DÉCIMO
TERCEIRO CANTO
E VAI
SER DE IRONIA E COM FUROR
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inclusive.
Descubra
o poema correspondente como uma mensagem particular para o seu dia de hoje.
1390 - E vai ser de ironia e com furor
E vai ser de ironia e com furor
Que me despego
Do apego
Com que indevido atei amor.
E vai de ser de gozo a se compor
Que fugirei do pego
Que aos mais lego
Quando não medi de erros um ror.
Despego-me e, liberto,
Acerto
Na atitude o compasso comedido:
No sorriso
Reencontro leve o siso
Que no engano da vida houver perdido.
1391 - Tartaruga |
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Atenção à tartaruga: |
Só progride (e com demora) |
Se o pescoço desenruga |
E deita cá para fora. |
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1392 - Quimera |
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Houve mesmo alguma era |
Em que a música, um roupão, |
Passavam, sem ser quimera, |
Geração a geração?! |
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1393 - Remoto |
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Hoje em dia há muito quem |
Portas da oportunidade |
Espere que as abra alguém |
E só lhe dará no goto, |
Não com suor de verdade, |
- Mas por controlo remoto! |
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1394 - Certo |
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A verdade é que sabemos |
Sempre o que é certo a fazer. |
O difícil (de somenos…) |
É fazê-lo acontecer! |
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1395 - Loiça |
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“Limpar a loiça?!” - pergunta |
Uma filha à mãe que já |
Tem-na ali lavada junta. |
- “Mas limpa já ela está!” |
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1396 - Rico |
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Gostavas de ficar rico? |
Compra ao preço que ele quer |
A consciência de quenquer. |
Eis como me justifico: |
- Trata então de a revender |
Ao preço que ele diz ter! |
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1397 - Desprezível |
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Moralmente desprezível, |
Continuam a elegê-lo: |
Um político é elegível |
Por passar a mão no pêlo. |
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De pouco tudo o mais conta. |
Nem há tempo de aprender |
Se tem um dedo que aponta |
Para um futuro qualquer. |
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O mundo fica tranquilo, |
Precisa lá dum porvir! |
Basta dele ouvir aquilo |
Que todos querem ouvir. |
Dorme o mundo descansado |
Tal como quis: enganado! |
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1398 - Favores |
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Grande é o templo dos favores, |
Porém as portas não são: |
Dobras todo, se lá fores, |
Até rastejar no chão. |
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1399 - Preciosos |
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Quanto aos bens de teu amigo, |
Para ti tão preciosos |
Devem ser que não lobrigo |
Dar-te que os teus menos gozos. |
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1400 - Carne |
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Êxito, fortuna, prazer, felicidade… |
- A carne a que o cristão tem horror! |
Não pode fruí-la de verdade, |
Que a teme, |
A vergonha e o remorso estragam-lhe o sabor. |
O dinheiro e a alegria |
Trazem-lhe a dor estreme |
Do miserável da enfermaria, |
Da mãe condenada, |
Do infortúnio alheio… |
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Da solidariedade incarnada |
Cheio, |
O cristão são todos os humilhados, |
Oprimidos, |
Castigados. |
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Só neles encontra sentidos, |
Não para os libertar |
Mas, como a eleitos, |
Para que a eles os mais fiquem sujeitos |
- E o mundo inteiro ali venha a encurralar. |
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Um mundo de humilhados, oprimidos, castigados, |
Eis o céu, para tais iluminados! |
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1401 - Pulgas |
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É ridículo o passado |
Se apenas vinte anos julgas? |
- Se apanhas o cão do lado |
Vê mas é se ele tem pulgas! |
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1402 - Situação |
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Aquele que nunca está |
Na situação é que sabe |
O que deve obrar-se lá |
E de raiva em si não cabe |
De o não poder fazer já. |
Sem dúvida que o faria |
Se em si tal poder havia! |
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- Se o poder lhe cai na mão, |
Perde logo a ocasião! |
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1403 - Certeiro |
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Não há nada mais certeiro |
Na hora da aparição, |
Do que da hora o ponteiro |
Em que haja uma refeição. |
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E nada menos certeiro, |
Para a hora colmatar, |
Do que chegar a terreiro, |
Na hora, qualquer jantar! |
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Pode o sabor ser cuidado: |
- Será sempre criticado! |
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1404 - Monsenhor |
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O monsenhor, a engolir |
Tem grande capacidade: |
Rápido irá deglutir |
O campo, o mar, a cidade… |
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E há quem julgue com paixão |
Que irá comer a Nação. |
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Quanto ao café da manhã, |
Não vai chegar-lhe à garganta |
Senão com a ajuda chã |
De oito mãos que em torno implanta, |
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Para além do cozinheiro, |
Indispensável ao cheiro. |
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O chefe da criadagem, |
Relógios, dois utiliza |
De oiro, tal que dele a imagem |
Ao monsenhor enfatiza. |
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Um lacaio vai servir |
Para que uma cafeteira |
À presença possa vir |
Da sagrada frioleira. |
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O segundo é o de escumar |
O café que ele tomar. |
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O terceiro serviçal |
Incha presunçoso o papo |
Ofertando, divinal, |
O trapo do guardanapo. |
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O quarto, em sentido, em pé, |
Despeja então o café. |
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Nenhum pode dispensar, |
Para admiração dos céus, |
Monsenhor, neste lugar, |
De tais servos que são seus. |
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Pois se três foram apenas |
Arder-lhe-iam as melenas. |
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E se dois qualquer desgraça |
Lhe houvera de impor em sorte, |
Com tal monsenhor não passa: |
Causar-lhe-iam a morte! |
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1405 - Vermelho |
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O carro passa o vermelho |
E atropela alguém no verde. |
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“Pare, seu escaravelho!” |
- Grita alguém que o siso perde. - |
“Onde é que julga que está?! |
Não é um filme de polícias, |
Olhe o sinal acolá!” |
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Para evitar mais sevícias, |
Por ofensa à autoridade |
É logo denunciado |
O do protesto inflamado: |
|
- O transgressor de verdade |
Era um polícia encartado! |
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1406 - Lugar |
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É o paraíso um lugar |
Onde há polícias ingleses |
E cozinheiros franceses. |
E, para bem rematar, |
Cervejeiros alemães, |
Amantes italianos. |
Suíços estão nos bens |
A gerir quaisquer arcanos. |
|
No inferno, pelo contrário, |
Polícias são alemães |
E os ingleses, por fadário, |
Cozinham tal para cães. |
Os cervejeiros franceses |
Dão aos amantes suíços |
As beberagens soezes. |
A rematar os enguiços, |
Culminando os nossos danos, |
Mandam os italianos! |
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E eis como a mesma receita |
Ao inferno ou céu se ajeita. |
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1407 - Promoção |
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Matar, quando se é paisano, |
É delito de prisão. |
Se é soldado, não traz dano, |
Virtude é com promoção! |
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1408 - Portento |
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Para ser bem masculino, |
Sobre as dúvidas me sento, |
Sem falar nem ter mais tino: |
- Pareço logo um portento! |
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1409 - Telefonia |
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Falar bem, falar mais alto: |
- Quem ambas confundiria |
É tal se em mim rodar falto |
Botão de telefonia! |
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1410 - Cigarros |
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Roubem-me o que há de melhor, |
Cubram-me, cubram de escarros: |
- Nem por isso um professor |
Serei só para os cigarros! |
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1411 - Enfermeiros |
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O problema dos enfermeiros |
Não é o da enfermagem, não senhor: |
- É que, mesmo os mais verdadeiros, |
Todos vestem de senhor Doutor! |
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1412 - Viúva |
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A viúva tinha um noivo. |
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Aconchegado à criada, |
O menino é um pé de goivo |
Arrancado de assentada, |
Largado algures na estrada. |
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O pequeno, com ciúme, |
Crê que a mãe tudo resume |
A ser uma enamorada. |
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Desconhece que a criada, |
Ao fazer-lhe uma carícia |
Sonha então, toda enlevada, |
No namorado polícia. |
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1413 - Súplicas |
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Deixa-te de vez de súplicas: |
É que, se uns nascem famosos, |
Outros tornam-se famosos! |
Os mais |
De relações públicas |
Contratam profissionais! |
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1414 - Milagrosamente |
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Milagrosamente, cremos |
Que quanto nos acontece, |
Só mesmo a nós, espantemos, |
E que isso dos mais se esquece! |
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1415 - Relvados |
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Alguns homens maior tempo |
Com os relvados investem |
Do que investem no alimento |
Das amizades que atestem. |
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1416 - Castigado |
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Por quê das guerras o aborto? |
- Só na guerra nos é dado |
Matar os mais ou ser morto |
Sem ninguém ser castigado! |
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1417 - Crânio |
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O crânio que te alimenta |
Topete de genial |
Só caixa de ferramenta |
É de alguém ser racional. |
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1418 - Burro |
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Qualquer burro que carregue |
As relíquias dum martírio, |
Crê que é nele, num delírio, |
O incenso nelas empregue. |
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1419 - Esponja |
|
A Terra não nos pertence: |
Como uma esponja espremida |
Num concurso a ver quem vence |
Já quase é de vez perdida. |
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1420 - Ajudar |
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Deus, os homens, satanás |
Bem te querem ajudar! |
A quem não quer tanto faz: |
Nada o muda de lugar… |
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1421 - Nadinha |
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Que é que ele fará? Nadinha! |
E muito mais tempo ainda |
Nada fará, se adivinha |
Que tem pensão que não finda! |
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1422 - Partido |
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Que será que nos faz aqui roer |
Com tamanhas ausências de sentido? |
- Quando um partido conquista o poder, |
É já o poder que conquista o partido! |
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1423 - Pobre |
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Se ser pobre é assim tão bom, |
Seja pobre quem quiser, |
Que eu, ao fim deste tempão, |
Eu já me fartei de o ser! |
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1424 - Fedor |
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Pf! Tresanda a honestidade, |
Que fedor a inteligência, |
- E, no fim, a realidade, |
Esta indigência! |
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1425 - Estadulho |
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Os pretensos capazes não se metem ao barulho: |
Acometem |
De estadulho |
Os incapazes que nele se intrometem! |
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E depois |
Explicam à mesa do café, |
Integérrimos heróis, |
Como é que é! |
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1426 - Arquitecto |
|
Um bom arquitecto pode |
Melhorar a casa velha |
Revelando aonde sobe |
O preço que a nova engelha. |
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1427 - Passos |
|
Todos os pregadores |
Têm um passo retórico, |
Todos os estupores |
Têm um passo eufórico, |
|
- Todo o homem |
Tem os passos que o comem! |
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1428 - Pechisbeque |
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Sociedade é pechisbeque, |
Com vantagem de mudar |
De dono, sem dar lugar |
A escrúpulos de quem peque. |
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1429 - Infelicidade |
|
Que grande infelicidade |
A dum povo que é feliz! |
Nunca um chefe de verdade |
Nele apura seu matiz. |
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Seria povo a que um fado |
Afinal fora negado. |
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Não porque um chefe é que o faz: |
- Porque já não corre atrás… |
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1430 - Esmoler |
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A casta esmoler, |
Alívio dos precisados |
(Sob a condição de cada um se manter |
Com a virtude dos esmagados), |
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A casta esmoler, |
Que lautos recursos! |
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Atrás, o cortejo dos ursos, |
A provar a quem quiser, |
Do pandeiro com os discursos, |
A grandeza do ter… |
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A casta esmoler |
E o banco |
De trepar para se ver… |
|
- O mundo manco! |
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1431 - Sorte |
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Na miséria que se veja |
Há quem não veja qualquer |
Outra coisa que não seja |
Sorte em não lhe pertencer. |
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1432 - Degraus |
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Os pobres são os degraus |
Da escada que eleva os ricos, |
Por tão alheios calhaus, |
Ao céu que aguardam seus bicos. |
|
Os pobres são os degraus |
E, portanto, é de bom tom |
Que sempre sejam os maus, |
Senão como é o rico o bom? |
|
E assim, ao sabor da esmola, |
Se compra e se vende céu, |
Quando o fundo da sacola, |
Se tem um segredo seu, |
É que ao rico sempre imola |
O que ali vai sempre ao léu. |
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1433 - Fósforo |
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Se o mundo estudara a sério, |
O resultado seria |
Pegar fósforo ao império |
Das escolas de hoje em dia |
E o professor serviria |
De carqueja ao fogo etéreo. |
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Com a leira nivelada |
Não há mais analfabetos: |
Como ninguém sabe nada, |
Não há os do chão e os dos tectos, |
Os ignaros e os correctos, |
Todos vão na mesma estrada. |
|
Hoje uns são cavalgaduras, |
Com gente escanchada em cima. |
Se arreganham dentaduras, |
Tal jamais impede a rima |
Dos letrados que se anima |
Deles montando andaduras. |
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Ou toda a gente o direito |
De saber tudo de entrada |
Há-de ter e toma a peito, |
Ou então, duma penada, |
Já ninguém nada de nada |
Deve saber doutro jeito. |
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Mas, se ninguém souber nada, |
Aquele que isto souber |
Mais do que os mais sobrenada, |
Pois mais do que os mais fica a ver. |
E descubra lá quenquer |
Como sair da embrulhada. |
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Daqui resulta o seguinte: |
Quem salta ao lombo de alguém |
São os que, antes, do requinte |
Nem sonham o que contém. |
E quem o frui é o refém |
Que cavalgam por acinte. |
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1434 - Viagens |
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Viajo, viajo muito, |
Que hei-de muito viajar |
Para os réditos, no intuito |
De as viagens custear. |
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1435 - Surdo |
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O surdo levo ao concerto, |
Que tocam Berlioz lhe digo. |
Se não confiar, ao certo |
Que vai partilhar comigo? |
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1436 - Paciência |
|
Paciência: a capacidade |
Dum motor de funcionar |
Lentamente, quando o invade |
A fúria de rebentar |
Caixas de velocidade! |
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1437 - Recibo |
|
Há gente que cumprimento |
Que parece vender cibo: |
Não requer só pagamento, |
Parece aguardar recibo! |
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1438 - Desilusão |
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O optimismo é aquela forma |
De explicar, habitual, |
A nós próprios que é de norma |
A desilusão final. |
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1439 - Inveja |
|
Inveja: a incapacidade |
De ver que há mais junto a mim, |
Por reparar de verdade |
Só no que me escapa ao fim. |
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1440 - Enganado |
|
O fraco se enche de orgulho, |
Vai imitar a dureza. |
O duro esconde no entulho |
A ferida que não preza. |
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Os mais não conseguem ver |
Senão o que à flor houver. |
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Eis como, por todo o lado, |
Ao fim tudo anda enganado. |
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1441 - Plástico |
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Se as flores que me rodeiam |
São de fibra atada a elástico, |
Os pensamentos que ameiam |
Em mim irão ser de plástico. |
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1442 - Manuais |
|
Manuais são condensado |
Das ideias penetrantes, |
No esquema simplificado |
Que as embota e põe de lado |
Os dentes que houveram antes. |
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1443 - Engodo |
|
Que engodo |
Leva o homem tanto tempo a perder |
Tentando-se matar, |
Quando de nenhum modo |
Quer morrer, |
Se calhar? |
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1444 - Caça |
|
Às vezes a caça humana |
Achega-se ao caçador: |
Ao animal não se engana |
Como se engana um senhor! |
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1445 - Gritante |
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Guerra que houver doravante |
Mata tanto quanto morre: |
É o progresso mais gritante |
Que de sempre nos ocorre! |
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1446 - Importantes |
|
Fraqueza dos importantes |
É de entregar-se ao primeiro |
Ignorando-o, após instantes. |
É que nem houve parceiro! |
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1447 - Travesso |
|
Mora um sorriso travesso |
Na discrição singular: |
De que serve ter sucesso |
Se a ninguém o vai contar? |
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1448 - Segredo |
|
Próprio dos intelectuais |
É elaborar em segredo |
O valor que alçam demais. |
Em público e muito a medo |
Só exibem um monumento: |
Um busto no interior oco |
Por onde vagueia o vento |
Mal se lhe escama o reboco! |
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1449 - Adeptos |
|
Todos os adeptos são |
Pessoas da mesma raça: |
Jamais o caçador, não, |
Dele antes peça de caça! |
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1450 - Cabeça |
|
A nossa gente só sabe |
Conhecer um rosto humano, |
Na cabeça não lhe cabe |
detestar, que é nela engano, |
|
Deveras qualquer ideia, |
Nem irá morrer por ela. |
Só tem a cabeça cheia |
De caras, a feia, a bela, |
|
A que adora ou repudia. |
Por elas um dia mata |
E por elas morreria: |
É o que acata e desacata. |
|
Uma ideia? Que fastio: |
O corpo dela é vazio! |
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1451 - Moedeiros |
|
Jornalistas, |
Moedeiros falsos, |
Os únicos que nas listas |
De percalços |
Acreditam que as suas moedas |
Ficam inteiras, |
Não sofrem quedas |
- E ainda por cima são as únicas verdadeiras! |
|
|
1452 - Polícia |
|
O polícia nasceu pobre |
E é do pobre um inimigo, |
Como o cão de guarda sobre |
O cão vadio: é o perigo! |
|
É o perigo dum vizinho |
A estragar-lhe um arranjinho. |
|
|
1453 - Espécies |
|
Há quatro espécies de amigos: |
Os que aparecem se há comes; |
Os que de nossos abrigos |
Não saem por outras fomes, |
|
As do favor que nos pedem; |
Os que de nós se aproximam |
Quando as fortunas excedem |
Os montantes que os encimam; |
|
E, por fim, os que não faltam |
Nas horas boas e más. |
Os caça-fortunas saltam |
Se o lucro não for assaz: |
|
Logo ao levantar da mesa |
Se abalam os comedores; |
Só enquanto um favor se preza, |
Uns tantos mentem favores. |
|
Ficarão, por derradeiro, |
Os que sempre permanecem. |
- Ser amigo verdadeiro, |
Só destes que nunca esquecem. |
|
|
1454 - Médicos |
|
Os médicos ficam em geral |
Mais descontentes, |
Irritados com os doentes, |
Quando estes lhes infirmam um diagnóstico fatal. |
|
O prazer intelectual |
De confirmar os precedentes |
Torna-os dementes |
Pela sequela final. |
|
Poucos ficarão felizes |
Por que deles os deslizes |
Redundarão |
Na salvação, |
Trazendo a bom porto |
O doente que já viam morto! |
|
|
1455 - Fome |
|
- Deste meu pão come! |
- Quanto o quero eu! |
- Comamos do teu! |
- Já não tenho fome… |
|
|
1456 - Generais |
|
Fazem questão os generais |
Que soldados |
Sacrificam mais |
Em que sejam bem alimentados. |
|
Crerão que a glória |
Tem barriga na memória? |
|
|
1457 - Fé |
|
Há quem profissões de fé |
Faça antimilitarista |
Porque apto ao serviço hoje é. |
Quando se julgara isento, |
Pé chato ou falta de vista, |
De patriota era um portento |
A inscrever os mais na lista! |
|
|
1458 - Público |
|
O que no público espanta |
É pensar pelos jornais |
Em si convicto que implanta, |
Não neles, opiniões tais. |
|
|
1459 - Conselho |
|
Quando alguém pede um conselho |
Quer confirmar, na jornada, |
Em vez da trilha ou do quelho, |
A posição já tomada. |
|
|
1460 - Cadeias |
|
É a democracia aquele |
Regime destes escravos |
Das cadeias de papel |
Que à cruz prendem como os cravos. |
|
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1461 - Doirada |
|
A compra fica embrulhada, |
Quando o vendedor tem siso, |
Em bela folha doirada: |
- Embrulhada num sorriso! |
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1462 - Sábio |
|
- Sabes muito de mulheres? |
- Quão mais velho, menos sei! |
- A tornar-te, sem quereres, |
Estás num sábio de lei. |
|
|
1463 - Castrar |
|
Mulheres há que castrar |
Pretendem um homem que amam, |
Para depois o amimar |
Como às crias que desmamam. |
|
1464 - Nações |
|
Têm as nações pequenas |
Os deuses mais poderosos, |
As maiores são apenas |
De homens-formigas repousos. |
|
Portanto, em nenhuma delas |
Ninguém atinge as estrelas. |
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1465 - Rapazelho |
|
Este mundo rapazelho |
Quer o carro de brincar, |
Junta pregos, tábua, espelho… |
- Nunca os monta no lugar! |
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1466 - Mulher |
|
O diabo sabe muito, |
Não por muito cirandar, |
Mas por jogar noutro intuito, |
Por ser mulher, se calhar. |
|
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1467 - Tolo |
|
Tolo é querer o que não |
Podemos e que sabemos |
Que jamais temos à mão |
- E assim mesmo continuemos! |
|
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