DÉCIMO  QUARTO  CANTO

 

 

 

QUE  O  IREI  MODELANDO  AO  BOM  HUMOR

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Escolha um número aleatoriamente entre 1468 e 1546 inclusive.

 

Descubra o poema correspondente como uma mensagem particular para o seu dia de hoje.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

                                                1468 - Que o irei modelando ao bom humor

 

                                                Que o irei modelando ao bom humor,

                                                Que irei modelando destino,

                                                É certo, quando o hino

                                                Do riso solto livre a cada alvor.

 

                                                É quando me inclino

                                                Para a festa que a vida faz supor

                                                Que da procissão dos dias cada andor

                                                Me abençoa com um cântico divino.

 

                                                Rir a vida

                                                É que convida

                                                A mais viver,

 

                                                Nesta medida

                                                É que a lida

                                                Nos faz ser.

 

 

1469 - Estimação

 

O gato de estimação

Ficou livre no quintal

Enquanto o dono foi à manifestação

Pelos direitos de todo e qualquer animal.

 

Ficou escandalizado,

Ao regressar,

Por o gato ter filado

Um rato no patamar.

 

Tirou-lho, meteu-o numa caixa

E correu para o abrigo dos animais.

Pelo caminho, enquanto a vítima enfaixa,

Atropela um esquilo e mais

Uns tantos bichos que tais…

 

Chegado ao destino, a empregada

Verifica a caixa dos estragos:

- Pelos bichos ninguém já pode fazer nada,

Mas ainda bem, traga-os,

Que são carne cuja

Oferta

Não terá perca:

Já podemos agora alimentar a coruja!

 

 

1470 - Camelo

 

Pergunta o camelo ao pai:

- Por que é que teremos bossas?

- Porque a comida ali vai

Preparada para as nossas

Carências pelo deserto.

- Para quê longas pestanas?

- Para que a areia que há perto,

Nos olhos, como as praganas,

Nos não entre.

- E as nossas unhas,

Unidas por almofadas?

- Para na areia onde as punhas

Não sumirem afundadas.

 

- Não há dúvida sequer?!

Sendo então tudo tão lógico,

Que é que estamos a fazer

Neste Jardim Zoológico?!

 

 

1471 - Telefone

 

Ela atende o telefone.

Ouve uma voz masculina

arrependida e insone:

- Perdoa-me, é minha sina!

Querida, pensei no assunto.

O Rolls-Royce é o meu presente

Que ao mais, ao casar, te junto.

E desde já fica assente:

Mudamo-nos para a Costa,

Pode a tua mãe viver

Connosco, já que ela gosta.

E, agora que a tal me obrigo,

Já me poderás dizer:

Assim casarás comigo?

- É claro que irei casar!

Mas quem é que está a falar?!

 

 

1472 - Contar

 

- Não sei o que hei-de fazer!

Eu amo-o como ele a mim,

Iguais filmes vamos ver,

Livros, gostamos de ler,

E a TV também é assim…

Quando não estamos juntos

Ficamos mesmo infelizes,

Morrem de todo os assuntos,

Perdemos mesmo as raízes…

 

- Santo Deus! Então vocês

Um para o outro já feitos

Decerto o foram de vez!

Qual é o problema?

- É que jeitos

Hei-de tomar no sentido

De o contar ao meu marido!

 

 

1473 - Aveia

 

Toca à porta a campainha.

Entrega, do andar de baixo,

De aveia um saco a vizinha:

- É para os cavalos que acho

Que andam, a todo o momento,

Com ferraduras no chão,

A escoicear no apartamento

Onde os daqui viverão…

 

 

1474 - Vestido

 

- A loja assaltou três vezes?!

- Mas só roubei um vestido!

- Ah! Então sofreu reveses?

- Fez-me a mulher o alarido

Que era já bem de supor:

Duas vezes devolvido,

Que ela não gostou da cor!…

 

 

1475 - Maioria

 

Se é tudo por maioria,

Bife é toda a refeição

E as calças de fantasia

São da ganga a esfregação.

E os livros da livraria

Das celebridades são

As dietas que haveria

Ou ginásticas que dão.

 

E depois, como a mulher

É a maioria do povo,

Os casamentos que houver

 

Têm o insólito renovo:

- O mundo inteiro casado

Com o galã de mais brado!

 

 

1476 - Liso

 

Um tampo liso no lar

É o convite para alguém

Logo em cima colocar

Algo que jamais convém.

 

O cônjuge que ressona

Mais alto será o primeiro

A adormecer e se adona

Do descanso do parceiro.

 

Se mondas ervas daninhas

das valiosas, à toa

As distingues, adivinhas:

- A que sai fácil é boa!

 

Quão mais for pesado o saco

E mais distante o carrego,

Mais comichão, quando o ataco,

No nariz com que o entrego.

 

A mais rápida maneira

De encontrar algo perdido:

Novo compra e logo à beira

Vês o que te andou fugido.

 

A lei dos pais é a razão

Ter, deles para conforto,

Mais que a reconhecerão

Se cada qual já for morto.

 

Um corpo em descanso tem,

Mais que parado no chão,

A tendência de, refém,

Pôr-se a ver televisão!

 

 

 

 

1477 - Nostalgia

 

Desabafa a nostalgia

Da mulher vendo o homem fora:

“É difícil ver agora

Que foi este homem que um dia

O maior galã que havia

Me fez esquecer outrora.”

 

 

1478 - Gasolina

 

O preço da gasolina

Quando sobe, o pessimista

Queixa-se que disto é sina

Vedar-lhe o que tenha em vista.

 

Um optimista, porém,

Que os três contos põe agora

Vê diminuir-lhe também

O tempo que a encher demora!

 

 

1479 - Tudo

 

Um cirurgião faz tudo,

Porém nunca sabe nada.

Sabe o médico, contudo,

E nada faz na parada.

 

O psiquiatra nunca sabe

Nem faz nada vez alguma.

Ao patologista cabe

Resolver a teia, em suma:

Sabe de tudo os sinais…

…Só que é já tarde demais!

 

 

1480 - Pianistas

 

Ter filhos não nos transforma

Em pais, por constar das listas:

Ter um piano, por norma,

Não nos torna em pianistas!

 

 

1481 - Lampeiro

 

Quando vem o mundo inteiro

Bater-nos lampeiro à porta?

- Quando a soneca, ligeiro,

Meu sábado à tarde corta.

 

 

1482 - Adolescente

 

Por que é que um adolescente

Quer o beliche de cima?

- A vista aérea consente

De tanta roupa que arrima!

 

 

1483 - Porcos

 

Ao mostrar aos visitantes

De meus porcos o chiqueiro,

Conto os gostos aberrantes

De alguns, pelo dia inteiro

Pedra a abocanhar constantes

Com insólito berreiro.

 

E, logo nesse momento,

Um leitão de nós bem perto

Confirma o bom fundamento

Deste estranho desconcerto:

O barulho corriqueiro

Leva-me a agarrar-lhe a pata,

Virá-lo pelo traseiro.

 

- Logo da boca desata

A deitar moedas de prata:

Era um porco-mealheiro!

 

 

1484 - Espirro

 

Um espirro de Deus é a poesia.

Se o não agarras logo

Na folha de papel que o enuncia,

No ar se lhe dilui inteiro o fogo.

E, para tua consternação,

Nem sequer te fica uma constipação.

 

 

1485 - Coquetaria

 

Com toda a coquetaria,

De olhos de homem a mulher

Se vê já na fantasia:

Bela então pretende ser

Dela na beleza móvel,

Para que ele lha aprecie

Com o fogo com que guie

Seu derradeiro automóvel!

 

 

 

 

1486 - Gato

 

Mais vale um gesto de amor

Que uma vida de latim:

Ei-las a contar-me a dor

De seu gato que houve fim…

 

Sofreram uma vigília,

Conta-me a lágrima rasa:

- O gato era da família,

Gente mesmo lá de casa!

 

 

1487 - Grácil

 

Os homens por objectivos

Se orientam, não é fácil

Mudar direcção e arquivos…

- Excepto quando ela é grácil!

 

 

1488 - Excesso

 

Quem tem excesso de peso

Não toma pequeno almoço?

Mas os magros que conheço

Tomam-no e até por grosso!

 

 

1489 - Aparência

 

Dou importância à aparência,

Embora me haja cruzado

Com idiotas à evidência

Bem vestidos no gramado!

 

 

1490 - Estúpidas

 

Algumas ideias são

Tão estúpidas que apenas

Intelectuais de serão

As coroam de verbenas.

 

 

1491 - Atraente

 

- Fácil vendem-te um pacote,

Se atraente, mas sem nada!…

- Qual julgas que foi teu dote,

Com que me casei de entrada?

 

 

 

1492 - Lágrimas

 

Ante um homem renitente,

As lágrimas da mulher

São a prova convincente

Da força hidráulica a ter.

 

 

1493 - Múmia

 

A memória da paisagem

Nem só um registo a preserva:

A múmia é uma personagem

Muito importante em conserva!

 

 

1494 - Queijo

 

A vida busca reforço

Em todo o modo de ser:

O queijo é um último esforço

Do leite a sobreviver.

 

 

1495 - Ribeiro

 

O ribeiro será o rio

Que se escapou do tormento:

De água tornam-no tal fio

Curas de emagrecimento!

 

 

1496 - Mania

 

Quem não crê que tem mania

É que duas então tem:

A que não crê que teria

Mais a de o não crer também!

 

 

1497 - Críticos

 

Se a política aos políticos

O trabalho abandonar

Em breve ficarão críticos

Da Pátria as sendas e o lar.

 

 

1498 - Bravatas

 

Não é por desacato,

São bravatas

Que me levam a provar no gato

Três, quando sei que há quatro patas!

 

 

1499 - Jogo

 

O amigável jogo

Tende a estes traços:

Começa aos abraços,

Finda aos murros logo!

 

 

1500 - Bigamia

 

Punição de bigamia

Não são chicotes nem puas,

É um golpe de fantasia:

- São duas sogras, são duas!

 

 

1501 - Tamanho

 

Nada a criatividade

Tem de místico ou de estranho,

É uma extensão, na verdade:

É o que sei… com mais tamanho!

 

 

1502 - Política

 

Fica ali o dia todo,

Fala, fala e não diz nada,

Promete tudo a bom modo…

- É política, de entrada!

 

 

1503 - Casadoira

 

Tenho filha casadoira

Com uns olhos de gazela,

Uns lábios de lenda moira,

Cada orelha, um mar à vela,

Uma voz de rouxinol,

Pescoço de flébil cana…

Da noiva perfeita o rol!

 

- Será?! Nem parece humana…

 

 

1504 - Sentimento

 

É o amor um sentimento

Que tende a subir, subir:

O do menino é alimento

No estômago a digerir;

Reside no coração

O do jovem que é fervente;

O dum homem fica à mão

Na cabeça, em sua mente.

 

E quando trepa demais

É na auréola exterior

Da carteira que encontrais

O melhor de seu fulgor!

 

 

1505 - Três

 

Na prática,

Três tipos de professores cabem

Na matemática:

Os que sabem contar e os que não sabem.

 

…O mais é só questão de gramática…

 

 

1506 - Sociedade

 

Da sociedade os encantos

São dizer bem dos que ficam,

Maldizer quem parte e os prantos

Encobrir de olhos que picam!

 

 

1507 - Quintal

 

Temos sol e frustração que baste

Para que aquela Europa

Que nos topa

Em nosso quintal paste!

 

 

1508 - Recuse

 

Não recuse tão de frente,

Faça o trabalho mal feito:

Não lhe tornam, certamente,

A pedir que o tome a peito.

 

 

1509 - Pirata

 

Fica um homem furioso

Se desonesto o pai dizem

E, ao invés, muito vaidoso

Se um avô pirata frisem!

 

 

1510 - Recluso

 

O recluso que sabia

Que uma carta da prisão

À censura sempre iria,

À esposa então respondia

Sobre a boa ocasião

 

De plantar em seu quintal

As batatas mai-las couves:

“Quer seja a bem, quer a mal,

Jamais escaves, bem ouves?,

Essa horta que removes,

- Que esconde o meu arsenal!”

 

Dias depois, a mulher

Escrevia novamente:

“A polícia, estás a ver,

Veio-me cá revolver,

Palmo a palmo, a terra assente

Da horta que quero ter!”

 

E, na volta do correio,

Eis a resposta matreira:

“É agora, segundo creio,

Que nos cavaram a leira,

A ocasião mais certeira

De plantar o campo cheio!”

 

 

1511 - Emigração

 

Um homem de bem morreu

E foi logo para o céu.

 

Corrida uma eternidade,

Farto de monotonia,

Eis que um apetite o invade

Ao inferno de ir um dia.

 

S. Pedro logo o deixou

Da noite tomar o voo.

 

- Olá, diabo, vir cá

Passar uma noite eu quis…

- Fizeste bem, pois vê lá

Que mulher-brasa te fiz!

 

E entregar-lhe a Miss Mundo

Com o riso mais jucundo.

 

No dia seguinte, o homem

Retorna ao céu mui contente

Sonhando que as noites tomem

Doravante a cor presente.

 

Nova eternidade após,

Sentindo-se muito a sós,

De vez resolve mudar

Afinal para o inferno,

Que ali é que tem lugar

O prazer, o gozo eterno.

 

Manda-o entrar o diabo,

tranca a porta com o rabo.

 

Recebe-o logo uma velha

De cabelos desgrenhados.

Corre dela, engelha a engelha,

Fedor por todos os lados.

 

- Diabo, que é da mulher

Que antes veio-me acolher?

 

- Sabes, amigo, turismo

É turismo: uma ilusão

Transitória é como o crismo.

Outra coisa é emigração!…

 

 

1512 - Rato

 

Um rato bem escondido

Da parede num buraco

Tem medo de ser comido,

Que lá fora o espera o gato.

 

Um pouco após, ronronar

Já não ouve e mais distante

É um galo a cacarejar

Que distingue: segue avante.

 

Porém, o gato lá estava,

Deita-lhe a garra, o devora:

- Sê bilingue, meditava,

Que a vantagem não demora!

 

 

1513 - Magra

 

Apontem-me uma mulher

Que apenas pela saúde

Ser magra, magra quiser,

 

Que um homem, pela virtude

Da legenda tipográfica,

Aponto a quem queira ver

Numa fita pornográfica!

 

 

 

 

1514 - Maneira

 

Hoje um pai pergunta ao filho

Como as aulas decorreram.

“Bem” - responde ele sem brilho.

“Que é que entretanto fizeram?”

“Nada.” “E trabalhos de casa?”

“Não sei…”  - pronto, apaga a brasa.

 

É com “bem”, “nada”, “não sei”

Que enche conversa de lei.

 

No futuro, eis a maneira:

“Senhor Presidente, como

Decorreu esta cimeira?”

“Bem” - é a resposta de tomo!

“Que foi debatido?” “Nada.”

“Quer dizer, logo de entrada,

 

Que o Mundo fica a beirar

O desastre nuclear?”

 

Então, tal como é de lei,

Ei-lo a responder: “não sei!”

 

 

1515 - Ninguém

 

Se teu filho a tarde inteira

Ao telefone se atém,

Pergunta: “quem é?! Que asneira!”,

Que ele responde: “ninguém!”

 

 

 

1516 - Coitadinho

 

Preguiça,

Falta de coragem,

Não é uma neurose que as enguiça,

É a clivagem

De quem resolve não agir,

À espera do vinho

Que surgir

De quem lhe diga: “coitadinho!”

 

 

1517 - Absurdo

 

Um absurdo pode ser

Tudo o que me fizer mossa.

Eis um absurdo: qualquer

Opinião contrária à nossa!

 

 

1518 - Tatuagem

 

A tatuagem permanente

Comprova de forma vária

Quanto andou ali presente

A loucura temporária.

 

 

1519 - Futebóis

 

Definir os futebóis

É identificar um vício:

Em campo estão vinte e dois

Que requerem descansar;

Quem precisa de exercício

São quarenta mil, a par

Na bancada a esbracejar,

Como se fora um comício!

 

 

1520 - Meia-idade

 

Estamos na meia-idade:

Os filhos a protestar

Que vamos mui devagar

E nossos pais, na verdade,

A ver que o carro começa

A correr muito depressa!

 

 

1521 - Sesta

 

Consciência do que precisa não tem:

De apanhar sol, de engordar, da sesta que repoisa…

 

Sabe, porém,

Muito bem

Que precisa de qualquer coisa!

 

 

1522 - Esmalte

 

Há quem pareça de esmalte

E por baixo é de oiro puro.

E quem, porque oiro lhe falte,

Se doire, pelo seguro…

 

 

1523 - Suja

 

Só amigos que a sério o são,

Se a amizade sobrepuja,

Te chamarão a atenção

Quando tens a cara suja.

 

 

1524 - Solteirona

 

Quando qualquer solteirona

Põe anúncio num jornal

A pretender casamento,

Pior que a crerem marafona

Ou que nem vale um postal,

É quando, a qualquer momento,

Lhe respondem ao pedido:

“Pode levar meu marido!”

 

 

1525 - Garotas

 

As garotas pintam lábios,

Cabelos, olhos e unhas

Das mãos e dos pés… Juram sábios,

Secretamente, no beco,

Que, além do que tu supunhas,

“Até pintam o caneco!”

 

 

1526 - Autêntica

 

Uma autêntica política

Políticos não a operam.

- Todos sabem, nem é crítica…

Menos eles: sempre o que eram!

 

 

1527 - Ridículo

 

Que ridículo costume

Sentar-nos à mesa, tortos,

A mastigar o chorume,

Em comum, de animais mortos!

 

 

1528 - Errado

 

O melhor de estar errado,

De me ver tão incapaz,

É a satisfação que, ao lado,

Aos demais aquilo traz.

 

 

1529 - Velho

 

Velho é quem chegar a casa

Pelas três da madrugada

E vir que se não atrasa,

Pois é o primeiro à chegada!

 

 

1530 - Viagem

 

Diz o marido à mulher,

Ao despedir-se em viagem:

“Como as notícias que houver

Te direi, com que mensagem?

 

Por telefone, em premência,

Por uma carta diária…?”

Diz ela: “de preferência

Por transferência bancária!”

 

 

1531 - Clientes

 

Pergunta o juiz ao réu:

“Quantas vezes já foi preso?”

“Nove, nove. Aconteceu…”

“Pena máxima, por vezo!”

 

“Mas então, como no mais,

Quem tanto cá marca o ponto,

Os clientes habituais,

Não têm nenhum desconto?!”

 

 

1532 - Galeria

 

Mãe e filha apreciavam

Na galeria a pintura

Dum amigo de que amavam

A paleta fina e pura.

 

A mãe pára de repente

Num quadro de mulher nua

Cuja cara, era evidente,

Ali pinta a filha sua.

 

“Não acredito que tenhas

Posado nua! Que história…?”

“Não! Peço que te contenhas:

Ele pintou de memória!”

 

 

1533 - Bofetada

 

Por que é que à nascença dão

Aos bebés a bofetada?

Os mais velhinhos dirão:

- A habituá-los de entrada…

 

 

 

 

1534 - Etapas

 

Três etapas tem a vida:

terás de dormir a sesta,

Mas não queres; em seguida,

Queres dormi-la, mas esta

 

Requer tempo que não tens;

Por fim, tens tempo e até queres,

Só não consta de teus bens

Lograr dormir. E conferes

 

Alegremente na vida

Quanto ela é causa perdida!

 

 

1535 - Ventríloquo

 

De ventríloquo o boneco

Quer um cliente turista:

“Tem minha língua o tareco”

- Pergunta - “dele na lista?”

 

 

1536 - Postiços

 

“<<Você tem dentes postiços?”

- A enfermeira perguntou.

“Quem me dera! Têm enguiços.

Um casamento os levou.”

 

“Casamento?!”  “Pois então!

Emprestei-os a uma amiga

E desde o fim da função

Nunca mais dela os desliga!”

 

 

1537 - Nadar

 

- Posso, mãe, ir já nadar?

- Não! Não sabes ter medida…

- Mas o pai anda no mar…

- Pois! Tem seguro de vida!…

 

 

1538 - Roda

 

A roda foi o maior

Invento do homem, garante

Do que ele tem de melhor

…Até sentar-se ao volante!

 

 

 

1539 - Espantoso

 

“É espantoso como você

Continua sempre jovem!”

Com isto o que me diz é

Que estou velho, mas que o movem

As melhores intenções.

 

Não há bela sem senões!

 

 

1540 - Coxeia

 

Aquele que já coxeia

Ou é do atraso na cura,

Ou então, de vida cheia,

Tem já um pé na sepultura.

 

 

1541 - Bocejar

 

Não estava a bocejar

Todo o tempo em que estiveste

Imparável a falar.

Era apenas a tentar,

Entre tanto vento agreste,

Não a cama que repoisa,

- Só dizer alguma coisa!

 

 

1542 - Casados

 

Eu só contrato casados:

É que não me metem medo

De estarem muito apressados

Em ir para casa cedo!

 

 

1543 - Pastilha

 

Escolhe o filho mais novo

Esta ceia perifrástica:

“Não há carne, peixe ou ovo.

Comemos pastilha elástica!”

 

 

1544 - Chá

 

Chá beber apagaria

Das gentes o mal que as tome:

Beber chá dia após dia

Matará o médico à fome!

 

 

 

1545 - Automóvel

 

- Este automóvel é teu?

- Sim e não, conforme deu.

 

- Por que respondes assim?

- se ir às compras for o fim,

 

Ele é de minha mulher.

Se a discoteca quiser,

 

Então é de minha filha.

Mas se o futebol perfilha,

 

É de meu filho que ele é.

 

Para meter gasolina,

Então é que me dou fé

De que ele a ser meu se inclina…

 

 

1546 - Manicómio

 

A terra dos homens deve

Ser manicómio de Deus

Onde em privado se atreve

A amar os internos seus!