TRILHO  REGULAR

 

 

 

 

 

Energia

 

A energia que lançamos

Volta sempre para nós.

Semente que semeamos

Brota em planta logo após:

Se semear macieira,

Como esperar a pereira?

 

Se plantar uma acção boa

O mundo mau atordoa.

 

E, se forem muitas mais,

Não há mundo mau jamais.

 

 

Momento

 

É importante decidir

Se o que tem é suficiente

Para em frente então seguir.

Que, se permanentemente

 

Decide que algo lhe falta,

Pela hora certa espera.

Só que não há na ribalta

Tal hora, em nenhuma era.

 

Certa, certa, só a de agora,

Senão não terá futuro.

Se a chave à porta demora,

Meu porvir só encontra um muro.

 

 

Comprometes-te

 

Comprometes-te deveras?

Todo o corpo, toda a mente,

Consciente, inconsciente,

Mesmo a dormir nas esferas,

Desatam a trabalhar

Para o que tens de alcançar.

 

É o que da tua presença

Fará toda a diferença.

 

 

Corpo

 

Se for de dar corpo ao sonho,

Nada de plano em reserva!

É que, quando este proponho,

Nunca fica de conserva:

 

Foco-me ali por engano,

Vai ser ele, ao fim, meu plano.

 

Lá se foi, então, talvez,

O meu sonho ali de vez.

 

 

Caiu

 

Quando tentou caminhar,

Caiu centenas de vezes.

Comer sozinho ao tentar,

Sofreu mil e um reveses.

Ao aprender a falar,

Quanto erro então foi nas teses!

 

Não passou pela cabeça

Desistir quando tropeça.

 

Esta determinação

É de nossa natureza:

Nosso sonho é ter à mão,

É daqui que agarra a presa.

 

 

Amor

 

O amor dos jovens, que ilusão bonita!

O amor dos velhos que se não desquita,

 

Como os mais todos, como todos são

Dignos, enfim, duma celebração!

 

Por sonho vamos, em qualquer idade,

E o sonho um dia vai ser realidade.

 

Pode além ser, pois, num além da vida,

Mas a promessa será lá cumprida.

 

 

Bravura

 

A bravura sem prudência

E da sensatez perdida,

Que o perigo na pendência

Não mede nem já medida

 

Toma de o eliminar,

É de bem má consequência

Uma bravata sem par.

Quem nela cai, de excelência

Tomba em nada, singular.

 

 

Povo

 

O povo, enquanto ignorante,

Há-de ser sempre esbulhado

Do direito de adiante

Ir traçando o próprio fado:

Na ditadura imperante,

Como submetido gado;

Na liberdade fundante,

Sempre a ser manipulado.

 

Sem o povo se educar

A entender o deve e haver,

Nem direito nem dever

Acabarão por vingar.

 

Doutro modo, a consequência,

Constatada dia a dia,

É trocar a prepotência

Só pela demagogia.

 

 

Matar

 

Ameaçar matar alguém

Por ter escrito um escrito,

Inventado um inventado

Mundo que nunca se tem

No real real inscrito,

Um lado sem nenhum lado,

É, dentro dum mundo cúpido,

O que houver de mais estúpido.

 

O perigo das palavras,

Aquela ameaça ao poder

Com que arroteiam as lavras

Sem mesmo em nada mexer...

 

No país do ditador

Governado do polícia,

Todo e qualquer escritor

Deve aguardar a sevícia,

Correr perigo de morte,

Se livre escrever à sorte.

 

Aí qualquer escritor

É sempre um perigo-mor:

 

Dele o mundo não é o centro,

- Muda as pessoas por dentro.

 

 

Transformar

 

Transformar o chumbo em oiro

Não é nada comparado

Com agarrar num desdoiro,

Em algo de inanimado,

 

Instrumento de arco e corda,

E, do som que nele acorda,

 

Reproduzir, no que emana,

Toda e qualquer alma humana.

 

 

Estranho

 

Por estranho que pareça,

Nada é o que parece:

O que nas coisas começa

Faz às pessoas remessa,

Dúplice tudo acontece.

 

Um mero lado de fora

Que aponta o que dentro mora.

 

A esta duplicidade

Há muito quem se convença

A sobrepor-lhe a vontade:

Outra cara, mais intensa...

Quando alguém em alguém pensa

Em quem pensa de verdade?

 

Na máscara que ali veste,

Noutra qualquer que o conteste?...

 

Ou na primeira raiz

Com que nada ao fim condiz?

 

 

Dois

 

Ninguém serve a dois senhores:

A Deus e mais ao dinheiro,

A Deus e mais ao poder,

Deus e o sexo sem amores,

Deus e o costume ronceiro,

A Deus e a um dogma qualquer...

 

Nem sequer a tradição

Nos salva na ocasião,

 

Antes também nos condena,

Se a dose dela for plena.

 

Nem os ritos mais sagrados,

Que ídolos nos são doados.

 

O Deus abscôndito à frente

Mais que tudo isto é exigente:

 

Ou tudo se lhe submete

Ou tudo se compromete.

 

Tudo então é indefinido,

Busca eterna de sentido.

 

Tudo devém relativo

Na infinda rota ao que é Vivo.

 

 

Livre

 

Faço quarenta e um anos

De livre da solidão

(Forma de antiga prisão

De vida a ferros e enganos).

 

Fazes tu sessenta e dois

De vida à partida armada

Para engendrar arrebóis

Em qualquer noite cerrada.

 

Desde então que vivo ao sol

Onde houvera só luar

Mal prometido no rol

Duma vida a esgravatar.

 

E aqui vamos de jornada,

Eu com neve de velhice

Na cabeça prateada,

Tu travando-me a tontice.

 

E o melhor do que acontece

É que não contém ludíbrio

Em nossa vida o equilíbrio

Da jornada que alvorece.

 

 

Celebrar

 

Celebrar anos de vida,

Só quem nesta despertou

E nunca mais acabou

A romagem para a ermida.

 

Vamos então para a festa,

Que, embora trôpego, eu vou

Coroar a tua testa

Das asas de todo o voo.

 

Porque trazes da lonjura

A doçura que há no mel

E tudo o que nela apura

A ventura que me impele.

 

Não te dou meus parabéns,

Dou-te antes a gratidão

Por cobrires o meu chão

Deste jardim de cecéns.

 

 

Muda

 

Somos gente

E uma gente bem mutante,

Tal qual como, à nossa frente,

Tudo muda a todo o instante.

 

Ora, se formos espertos,

Faremos nós as mudanças,

Antes que os rombos abertos

Nos forcem delas às tranças.

 

E não mudar por mudar,

Mas mudar para melhor.

A tradição tem lugar

Mas não preserva da dor.

 

É melhor do que a anarquia

Ou que o combate letal,

Mas não é perfeita via

Se for só tradicional.

 

Importa sempre visar

O fito que a tradição

Afinal quis preservar

Com o que erigiu do chão.

 

Se o já não logra atingir,

Que, entretanto, algo mudou,

Só se a tradição ferir

Sou fiel ao que intentou.

 

Entre ser fiel a ela

E sê-lo àquilo que visa

É que distingue a sequela

Do inferno ao que diviniza.

 

E depois

Somos gente tão mutante,

Sempre a sonhar arrebóis

Que alvorecem adiante!

 

 

Salto

 

Quando outra via é inviável

E só o salto se concebe,

Que encontres tudo agradável

Do outro lado da sebe!

 

Quando a rotina te entala

Os olhos que o longe miram

Entre as paredes da sala,

Teus pés o salto conspiram.

 

Quando a tradição te murcha

Sentidos ébrios de vida,

Tal que flor nenhuma surja,

O salto além te convida.

 

Quando a prepotência amarra

Teus actos de pés e mãos,

Teu sonho, preso em tal garra,

Salta em busca doutros chãos.

 

Quando o dogmatismo cego

Duma fé ou dum partido

Do amor matam todo o apego,

Saltar fora faz sentido.

 

Quando outra via é inviável

E só o salto se concebe,

Que encontres tudo agradável

Do outro lado da sebe.

 

 

Luar

 

Um amor sonhado,

Que luar de Agosto!

O amor consumado,

Aurora ou sol posto?

 

E que trabalheira

A Lua a nascer

Por trás da cimeira

Serra a mal se ver!

 

Mas a quem se deu

Ao trabalho todo,

Céu fora nasceu

Do luar o engodo.

 

E a noite é de estrelas

Sempre a luzir belas.

 

Do amor a magia

Mesmo à noite é dia.

 

 

Dor

 

A dor esmorece,

Não desaparece.

 

O tempo dilui,

Nunca substitui.

 

Fica a cicatriz

Do que foi que fiz,

 

Cada vez mais ágil,

Sempre um pouco frágil,

 

Mais a aprendizagem

Da vindoira viagem.

 

 

Sabemos

 

Todos nós sabemos bem

Aquilo que não queremos,

Que detestamos também,

Que impede quanto seremos,

Todo o desenvolvimento

E o bem-estar de momento.

 

Aquilo que causa dor,

Que nos causa sofrimento,

Seja aquela lá qual for

E deste qual o tormento,

- Tudo isto nós rejeitamos

E nunca nos enganamos.

 

O difícil é saber

O que, ao fim, cada qual quer.

 

Mesmo sabendo, porém,

Podemos perder a vida

A tentá-lo, de seguida,

Sem o atingirmos também.

O maior motivo disto

É aguardar doutrem o visto.

 

Aguardo a transformação

Dos outros e não de mim.

A vítima quer assim

Que o carrasco perca a mão.

Se noutrem ponho a esperança

Nunca alcanço o que se alcança.

 

 

Decisões

 

Decisões da grande empresa,

De cúpulas de poder,

Das religiões que houver,

Dos órgãos mundiais a presa,

- Por muito que a tal me lance,

Ficam-me fora de alcance.

 

Posso mostrar-me inconforme,

Com tais rumos me indignar,

Até mesmo organizar

Luta que outro mundo forme

Atento a uma maioria

Que aquilo espezinharia.

 

A vitória garantida

Nunca terei, entretanto.

O poderoso no pranto

Afoga qualquer medida

Que vir atacá-lo entenda,

Por muito bem que aos mais renda.

 

E o pior é que a mudança,

Para devir verdadeira,

Só se sustentada inteira

Por todos a quem alcança:

Quem conforma todo o ente

A tal mundo diferente?

 

Não me basta desejar

Para vir a acontecer

O mundo que, enfim, quiser,

Pois quando ao poder chegar

Vou repetir com horror

Os erros do antecessor.

 

Em toda a revolução

Isto foi que aconteceu:

Depois de entrever o céu,

Só esbirros gerar o chão

E às vezes piores estes

Que os de outrora que detestes.

 

Sem da conversão o esteio

Que mundo fora fermente

O renovo em toda a gente

Não há disto remedeio.

Pelo Ano Novo demora

O ano velho a ir-se embora.

 

 

Momento

 

No momento em que detecte

O que em mim é acção errada,

É mais fácil que projecte

Mudar de estrada.

 

É mais fácil evitar

Repeti-la no presente

E com isto assegurar

Porvir em frente.

 

Aniquilo o mau efeito

Se a causa evito, seguro,

A que antes andei sujeito...

- Terei futuro!

 

 

Desaparece

 

O mundo que conhecemos

Desaparece entre nós

E surgem os novos remos

Doutras soluções após.

 

Num efeito dominó,

Caem velhas estruturas

Ante as novas, tudo em pó,

E um novo mundo inauguras.

 

Tudo será diferente

Se difere toda a gente.

 

 

Gera

 

Uns deterem mais dinheiro

E mais bens do que os demais

Gera de inveja um lameiro,

De ressentimentos reais.

 

Se alto se desnivelar,

Dele a consciência for alta,

Então o que é de esperar

É uma explosão na ribalta.

 

Tal vai ser entre vizinhos,

Entre classes dum país,

Entre povos que maninhos

Ignorem os aguazis.

 

É assim que o planeta inteiro

Se afoga neste ribeiro.

 

Como evitar este abismo?

É só distribuir justiça:

Será o fim do cataclismo

Com a morte da cobiça.

 

 

Cinza

 

Um amor de velho,

Cinza no borralho,

Falha-me o artelho

Mas inda não falho.

 

É já uma saudade,

Já uma despedida,

Mas o abraço invade

Derradeiro a vida.

 

Assoma a alegria

Última e de vez

Na lareira, um dia,

Que o mundo nos fez.

 

 

Tempo

 

Tudo nasce e morre.

Com boa ou má sorte,

No tempo que corre

Tudo leva à morte.

Entretanto, há vida:

- Dou-a em que medida?

 

Se a morte se empreita,

Que vida se ajeita?

 

Toda a escolha é tua:

Como é tua rua?

 

 

Vítima

 

Vítima deixar de ser

Pode ser acidentado:

Poderei já não querer

Deixar de ser vitimado,

Afeiçoei-me ao personagem

Da vida durante a viagem.

 

Fiz de mulher abnegada

Ou de filho obediente,

De homem duro na jornada,

De avó fingindo um presente...

- E tudo é simulação

Nesta representação.

 

Até o líder reeleito

Que sempre traiu a base

Vem de actores cujo preito

É o suicídio comum quase.

E ei-lo no cargo, talvez,

Uma e outra e outra vez...

 

Até mesmo o salvador

Não quererá que melhore

A vida a que ande a se impor,

Não vá findar quem lhe implore.

Se ninguém precisar dele,

A que vida então se impele?

 

Positivo ou negativo,

Ao personagem diário

Demos carinho tão vivo

Que dói pormos-lhe o sudário.

- Quando fora dele vou,

Se não sou ele, quem sou?

 

 

Atando

 

Os sonhos são meus desejos

E não só meus pesadelos,

Tudo depende dos elos

Que atando for pelos brejos.

 

Vontade de cada um

E toda a comunidade

É o que é mesmo o bem comum,

A vera prosperidade,

 

A via mais realista

E autêntica, nos matizes,

De sermos, por esta pista,

Todos deveras felizes.

 

 

Passado

 

Se algo me traumatizou

Não me logro aperceber

Do que no mundo mudou,

O passado sempre a ver.

 

A visão culpabiliza

Este hoje que nem divisa.

 

E mantém-me prisioneiro

Do que atrás sofri primeiro.

 

 

Parte

 

Vejo-me parte do todo:

Se alguém não merece amor,

Eu também não, de algum modo,

Sofro nele a minha dor.

É meu seu projecto inteiro,

Se falhar, falho primeiro.

 

Como em jogo desportivo,

Se minha equipa perdeu,

Quando é por ela que vivo,

Se perde ela, perco eu.

Se o fito nos é comum,

Tudo e todos somos um.

 

 

Exclusão

 

Se de exclusão a energia

Impera em mente que cria

 

E que dá forma à matéria,

Então a união sidérea

 

Que do Todo era repleta,

Finda rompida, incompleta.

 

Findamos todos frustrados,

Com nossa sina aos bocados.

 

O mundo inteiro aos retalhos

Será o cabo dos trabalhos.

 

Não se pode a uma mentira

Do Homem apontar a mira.

 

Findaremos todos mortos

Mesmo em vida, de tão tortos.

 

 

Dois

 

A mulher na dor de parto,

O homem numa batalha...

Quando aos dois vida reparto,

Qual é que a cada qual calha?

 

A linha assim dividida,

Eis o que lhes cabe em sorte:

A mulher luta por vida,

O homem luta por morte.

 

De ambas as linhas memória

É aquilo que tece a história.

 

Qualquer árvore precisa

Tanto do botão brotando

Como da rama que visa

O vento que a vai podando.

 

 

Nenhum

 

Nenhum homem mesmo macho

É só por ter erecção

Ou ter orgasmos em cacho.

Macho deveras então

É se é capaz de prazer

Dar de vez a uma mulher.

 

Por isso é que ela se ocupa

Em simular cada upa:

 

Pode tanto dar prazer

Tal de macho o convencer.

 

E quantas vezes de fora

Fica o prazer dela agora!

 

 

Usado

 

Sexo é usado muitas vezes

Tal e qual como uma droga:

A realidades soezes

Para fugir quem se afoga,

Para ignorar os problemas,

Para relaxar dos lemas...

 

E, tal como as drogas todas,

É nocivo, destruidor.

Destas músicas as codas,

De efeito melhor, pior,

Devem levar a entender

Que o bom não é o melhor ser.

 

O sexo inteiro assumido

Não é sexo a qualquer hora,

Tem relógio embutido

E os dois acertar demora:

Os dois ponteiros a par

Têm o mesmo de apontar.

 

Não é de todos os dias

E quem ama sente bem,

Mesmo sem do sexo as vias,

O par com que se mantém.

Paciência, perseverança

É que um corpo em dois alcança.

 

Amar que um encontro é mais:

São abraços genitais.

 

 

Viver

 

Quem viver intensamente

Não sente do sexo a falta,

Tem prazer todo o presente.

Se o sexo vem à ribalta,

É por superabundância,

Vinho a espumar de elegância

 

Que transborda, natural,

Porque então é inevitável.

O apelo à vida total

Acolhido, de inefável,

Com a vida então me enrolo,

Perdido todo o controlo.

 

 

Criança

 

Ante o poder colossal

Do Cosmos perante mim,

Sou a criança, afinal,

De aldeia lá do confim,

Do acaso joguete real,

Ignorada: um nada, enfim!

 

Quando olho dentro, contudo,

Tudo em meu imo: sou tudo!

 

 

Habitues

 

Não te habitues à dor,

(Que é fácil viver com ela)

Por poderosa que for.

 

É do cotio sequela,

No sofrimento escondido,

Na renúncia ao que me apela.

 

Culpamos o amor ferido

Pela derrota do sonho.

A dor assusta, sentido

 

O rosto dela medonho,

Mas é sedutora quando,

Em sacrifício bisonho,

 

Mil renúncias vai pintando.

Por mais que a gente a rejeite,

Um meio vai encontrando

 

De a cortejar, bem aceite,

Da própria vida a ser parte,

Para que se nos respeite:

 

Somos os justos, aparte,

Puros e merecedores

De todos, disto por arte.

 

Movem o mundo os cultores,

Não da busca do prazer,

Mas da renúncia aos favores.

 

Soldado, guerra ao fazer,

Não vai matar o inimigo:

Seu país vai defender.

 

Esposa, não é o pascigo

Que mostra de estar contente:

Mas quão sofre, que castigo,

 

Para que o marido tente

Ver feliz a vida inteira.

E o marido é competente

 

Por de realizar-se à beira?

Não: pelo bem da família!

E o filho é renúncia à feira

 

Da vida, pela vigília

Que respeita, atento aos pais.

Pais que vivem em quezília

 

Por filhos não ter tais quais...

- Tudo dor e sofrimento

A justificar reais

 

Perdas a todo o momento

Do que apenas deveria

Dar, com puro sentimento,

 

A vida inteira alegria:

O amor, a emoção do vento,

A vontade da magia.

 

 

Beber

 

Deseja beber sem par

Lentamente, a saborear...

 

De vez esquece o mau vinho,

Gole a gole, no caminho.

 

Faz sentir a embriaguez,

Dói a cabeça talvez...

 

E, depois que tudo acalma,

Fica-lhe um buraco de alma.

 

 

Extra

 

Por mais dinheiro que tenhas,

Se vais ao banco comprar

Horas extra, a acrescentar

À vida a que tu te atenhas,

Não encontras quem te atenda:

Não há tais horas à venda.

 

Dure a vida o que durar,

Não faz com riqueza par.

 

- Porquê tal prioridade

À riqueza em toda a idade?

 

 

Pouco

 

Um pouco mais esperar

Pode o sonho, nunca é de hoje,

Que preciso de ganhar

O dinheiro que me foge.

 

Meu tempo vender, premente,

Como, aliás, faz toda a gente.

 

Aturar insuportáveis

Como as gentes mais fiáveis,

 

Entregar meu corpo e alma

Sempre em nome dum futuro

Que nunca vem nem me acalma,

- Tal toda a gente que apuro.

 

Ver que inda não é bastante,

Como a gente que há diante...

 

- Quem é lúcido aproveita

E fora tudo isto deita.

 

Vai dar prioridade ao sonho:

Vive do ar de que disponho

 

E das migalhas do dia

Que algum suor granjearia.

 

E nunca inverte na escala

O primado ao que é uma gala.

 

 

Procuro

 

Quanto mais longe, mais perto

Do coração os afectos

Que ignorar, matar decerto

Procuro sob meus tectos.

 

É sempre quando no exílio

Que vou queimar o meu cílio

 

A escrever cada lembrança,

Não vá morrer quanto alcança.

 

É assim com nossas raízes,

Com qualquer nosso ente amado...

De ir em frente são matrizes

Por onde sou retratado.

 

Não queremos nem podemos

Deixar de ser quem seremos.

 

 

Perde

 

Amor, amor sem humor

Perde logo toda a graça.

Que chatice de pendor

Às costas de quem congraça!

 

Mesmo a Terra é divertida:

Redonda como os rebolos,

Não é bola bem medida,

Duma chatice nos pólos.

 

Porque havemos de ser chatos

Do amor fruindo dos tratos?

 

No amor feito obrigação

Aonde a jubilação?

 

 

Lírios

 

Os lírios do campo olhai,

As avezinhas do céu...

- Reforma agrária não sai

Dum poema que alguém nos leu.

 

Em qualquer religião,

Pretender tirar medidas

Que nos lavrem nosso chão

Só trará pernas partidas...

 

O Estado confessional

É da fé traição total:

 

Pretende ter neste mundo

Do Outro a forma e o fundo.

 

Outro o Outro então não era,

Mas terrena farsa mera.

 

Tal foi no Estado cristão,

É no islâmico de agora

E em qualquer religião

Sempre a mesma perda mora.

 

Quem os dois mundos confunde

Nunca o Outro neste infunde,

 

Transforma numa irrisão

Toda a espera, agora em vão.

 

São tudo ídolos humanos

Adorados: tudo enganos.

 

 

Verdade

 

A verdade é inatingível,

Jamais, pois, definitiva,

Horizonte perseguível,

Eterno além do que viva.

Não há dogma que convença

Se por verdade é sentença.

 

A verdade é aproximável,

(Nunca posse de ninguém)

A negacear, desejável,

Sempre um pouco mais além.

É eternidade no tempo

A aflorar nas vinhas que empo.

 

É fazer acontecer

O que nunca aconteceu

Que é norma de bem viver,

Não atar-me ao que morreu.

Quem na infalibilidade

Apostar, mata a verdade.

 

 

Raiz

 

Temos a raiz comum

E sortes bem diferentes.

Logo, em vez de sermos Um,

Somos muitos divergentes.

 

Do centro à periferia

Como aumenta a tropelia!

 

Sem negar a divergência,

Busquemos a convergência,

 

A ver mesmo se algum dia

Aumentamos a harmonia:

 

- De tantos mundos talvez

Um só faremos de vez.

 

 

Parêntesis

 

É o diálogo grande arte

De conviver entre humanos,

Não astúcia de quem parte

A impor-se à custa de enganos.

 

Entre parêntesis pôr-se

Para operar a colheita

De a quanto é que o outro orce

Em quanto a mim me aproveita.

 

É de vez abrir a porta

Para em meu lar acolher

Tudo o que a todos importa,

Toda a fome a amortecer.

 

 

Pese

 

Todos somos muito ateus,

Com Deus pese embora o encontro.

Nos outros vislumbro céus

Que dum não são nem são doutro.

Meu credo é nunca sem Deus

Como nunca sem o outro:

 

Um vector horizontal

A cruzar o vertical.

 

Este a puxar sempre aquele,

Céus fora por onde o impele.

 

Mas sou sempre um estrangeiro

Nestes céus de que me abeiro.

 

E como sou, sem querer,

Afinal tão traiçoeiro

Ao vector que me faz ser!

 

 

Imo

 

Não destrói a natureza

Deus no imo dela presente.

Corpo dele que Ele preza,

Jamais é dela absorvente,

Nela as leis dele não lesa,

Menos inda é dissolvente.

Mostra-se-nos na beleza,

Mistério que encanta a gente:

Fluída luz que aqui perpassa

E em nosso imo deixa a traça.

 

 

Ri-se

 

Israel quis prender Deus

Como a Igreja o quis prender.

Deus ri-se destes ateus,

Sempre o diabo a refazer,

Embora em nome dos Céus.

 

Age o Espírito onde quer

E tal como bem quiser.

 

Sem pedir licença, aliás,

A ninguém, ninguém por trás.

 

Quando uma religião

Cuida que o pode reter,

Eis a sacralização

Da violência a aparecer.

 

Sempre o Espírito traiu

Quem assim já procedeu.

 

E não há quem não conviva

Com mais outra recidiva.

 

 

Num

 

Não é só no matrimónio

Que dois num se erguem do pó.

Busca a vida um som de harmónio

Do real ao sonho a dar nó.

 

Isto em tudo é o requisito

De ir daqui ao Infinito.

 

A vida viver idóneo

É fazer de dois um só.

 

Assim é que um lar edita

O Infindo que ao fim concita.

 

Assim é que ele é um espelho:

Novo a germinar do velho.

 

Assim é que incarna a estrada:

O Todo a brotar do nada.

 

 

Centro

 

A religião tira o homem

Do meio do narcisismo:

Do centro do mundo o comem

As ânsias do Infindo abismo.

 

Salva o homem de afogar-se

Em só temporalidade,

Embora os membros lhe esgarce

Esticando-o à Infinidade.

 

Descobre como é vazia

Toda a minha vacuidade.

Fica o egoísmo sem via

E a dor sem realidade.

 

 

Elevar

 

O papel da religião,

Quando a seu germe fiel,

É elevar o homem do chão

Para além do que o impele,

É proporcionar-lhe o ganho

De ir além de seu tamanho.

 

É o germe de cada fito

Projectá-lo ao Infinito.

 

E, da romaria à testa,

Abrir o caminho à Festa.

 

Se o não fazem é uma pena:

É a vida, ao fim, tão pequena!

 

 

Pilar

 

O justo é o pilar do mundo:

Bem para além de equidade,

Paga o mal com a bondade.

Nisto semeia, fecundo,

Mundo além, a novidade,

Erradica o mundo imundo

Dos talhões por onde grade.

 

Depois de sua passagem

Fica do Outro Mundo a imagem.

 

Todos nos tornando irmãos,

Dá-nos Deus por suas mãos.

 

 

Quer

 

O justo quer a razão

E a ética que descobre:

A ninguém faças, então,

Se não queres que igual cobre,

Antes, em primeira mão,

Faz-lhe o melhor que em ti obre.

Só que isto não leva a amar

Nem, portanto, a executar.

 

Extasia-se do Belo

E do esplendor da verdade.

Só que só fruir deste elo

Não nos salva a humanidade

E do mal o camartelo

Como a morte nos invade.

Sobrevive arte ao autor,

Dela até o crime é senhor...

 

Só o amor concreto, activo,

À vítima do abandono,

Do sofrimento mais vivo,

Da crueldade sem sono,

Faz do justo o olho furtivo,

Sentinela contra o dono

Dos roteiros que nos urda

Na vida uma vida absurda.

 

 

 

Mística e religião

Só por união com Deus

Tornam-se é mesmo evasão:

Não buscam, fogem dos céus.

 

Se procuram a unidade

Unicamente interior,

Narcísicas de verdade

São, sem fogo nem calor.

 

Se aos demais são ligação

E ficam por esta via,

O que deveras serão

É apenas filantropia.

 

Se somente à natureza

Se unirem, inda que bem,

Transformaram-se na presa

Dum culto da terra-mãe.

 

- Para ao homem ser fiel,

O místico é todo o mel.

 

E nenhuma dimensão

Lhe escapa: é o Todo em fusão.

 

 

Provam-se

 

Mística e religião

Provam-se pelo exercício

Do direito a todo o pão,

Da justiça em benefício,

Misericórdia a que não

Acede qualquer resquício

Das margens da humanidade

Que algum dia ser gente há-de.

 

 

Fórmula

 

A fórmula redentora

Com alcance universal

É o coração que em nós mora,

No fundo de cada qual:

 

É de amor um apetite

Tão largo que abarca tudo,

A si, aos mais, num desquite

Tal que o mundo até lhe grudo.

 

Às vezes tão fundo mora

Que demora a vida inteira

A saltar cá para fora,

A cultivar cada jeira.

 

A faísca deste amor

É que eu amo em cada qual:

É só ver-lhe o resplendor

Na fundura, a dar sinal.

 

Mesmo no pior criminoso,

No regime mais violento,

No ódio mais tenebroso,

Há o morrão do fogo lento.

 

Isto é que é de amar em todos,

Para lá do crime atroz,

Soprá-lo de mil e um modos,

A chama a soltar após.

 

Isto é que permite amar,

Num amor de mil vertentes,

Mesmo até quem me matar,

Na dor a cerrar os dentes.

 

Amo-o naquela fundura

Onde ele acaso nem chega,

Mas que é dele a forma pura,

Fogo de Deus que carrega.

 

Amo-o no sonho Infinito

Que é meu fascínio, que é dele,

E por trás de qualquer grito

Nos une na mesma pele.

 

Amo-o no germe que for

Este Deus atrofiado

Que ele é já do infindo amor

De raiz atraiçoado.

 

Sempre o espírito está pronto,

Todavia a carne é fraca.

Mas só de marcar o ponto

Já o Mundo Novo enche a saca,

 

Que o Mundo Novo é um pedinte

Através das eras todas,

Daqui à era seguinte,

A apontar do Infindo as bodas.

 

 

Roubar-nos

 

Podem roubar-nos os bens,

A aparente liberdade...

O roubo maior que tens

Pelas tuas mãos te invade:

 

É a mentalidade errada.

Sentindo-te perseguido,

A vida inteira humilhada,

Ofendido e oprimido,

 

És ódio só, de repente.

E com a fanfarronice

Medo escondes que te mente,

Trancas-te onde ninguém visse.

 

Sentes-te triste, abatido,

Por mor do que te fizerem.

Será humano, tem sentido,

Não males com mal crescerem.

 

Não apagues tua luz

Nem a que noutrem se esconde:

O amor é que em nós traduz

O Infindo, ninguém sabe onde.

 

Terá de mais força ter

Que qualquer ódio que houver.

 

Doutrem vai mesmo às funduras,

Que aí sempre é amor que apuras.

 

Nisto é que amar o inimigo

Me põe do mal ao abrigo:

 

Odeio o mal em mim, nele,

Que amo o amor que nos impele.

 

É neste que somos nós,

Cada um e os dois após.

 

 

Paz

 

Uma paz só pode ser

Mais tarde a paz verdadeira,

Depois de em cada crescer

Como semente primeira.

 

Criar a paz dentro em mim,

Meu ódio banir aos mais,

Sejam quem forem, assim,

Raças, povos, fés que tais...

 

Vencer o ódio, mudá-lo

No inverso do que ele for:

Tentar em mim ser o abalo

Do incondicional amor.

 

 

Ajudar

 

Meu Deus, se tu não puderes

Ajudar o mundo louco,

Vou tentar, do que me deres,

Ajudar-te com meu pouco.

 

Se tu não podes soprar

Da cinza do amor a brasa,

Temos nós de te ajudar

A ajudar-nos, casa a casa.

 

Assim é que de ti, Deus,

Há um pouco em mim, de teus céus.

 

Talvez nisto a descoberto

Te ajude a pôr, no deserto

 

Dos corações que, em tormento,

Nem sequer sentem teu vento.

 

Impotente nos sinais

Com que me inundar dos céus,

Se Deus não me ajudar mais,

Hei-de eu ajudar a Deus.

 

 

Faca

 

Toda a faca tem dois gumes:

Se a der a um cirurgião,

Salva a vida até aos cumes

Mesmo da maior lesão;

 

Mas, se a der a um assassino,

Acaba por matar tanto

Quanto além salva ao destino

Quenquer que retira ao pranto.

 

Ora, tudo o que fazemos,

Criamos ou inventamos,

Instituímos e temos

Entre mãos, em quaisquer ramos,

 

Será sempre aquela faca,

Mesmo a do maior progresso:

Sempre o mal o bem ataca

Com armas de igual processo.

 

O nosso livre alvedrio

Tem isto de singular:

Com quanto entre mãos se viu

Bem ou mal escolhe a par.

 

E não é viável nunca

Algo criar que isto anule:

Quem no invés creu, de mal junca

O mundo, de norte a sul.

 

 

Vivenciar

 

A mais bela experiência

É vivenciar o mistério,

Profundeza em turbulência

De incontornável império.

 

Fonte da religião,

Das artes e da ciência,

Três rios em comum chão,

Em concorrente escorrência.

 

Quem nunca passou por lá,

Se inda não estiver morto,

Cego é que então estará

Com cada olho bem torto.

 

 

Inovação

 

A inovação descoberta

De nova tecnologia,

Científica teoria,

É apenas a porta aberta

Para quem as descobriu:

É que ele nunca previu

O final significado

A que tudo houver chegado.

 

Se a roda for só brinquedo,

A tudo o mais como acedo?...

 

Jamais ele descobriu

O porvir do gesto seu.

 

Abre uma fresta de nada,

De repente é uma enxurrada.

 

 

Avanço

 

Um avanço tecnológico

Será revolucionário?

Um novo conceito, é lógico,

É um efeito secundário...

 

Porém, na revolução,

Este pesa, outro, não.

 

É que, ao olhar-me ao espelho,

Sou novo aqui, no outro, velho:

 

Por mais que inovação traga,

Não me atinge nem me afaga.

 

 

Números

 

Os números não são coisas

Nem coisas números são,

Mas apontados nas loisas,

Parece que até serão:

Nos dois os comportamentos

Tendem a iguais, por momentos.

 

Assim é que ler o mundo

É no número entrar fundo.

 

Até descobrir depois

Que cada um não são dois:

 

De ambos a aproximação

É trilho infindo no chão,

 

Jamais há coincidência.

Até no ponto é evidência:

 

Já que dimensões não tem,

Nenhuma coisa é também.

 

Mas é coisa matemática:

Teoria longe da prática.

 

 

Inimigo

 

O inimigo natural

Da ideia preconcebida,

Do poder enquanto tal,

Autoridade erigida,

 

É a ciência, de maneira

Que a si própria se escaqueira.

 

É de ser tão provisória

Que tanto goza de glória.

 

É, no inseguro, o seguro

Mais firme que em vida apuro.

 

Na transitoriedade

É, fiel, minha fatuidade.

 

Mas, alpondras na corrente

Enquanto estão, salta a gente.

 

 

Consiga

 

Há quem consiga fazer

O que a todos é impossível,

Degraus a tentar qualquer

Busca do compreensível.

 

Cuidado, pois, é o conselho,

Com quem nunca vê mistério

Quando se olhar ao espelho,

Da dúvida além do império.

 

Ou é um parvo tirano

Ou então se crerá deus...

Nunca vê, por trás do pano,

Que se escapam traços seus.

 

Ora, ao não ser permanente,

Não posso ter a certeza

De quem sou, mutável ente,

Nem do que Deus em mim preza.

 

 

Revelar

 

Quem tem um filho capaz

De revelar o escondido,

Do medo anda sempre atrás

De que ele, descomedido,

Mostre aquilo que o poder

Preferiria esconder.

 

É que o poder sempre abusa

Duma iniquidade oclusa.

 

E o Cristo crucificado

Enche o mundo em todo o lado.

 

 

Esforços

 

Não há nenhuma heresia,

Que todos somos heréticos

Nestes esforços patéticos

De entender a luz do dia.

 

Resta das nossas sentenças

O direito de escolher,

Pela parte de quenquer,

Quais são suas próprias crenças.

 

Por isto é que o inefável

Se mantém sempre intocável.

 

Só quem não aceite o Além,

Condena julgando alguém.

 

 

Firmes

 

Pais, família, educadores...

Quanto mais indesejados

Só por serem bons mentores,

Tão mais firmes nos estrados.

 

Quando já não são precisos,

É que então são adorados...

Vão-se embora sem avisos,

Eternamente lembrados.

 

- Andamos sempre às avessas,

A vida a enterrar nas essas.

 

 

Manhã

 

Se de manhã deparar

Com amor e compaixão,

Cantarei o dia inteiro.

Ao invés, se eu esbarrar

Com o roubo dum ladrão,

No abismo caio rasteiro.

 

É de fora o que me incita

Para a dita ou a desdita.

 

Tenho margem de manobra

Mas muita baia me dobra.

 

 

Circunstâncias

 

As circunstâncias do início

Não determinam o fim.

Tenho sempre dentro em mim

De qualidade um resquício

 

Que me permite fazer,

Contra a probabilidade,

Para o sonho ser verdade

Tudo aquilo que eu quiser.

 

 

Jamais

 

Jamais é o mundo exterior

Que diz se o sonho é ou não,

Não é o dinheiro que for,

Nem da cultura o estadão.

 

São mesmo as capacidades

Que tiver dentro de si

E usá-las contra do hades

O diabo que houver ali.

 

O que for bem-sucedido

Isto fez do guião vivido.

 

 

Desejo

 

Se tens um desejo ardente

De ter ou de fazer algo,

Tens a força em ti presente

Com que os impossíveis galgo.

 

Grandeza não é nascer

Num berço de oiro qualquer.

 

É seguir o próprio sonho

E perceber o herói

Que em nós há, de que disponho

A ser o que nunca foi.

 

 

Trará

 

Quem nasce ou irá nascer

Trará consigo um talento

Único de vir a ser.

Muitos este chamamento

Viverão sem descobrir

Nem o viver, a seguir.

 

É o que estimula e atrai

Como nada mais na vida,

É o que de alegria vai

Encher o peito à medida.

 

É aquilo que a gente adora

E onde o melhor tempo mora.

 

 

Circunstância

 

A circunstância de vida

Cem por cento negativa,

Ao invés também convida

A que positiva a viva.

 

Há um pendor bom escondido

Numa conjuntura má.

A vida este oiro perdido

Quer que eu use desde já.

 

O bom ou mau da sequela

Pende do oiro que use nela.

 

 

Recusar

 

Recusar o chamamento

Do sonho, eis o terminal:

Finda o enriquecimento,

A realização pessoal,

Vida sem contentamento,

Sem alegria real.

 

E tudo o que nos invade

É sempre infelicidade.

 

 

Seguir

 

Seguir o meu chamamento

E perseguir o meu sonho

É meu fácil ir no vento.

Se, difícil, contraponho,

 

É o risco de infeliz ser,

É a vida sem alegria,

Sem paixão a florescer,

Sem sentido murcha via.

 

- Onde do sonho o recurso

Ignorei no meu percurso?

 

 

Cintila

 

A vida não é ficar

A televisão a ver,

Todo o dia a se queixar

Do que a vida deve ser.

 

É de encará-la de frente,

É de ao máximo vivê-la,

Descobrir em toda a gente

Onde cintila uma estrela.

 

 

Controlando

 

Que é para ti o dinheiro?

Se ele for um objectivo

Em ti vai mandar inteiro

Controlando quanto é vivo.

 

Dá o bem material prazer

Mas não é meta de vida,

Passa depressa o que der,

Buscamos outro em seguida.

 

Felicidade fugaz,

De durar não é capaz.

 

Se da vida fora a meta

Levávamo-lo connosco

Ao fim, na viagem secreta

Quando na campa me enrosco.

 

Não é, porém, quem eu sou

E, pese embora a alegria,

Não vai nunca aonde eu vou,

Não é meta, é fantasia.

 

 

Procurar

 

Procurar bens materiais

Por prazer de possuir

Liberdade tira mais

De a vida encher a seguir.

 

Se decido ir pelo sonho

Em lugar da segurança,

De riqueza ao fim disponho

E a vida é música e dança.

 

 

Maioria

 

A maioria não dá

O salto porque não sente

Uma dor que o fira já

Como dor suficiente.

 

Só reagem quando estão

Muito fartos, muito doentes,

Exaustos, rentes ao chão,

E um “não aguento!” entre dentes.

 

Então é que saltam fora

Da carruagem que os demora.

 

 

Ignora

 

Ignora as opiniões,

Convicções e conclusões

 

Que de ti próprio tu tens:

É o que impede teus aléns.

 

Tens em ti potencial

Que ninguém tem por igual.

 

Abre à possibilidade

O fardo que te persuade

 

A pensar limitador

Do que em ti teu melhor for.

 

Acorda de manhã cedo

Completo, novo e sem medo,

 

Do zero a gerar o incrível

Que em tua vida é possível.

 

 

Quero

 

Sei lá bem o que é que quero!

O que não quero é que sei.

Se o não quero, não farei

E em nem pensá-lo me esmero.

 

Trato então de evoluir.

Desta minha má viagem

Terei mas é de sair

Ou só dela tenho a imagem.

 

Quando sair, ficarei

Receptivo a um mundo novo

Que o presente tem por lei

Ir chocando desde o ovo.

 

 

Dia

 

Dia de ver-me feliz,

Momento em que o tempo voa,

Iluminada a raiz,

A inspirar minha canoa...

 

- Muito embora passageiro,

É a porta de que disponho

A mostrar, no véu ligeiro,

Qual é deveras meu sonho.

 

 

Ouve-te

 

Ouve-te a ti próprio no imo,

Entra em ti, fica ali quieto.

Vai para o bosque, no cimo,

Vai ver o mar, céu por tecto...

- Procura ir ao lugar

De ouvir-te a ti a chegar.

 

Algo em ti te irá dizer

Que o sonho dentro de ti

Sempre esteve a te ocorrer,

Mas ignoraste-o ali:

Para ir olhar o mundo

Enterraste-o muito fundo.

 

Teu fundo abre ao Universo,

Que ele a ti vem, no reverso.

 

 

Resolvo-o

 

De que é que o mundo precisa,

Que é que quer neste momento?

O problema que ele visa

Resolvo-o com meu intento?

 

Descobrir onde responde

Ao que eu adoro, eis a chave

Para a vitória sempre onde

Nada quero que me entrave.

 

É o cume a atingir ideal,

A atrair-me ali, cimeiro,

No roteiro emocional,

A envolver-me a mim inteiro.

 

 

Demore

 

Demore o que demorar,

A tempo de ter certeza

Do que quiser com clareza,

Depois vá-o realizar!

 

Se não souber o que quer,

Vai deixar que a vida dite

A condição e o palpite

Do que for de se fazer.

 

Quem vence nunca de fora

Admite o que é seu agora.

 

 

Conduz-te

 

Se estiveres concentrado

Em teu objectivo, a mente

Conduz-te para tal lado,

Alcançando-o gradualmente.

 

Quanto mais tempo estiver

O teu ideal em frente,

Mais vai ele acontecer,

Que atinge quanto fermente.

 

E há-de ser algo alcançar

Como outro em ti te tornar.

 

 

Jeira

 

Pode o sonho ser pequeno,

Que não tem nada de mal.

Ara a jeira do terreno

Onde só pia um pardal.

 

Mas importa o sonho grande

Que torna empolgante a vida,

Senão não há quem comande

A realidade erigida.

 

Porque há-de doutrem ser feita

A realidade empolgante?

Tenho é de ver se se ajeita

Ao meu pé sempre hesitante.

 

Que é que estou disposto a dar

Para receber em troca?

Se pouco der, vou tirar

Pouco para a minha boca.

 

 

Abre

 

O sonho, quando é pequeno,

Bloco dum quebra-cabeças,

 Abre ao maior, num aceno,

A encaixar-se-lhe entre as peças.

 

Quando um se realiza,

Logo outros arrasta atrás

E, quão maior fito visa,

Maior cortejo ele traz.

 

Todos vão interligados,

Colar de sonhos doirados.

 

 

Descontrai-te

 

É sentar-te num parque, num jardim,

Será descontrair-te, os pés no ar,

Beber calmo o café, sem frenesim,

Ou observar o mundo a respirar...

 

Por insignificante que pareça,

Farás o teu caminho já sem pressa.

 

E logo encontrarás o condutor

Fio de sonho e vida bem melhor.

 

 

Trabalho

 

Tal qual amigos, família,

O trabalho enreda a vida,

Do dia-a-dia mobília

Que a me enquadrar me convida.

 

Tem, pois, de ser agradável,

Algo com que me entusiasmo,

De que gosto, onde sou fiável,

Acaso, às vezes, com pasmo.

 

É dinheiro, segurança,

Mas é mais satisfação,

Que, quando o sonho ele alcança,

O que mais vale é a paixão.

 

 

Empolgado

 

Terei de me divertir

Com aquilo que farei,

Empolgado me sentir,

De Natal mágico rei.

 

Que, se eu sentir aversão,

A querer que tudo acabe,

Algo vai mudar então,

Mesmo se inda ninguém sabe.

 

Quem se diverte ao labor

Dele aproveita o melhor.

 

Aqui há mesmo futuro:

Nele entro e lá me inauguro.

 

 

Labor

 

A ti próprio sê fiel.

Se o labor felicidade

Te trouxer, então tu nele

És feliz quanto te agrade.

 

Fazer por ter de fazer

E jamais porque se adora

É vida falsa manter,

A ti mesmo impor demora.

 

Rumo bem-intencionado

Em vida que não acerta,

É escolher infeliz fado

Ao trancar a porta aberta.

 

 

Preciso

 

É preciso ter coragem

De fazer o que se adora,

Contra embora a maioria.

É uma tentação a imagem

De vir toda a gente agora

Querer o que eu quereria.

 

Sê verdadeiro contigo:

Ninguém tem obrigação

De agradar a mais ninguém.

Cada um tem por pascigo

O que agrada em próprio chão:

É feliz por si além.

 

Segue, pois, teu coração,

É tua vida especial,

Com uma capacidade,

Um talento sem irmão.

De usá-los tens: é o fanal

Que guia à tua verdade.

 

 

Alcançar

 

A mente do homem pode

Alcançar tudo o que fita

E, se dela o não sacode,

Tudo aquilo em que acredita.

 

Alinha a mente o Universo

Com seu fito, verso a verso.

 

E o homem vai percorrendo

Trilhos que até nem vai vendo.

 

 

Dúvida

 

Da dúvida no momento,

Avança o passo seguinte:

É mais fácil crer no intento

Dando a passada que a finte.

 

Um passo de cada vez

Não atordoa ninguém

Com a viagem que vês

À frente Infinito além.

 

Passo a passo sempre foi

Feita a viagem do herói.

 

 

Manhã

 

De manhã tua atitude

Positiva ou negativa

É que te trará virtude

Ou inferno em chaga viva.

 

Ou bloqueias tua sorte

Sendo infeliz e doente

Ou morte darás à morte

A rir optimista em frente.

 

Tudo pode começar

De como a vida encarar.

 

Tens em ti tua ruína

Ou ferramenta potente:

Que trarás à tua sina,

A festa ou fogo inclemente?

 

 

Pegadas

 

Tinha o sonho e a solidão,

Que nos passos de meu trilho

Pegadas doutrem no chão

Ninguém lhes vislumbra o brilho.

 

Mas tu trouxeste o teu sol

Mais os risos da alegria,

Mais teu jeito de arrebol

Fazer nascer cada dia.

 

Cruzámos nossos carreiros

E, desse dia em diante,

Mesmo os cumes mais cimeiros

Cantam festa lá adiante.

 

Tu és sol, eu sou luar:

Aqueces, enquanto eu ponho

Um pó mágico a voar

Do escaninho de meu sonho.

 

São caminhos paralelos,

Solidões em companhia,

Mas o amor é destes elos

Que sempre se fantasia.

 

 

Entrecruzam

 

Em todas as conjunturas

Positivo e negativo

Se entrecruzam nas costuras.

Na tua escolha, que apuras

Para mais e mais ser vivo?

 

Assenta no positivo,

Transforma as tristes figuras

De antanho que tens no arquivo,

Muda a roupa das tristuras

Que em teu corpo configuras,

Jamais à folia esquivo.

 

Dum feliz dia o feitiço

É tão simples como isso.

 

 

Fazenda

 

 

Há gente bem-educada

Que não é bem sucedida.

É de fazenda abastada,

Classe social elevada?

- Na atitude nega a vida.

 

Negatividade encaixo?

- Logo ela me deita abaixo.

 

 

Culpam

 

Todos culpam, se ressentem,

Lamuriam e se queixam.

Mas tais atitudes mentem,

À berma da estrada deixam.

 

As emoções negativas

São desesperos em cacho

E em lugar das horas vivas

Só nos puxam para baixo.

 

Quando só delas disponho,

Então perdi-me do sonho.

 

 

Aposta

 

Positivo aposta em tons

Que te alegram teu viver.

Nunca seremos tão bons

Como poderia ser.

 

Carregar no negativo

Só mata o que é positivo.

 

Portanto, vamos em frente

A cantar com toda a gente.

 

 

Arrisca

 

Arrisca, é muito importante,

Embora a desconhecer

O efeito, se estás confiante

De que efeito bom vai ter.

 

Quem o risco não correr

Não descobre quanto é forte

Nem jamais irá crescer,

A murchar na praça-forte.

 

 

Coração

 

Coração agradecido,

Que a gratidão é uma chave

Do sonho a ser atingido

E voa como uma ave

Pelo Infindo pressentido.

 

Gratidão pelo que tem,

Pelo que há-de vir a ter,

É um primeiro passo além

Para positivo ser.

Sentir que tudo vai bem

Com o mundo e seu reverso

Vai-nos permitir reter

Toda a bênção do Universo.

 

 

Manhã

 

De manhã, ao acordar,

Agradece por saudável

Ser e por poder andar,

Por poder ver, confiável,

E por poder respirar...

 

Todo o muro que haja em frente

Tomba-te aos pés, de repente.

 

Encontraste a solução:

- Caminha, caminha então!

 

 

Mantém

 

Se mantém a gratidão

Toda ao longo do percurso,

Mais fácil é tudo, então,

E o difícil tem recurso.

 

Sem gratidão, o Universo

Perde que anda a conspirar

Para lhe proporcionar

Quem é o perito mais terso

Para o sonho em realidade

Mudar na totalidade.

 

Viagem atribulada

Vai ter sem a sensação

Venturosa que na estrada

Tem quem vem com coração.

 

 

Ânimo

 

Quando tenho um dia mau,

Então penso, ao fim do dia,

Em tudo por que estou grato:

Na saúde que auferia,

Nos amigos que eu acato,

Na família em cuja nau

Cruzo furacões a vau...

 

De repente fico à solta

E o meu ânimo então volta.

 

 

Escuta

 

Se tens uma sensação

Relativamente a alguém

Ou a uma situação,

Escuta com atenção,

É o que então mais te convém.

 

É que o nosso inconsciente

Sabe mais que a nossa mente

 

E vai conjugar-se, amigo,

Em tudo sempre contigo.

 

 

Cordão

 

A intuição é umbilical

Cordão com o Universo:

Dali dá-me ele sinal

Do meu caminho mais terso.

 

Por mais provas em contrário

Que houver, sabe ele o caminho.

Tudo o mais é rumo vário

Perdido algures do ninho.