
Agressivo, impaciente...
- Tudo porque ninguém ultrapassou
Um passado que nos castrou.
Luz
Pai que não foi criança
Como é que no filho
Alcança
Da luz o brilho
Que com o filho se entrança?
Tanto medo têm dum “não!”
Com traumatismo
Que tudo farão
Do desamor para evitar o abismo.
Tratando os filhos
Como iguais,
Quebram de pais
Os vincilhos.
Findam os filhos sozinhos
Como sozinhos findaram os pais
Por caminhos
Tais.
Para o filho só é credível
Um pai
Que não se esvai,
Sempre acima de seu pequeno nível,
Disponível.
Acumular
Acumular desamparos
Dos próprios pais
E ao mesmo tempo ser dos filhos acolhedor,
Atento e protector,
São heroísmos raros,
Geniais.
Ser órfão de pais vivos
Fácil não é,
Quanto mais manter de pé,
Assertivos,
Os gestos de pais sobrevivos!
Seguram
Quando os filhos seguram demais
A relação
Dos pais,
A manterem-nos à mão,
Sofrerão
Por crianças já não serem mais.
Quem o vazio
Colmata deste desvio?
O que o equilíbrio alguma vez porventura alcança
É o direito de a criança ser apenas criança.
Tentam
Da vida singular
Presos nas peneiras
Ilegítimas,
Todos os pais tentam evitar
As asneiras
De que foram vítimas.
O colo que lhes faltou
Tentam dar,
Crianças a nunca de ser filhos se fartar,
Toda a vida tentando o falhado sobrevoo.
Crianças ressentidas,
Idealizam a infância dos filhos:
Então vivem-na desviada, que as vidas
Andam de trocados vincilhos.
Vai
Criança saudável não é certinha
Nem sossegada,
Vai à vinha
Pela calada.
Pode, porém, ser tranquila
E ousada,
Afoita, traquina,
Reguila,
Todavia, educada.
Questão é ter rotina
E regras:
O ritmo da criança com a crença dos pais
Nas normas integras
Enquanto estabilizar tudo vais,
Com a repetida sequela,
Dia a dia, da rotina feita trela.
A rotina permite que nunca se perca
A correria
Dentro desta cerca,
O espanto que a criança guia,
A curiosidade
Pela fugidia
Novidade,
A criatividade...
Nenhuma criança tem de ser guardiã
Dos sonhos infantis dos pais.
Para crescer sã,
É ser criança, nada mais.
Pequena
A pequena pancada
Acumulada
Cria a nódoa negra,
Em regra,
E, se não for travada,
Deriva para ferida
Que, prosseguida,
Culmina num aleijão
De tal tamanho
Que só um deficiente então
Com isto ganho.
Falta humildade fiável
Para perguntar:
Em que pendor sou responsável
Por todo este derrapar?
Que dificuldade em aceitar
Que só quem erra aprende
E que, fugindo dos erros,
Ninguém rende,
Ninguém trepa aos cerros!
O que a este bloqueio acresce
É que ninguém cresce.
Querem
Querem os filhos a aprender depressa,
Sem erros
E sem divergência que meça
Os grilhões dos ferros
De cada disciplina.
- Longe de lhes subir as cotas,
É o que os inclina
Às más notas.
Ajudam
Os pais ajudam tanto
Que os filhos não aprendem a aprender,
Não aprendem a discorrer
Perante o opaco manto
De cada problema,
Não aprendem a errar...
- Cada qual acaba manco
Diante de cada tema
Sem discernir como o atamancar.
Roubam
Roubam tempo ao recreio,
Aos relacionamentos,
Às vivências de vida,
Não há jogos pelo meio,
De brincar nenhuns momentos,
Tudo delapidado na corrida...
- Findam comprometidos os crescimentos
Saudáveis
Por falta das competências indispensáveis.
Sentir-se
Sentir-se um pai responsável
Pelos obstáculos dum filho
É lisonjeante
O bastante.
Não culpado nem culpável,
Contudo, por qualquer sarilho:
Isto apenas vitimiza
E a saída já não visa.
Bem-vinda
Bem-vinda a criança
Que mundo além avança!
Parabéns ao adulto
Que dentro de si
Mantém o culto
À criança que vida fora
Mora
Aí.
Participa
Só há participação
No que é
Realização,
No sopé
Da montanha em construção.
Ninguém participa, em nenhum lado,
No já consumado.
Só quando eu e o mundo, indo em frente,
Nos construímos mutuamente.
Perece um dado
Evidente...
Nenhuma classe dominante, porém, dá conta do recado,
Para ela está tudo assente,
Já tudo foi consumado.
Nem repara que esta é a palavra da morte iminente...
- Em todas as idades
Eis o equívoco gerador de todas as mortandades.
Povo
Um Povo é uma memória
Das matrizes:
É a glória
Das próprias raízes.
E é coragem perante o porvir
Ou é dominável no trilho que seguir,
Reduzida a pluriformidade
Potencial
A uma uniformidade
Letal,
Em conformada escravidão
A um qualquer império mandão.
E é o presente
Agarrado à unha
Permanentemente,
Para servir o Bem Comum
Como já detrás se impunha
Para de fora não deixar sonho nenhum.
Torna-se
Um homem torna-se homem
Na comunicação,
Não quando uns aos outros se comem,
Mas na relação
De amor
Universal,
Seja com quem for,
Sempre em busca do total,
Núcleo fugidio de mim que fito
Projectado ao Infinito.
Marcam
Mágoas
Contadas,
Águas
Passadas,
São
Aliviadas,
Não marcam o chão.
Mágoas
Contidas
Águas
Retidas,
São
Feridas
A rasgar o coração.
Imprescindíveis
Não são imprescindíveis templos,
Liturgias,
Teologias,
Nem bastam os bons exemplos...
Nosso coração
É nosso templo, de que a mente
É o sacristão
Permanente,
E a teologia do crente
Que nos salva de verdade
É a bondade.
Desgosto
Ao desgosto não há como fugir,
Estejas onde estiveres.
De nada irá servir
Correr ou esconder-se: mais que um de teus haveres,
É um modo de tu seres.
Só contigo não emparceira
Quando tu fores tu doutra maneira.
Contas
Não podes, para proteger,
Manter
Quem amas numa redoma.
Tens de deixá-lo escolher
Sozinho
A retoma
Do próprio caminho.
Sem prestar contas do ajuste,
Por muito que te custe.
Tornar-se
Tornar-se bom...
Não há marcos da verdade
De que atingimos a bondade.
Não há tom.
Porém, dum destrambelhamento qualquer
São todos fáceis de ver.
Há mesmo um perverso ludíbrio
Neste desequilíbrio.
Vazio
É diferente
Sentir o vazio dum finado ente
E não querer que acerca dele nada mude.
Em ambos os casos
Todo o mundo se ilude:
Tudo muda sem atrasos.
É a regra da vida:
Podes lutar contra ou aceitar.
Se aceitas, outros rumos trilhas de seguida;
Se lutas, ficas de vez preso no mesmo lugar.
Algo
Vivemos apaixonados
De algo por uma ideia
Em vez da realidade disso.
É o que nos mantém condenados,
Crendo acaso numa vida cheia
Quando dela, nem chamiço.
O sonho então, volta e meia,
Leva sumiço.
Abrir-me
Abrir-me os olhos
Para o que há tanto tempo vejo
Que deixei de reparar nisso...
No casamento, o pior dos escolhos
É o selvagem brejo
Deste enguiço,
A ilusão da caça morta
Que nos bate à porta.
- Depois, de repente, sinto
Que estou a morrer faminto.
Emancipar
Como emancipar alguém
Que não tem
De que não é livre a menor noção?
Falta-nos a chão...
Só nos acolhe e vive
Quem a noção cative.
Ou há reconversão
Ou nenhuma emancipação
Sobrevive.
Sombra
À sombra do solitário ditador
Floresce a multidão de acorrentados democratas.
Do massacre à dor,
Contrapõe-se-lhe a multidão de batas
Que dedicam as vidas
A tornar as doutrem mais cumpridas.
É sempre minoria
O semeador
De horror.
Eficiente, todavia,
É-o tanto mais
Quanto em seu poder acreditais.
Abriguem-se
- “Abriguem-se bem, meus filhos,
Que o mundo vai acabar!”
Ora, não há mais brilhos
Que contar?
Dos milénios caducos a função
Teve sempre, por essência,
Confundir transformação
Com degenerescência.
Foi o que lhes impediu a inovação
E condenou à decadência.
O mais estranho
É nunca aprendermos a converter a perda em ganho,
Encantando-nos com o fascínio da paisagem
Da nova viagem.
E, quem sabe, dar um jeito
De apoiar quem o for tomando a peito.
Discurso
O discurso fala.
Porém, no que entalha,
Importa mais o que o discurso cala:
O discurso falha.
Entre a palavra e a coisa
Medeia uma montanha de apagada loisa.
Por mais que nela escreva,
O que meu escrito
Apenas ceva
Um mero vislumbre dum trilho ao Infinito:
Abismo fora de alcance
Que apela a que nele me lance.
Palavras
As palavras são ausência
Que um vestígio de presença
Apontam na lonjura.
Quem isto não apura
Cai na insolência
De renegar a procura
E é de morte a sentença:
O dogmatismo,
A ideologia
São o abismo
Onde enterram a luz do dia.
Carne e sangue
São a morte
Do desnorte
Duma humanidade
Exangue,
Por confundir a pegada
Com a verdade
Desnudada.
A verdade eternamente nos escapa:
Jamais se confunde com a nossa frágil capa.
Inteiramente
Inteiramente feliz?!
Não tem aqui lugar,
Nem que seja por um triz.
- Que ficaria para desejar?
O absoluto,
Eternamente fora de alcance,
Não é um produto,
É o Infinito a que me lance.
É um vislumbre,
Nítido embora cada vez mais,
Com que me alumbre
No itinerário dos sinais.
Longe
Tudo o que toco
Se desfaz,
Não vá meu foco
Virar-me para trás.
É que lá longe, à frente,
Me chama
O abismo ingente
Da vindoira trama.
Todo o presente
É mera semente.
Perda
O poder humano
De verdade
Envolve sempre o engano
De alguma perda de humanidade.
Não por emular o divino,
Mas por se perder do próprio destino.
Por isso é que só quando o poder se torna inútil
Se reencontra humano deveras: é radicalmente fútil.
Nesta nulidade é que a grandeza
Finda infinitamente presa.
É do Infinito uma estilha
Que aí brilha.
Resposta
Todos queremos
Saber o que correu mal
Mesmo quando deveras não temos
Resposta para tal.
É da natureza humana:
Nada nos anula a gana.
Pode-nos levar milhares de anos,
Mas um dia Ícaro voa e vence os danos.
Fio
As vidas da gente
Andam tão firmemente
Interligadas
Como um pedaço de renda:
Quando um fio lhe desprenda,
Findam todas as fieiras desmontadas.
- Como é que, afinal, a solidariedade
Tão pouco nos persuade?
Amargos
Não é o que ignoramos
Acerca de quem amamos
Que nos choca.
É o que acerca de nós próprios discernir
Não queremos admitir
O que nos toca
Com mil amargos de boca.
Depressa
Toda a gente
Que depressa demais se movimente
E falando demais,
De repente
Volta a correr para os quintais
Onde não quer estar,
Para onde não quer ir,
Só que doravante não há mais lugar
Para onde fugir.
Falta
O amor é violento,
Às vezes, devastador.
Não há nada pior
Nem melhor.
Os altos e baixos, que tormento!
A falta deles, dia a dia,
Ainda é mais tormentosa, todavia...
No inferno do vazio,
Todo eu me atrofio
E, momento a momento,
De mim me esvazio.
Vemos
Vemos o que acontece
E passamos ao lado,
A ver se esquece,
Se não dá cuidado.
Porque não queremos saber,
Porque assusta,
Porque embaraça quenquer,
Porque, doloroso, terrivelmente custa...
E a vítima então?
Ela é que sofre,
Não é o carniceiro, não,
Que continua a encher a mão
E o cofre.
Porque é que a covardia
Encarneirada
É o tecido de cada dia,
A cada jornada?
Espero
Espero ser perigoso para os perigosos,
Espero sempre vir a sê-lo.
Os que voltam as costas aos infaustos gestos,
Aos trilhos danosos,
Escondendo-se por trás de cada portelo,
Nos aprestos
Do próprio postigo,
Estes é que são o verdadeiro perigo.
Nada
A vida, por mais que seja grácil,
Não tem nada fácil:
Por vezes, porém, acontece
Que é mais fácil do que parece:
Basta-nos, aos eventos que nela vicejam,
Deixarmos que sejam.
É vasculhar-lhes do sentido o fio
E da correnteza dele abandonarmo-nos no rio.
Gentes
As gentes, por aqui,
Cuidam delas mesmas
E umas das outras, quando requerido?
Quando o pedi,
Foram resmas
De ofertas de sentido?
Dar-se no que dão
É o segredo da união
E o mais estranho mistério
Do orbe sidéreo.
Sentir
Um consórcio,
Não,
Todavia um divórcio
Faz-nos sentir sem chão.
Mais cedo ou mais tarde, todavia,
Ao deixar ir-me,
Voltaremos a pisar, algum dia,
Terra firme.
Lonjura
Sexo
Sem violinos e luar
A ele conexo
É um anexo
De lupanar.
Sexo, lá no centro,
Tem violinos e luar por dentro,
Nem irá precisar
De tê-los em nenhum outro lugar.
- Então, aí,
Que lonjura pressenti!
Fecundo,
Inaugura mesmo um outro mundo.
Exagero
O exagero no vestido,
Um exagero qualquer
Leva a prender nele o sentido,
Não na mulher.
Por igual é na música, no poema,
Em qualquer forma de arte:
Perdemos de vista o tema
Com o aparte.
Ora, quando a roupagem é preferida,
Finda a mulher abandonada,
Preterida
Em qualquer canto da jornada.
- E por igual ocorre com qualquer canto da vida.
Verdade
A verdade absoluta
É assassina:
Quando em disputa,
É apenas morte o que nos assina
E destina.
Hitler, Estaline, Mao...
- Verdade absoluta é o que detinham.
Daí despenharem no calhau
Milhões e milhões que lhes não convinham.
Apenas a verdade relativa
É humilde o bastante
Para encaminhar sempre viva
A humanidade para diante.
Em nenhum recanto o absoluto
É da humanidade presa nem produto.
Muros
Do México a Berlim,
Na humanidade
Os muros nunca são
Por fim,
A solução.
Somos feitos para a comunidade.
A questão
É construir nela, com autenticidade,
A partir do coração,
A própria identidade.
O isolacionismo
Perante os que me atacam
É o abismo,
Se não der a mão aos que me acatam.
Entre
Nos mais belos palácios,
Entre sedas e talhas doiradas,
Os posfácios
São que as correntes de ar são geladas.
Na vida tudo podemos ter,
Riqueza, honras e poder
E, num abrir e fechar de olhos,
Tudo podemos perder
Nos imprevistos escolhos
Da hora que vier.
Ficamos apenas, expostos ao luar,
Com o amor que lográmos semear.
Terapia
Terapia de casal,
Um trabalho ainda em curso?
Por sinal
É o discurso
Permanente do real:
É quem abandona o percurso
Que finda mal.
O itinerário perene é o único recurso
Rumo ao inatingível ideal.
De meu casal
O dia
Mais feliz
É o da bem lograda terapia
Que de meu dia
Fiz.
História
A história certa na idade certa.
Aquilo a que reagimos
Aos vinte anos de descoberta,
Aos quarenta nem o vimos
Na porta deserta.
Na história lida
Como na vida.
E da vida quando do lado de Lá,
O mesmo será.
Presta
Quem não presta bem merece
(E muito bem)
O que tem (ou que não tem).
Mas parece
(Ou adivinho)
Que detesta estar sozinho.
Solidão indesejada
(E, pior, se acompanhada
Sem se fazer companhia)
É o inferno nesta vida,
Já vazia,
E depois dela, em seguida.
Sabe
Ele sabe que ela não é perfeita,
Ela sabe que ele não é perfeito,
Ambos sabem que a perfeição não existe.
Podem casar, desta feita.
Do rio ao leito
Abriram as comportas para o que mal se aviste:
Da perfeição a negaça
Que ao infinito nos ultrapassa
E que de lá nos conclama
Do coração com a chama.
Se ambos se puserem indefinidamente a caminho,
Nunca mais ninguém ficará sozinho.
E, para o bem e para o mal,
Nunca mais nenhum ficará igual.
Crer
Por me não crer digno de amor, findo isolado.
Isolado, não me creio digno de amor.
Um dia qualquer, porém, no trilho calcorreado,
Eis um olhar
De fulgor,
Por mim a esperar.
Deste cadinho
Ao calor,
Nunca mais fico sozinho.
Simples
É simples, até,
A maravilha:
Um homem idealmente não é
A sua própria ilha.
E, sobretudo,
É o mesmo com tudo.
Em resumo, do mundo o teor
Singular
É que tudo é amor
Perenemente a amar.
Somos
Não somos o que temos,
Nem o que compramos,
Coleccionamos
Ou lemos.
Nós somos o que amamos.
Somos o amor
De quem amamos
E do que amamos,
Único vigor
Que prevalece para além da morte,
Seja lá qual for
De tudo o mais a sorte.
Jamais
Jamais é de confiar
Em quem parece
Tudo aceitar,
Tudo suportar,
Num silêncio que adormece,
Porventura a sorrir,
Em paz ao ir.
Submissão ilimitada,
Tolerância inesgotável...
Um dia desistem da fachada,
Dão meia volta no ar irrespirável,
Batem com a porta e o novo motivo
Então é definitivo.
Já nada os logra prender,
Findaram o itinerário,
Não há contas a prestar a quenquer,
Já nem andam por aqui, já trilham novo fadário.
Pára
Pára de lutar,
Mantém-te firme no chão,
Cuida de ti devagar
Mas não
Resistas em demasia
Ao inevitável de teu dia.
Não ignores a força da corrente
Que te arrasta para trás e para a frente.
Senão, andas a matar-te
Para nada,
A magoar-te
Nas pedras da enxurrada.
Sê bom contigo:
És tu o teu melhor amigo!
Cuidado
O cuidado requerido com as amizades!
Tudo tão frágil!
Arriscamos perder por veleidades,
Um gesto pouco ágil,
Aqueles que amamos.
Um passo em falso,
Um pensamento negro que não afastamos,
Um percalço
De nada
E pronto, findou a jornada!
Mudamos
Quando mudamos algo importante
Em nós,
Tudo muda logo adiante,
Após.
Ora, há quem não tolere
O que mudamos
E logo nos fere,
Nos poda os novos ramos.
É o preço a pagar.
Tanto melhor,
Todavia, se for
Eu, singular,
Meu íntimo a impor,
Eu com o mundo inteiro a me partilhar.
Tinha
És mágica.
Eu tinha tudo e não via,
Na minha trágica
Via.
Reclinado na alfombra,
Vasculhava o arrebol,
Contentando-me com a sombra.
- E tu inventas-me o sol!
O jardim pequeno e denso
De repente é desafogado, imenso!
Abres-me o horizonte
Pejado de calor.
Sem ti não tinha ponte,
Nesta gruta de vida sombria e mesquinha
Onde o amor
Mal se adivinha.
Meu Deus, no desabrochar de cada ramo,
Como te amo!
Modelar
Aceito
O bom e o mau da vida
Para o modelar a eito,
Em seguida.
Farei, pois, o melhor que souber
E puder
Do que o destino da corrida
Desvalida
Me trouxer.
Aumentar
Aumentar o envolvimento
Convivial
Produz o aumento
Da satisfação vital.
Não há monetário rendimento
Que pague o acrescento.
Ser feliz
É apenas com aquilo que condiz.
Empenho
Não há bem-estar
Que aguente
Se eu não desfrutar
Do presente.
Todo o ganho
Vem deste meu empenho com arreganho.
Tudo o mais que interferir
De estranho
Vai-o ferir,
Diminuir de tamanho,
E acaba por me destruir.
- Desfrutar do momento,
Eis o secreto fermento.
Passo
As caminhadas
A passo vagaroso, rústico e convivial
São o ovo da Páscoa das jornadas
Sentimental.
Apanhar lenha,
Atear a fogueira,
Preparar a comida que advenha,
Vê-la a cozinhar, do lume à beira...
Beber um copo à luz das estrelas
- Enche de estrelas todas as vielas.
Melhor
A melhor coisa da vida
É que da vida as melhores coisas
São gratuitas.
Nada de requintado, luxuoso
Ou dispendioso
Nos convida.
Repoisas
Em vivências fortuitas:
O rústico em vez do novo,
O simples em vez do floreado,
Bom ambiente em vez de excitação...
- Deste ovo
É nado
Todo o bater do coração.
Natal
O Natal é mais
Que prendas e compras e família,
Que a lauta consoada da vigília,
Que a festa das festas ancestrais.
É o amor de todos os umbrais,
É doutro mundo uma entrega de mobília...
- O Natal é mais!
Seguro
O Natal é o lar,
É a família e os amigos
Com quem seguro irei ficar,
À vontade para ser eu sem precisar
De abrigos.
Conhecemo-nos e gostamos,
Somos o clã que adoramos.
Ser feliz,
Em todo o lado,
Terá sempre disto o cariz,
Mais ou menos fermentado:
A mesa pejada em que tudo é uma iguaria
Para gozar a vida
E dos demais a companhia,
Dos anos a cada ida.
A família,
Nesta saborosa calma,
Cura mais que um chá de tília,
Vem curar alma.
Fundamentos
Relacionamentos
De qualidade
São os fundamentos
Dos sentimentos
De felicidade.
Estes fermentos
Cruzam toda a idade,
Qualquer nacionalidade,
Sejam quais forem os ventos.
Relacionamentos traídos,
Corpos por fora inteiros
E por dentro retalhados:
- Corpos de almas sem parceiros.
Aconchego
O aconchego é um mimo,
Um chocolate com natas
A coroar
O bem-estar
Bem no cimo
A que te atas.
Um presente
A sublinhar
Que estou aqui no presente,
Ausente doutro lugar.
Estou aqui concentrado,
Quero lá saber doutro lado!
E, consequentemente,
- Muito obrigado!
Quando
Quando amar é apenas sofrer,
Então amamos demais
E mal.
Quando não houver
Outro tema jamais,
É de alerta o sinal.
Desculpamos mau humor, mau feitio,
Indiferença, desconsiderações,
Da infância a pretexto dum desvio,
Feitos terapeutas de ilusões.
Quando não gostamos
De caracteres, valores, comportamentos
E apesar disto os toleramos,
À espera de que mudem aos harpejos
De nossos desejos,
Não somos fermentos,
Abolorecemos a massa
Da vida dia a dia mais escassa.
Tendemos
Com horror
Tendemos a negar
O que for
Demasiado doloroso e ameaçador
De aceitar.
Auto-protecção
Livre e automática,
Esta negação
Mata-nos, na prática:
Mais depressa ou devagar,
Faz-nos perder fatalmente o lugar.
Perene
Com os pais a relação
De ternura,
Com perene manifestação
De afecto, interesse e aprovação,
É que adultos augura
Que tendem a sentir-se bem
Com quem
Com sentimentos similares priva
De segurança, calor e atitude positiva.
E tendem a evitar
Quem de nós nos leve a desconfiar
Com criticismo malsão
E tentativas de manipulação,
Comportamentos
Que chocam,
Cujos intentos
Então só provocam
Aversão.
Mão
No amor, ninguém controla ninguém,
Cada qual a si se ajuda.
E a mão que na mão tem
Nada disto muda:
Dão um ao outro o que a cada acuda,
Na jornada solitária que cada um mantém
A trepar a montanha a que se gruda
Vida além.
Fonte
Não há nada de errado
Em querer ser feliz,
Mas em a fonte colocar noutro lado,
Que não na minha matriz.
É a responsabilidade ignorar
De a minha vida me propor
A partir de mim modificar
Para melhor,
A pretexto de outrem reconverter
Para, ao fim, a partir dele eu ser.
Se for a partir dele e não de mim,
Então é o fim.
- O erro é disto,
Não da plenitude por que existo.
Virar-me
Virar-me do avesso
Para agradar a alguém?
Não, que reconheço
Que assim é que tropeço
No facto de não ter nada
Que agrada
A ninguém.
Produtivo
Quem produtivo no amor
For,
Também a si próprio ama.
Quem apenas outrem ama,
É fama,
Em lugar,
De que é incapaz de amar.
Compreender
Com o entendimento brota
A oportunidade de escolha.
Quão mais compreender o que me derrota,
Mais alternativas,
No que recolha,
Para trocar trilhas mortas por trilhas vivas.
Com o aumento de verdade
Aumento a liberdade.
Libertar-me
Germinar espiritualidade
É libertar-me da obstinação
Em minha interioridade.
É ter noção
De minha infinita limitação
Perante a Infinidade
Do Universo
Ou, no inverso,
Da sua misteriosa intimidade.
É o fim da determinação
De fazer
Que tudo como eu quero deve acontecer.
É aceitar
Que poderei não saber
O melhor para mim ou para quenquer.
E então, no fundo, tudo entregar
Ao que, na vida, me ultrapassar.
Na obstinação cria ter as respostas.
Agora, porém,
Só apostas,
Só propostas
Ou nem isto, vendo bem:
Eis-me aberto,
Doravante desperto
A uma orientação para o quê ou quem
Vislumbro infinitamente além.
Caminhar
Espiritualidade
Não é
Fé,
Mas disponibilidade
Para caminhar incarnando o Infinito
Que do íntimo me apela em silente grito.
Crente ou ateu,
Neste imo é que sou mais eu.
E mais serei
Quão mais longe caminhar por esta lei,
Criando e recriando a nova grei.
Na ressurreição,
Crentes e ateus,
Seremos então
Corpo de Deus.
Portanto
O amor ou medra
Ou morre.
Portanto, corre,
Ou acabas feito uma estátua de pedra.
É o amor
O teu desejo de ser,
Fazer
Ou ter
Seja o que for.
É o que cria o positivo,
Intensifica o bom,
Converte o negativo,
Define de tua vida todo o tom:
Tem poder na saúde,
Na abundância,
Na carreira a que te grude,
Dos relacionamentos na fragrância...
Então porque não é todo alegria
O teu dia?
Porque tens escolha
Em toda a ocasião:
Ou escolhes o amor e tens de amor uma recolha
Ou então,
Não.
Lei
A lei do amor
É a lei da atracção
Que mantém coeso todo o mundo exterior
E, no interior,
Nos prende o coração.
É o que tudo a tudo e a todos
Nos mantém unidos,
De todos os modos
E em todos os sentidos.
Fale
Fale daquilo que ama,
Que, ao falar,
Muda a trama
Dos trilhos da vida por onde andar.
Se falar em dificuldades
Com dinheiro, relacionamentos, doença,
Não fala do que ama, apela à presença
De todas as negatividades.
E a vida consente:
Torna tudo aquilo cada vez mais presente
E reforça-
-Lhe a força.
Não lhe importa a sua atitude,
Se aquilo aceita
Ou rejeita,
Mas apenas a que é que o pensamento grude,
É indiferente se positivo
Ou negativo.
E então, eficaz,
É aquilo que lhe traz.
Ao invés, fale do bom de cada dia,
Do encontro feliz,
De como adora
Chegar a um lugar antes da hora,
E que alegria
Andar de bom cariz!...
Fale de tudo o que correu bem:
É o que ama, o que lhe convém.
E aí
Trará então aquilo que ama até si.
Se apenas se enrola
Naquilo que o rala,
Como papagaio na gaiola
Mais e mais se encurrala.
Falar do que não ama apenas há-de
Aumentar-lhe à gaiola mais uma grade.
Ilimitado
Ao falar do que ama
Tem o poder ilimitado de atrair
O bom da vida.
Joeira a grama,
Ao sentir
Como o amor o convida
Em cada fio da trama
Da diária lida.
Então domina
Do poder toda a inesgotável mina.
Mando
Na gestação
Do sentimento
Não mando,
Mas na gestão
Do momento,
Do como e quando.
Quantas vezes as confundo
E dou cabo do mundo!
Ou corro atrás, instintivo,
Ou fico um animal cativo!
De ambos os modos
Acabei da vida com os bodos.
Envolvermos
Ao envolvermos a emoção
É que palavra e pensamento
Forma tomarão
E forma darão
A cada momento.
Apenas então
Entrarão em movimento.
Combustível
Palavra e pensamento
São o foguete
Cujo combustível é o sentimento
Que os afecte.
São veículos que não logram subir
Sem um sentimento qualquer
Que, levando-os a agir,
Seja deles o poder.
Doutro modo,
Pense o que pensar,
Ficarei parado de todo
No chão que pisar.
Todo
Todo o bom sentimento vem do amor
E o mau, do desamor.
Ao melhor me sentir,
Mais amor transmitiria,
Em redor a se espargir
Pelo meu dia.
E, quanto mais amor der,
Mais amor irei receber.
O amor é a energia
Positiva da vida.
O afecto negativo não avia
Nenhum amor na minha lida.
Sentir
Quando alguém
Se sentir bem,
O pensamento logo, automático,
É positivo e prático.
Ninguém
Se pode sentir bem
Tendo negativo pensamento
No mesmo momento.
Quem se sentir mal
Não tem bom pensamento,
Por igual,
No mesmo momento.
O modo como me sentir
É a medida
Do que ando a emitir
Pela vida.
Basta sentir-me bem
Para garantir que é amor
O que de mim provém
E que colho em meu redor.
Sinto
Quando me sentir alegre,
Emito alegria,
O que leva a que em mim integre
Toda a magia
Da alegria que há
Por onde quer que vá.
Tudo o que então se experiencia
É a lei da atracção
A responder com alegria
À alegria que lhe dão.
O bom sentimento cria
Uma união
Do amor com a poderosa energia,
A fonte em cachão,
A todo o momento,
Do bom sentimento.
Quanto mais ampliar
O bom sentimento,
Mais amor há-de jorrar
Do mundo para fermento.
E depois para mim vai retornar
Em paralelo aumento.
Cume
Não há limite
Para o cume da vida.
Apenas a descida
Emite
O palpite
De trocá-la por subida.
Não é por acaso:
O amor atrai a chama
Para tudo o que cada um ama,
No imediato e a prazo.
O mau sentimento fere,
A empurrar cada um para quanto não prefere,
Para o que lhe tolhe a festa
De tudo o que, afinal, na vida presta.
Sentes
Se te sentes entusiasta,
Vais atrair indivíduos, conjunturas, eventos
Que afasta
Quem não for entusiasta.
É donde sopram os ventos.
Se te sentes receoso,
Atrais tudo o que é medroso.
Podes mudar, a qualquer momento,
O teu sentimento
E tudo muda à tua volta
No teu novo mundo à solta.
Centos
Amamos e deixamos de amar
Centos de vezes por dia.
Amor não há, pois, que bastar
À festa que se urdiria.
Amo ao abraçar alguém,
Desamo ao não encontrar
As chaves,
Ao findar
Preso no trânsito também...
E, para estacionar,
Que entraves!...
Amo quando me rio
Com o colega de trabalho,
Desamo com o fastio
Do restaurante onde calho...
Amo e deixo de amar
Tantas vezes, a par!
Como é que tiro proveito
Do amor
Se o ando a ceifar a eito,
Sem lhe dar o valor?
Normalmente nem reparo.
Depois é a descabida
Serradura da vida
Que nas mãos aparo.
Vive
Vive hoje,
Não vivas ontem
Que te foge,
Nem amanhãs que inda não contem.
Vive o momento:
Só nele inauguro
Cada invento.
Não o alugo, portanto, ao futuro.
Sentir
Quando imagino,
A força do amor domino.
Se imagino quanto é bom
E sentir amor por tudo,
Emito amor no meu tom
E colho amor a miúdo.
Se imagino o mal de alguém,
Do amor não vem.
E o mal, mesmo imaginado,
Volta a mim com igual fado.
Aquilo que deres,
Pensado apenas embora,
É igual ao que receberes,
Não demora.
Elevado
Imagina o melhor,
O mais elevado que te for
Possível.
Deseja-o com fervor!
Então vai ocorrer algo de incrível.
E nem o vês,
Tão pouco em ti crês.
Diferença
A diferença entre quem
Tem uma vida fabulosa
E um zé-ninguém
Resume-se a uma coisa:
- O amor que se tem.
Aquele imagina, deseja e ama,
Sente paixão pelo que reclama.
Este usa a imaginação
Para gritar não
A tudo o que não quer.
Como isto é o que refere,
É o que a vida então
Lhe confere.
E, quanto mais na via torta se enliça,
Mais se enguiça.
A vida ignora
O que quero ou não quero.
Regista o que dentro em mim mora
(Prosseguido ou rejeitado)
E este é o pendão mero
Do que põe a meu lado.
Não posso pensar no que rejeito
Ou a vida mo cultiva
Logo a eito.
Pensarei no que quero, em alternativa,
E a vida acolherá o novo trejeito
Dando-mo em história viva.
Apenas
A vida inteira
É aquilo que imaginamos.
Asneira
Em todos os ramos
É a quantidade de gente
Que apenas pensa o pior e o sente.
Contra si próprios viram
A ferramenta mais poderosa:
Eis como se urdiram,
Na vida que devia ser gozosa,
As negras laudas da pasta
Duma vida madrasta.
Imagina e sente o melhor e o maior
Em qualquer área da realidade:
É a migalha
Que te calha,
Que a força do amor
Que tudo e todos invade,
De vez a teu favor
Persuade.
Difícil
Na mais difícil situação,
Imagine a melhor solução
Que houver
E sinta-a então.
Quando o fizer,
Mudada a conjuntura,
Muda tudo de figura,
A caminho finalmente do resultado
Por si desejado.
Acartar
Para acartar do invisível para o visível
O que deseja e ama
Basta emitir amor bem discernível
Por aquilo onde o derrama,
Através do pensamento
E sentimento.
Abriu-lhe a calha
Por onde tudo lhe escorre da virtual cimalha.
Lugar
Em lugar da queixa
Por não teres sido promovido,
Troca a deixa:
Há um lugar bem mais subido
À tua espera.
Ama-o desde já!
- Então provavelmente ocorrerá
Onde antes nada era.
Domino
Quando imagino positivo
O que desejo e amo,
Domino o amor vivo
Naquele ramo.
Então elevo a imaginação ao limite,
Ao maior e melhor,
Até que o desejo palpite,
Até que torne real seja o que for.
No que depender de mim
Aí fui até ao fim.
E só não devirá real
Se alguém intervier amando mal.
Falta
Tudo o que negativo for
É falta de amor.
O inverso terei de imaginar
E depois amar.
Por aí ao ir,
Inauguro,
Puro,
O novo porvir.
Outro
Não é de transformar
O negativo em positivo.
Outro é o modo de operar,
Ao criar
Ao vivo.
Não penses no mau que mudas,
Que a ele te grudas.
Ama o que desejas,
Que a energia do amor mudará
A negatividade no que almejas
Desde já!
A forma de inverter
É imaginar e sentir o que deveras se quiser.
Abundar em bons sentimentos
Torna bons os momentos.
Fonte
A fonte dos sentimentos não é minha:
Aí eles não são meus,
Chegam-me duma terra vizinha,
Mensagem que por mim além caminha,
Sem erguer os véus.
Resta-me geri-los
Com meus jeitos, meus estilos.
Meus sentimentos não são meus:
São meu diabo e meu deus.
Contradiga
Imaginado e sentido o que deseja,
Inaugurado o mundo novo,
Não contradiga o que almeja
Falando de o não atingir a todo o povo.
É que irá imaginar
Outra vez o pior
E, portanto, irá retornar
Ao velho mundo
De infecundo
Pendor.
Aquilo em que se centrar,
Embora rejeitando,
Para si há-de voltar
De vez em quando.
Níveis
Todos os sentimentos
São níveis de amor.
Se me faltar, no copo de licor,
O licor de meus proventos,
Não é lutando contra o vazio
Que o copo encherei por tal desvio:
O vazio só irá desaparecer
Quando o copo encher.
O vazio é amor em falta.
Se puser o amor em alta,
De meu sentimento de vazio
Não irá restar na ribalta
Nem um fio.
Mundo
Há o mundo interior,
Sentimentos, pensamentos e poder,
De luz e de beleza o fulgor...
Apesar de invisível ser,
As energias de que nele gozas
São infinitamente poderosas.
E tanto mais
Quando o mundo nisto nem creia jamais.
Sentires
Se te sentires desconfortável
Com um mau sentimento,
Andas a tornar-lhe viável
O aumento.
Descarregar
A má energia
É espevitar
A contrária boa que nela nem veria.
Demasiado
A vida
É para ser divertida.
Levá-la demasiado a sério
Implanta o império
Que a poderá pôr combalida.
O mau sentimento
É um cavalo selvagem.
Se o cavalgar um momento,
Já perdi a viagem.
E não irei chicoteá-lo,
Vou é saltar do cavalo.
Se tomar tudo a peito,
Findarei maldisposto,
Perdi à vida o gosto
A eito.
Ir-me-ei divertir,
Tirar poder ao que não quero,
Que, ao rir,
Esvazio o papão
Do balão
Que não tolero.
Findou o mau sentimento?
- Mudei a rota da caravela ao vento.
Chicoteies
Se não te sentires bem,
Não chicoteies teu cavalo
Mais te punindo também,
Que ao mal vais aumentá-lo.
Não odeies o mau sentimento,
Escolhe o bom
A cada momento:
Mudaste teu tom,
Vem o bom logo em aumento.
Ao mal nunca se resiste,
Senão ele persiste.
Deixamo-lo antes cair
Só no que é bom ao investir.
Esvazio-lhe o poder
Abandonando-lhe o ser.
Reduzido a nada,
Apenas resta alegria em minha jornada.
Tudo
Tudo na vida é energia de amor.
Sente-se bem
Porque o tem,
Com íntimo fervor.
Sente-se mal,
Porque lhe falta, por igual,
Dos frios no rigor.
Todos os sentimentos, bons ou maus,
São apenas de amor os degraus.
Segue-me
A vida não me acontece,
Segue-me, conforme o afecto e sentimento
Que semeio ao vento,
Da vida a germinar na messe,
Tenha eu consciência ou não
De tal coligação.
O destino
Está na minha mão:
Com o que sinto e penso
É que pequenino
Ou imenso
O defino.
Escolha
A vida é um catálogo
Onde eu escolho o que amo.
Será que isto é o que nela acamo
Ou antes o inverso análogo,
O enumerar de cada ponto negativo
Que em meus dias arquivo?
A vida não é mais maravilhosa
Se caí no enguiço
Desta negra prosa,
Embora sem dar por isso.
Escolher o que amo,
Do que não amo me desviar,
Este é o meu ramo
De na vida cirandar.
Se me engano
E me desvio,
Desceu o pano
E perdi o desafio.
Vira
Vira costas ao que não amas,
Não lhe dês nenhuma atenção
Nem emoção.
Para dentro de ti o chamas
Se lhe dizes que não,
Não o afastas
Quando dentro em ti deste modo o engastas:
Sentes-te mal,
Emites maus sentimentos
E a vida real
Reentrega-to em tormentos.
Não digas não a nada,
Que isto diz sim
A qualquer atracção
Pelo que eu puser dentro de mim.
E em minha jornada
Tudo será doravante contusão.
Se de vez me afasto,
É que findo no bom pasto.
Faltas
Não há lacunas
No Universo.
Se bem as vires, quando as reúnas,
São o reverso,
Delas em todo o teor,
De faltas de amor.
Se amor deveras dás,
Recebê-lo-ás.
Dá-o
Então
E saltarás o vau
De qualquer escuridão.
Ligues
Não ligues a quem disser
Que és inferior a quenquer.
Não oiças quem proclama
Que não podes fazer o que se ama.
Não repares em quem te nega o valor
Mesmo do ser humano pior...
- Se acreditares nisso
Acendes em ti o chamiço
Da castração
De teu pé e tua mão.
Ora, é tudo mentira:
O amor tudo revira,
Não há nada em demasia
Para ti, em tua via.
Mesmo um erro do passado,
Ao tê-lo tu anotado,
É a tua absolvição
Para reacenderes mundo fora o teu clarão.
Existe
Só existe o presente.
Nem passado, nem futuro.
O passado
É o traslado
Aqui neste momento assente.
O futuro,
A potencialidade que hoje inauguro.
Tudo é só presente na jornada
Da onda caminho fora alevantada.
Cientista
O que o cientista acredita ou imagina
Sobre o efeito
Da experiência,
Inclina
De tal jeito
Aquele efeito
Que a realidade da ciência
Finda por ser em grande parte a da vivência.
A ciência, nas raízes,
Tem destes matizes.
- E há quem no poder não creia
Que do imaginário e da crença nos ameia!
Cria-lhe
O que imagina e sente como verdadeiro
Cria-lhe a vida:
É o que transmite em redor que, por inteiro,
É a receita devolvida.
O imaginário é mais real
Que o mundanal que vê,
Que o mundo que vê vem, afinal,
Do que imagina e crê.
O que acredita e sente, em seguida,
Tende a ser a sua vida.
Então, ao invés, se não acredita no que sonha,
O mundo se encarrega de que dele não disponha.
Força
Uma força eterna e misteriosa
Empurra-nos para diante.
Enquanto muitos seguem avante,
Outros atrasam a vida preguiçosa,
Olhando para trás.
Inconscientemente, aliás,
Cada um deles cria
Oposição a tal energia.
Atolam-se por inteiro
De antanho no lameiro.
De vida não são transporte,
São de morte.
História
A humanidade conta
Uma história de limitações.
Ora, cada um de nós aponta
O infinito nas aspirações:
Somos o ilimitado
Por todo o lado.
O Universo e o mundo
São ilimitados, no fundo.
Se contarmos esta história como diferente,
É a que irá sendo devolvida a toda a gente.
O verdadeiro
Historial de nossa vida
É o do Infindo a integrar-se, por inteiro,
Gradualmente, em nossa curta medida.
Fique
Se algum outro tiver o que você deseja,
Fique tão entusiasmado
Como se fora aqueloutro que o almeja
E frui por fado.
A vida apresenta-lhe tudo:
Se amar aquilo,
O sigilo
É que lhe trará, a miúdo,
Até si
O que o entusiasmou ali.
Catálogo
Contém
O catálogo da vida
Também
O que não amas.
Que tal não entre, nem rejeitando, na escolha decidida
De tuas íntimas tramas
Ou emites, vivas,
Ondas mil negativas.
E é o que receberás, então,
Da vida por tua mão.
Atraio
O que amo me atrai e o atraio a mim:
O Universo responde ao meu sentimento.
Conta apenas então o que transmito assim.
A atracção, única e pessoal, é o vento
Com que alimento,
Dentro e fora de fronteiras,
As más e as boas maneiras
De meu confim.
Bom
És bom que baste desde agora.
Se fizeste algo de errado
No passado,
De tal a consciência e aceitação,
Rejeitando-o sem demora,
É a absolvição
Ante qualquer maléfica atracção.
Doravante aposta no amor,
Atrairás vida nova bem melhor.
História
Seja qual for a história que contar,
Boa ou má,
Tal será
A história de sua vida, a par.
Então, a história fantástica que o embebe
Conte desde já,
Que a atracção cósmica garantirá
Que tendencialmente a recebe.
Invisível
O mais precioso e valioso bem
Que detém,
O maior poder,
É o invisível, o intangível.
Tirar-lho do íntimo ninguém
O há-de poder,
Só por si é transmissível.
Receberá em abundância,
No aconchego da própria pele,
Em qualquer instância,
Pela gratuita dádiva que ao mundo fizer dele.
Mantém-te
Mantém-te atento
Para sentir amor por tudo
O que te ameia
No que te rodeia.
Doutro modo, no alheamento,
Escapa-te o conteúdo,
Ao sabor do vento.
Alerta,
Para veres o que te desperta!
Se andas pela rua a ouvir
Apenas teu pensamento
A zumbir,
Findas num tal estado de transe
Que nada mais há que te alcance.
E, de vez, o que te rodeia
Afogou-se de tua mente na cheia.
Caminhas
Caminhas pela rua e, de repente,
Chama por ti um amigo.
Espantas-te de não ter visto entre a gente
Teu amigo ali contigo?
É que apenas teu pensamento tens ouvido
Num transe perdido.
Ora, quanto mais amor por tua mão desperta,
Mais alerta.
O amor, afinal,
Tende à consciência total.
Sem
Ninguém
Pode exercer
Sem gratidão
Um grande poder:
É o que o mantém
Com o poder em união.
Doutra sorte
É o desnorte
E cai no chão:
Já não tem
Para o poder mais passaporte.
Trepa
A gratidão
Muda por inteiro a vida,
Trepa do chão
A mais íngreme subida.
Todo o salvador do mundo
Usou gratidão,
Acrisolada expressão
De amor fecundo.
Gratidão por sentir,
Mal se apercebe
Que amor é o que ali anda a transmitir
E aquilo que dá é o que recebe.
O agradecimento
Leveda na fornada
Da vida novo fermento:
Cheira a pão fresco à chegada.
Cem
Cem vezes por dia lembro
Que minha vida interior e exterior
É o ponto de chegada a mim, um mero membro
Do labor
De infindos vivos e mortos.
Terei de ter igual entrega,
Da vida nos hortos,
Àquilo que recebi nesta refrega
E, enquanto viver,
Ainda continuarei a receber.
Descubra o que descobrir,
É pelos ombros de ancestrais que irei subir.
Toda
Grato por toda a bênção recebida
Durante toda a vida.
Grato por tudo o que ando a receber,
No presente agora a ocorrer.
Grato por tudo o que desejo
Como se já o houvera recebido,
Pressentido
Do porvir no ensejo.
Transforma
O que deseja aparece
Quando o desejo veemente
Acontece
No que sente.
Porém, se for o que não quer
Fá-lo de igual modo ocorrer.
Onde fixar a mente,
Aceite
Ou rejeite,
Tende a transformar aquilo num ente.
O inferno ou o paraíso
Vêm do bom ou do mau siso
Presente
No juízo.
Faíscas
Umas faíscas de imaginário,
Os afectos do sonho
- E eis que o poder do amor, sumário,
Deriva para onde tudo aquilo ponho.
É a brincadeira,
A alegria
De criar a vida inteira
Dia a dia.
Usar
Para usar o poder da gratidão,
Pratique-a então.
Quando algo bom lhe ocorre na vida,
Agradeça, de seguida,
Não importa o tamanho
Para o ganho.
Diga apenas obrigado
E ei-lo consumado.
Brinco
Quando brinco, sinto-me bem.
Quando me sinto bem, acontece
Na vida o que a vida melhor tem.
A seriedade tece
O império
De tudo o que é sério.
Ora, a vida
Deve ser divertida.
Entre
A diferença
Entre o rico e os mais
É que o rico emite positivos sinais
Relativamente ao que lhe pertença.
Às vezes tão obcecado
Que tudo o mais despreza
E ele finda infeliz, abandonado
Por trás da montanha da riqueza.
Todavia, é rico,
A confirmar dos sinais o veredicto.
Sinta
Sinta amor
Quando pagar
Seja o que for.
As notas ao entregar,
Sinta do coração todo o calor,
Porquanto seu dinheiro
Ajuda a empresa e quem nela labora.
Sente-se bem com o que der, primeiro,
E não se sente mal por ter menos agora.
É a diferença entre ter muito, em seguida,
Ou debater-se com falta pelo resto da vida.
Verdadeira
Verdadeira genialidade
Sem coração
Não vale nada, não.
Nenhum conhecimento em soledade,
Nenhuma inteligência em soledade,
Nem ambos juntos, então,
Criarão
Qualquer genialidade
Que tenha qualquer valor.
O que a genialidade empalma
Com fervor,
Com alma,
- O amor apenas, o amor –
- Isso é que é libertador.
Bolso
Se te empregas
E não gostas,
O dinheiro corre às cegas
Para o bolso doutras apostas.
Procura o bom
Do emprego actual,
Ama os pendores de tal tom,
Que, do amor ao sinal,
O calor dele tudo aquece
E o que amares acontece.
O emprego outro que adoras
Procura-te sem mais demoras.
Ignoras
Ignoras que fazer da vida?
Transmite amor com mil afectos bons:
Atrairás magnético, em seguida,
Para ti o que amas
Em todos os tons
E em ti o acamas.
Até o emprego com que sonhas
Farás que em tua mão breve o deponhas.
Causa
A causa principal
Dum negócio bloqueado
É o afecto negativo projectado
Como sinal
Sobre o insucesso eventual
Constatado.
Mesmo quando tudo corre bem,
Um sentimento negativo
É bastante motivo
Para um buraco se cavar logo além.
Tudo é amor ou desamor
E o que vier
Depende do acelerador
Que escolher.
Sabendo que, se disser não
Seja ao que for,
Então
É nisso que se centra:
- É o que, directo à mão,
Logo pela porta lhe entra.
Formas
O amor tem formas ilimitadas
De entrega.
O dinheiro é apenas uma das estradas
Em que pega.
Considerá-la única
É do amor
Cerrar a túnica
Dos abraços
Com um pensamento limitador
Que nos finda a limitar os traços.
Sabe
O amor é sábio.
Você não sabe como o amor lhe trará o que deseja
Mas o amor sabe-o
E o que você almeja
Alveja
Com o beijo insondável de seu lábio.
Por trilhos embora ignorados
Depõe-lhe aos pés então dele os traslados.
Frente
Ao dinheiro nunca o pode colocar
À frente do amor.
Se o fizer, vai violar
Do amor a atracção
E sofrerá o efeito demolidor
Da vida em decomposição.
O amor é que revigora
Da vida a energia orientadora.
O dinheiro
Chega através do amor.
Se o colocar à frente,
De pioneiro
Devém devastador,
Serpente
Do paraíso,
E toda a vida será uma falta de siso.
Experimentar
O dinheiro é mera ferramenta
De experimentar o que ama.
Do amor a força atractiva
Inventa
Formas ilimitadas
De lhe entregar o que reclama.
O dinheiro é aqui mera senda exemplificativa
De como induzir-lhe as infinitas estradas.
Como convém,
Há infinitos caminhos para além.
Primeiro
Incrível
É que o amor em primeiro lugar
Faz-lhe chegar,
Do modo mais imprevisível,
O dinheiro de que precisar.
É só com precisão
Saber amar, então.
Sem nada de negativo
A contrariar-lhe o voo vivo.
Relacionamento
O relacionamento é o maior canal
Para dar amor.
Poderei mudar a vida inteira
Por este vale,
Colhendo de cada pendor,
Por cada ladeira,
A correnteza do amor
Com que alimento
Cada relacionamento.
Pode, porém, tornar-se a armadilha pior:
É que, muitas vezes,
É a desculpa maior,
Ante reveses
Repetidos, soezes,
Para não dar amor.
Afectos
Ame os demais
Com bondade, apoio, encorajamento,
Gratidão ou qualquer outro nobre sentimento.
A si retornarão afectos tais
Inundando todas as áreas da vida,
Mesmo a mais desguarnecida.
Se transmitir negatividade
Por crítica, acusação, impaciência
Ou outra emoção que desagrade,
A si retornarão com insolência
Multiplicada
A cada esquina da jornada.
Mais
Se a relação
Está muito boa,
É que transmiti mais amor e gratidão
Que negatividade à toa.
Se é difícil, um desafio,
É que mais negatividade que amor
Desfio,
Dos dias ao sabor.
Devido
A relação não é má nem boa
Devido à outra pessoa.
É que só irei receber
Aquilo que primeiro der.
Se tudo é mau,
É que ando a tratá-la a varapau.
Tudo tende a derivar dos afectos que abrigo:
Tudo, portanto, tem apenas a ver comigo.
Melhore
Melhore o relacionamento:
Procure o que ama e aprecia
No outro elemento
Todo o dia.
Quando deliberadamente
Procura o que ama, não o que repudia,
De repente
Um milagre se anuncia:
Dissolve a negatividade
Do amor a energia,
Trocando-a por quanto agrade:
- Da relação doravante é a nova via.
Transmitir
Transmitir amor é delicado.
Por não o entender,
Muitos o têm evitado
E nunca o irão receber.
Tentar mudar alguém
Não é dar amor.
Pensar também
Que sabe o que é melhor
Para outra pessoa,
Nem sequer é amar
À toa,
Antes é manipular.
Pensar que está certo
E o outro errado
Não é dar amor,
É se pôr
A coberto
Dum telhado
A melhor visar na mira
Contra quem atira.
Criticar, queixar-se, culpar,
Aborrecer ou inventariar
Doutrem os erros que são de supor
Não é dar amor.
Ódio por ódio não é conquistado,
Só pelo amor no evento empenhado.
A desta levedura terna
É uma lei eterna.
Negar
Não pode negar a ninguém
A escolha daquilo que quiser
Porque não é nem
O amor que lhe tem
Nem o que ali quer.
É sempre, ao invés, um pendor
De vero desamor.
Apresenta
A vida apresenta o tabuleiro
Para que escolha o que amo.
Na dádiva põe-me à frente
Todo o tipo de gente.
Em cada qual me abeiro
Do que nele aclamo
E desvio o rosto
Do que não gosto.
E então tento
Não investir aí nenhum sentimento.
Não vou discutir nem provar
Que andam errados,
Nem criticar, nem culpar,
Nem os quero mudados
Por cuidar, em vão,
Que tenho razão.
Se porventura, ao invés, por ali for,
Não estarei a dar amor.
Quando deveras amo,
Só quem amar
Finda por vir pousar
E repousar
Em meu ramo.
Amor
O ódio a vida paralisa,
O amor a liberta.
O ódio a vida confunde,
O amor a harmoniza.
O amor é a porta aberta
Para a horta onde tudo fecunde.
O ódio a vida escurece em toda a sina,
O amor a ilumina.
Treinador
Cada qual
Ante os demais
É um treinador pessoal
Emocional
Dos passos que dais.
Uns, brandos,
Nunca farão
Pressão,
Fáceis de amar em todos os mandos.
Outros, duros,
Levam-nos ao limite,
Exigem-nos puros
Em tudo o que nos incite.
E todo o desafio
É para escolher o amor
Contra qualquer desvio
De negatividade, culpa ou dor.
Espicaçam para julgá-los?
É uma armadilha,
Só traria abalos
E, pelos ralos,
Esvazia-se do amor toda a fecunda bilha.
Se não logro amar positivamente,
Desvio-me, a ficar do desamor ausente.
Provocam vingança, raiva, ódio?
Desvio-me deste bródio
Para o que amar na vida.
É culpa, desvalor ou medo?
O segredo
É nunca escorregar nesta descida.
O treinador mais duro
Torna-me mais forte
Mas também confirma, seguro,
Que nalgum ponto andarei perdendo o norte:
Doutro modo nunca atrairia
A dureza desta via.
Não há inimigos,
Há treinadores de excepção
Que serão
Os que melhores abrigos
Nos dão.
Degrau
Trepar o primeiro degrau com um bom pensamento,
O segundo, com uma boa palavra,
O terceiro, com uma boa acção.
E, com meu vento
Na lavra,
Sem mais aviso,
Então,
- Entrei já no Paraíso!
Mim
O que o amor atrai
A mim se agarra.
Rejubilo com a vitória que alguém contrai
E a vitória a mim se amarra,
Tão vizinha
Que parece minha.
Se penso mal ou discuto, negativo,
Também o negativo se me agarra
Como parasita vivo.
Se colo uma etiqueta em alguém,
A mim a colo também,
O que lhe der
É o que irei receber.
Posso colar-me a quanto amo e desejo,
Aceitando-o no coração,
E, ao primeiro ensejo,
Juncará meu chão.
Reparar no que amo,
Desviar-me do que rejeito
(Evitando o tramo
Do afecto repulsivo a ele atreito),
- Eis a jeira
Que nos optimiza a vida inteira.
Persegue-o
Quando alguém fala ou age
Com negativo sentimento,
Persegue-o o sofrimento.
Quando fala ou age
Com pensamento puro,
A felicidade reage,
Correndo-lhe no encalço
Como a sombra no muro
Que nunca o abandona em falso.
Soa
O mexerico
Soa como inofensivo
Mas é negatividade com que fico
Em meu arquivo.
Falar pelas costas não é dar amor,
É o gelo polar
A levar
De meu íntimo o calor.
No mexerico
Não prejudico
Aquele de quem falo:
É a mim que me ralo.
Ouvir alguém negativo
É enegrecer minha emoção,
Por mais que, esquivo,
Lhe tente fugir do chão.
Antes de pôr o nariz
Nos assuntos de alguém,
Olhe que ao nariz se lhe colam de raiz
Também.
Se o não quiser,
Desvie-se, sem um afecto sequer.
Fará um favor a si
E ao outro com que topar aí.
Termine com a frase:
“Sinto gratidão
Por tudo o que ele tem de bom
E oxalá que com tudo isto se case,
Em qualquer tom,
Em qualquer fase.”
Invento
Se eu tiver auto-domínio,
Derroto a tristeza, invento a alegria.
Não quero viver ao sabor do fascínio
Da emoção que em mim brotaria.
Quero usá-la,
Desfrutar dela,
Dominá-la
Da vida em qualquer sequela
Que me regala
Ou abala,
Sem nunca lhe andar à trela.
Reacção
A minha reacção perante algo
Aproxima-o de mim,
Etapas que galgo
Sem reparar, assim.
Boa ou má,
É tal se dissera: “Quero mais!”
E volta-me dacolá
O duplicado com os mesmos sinais.
“Não quero!”
Mas aposto
Que, com todo o esmero
Aí fixei meu rosto:
Volta-me então ao lado
O que não quero, redobrado.
O que importa é o centro
Onde me concentro.
Se o aceito
Ou rejeito,
É o que a vida
Nunca toma a peito:
Dá-mo sempre, em seguida,
E em multiplicada medida.
Aborrecido
Se ficar
Aborrecido, ofendido ou furioso,
Tal negatividade é logo de alterar,
Pressuroso.
Consciente,
A emoção negativa logo se abala
E pode pará-la
Rapidamente.
Ou se retira,
Ou procura o que ama,
Ou faz aquilo com que a sorte revira
Ou a atenção concentra noutra trama...
Irá devir então
Mestre da emoção.
O evento negativo
Não se altera
Com sentimento por igual negativo,
Só abordado a partir doutra esfera.
Mesmo que não logre imaginar
Como positivo encarar um evento,
A força do amor descobre um trilho no lugar
E troca-lhe o fermento.
Águas
Águas lamacentas
Quando as paras,
De turbulentas
Devêm claras.
Sem paragem,
Nas águas como na vida,
Nunca a viragem
Será conseguida.
Volta
Em volta de cada qual
Há um campo de amor, alegria, felicidade,
Toda a positividade
Real
Que lhe agrade.
E há um campo de raiva, frustração e medo
Onde ao negativo
Cedo
O meu terreno cativo.
Quando me sinto fantástico,
Crio um escudo
Que me defende do orgiástico
Negativo entrudo.
A negatividade que contra mim inflecte
Fará ricochete.
Dois negativos juntos,
Tudo em sangue,
Matam da vida todos os assuntos,
Finda a vida exangue.
Quando
Quando triste e decepcionado,
Todo o mundo é decepcionante e triste.
Não verei positivo nenhum lado
Quando o negativo em mim persiste.
Só mudando a forma
Como me sinto por norma.
Mudar o que sinto é parca freima
Ante mudar do mundo a teima.
Mudando, porém, em mim a emoção,
As cores do mundo mudarão.
Ilumina
Entusiasmo, alegria, felicidade...
- Quando os sente
Ilumina toda a gente.
De forma breve ou longa
Pelos mais se prolonga,
Onda que a correr o mundo invade.
E a vida
Prosseguida
É mais uma festa que a todos agrade.
Amor
O amor é a resposta
Em toda a relação:
Aposta
No coração.
Concentra-te no que amas,
Desvia-te do que não amas:
- Por aí virá sempre a solução.
Tentar
O outro tentar mudar,
Crer que sabe o que para ele é melhor,
Que está certo e ele errado, a par,
- Não é dar amor.
Criticar, culpar, reclamar,
Pisotear seja lá pelo que for,
Descobrir falhas a listar,
- Não é dar amor.
Calcorrear tal via
Sempre o amor mataria.
O amor cresce, não do que for negativo,
Mas de quanto for
Vivo.
Apresenta-lhe
A vida apresenta-lhe quaisquer
Indivíduos e conjunturas
Para poder escolher
O que ama e não ama, em todas as alturas.
Ao reagir em quaisquer delas,
Reage com sentimento:
A fazê-lo, anda a escolhê-las,
Para alegria ou tormento.
Se as não quer,
Fuja,
Sem um afecto sequer:
- Aí é que a boa sorte lhe puja.
Saltar
Ser saudável
É ser criança
A saltar inacreditável
Para o que ninguém alcança.
É ser leve como pluma
A rir por coisa nenhuma.
Sem preocupação e sem stresse,
É dormir profundamente
Na hora que lhe apetece
E acordar depois toda a gente,
Como quem saltou do ovo
Sempre com um corpo novo.
É sentir-se entusiasmado
Com cada novo dia,
Tal se fora à romaria
Num horário encaixotado
De magia.
É o que sempre poderemos ser:
- É só abrir a porta para o receber.
Cai
O que mais temo
É o que cai sobre mim.
Remo,
Assim,
Ao que em meu desfavor
Me aparece:
O meu maior temor
É o que acontece.
Habitual
A crença
É um habitual pensamento
Com um forte sentimento
A ele agarrado como uma prensa.
Quaisquer que sejam os factos,
Já decidiu o veredicto,
Não há mais pactos,
É tudo interdito.
Como a crença que emite é a que a si torna,
Determina-lhe a jorna.
Quem emitir mais medo da doença
Que crença na saúde
Dita a sentença
Que se lhe grude:
Bem pode progredir a medicina,
Da doença o medo
O número de doentes determina
Que aumente desde cedo.
Se acredita
Na doença,
É a sentença
Que a si próprio dita:
Tudo na vida
Lhe abrirá para a doença uma avenida.
Eis
Stresse, preocupação e medo,
Sentimentos negativos,
Eis o que a mim me concedo
Quando os não troco por positivos
Afectos vivos.
Vivo-o,
Espalho-o
E, quando repisei todo aquele cascalho,
É o pedregal que em mim arquivo.
Questionam
O que do próprio corpo pensa,
As células o seguirão.
Não questionam a presença
Do que sente, acredita ou pensa:
Ouvem-no e obedecem-lhe então.
Se temer uma doença,
É a doença que constatam
Em seu íntimo presente:
Portanto, desatam
A servir-lha, obedientemente:
Pela ordem que lhe acatam
Terminam a pô-lo doente.
É o que, aceite ou rejeitado, lhe viceja
Na mente
Que lhe servem de bandeja.
Queira-o ou não o queira,
Verificam que é do que se abeira:
É o que lhe porão
À mão
Da vida na estranha jeira.
Mudo
Amando, mudo a estrutura
Dos iões de água de meu corpo,
Alinhando-os na figura
Da harmonia que encorpo.
Com negros afectos
Logo os desalinho
Com os aspectos
De guerra de vizinho com vizinho.
Força
Quando me sinto mal
Seja lá pelo que for,
Minha força vital
Diminui um ror.
Não há saúde
Que a tal
Se grude.
A gratidão
Multiplicadora
Por tudo o que for
Bom
É que mudará o teor
De minha hora.
O melhor seguro de saúde que tiver
É a gratidão pela saúde que queira ter:
Centrado nela
Abro-lhe a janela.
Ocorre
A vida não ocorre ao contrário.
Se a quer boa,
Não é com ela má no imaginário
Que o mal atordoa:
Ao invés, semeia o mal no seu ervário.
Se trocar de vivência,
Sonhando com a alegria,
Ela muda de tendência
E traz-lhe a luz do dia.
Apomos
Um evento
Não é bom nem mau,
É um acontecimento,
Está para ali, inerme, como um calhau.
Nós é que por todo o lado
Apomos significado:
É do modo que o sinto
Que, afinal, o pinto.
Nada é mau nem bom,
Eu é que o defino
Pelo tom
Do afecto que lhe destino.
Magoa
Quando alguém magoa alguém,
De volta tem
O que lhe deu,
Que o mundo lho devolveu.
Pode vir logo ou depois
De múltiplos arrebóis,
Mas a ele, aos filhos ou netos
Irão cair-lhes os tectos.
Mais tarde ou agora,
Não perderão pela demora.
Só lhes restará converter-se
Para que o mundo noutra língua converse.
Comunica
A vida responde,
Comunica consigo.
Tudo o que vê, seja lá onde,
A descoberto ou ao abrigo,
Todos os sinais,
Pessoas, objectos, animais,
Tudo o que ouve,
Todos os eventos,
- Tudo se move
Em sintonia
Com os momentos
De sua energia.
Doutro modo
Nem o notaria de todo.
Acasos
Não há acasos nem coincidência,
Tudo é sincronia
Com a frequência
De cada energia
De tristeza ou de alegria.
É a física da vida,
Cada qual como pólo de atracção
Num Universo em acção
Na cósmica corrida.
E nem reparo
Como sou este íman raro!
Além
A energia do amor não tem oposto,
Nada se lhe contrapõe.
Não há outro poder qualquer no posto
Da vida, além do que o amor lá põe.
Todo o negativo do mundo,
Seja lá qual for,
É sempre, sempre, no fundo,
Falta de amor.
Vieste
Vieste a este mundo com o teu amor
E é o único dom que podes levar contigo.
Enquanto cá estiveres,
Se for
Um bom abrigo
O que escolheres,
Amor andas a dar
E, com ele, a iluminar
O mundo.
É o que te seguirá pelo rio profundo.
Autonomia
Autonomia não é itinerário
De opor-se a ninguém,
Não é o abandono que contém,
Secundário,
Muito menos rejeição.
É levantar asas do chão,
Em busca, pelo céu além,
Dum tesoiro imaginário.
É a subida
Pelo mistério da vida.
Pertences-me
“Tu pertences-me a mim,
Faço de ti o que quero,
Não passas duma serapilheira, enfim,
Mijo-te em cima, a meu gosto mero...”
Foge de quem
Falar-te assim vem!
O manipulador perverso
Não tem conserto,
Menos ainda quando na intimidade converso
Do acerto.
- Foge pela estrada
Sem deixar morada!
Ameaça
Nenhum manipulador
Que ameaça suicidar-se,
Retirado o disfarce,
Se mata, como era de supor.
O que lhe é insuportável a sério
É a surpresa
Da queda do próprio império:
Deixar fugir a presa.
Não se iluda,
Fuja dele:
Não lhe acuda
Ou deixa-lhe nas mãos a própria pele!
Chave
Nossas crenças e convicções são
A chave da corrente
Que nos prende a quem vive da negação
De nossa identidade como ente,
No vampirismo, por excelência,
De nossa essência.
Quem se obstina
A alimentar o sonho
Com uma realidade que se inclina
A destruir tudo o que nele ponho?
Deveria
Como deveria ser o mundo
Não é como ele é.
Se acolá prendo o pé,
Acabo afogado bem no fundo.
A utopia
Só como fermento
Bem atento
Da realidade
Não me estropia
De verdade.
Se a pretendo aqui-agora realizar
Acabarei matando e a me matar.
Se pretendo que já está realizada,
Suicidei-me na estrada.
Mal
O mal é o poder
De impor a vontade própria sobre quenquer,
A oprimir,
Clara ou disfarçadamente,
A fim de o impedir
De caminhar em frente,
De evoluir
Espiritualmente.
É reduzir
As pessoas a nada,
Tornados meros números da manada.
Equilíbrio
Quando o equilíbrio do casal se quebra
E um desata a roer a febra
Do território e identidade do parceiro,
Urge rebelar-se contra o atoleiro.
Sem hesitações,
Que o casal já morreu.
Quebrado o céu,
Não há mais reparações.
Tudo o mais são ilusões
De quem morre lento num horizonte sem luzeiro.
Reentrada
Para reconstruir
Uma relação,
Desculpa pedir
É que irá permitir
A reentrada dela em função.
Tão simples como isso,
É o que acende o rastilho do chamiço.
Sujeitos
Ambos sujeitos do cancro ao perigo,
Eu continuo para diante,
Morreu, todavia, o meu amigo.
É reconfortante
Saber que terei,
Lá na escuridão para onde um dia irei,
O abrigo
À espera
Dum amigo,
No termo da minha era.
Público
Terror em público instigar
Induz à resposta de manada:
É a lei da turba a dominar,
Reacção visceral descontrolada.
Todos lutando pela sobrevivência,
Não há escrúpulos na luta.
A única evidência
É que é de temer pela vida na disputa.
Maior
Por maior que seja o esforço,
É o dinheiro
A chave-mestra de qualquer fito
Pioneiro,
Em cujo escorço
Medito:
Quer o amor quer a guerra tenha em vista,
Antecipa-lhes a conquista.
Sem
Imanência sem transcendência
É no presente imersão.
Transcendência sem imanência
É do presente evasão.
Ambas são
Improcedência,
Perene fermentação
Da insuficiência.
Apenas a fusão
De ambos os caminhos
Nos torna adivinhos
Da excelência.
Aí tomamos rumo
E esprememos, gota a gota,
Nesta rota,
Do Infinito o sumo.
Mal
O mal que se espalha em meu redor
Não é um mal, é um desafio
Ao que me irei propor.
Mal é o que desfio
De meu íntimo, em desamor
Por um qualquer fio
De vida
Que em mim buscou guarida
E eu abandonei, dos dias ao sabor.
O mal é só o que eu tiver dentro:
A linha de desempate de meu centro.
Tudo o mais, lá de fora,
São as texturas de minha escolha a cada hora.
Renunciar
Poderei renunciar a indivíduos, a objectos,
Mas a mim próprio não poderei.
Mudam as conjunturas, acolho-me a outros tectos,
Arrebanho-me a outra grei,
A todo o lado, porém, me transporto a mim
E a dor ou a alegria iguais se manterão, sem fim.
Ninguém se corrige mudando de lugar.
Ao invés, porém, mudando-me a mim, mudo o mundo a par.
O lugar é indiferente:
Todo o lugar é lugar de gente.
Por igual,
Para bem ou para mal.
Batemo-nos
Batemo-nos acompanhados,
Morremos sozinhos,
Cada qual com sua morte, nos prados
Maninhos.
Solitária para cada um, furtiva,
A morte é privativa.
É um objecto de uso pessoal
Como a carteira, o saco de praia,
Íntimo por igual,
Da vida na raia.
Mesmo perante testemunhas, ao acaso da sorte,
Afundamo-nos sós no mundo
No poço sem fundo
Da morte.
É a angústia temida
Que nada conforte
De só termos uma vida.
Bordar
Bordar, coser, tricotar
É um modo de amar
Que muitos amores terão:
Tecem com o coração.
E o lar
É do amor uma invenção.
Vida além,
Com fervor,
Só faremos bem
O que fizermos com amor.
Papéis
A gente traz na cabeça
Papéis velhos que não ardem nunca
Nem se perdem na mala velha que neles tropeça
E a memória deles junca.
E carregamo-los nos traços
E dos gestos nos embaraços.
Com que a vida nos sarne,
São papéis velhos feitos carne.
Definitivo
Definitivo não há
Nada no mundo,
Nem o infortúnio que houver já,
Nem a prosperidade onde me afundo.
Do tempo na fila
Tudo transita,
Da vida nos rolos
Invertendo os pólos.
Abastança
Na abastança é sempre inviável
Entender a luta da miséria.
Crer que o esforço torna provável
Ganhar a mesma féria
Antolha-se verdade a nu
A quem trincha o peru.
Ora, a muitos nem um hercúleo esforço
Garante daquilo nem um escorço.
Longa
Quando não simulado
Nem forçado,
O amor
Duma longa amizade germinado
É o melhor:
Em morrão ou ateado,
Deita sempre calor.
Ordem
A ordem da organização
Agiliza a operação.
Se toda a gente organizada for,
O mundo será bem melhor.
Precisamos de regras.
Quando as integras,
Temos o mundo civilizado;
Sem elas, finda tudo esbarrondado.
Com elas é tudo mais eficiente;
Sem elas, nada é suficiente.
- Quem
Apenas obedece à regra, porém,
Perde, a todo o momento,
O divertimento.
Sente
Se não for muito alta
E se for breve,
Ninguém sente a falta
Daquilo que nunca teve.
Ao invés opera o grito
Com que eternamente em mim concito
A chegar à ribalta
O Infinito.
Extingue-se
Não é um ludíbrio
Ter de haver entre cooperação
E competição
Um equilíbrio.
Como entre caçador a caça,
Senão extingue-se de ambos a raça.
Evoluir
Implica
Competir
Para melhor cooperar, a seguir,
A espécie que se radica,
A civilização que se amplifica...
Todos estamos ligados:
É a verdade de fundo
No mundo,
Por todos os lados.