QUINTO VERSO
EU VEREI LÚCIDO O QUE HOUVER NUM
OVO
Escolha aleatoriamente um número
entre 469 e 572 inclusive.
Descubra o poema correspondente
como uma mensagem particular para o seu dia de hoje.
469
472
Eu
verei
Esmolar
Eu verei lúcido o
que
houver
Esmolar doutrem os bens
Num
ovo:
Não mostra sabedoria,
Irei comê-lo à
colher,
Que é vulgar vermos reféns
- Alimentar-me-ei
de
povo!
Os pobres cuja iguaria
Famosas e triunfais
470
Capelas e monumentos
Bom
Cimenta em nome dos tais
Que usam como emolumentos
Ser bom pai e bom
amigo
É a mais difícil
aposta,
Daqueles os alimentos:
Pois, quando ser
um
consigo,
A
Deus pagam edifícios
Perdi já do outro
a
resposta.
Do roubo com desperdícios.
Por isso, filho,
não
sejas
Os roubados são inventos?
Por demais nisto
exigente.
- Como se Deus, distraído,
Espera, para que
o
vejas
Fizera contas de ouvido!
No momento de ser
gente.
O que sou não sou
à
toa:
473
Nem que seja
indiferente,
Comprar
Nalgum traço uma
pessoa
Muito me tenho espantado
O melhor busca e
consente.
Com quem tenta comprar Deus
- Toda a gente é
boa
gente
Por Deus com o condenado:
Quando algo fundo
lhe
doa.
Com oiros e coruchéus!
Um coração humilhado
471
Que,
contrito, adora os seus
Crueldade
É
que era o templo habitado
Por
sonhos que vão aos céus.
De tal modo a
crueldade
Dum amor, no que
me toca,
É assim que, durante a vida,
Quase a morrer me
coloca
Quem
cuida da consciência
No que sofri de
verdade
Não precisa, à despedida,
Que se me fechou
a
boca.
De acalmar a Providência
E condenado é que
se
há-de
Pedindo a quem cá ficar
O tamanho que
degrade
Que
lhe compre lá o lugar.
Medir onde
desemboca.
Morrer ou ser
condenado,
Só por mor do
desespero
Em que a mulher
me lançou.
E o desvario é
tão grado
Que este inferno
mais o quero,
Se por mão dela
mo dou,
Que um paraíso em
que vou,
Por mais que seja
sincero,
Doutra qualquer ser
amado.
===============================================================================================
474
Não é nada edificante
Seguro
Só
quando em causa ficar
Ao
redor ver meu lugar.
Se ninguém ficar
seguro
Em nenhum lugar,
então
Porém, o mais alarmante
O que há de
melhor é
não
É
que o perfil que isto dá
Revelar brechas
no
muro.
Foi sempre assim e será!
A nossa melhor
defesa
É jamais abrir a
boca
477
Da desconfiança
presa,
Bem refechada na
toca.
Propaganda
É nesta
incomunidade
Quando
tanta propaganda
Que se encontra a
qualidade
Durante a vida nos rufam,
Principal que nos
descansa.
Nossas orelhas se atufam
E ninguém já se comanda.
E é porque roi as
entranhas
Que com explosões
tamanhas
Era
difícil ouvir
O amanhã dali se
entrança.
Entre o berreiro outra coisa
E morreu-nos o porvir
Nas lições daquela loisa.
475
Verme
É que segreda baixinho
Todo
o rumor da semente
Nós somos o
melhor
deus
Que amanhã será evidência:
De quanto verme
existir,
Já que na guerra
os
ateus
- É a dúvida que adivinho,
São o menu do
porvir.
Que me varre, lenta, a mente
E devirá consciência.
E aqui debaixo
dos céus
São os vermes a
luzir
De gordos que os
medos
meus
478
Andam de facto a
medir.
Nora
Servimos-lhes os
soldados
Anda o burro a circular
Mais a carne das
crianças,
De olhos vendados, à nora,
De viúvas, de
amputados...
Não vá ele adivinhar
Que anda à roda o que demora.
Dos vermes nas
contradanças
Somos o fim dos
cuidados,
E à nora andamos no mundo,
Os deuses das
abastanças.
Que, se em frente caminhamos
Do caminho até ao fundo,
Aqui
mesmo é que chegamos.
476
Lugar
E tão burros somos todos,
Com
olhos tão bem vendados,
Terrível e
curioso
Que acaso ninguém repara
Como passo a
compreender
Os demais assim
que o
gozo
Que, se acabam nossos modos
Me deu lugar ao
sofrer!
Nos campos por nós lavrados,
É o mundo inteiro que pára.
Quanto na vida,
porém,
São ignorados
sinais?
Quando tudo corre
bem,
Quero lá saber
dos mais!
===============================================================================================
479
Olha uma plaina, uma enxada,
Pão
Um
tanto de ferro e pau,
Cada
qual encaminhada
Por mais que seja
vadio,
Se um homem tem
uma casa,
Uma
à terra, uma outra à nau:
Uma mulher,
passadio,
E o que à gleba faz aquela,
Dos filhos o
golpe de
asa,
Esta o faz à caravela.
O seu lar vai ter
o gosto
Que na vida tem o
pão
482
Saboreado ao
sol-posto,
Segredo
A freima após do
Verão.
O segredo dos segredos
Não o come a toda
a
hora,
É que nem tudo é animal,
Que o sabor quer
a demora
Vegetal ou mineral.
De quem sabe as
primazias,
O mais incrível dos credos
Porém, vai
sentir-lhe a
falta
É que o sonho dum poema,
Que vai ser tanto
mais
alta
A música de que o teço,
Se o não tem
todos os
dias.
Das odisseias o tema,
Com
tais metros não os meço.
480
Quando passo tudo ao crivo
Mar
Reparo
que então convivo
Sempre,
sempre noutro reino.
Este mar longe e
tão perto
Arvora a espada
do
sol,
Só quem dele não tem treino
Do sol que, no
anti-deserto
Não vê como o laço é leino:
Do mar pleno de
arrebol,
O quarto reino é o que vivo.
Sempre a acaba
embainhando
Devagar,
devagarinho,
483
Pelo crepúsculo
quando,
Tampas
Num horizonte
sozinho,
As pessoas no caminho
Vai descendo, vai
descendo,
São estas arcas fechadas,
Enfim até se
sumir...
Cofres feitos ao cadinho,
E foi tudo uma
ilusão:
De tampas aferrolhadas.
Se à espada me
recomendo,
Se por fora um sorrisinho
Perco-me pelo
nadir,
Ou de máscara às entradas,
Nem sequer vejo o
meu
chão.
Pouco importa, que no ninho
Nada contam as chegadas.
481
O que conta é que quem olha
Matérias
Não
deverá saber mais
Daqueloutro que o acolha
Não são muitas as
matérias
De que os homens
se
serviram,
Do que aquele que é olhado.
Não foi de
andarem de
férias
Os equilíbrios são tais
Nem de quanto só
deliram.
Dentro e fora em todo o lado.
Tudo pende da
maneira
De as comporem,
ordenarem,
Cada qual como
emparceira
Para que as
leivas nos arem.
===============================================================================================
484
E, na abóbada celeste
Tarde
Aonde
estes nunca irão
Nem vislumbram que é que
a veste
Por que vence
sempre tarde
Quem por justiça
devia
De tamanha imensidão,
Cedo vencer sem
que
aguarde
- A glória aqueles investe,
Quanto afinal
merecia?
Não
estes vermes do chão!
Que tarde perca
quem guarde
Das horas a
felonia
487
É injustiça que
nos
arde
Igreja
Tanto mais quanto
se adia.
São
os céus uma só igreja
É que,
entretanto,
mungindo
E não mais que um grão de areia
Tetas nédias de
dinheiro,
É a maior que os céus almeja,
Vai-se o iníquo
bem
nutrindo.
Da cegueira presa à teia.
Para o réu é um
ano
lindo,
Então
por que as construímos,
O juiz é seu
parceiro...
Às igrejas e conventos,
- Todos andam de
nós
rindo!
Coroando à terra os cimos?
Para ver se dão fermentos?
485
É
que não compreendemos
Inquisição
Que
é o mundo convento, igreja
Para a fé que se deseja.
Quando a Inquisição
acaso
Se achegando vai
de alguém,
Desde
sempre já cá temos
Uma aura recobre
o
caso
Este lugar de clausura
De órfão que
perdeu a
mãe
Onde o que é livre se apura.
E o suspeito até
rebrilha
Aos olhos do
inquisidor
488
Como aquela
maravilha
Esperto
Onde cevar o
rancor.
Mais esperto que os espertos
Uma aura de quem
não
sabe
É quem dos desastres tira
De que vai ser
acusado
Lições
de braços abertos,
E na pele já não
cabe,
De renovar-se na mira.
Tinta de ignoto
pecado.
Os outros sempre ouvir quer
Antes de que tudo
acabe
E nunca a sério demais
Parece mesmo um
culpado.
A
si próprio se confere,
Limites seus vê reais.
486
Procura e vê com cuidado
Favoritos
Dos
outros as reacções
A
quaisquer dele medidas.
Deus escolhe os
favoritos:
O doido, o coxo,
o malsão...
"Tão esperto, por meu lado,
Mas, por mais que
solte
gritos,
Assim não sou, mas tenções
Lá não entra a Inquisição.
De
mudar me dão mil vidas."
A da Igreja ou
dos peritos,
Mesmo ateus de
profissão,
Que não dirimem
conflitos
Senão a murro, a
canhão.
===============================================================================================
489
Não sendo pesado,
Atenção
Deixo então eu de
tentar
Mais
tempo me conquistar.
A atenção para
com quem
Por acaso entrou
na
vida
Se com ele acamarado,
Como a amizade
contém
Se colaboro com ele,
Valia
desconhecida.
Só
então é que ele me impele.
Carteiro, guarda
de ermida,
Vizinho ou colega
-
alguém:
492
A simpatia à
partida
Armas
Abre-me àquele
que vem.
Estas minhas fracas armas,
Aceitá-lo,
apreciá-lo
Armas tão só de papel,
É poder já gostar
dele,
Donde lhes vêm os Karmas,
É programar o
intervalo
A força do mago anel?
Do destino em
minha
pele:
Dão
a volta sobre si,
- Sei lá quando
calo ou
falo
Não lutam noutro conjunto,
Se um acaso é que
me impele!
Solitário frenesi
Que sozinho atento junto.
490
Porém,
assim manejadas,
Organizar
Perturbam
violadores,
Acusam patifarias...
Nosso tempo
organizar
Não é a
produtividade
Desde
então, as madrugadas
Ao segundo, se
calhar,
Acompanham onde fores
Crescer na
totalidade.
Teus passos de novos dias.
Se calhar é
reduzir
Volumes de
actividade,
493
Com o tempo nem
bulir,
Perco
Para que lhe
sobrenade
Quando
me perco do mundo
Tudo aquilo que é
pequeno,
Dou-lhe então valores novos.
Que é realmente o
importante,
Se
desmoronado afundo,
Se da produção
sereno,
Vou logo, formiga, aos ovos,
Acarinho então o
instante:
Salvar migalhas de vida,
- Só aqui neste
atinjo,
pleno,
Cultivá-las, desdobrá-las:
O sabor que tenho
diante. Toda
a valia é subida
A quanto venha abrir alas.
491
Doutro modo, eis-me formiga
Castigo
Mas em desastre completo:
No nada nada se abriga.
O tempo é um
castigo.
Se tentamos dominá-lo
Como a uma casa sem tecto,
Em vez de o
tornar
amigo,
Fujo quando se lobriga
Domina o que sou
e
falo.
O nada mal o detecto.
Porém, se não
luto
Contra ele, o
envolvimento
Dele é mais leve
e o produto
É que domá-lo nem
tento.
===============================================================================================
494
Pouco serve a absolvição
Nascido
A
quem, movido a cordéis,
Perdeu
outra habituação.
Nascido na
serração
E sempre a serrar
de
cima,
Já vos não libertareis,
Conquistando
posição
Condenados à prisão
Quando ao
padrinho se
arrima,
Dos danos de que sofreis.
Doutor, deputado
e acima,
Não via nunca
razão
497
De descontento e
até
mima
Grãos
Os ouropéis do
brazão.
Somos
grãos de trigo
Mas o sobressalto
existe,
Que o moinho tritura
Já que cabeças
alheias
E nenhum amigo
Tramam algo que
resiste.
A verdade apura.
É que basta um
gesto
apenas:
Ninguém quer saber
Logo o prenderão
as
teias
Se resisto à mó,
Das injustiças
terrenas.
Se mudo em qualquer
Vago grão de pó.
495
Uniformizados,
Prisioneiro
Com
farda ou sem ela,
Mal somos alguém.
Se me jogam,
prisioneiro,
Deste lado para
aquele
Números pregados
Sem razão, então,
de
inteiro
Em vaga lapela,
Não me fica nem a
pele.
Quem somos nós, quem?
O pensamento
repele
O ilógico
caminheiro,
498
Jamais se habitua
a
ele,
Exemplo
Que há rumo até
num sendeiro.
Quando o exemplo é necessário,
Deve haver uma
razão
A prisão serve de prova,
Para assim se
agir
connosco
Ao menos de indício vário,
Mas, ignorando-a,
eu
não
Se prova nenhuma aprova.
Vejo a teia em
que me enrosco.
A pública opinião
E, com tão
pequena
ausência,
Sempre se contenta, aliás,
Toda a vida é
incongruência.
Não com as provas à mão,
Com a aparência falaz.
496
E assim vamos de justiça,
Suprimem
Pondo o justo na prisão,
Não vá, culposa, a
preguiça
Se suprimem o
direito
De me sentar, de
dormir,
Ainda sofrer senão.
Tenho a impressão
de que a
peito
E
em vez da verdade omissa,
Tomam é de me
elidir.
Na cadeia há uma ilusão!
E,
despersonalizado
Por semelhante
regime,
Mesmo absolvido,
o cuidado
Nem em casa me
redime.
===============================================================================================
499
E mesmo um tácito apoio
Indiferença
A
um errar a que me irmano
Mede
menos algum moio
A indiferença,
por vezes,
Nos chega como um
favor.
Que a dor fora deste engano.
Se podes sofrer
revezes
Se
é um passo para a loucura,
De alguém que te
anda ao
redor
A vida, entretanto, dura.
E passa sem
causar dano,
A fingir-se
distraído,
502
Não te enxergando
no
pano
Esconso
Que mal te
houveras tecido,
Olhar grave que se adoça,
Índole boa
revela.
Lábios breves num sorriso,
Então é que
agradecemos
É quase quanto se possa
A atenta
desatenção.
Desejar
como preciso.
E fugimos à
sequela
Alguém já que se interessa,
Discretos remando
remos
Que solidário se mostra,
Às águas que
encobrirão.
Comprometido atravessa
A vida com vida à mostra.
500
Só por si despercebido,
Princípios
Na
prisão da humanidade
Tem
valor jamais volvido.
Os princípios
admitimos
Que mais firmes
nós
julgamos
É de similar verdade
E de repente
notamos
Que nos vai sendo erigido
Uma falha lá nos
cimos.
O
esconso da liberdade.
As coisas não
sofrem amos
Nem querem nossos
arrimos,
503
Pelo imprevisto
não
damos,
Ordens
Não é nunca o que
nós vimos.
Cumprir
ordens sem razão
Tudo se passa ao
contrário,
É tortura refinada,
A excepção nos
atrapalha,
O automatismo em prisão
Torna-se o juízo
vário,
Um ser livre torna em nada.
Pensa, afinal, o
que
calha.
Imaginar
a extensão
Nos princípios
qual meu
lar
Do tormento não é cada
Urge então
reformular.
Pessoa que o vê, se não
Tem de desatar a meada.
501
Certo que haverá motivo
Convicção
Para agir dum, doutro
modo:
Por
qual, porém, é que vivo?
Convicção oposta
aos factos,
Para quê
firmar-se
nela,
Ignorando-os de todo,
Cegar voluntário
os
actos
Vivo à toa, relativo,
Do real com a
chancela?
Fico reduzido a lodo.
É quando a dor é
demais
Que aos mais
confesso a cegueira,
Buscando um sim
que jamais
Lograrei doutra
maneira.
===============================================================================================
504
Que aqueles irão comer?
Cinzas
Só
se não tens inimigos
É que podes fazer jus
Quase um murmúrio
plangente,
Um amor breve em
rumor,
A cada razão de ser
- Logo adere ao
estupor
E prevenir os perigos
Cada pé no chão
assente.
De punhos livres e nus.
Ergue-se o corpo
jacente,
Acende um novo
fulgor,
507
O aniquilado da
dor
Labéu
Dum pulsar vivo é
semente.
Sem se examinar a ideia,
A espinha curva
se
apruma,
Conferia-se o labéu:
O pulmão opresso
grita
A frivolidade é a teia
À brisa que tudo
empluma:
Em
que o juízo prendeu.
- É um fandango,
uma
rebita,
Difama-se a ideia alheia
Um samba que, de
repente,
Infensa a todo o escarcéu,
Acende as cinzas
da
gente!
Ao que a multidão semeia,
Voa
só num novo céu.
505
Inspira desconfiança
Odiar
A
palavra ressentida,
Enorme
extensão alcança.
Odiar quem
suplicia?
Mas eles são
instrumentos!
Assim tão mal discernida,
Quem manda a
gendarmaria?
Em equívocos balança:
Somos todos
elementos
- É cada qual que ela olvida.
Da imensa teia
vazia.
Responsáveis? São
os
ventos!
508
Os dirigentes são
via
Casamento
Por que passam os
tormentos,
Perpassar do casamento
Muito embora
criticáveis.
Monótono, mui formal,
As vítimas e os
carrascos
Vão desgosto ainda sedento,
São nuvens de pó
revoltas,
Pequeno
nada fatal...
Por forças
imponderáveis
Atrito sem sentimento,
Arrastadas aos
penhascos:
Reconcilia, afinal,
- E aqui vão as
vidas
soltas!
O corpo em despojamento
Onde
a velhice resvale.
506
Desleixo, ausência de véus,
Braços
Precauções abandonadas,
São dois egoísmos incréus
Se atingiras o
poder,
Conservarias os
cargos
De saídas e de entradas
Aos inimigos que
houver?
A ferirem-se, mesquinhos,
Ou teus braços
são tão
largos
Descaminhando caminhos.
Que nem os terás
sequer
E que na tua nau
Argos
Cabe o homem, a
mulher,
Os tubarões e os
pargos
===============================================================================================
509
Porém, quando fujo ao mundo,
Teorias
Entrando
nos bastidores
Donde
posso ver a fundo,
Imputam-me
teorias
Com que nada
tenho a
ver
Lá se nos vão os fervores:
E nem me restarão
vias
- Cada qual é tão pequeno
De me explicar,
defender.
Que eu nem ver quero o veneno!
Em meio às
algaravias,
Quanto mais eu
pretender
512
Desmascarar as
tranvias
Gestos
Mais meu trem se
irá perder.
Quando se me abrem as portas
Todos somos boa
gente,
Chego à rua machucado,
Cada qual, em seu
juízo,
Bambo e desarticulado.
Um democrata
decente.
As vidas na vida mortas,
Se a alguém,
porém, falta o
siso,
Coze o esforço nas retortas,
Vai cada qual,
inocente,
Vago me sinto e cansado,
Fuzilá-lo para
aviso!
Vagueio
de lado a lado
Desertos que foram hortas.
510
Se alguma coisa me prende
Forçado
No meio deste desnorte
São lumes que em nós acende
No forçado a
resistir,
Ninguém procura
saber
Quem o anonimato corte:
Se há culpas a
atribuir
- Sempre me acompanharão
Quando não logra
vencer.
Gestos
contra a solidão.
Se a resistência
precisa
Um organismo não
tem
513
E se fraco se
divisa
Regra
Na traição a quem
quer bem,
Tudo fica em regra,
De vez isto o
inutiliza,
Nem
há um outro modo:
Já que então é um
desertor.
- Alguém que me integra
Ser fraco não é
divisa,
Em todo o meu todo.
Das desgraças é a
maior:
Nem tinha pensado
É que só mesmo o
inimigo
E alguém me articula
Ao desgraçado dá
abrigo.
Um lado e outro lado
Com que me cogula.
511
Da vontade bamba,
Veneno
Da
aspiração vaga
Já se não descamba,
Quando alguém se
demorou
Junto a mim a
cochichar
Recompensa a paga:
Cabalas onde
aflorou
Soldo o rombo dente,
Mensagens de além
do
ar,
Já rodo eficiente.
Seu tamanho ganha
voo
Com excessivo
luar
E eu deixei de
ser quem sou,
Pequenino e sem
lugar.
===============================================================================================
514
Deixara até de ser eu
Emperrado
E
noutro me mudaria
Se
um defeito me morreu.
Emperrado no
optimismo
A sonhar
conspirações,
Não, que me perderia!
Aquilo de que me
crismo
Quero guardá.los, senão,
São erros, são
ilusões.
Perdendo-os, me perderão.
Serei sempre aquele
moço
Das meias-noites
sonoras
517
Ouvindo, ao fundo
do
fosso,
Sestros
Badalar
metralhadoras.
Animais desarranjados
Assim murcham
esperanças
Com sestros incompatíveis,
Cada vez mais
encolhidas,
Sentimos todos os prados
De interesse
aniquilado.
Ao
pensamento invisíveis.
Mas eu já
acendera
danças
Sentimos em demasia,
Só com sonhar
novas
vidas
Já nem pensamento existe:
Nos subterrâneos
do
fado!
Opera e pára num dia
Sem
dar conta do que viste.
515
A máquinas reduzidos,
Prisão Todos
perros, sem azeite,
Ora vamos,
incontidos,
Na lenta prisão
da vida,
Pedaços mortos de
mim
Ora vimos sem aceite...
Esparsos pela
avenida
- Nem sabemos, tempos idos,
Me preparam para
o
fim.
A quem é que isto aproveite!
Porém, se for um
começo,
Como irei
habituar-me
518
Se de mim só me
despeço,
Sapateiros
Se mais e mais me
desarme?
Somos sapateiros,
Habituado à
sepultura,
Façamos sapatos,
Aos poucos alma
penada,
Mas bons e baratos,
Como é que irei à
procura
De
parcos dinheiros.
De vir a ter uma
estrada?
Como fabricar
Cada dia me
afigura
Pulseiras e brincos?
Que sou nada,
nada,
nada!
Ourives do ar?
Não bastam afincos!...
516
Sapateiros somos,
Defeitos
Ourives
da sola,
Neste
ofício pomos
Vou conhecer meus
defeitos
Para conservá-los
todos
Força
que consola,
Com cuidado e com
bons
modos,
E, se é sacrifício,
Tanto a mim andam
afeitos.
- É por gosto e vício!
Se somem, não
vejo jeitos
De dispor deles a
rodos,
Desses meus tão
fundos lodos
De que meus
traços são feitos.
===============================================================================================
519
Um nada na distracção,
Discórdia
Um
desvio no sentido
E a certeza é a confusão
Os motivos dos
dissídios
São, afinal, as
palavras.
Do nada que foi vivido
Trata dos erros,
elide-os
Com
o todo em que há questão
Com os sentidos
que
lavras.
E alguém fica assim perdido.
A discórdia
principia
A embrulhar
significados,
522
Aprofunda e se
desvia,
Integridade
Com os termos
entalados.
Os
personagens da história
Se houvera motivo
a
tal,
Famosos de integridade,
O inimigo
lograria
Correm a vida sem glória,
Concertar sentido
igual.
Mártires da humanidade,
A razão que
impede a
via
Na
quase totalidade
É não haver,
afinal,
Chacinados e queimados,
Nada aonde
principia.
Enterrados de verdade
Vivos ou emparedados...
520
Como
é que tal pode ser?!
Conjugável
O que é mais consolador,
Quando
nem mesmo há sequer
Em jovem sempre
sonhara
Casar-me com quem
jamais,
Excepções a contrapor,
Jamais de amar-me
deixara.
É que há sempre alguém que quer
Disse-me a
vida:"é
demais!"
Pôr fim de vez ao horror.
Desapontado,
aceitara
Os mais antigos
sinais:
523
"Um amor tem
muita
cara,
Pensar
E tipos tem
muitos mais:
Pensar-com ou pensar-contra
Há, por um lado,
a paixão,
São dois modos de presença
Por outro, a
dedicação,
E pensar-contra compensa
Uma efémera,
outra estável."
Se,
ao contra-pensar, me encontra.
Por fim, porém,
adivinho
Pensar-com me reencontra,
Que, com jeito,
há um melhor
vinho:
Mas, quando a si se dispensa,
- Uma noutra é
conjugável.
Não pensa mas crê que pensa,
De
todos se desencontra.
521
Pior, porém, é que alguém,
Parece
Ao
pensar-contra por vício,
À vitória só se atém,
O que importa é a
boa-fé
Atenta ao que a
vida
tece:
De pensar não tem resquício.
Uma pessoa não
é
Não é homem nem ninguém,
Nunca aquilo que
parece.
Matou-se logo de início.
Não só por quanto
mascara,
Mas porque
germina em si
O porvir que só
dá a cara
No que apenas
entrevi.
===============================================================================================
524
Como ser independente
Oposto
Do poder que
tem de usar,
Viver
apenas assente
Se pensar-contra,
um igual
Tenho de encarar
no
oposto,
Na
razão? Dela o lugar
O confronto é um
ideal,
Só o talha quando consente
No risco é que
encontro
gosto.
No poder erguer-lhe o lar.
Se lutar para
vencer
Ou ganhar a
qualquer
preço
527
Nem pensamento
sequer
Religião
Haverá no que
apareço.
A qualquer religião
A alegria da
vitória
O que a acaba por aluir
É a tristeza do
fracasso
É a fortuita opinião
Duma passageira
glória,
Ter
por Deus a decidir.
Dum pensar em
tudo
escasso.
Se em qualquer ocasião
Se, porém, busco
saber,
Tal modelara o porvir,
Mais que penso,
penso o
ser.
Sendo outro o tempo e a função,
Hoje
dali que há-de vir?
525
As tradições e os ritos
Intelecto
Mudam
de tempo e lugar,
São
pequenos infinitos
O intelecto
universal
Pensa na razão de
tudo,
A que aponta o polegar:
O espacífico é
tal
qual
Diversos nos mesmos fitos,
Mas na parte e
por
miúdo.
Perderam há muito o lar.
Entre ambos fica
um terceiro
Que humilde se
não demite
528
De se entregar
por
inteiro
Comunhão
Dos problemas ao
convite.
No fundo, a religião
Marca do
particular,
Responde à necessidade
As razões que
então
tiver
De haver uma comunhão
No todo irá
partilhar
Além de qualquer idade.
Sem pretender
razão
ter.
Como num tempo e lugar
É o que ao acervo
geral
É que sempre a viveremos,
Traz da harmonia
o
sinal.
Vamo-la simbolizar
Na religião que temos.
526
Como ela não no-la dá,
Poder
Apenas
a simboliza,
É
a saudade do maná
Ser um
intelectual
É ser homem de
poder,
Que a História jamais divisa.
Porém, que o
poder não
quer,
Mas é aquilo que no que há
Já que o poder é
o seu mal.
Germina
o que diviniza.
Do poder o que
precisa
É do
reconhecimento,
Que ser ouvido é
o que visa:
Não lhe quer o
envolvimento.
===============================================================================================
529
Tudo o mais é apenas isto
Pão
Ou
nem tem razão de ser.
Maomé,
Buda, Jesus Cristo,
Quando da
religião
Se expurgam todos
os
mitos
Como um místico qualquer,
Fica-nos somente
o
pão
São gritos de nossa dor:
Que alimenta os
infinitos.
Eis por que acordam
amor.
Para que servem
os ritos
Senão para uma
ilusão
532
De que de
vez os
conflitos
Sina
Se um dia
dirimirão?
Uma máquina ideal
São o sinal duma
espera:
Era
a de medir a sina,
Alerta à
profundidade
Dava-nos logo o sinal
Por dentro de
qualquer
era,
Que a cada qual se destina.
Como ao fim
ninguém a
invade,
Assim se tolhia o susto
Vemos quanto
prometera,
Do
imprevisto desafio
- Do porvir temos
saudade!
Que nos faz pagar o custo
De a vida ter por um fio.
530
Por isso é que acreditamos,
Funcionários
Sem ninguém acreditar,
Que
iremos vencer os amos
As igrejas
organizam
Funcionários da
palavra:
Que de nós andam a par
Na letra morta
deslizam,
Quando
à máquina compramos
Já nenhum fogo
ali
lavra.
Uma sina de enganar.
E nas seitas é
pior:
A palavra que
incendeia
533
Queima todo o
interior
Presos
Nas labaredas que
ateia.
Culpamos
a vida em tudo,
A vera
religião
Sem forças para embarcar
É vivida pelo crente
Num barco, por mais miúdo,
Ou ateu que
deitam
mão
Que demande outro lugar.
À vida em quanto
a
consente.
Continuamos sobretudo
Naquele amor se
interligam
Presos à pedra do lar,
Além dos dogmas
que
brigam.
Justificando, contudo,
O que importa preservar.
531
E então tais coisas nos vivem
Busca
A
vida que fora nossa
E cremos que assim
convivem
Religião é
palavra
Em busca de
acontecer,
Contra quanto nos destroça.
Que a vida fundo
escalavra
Não veremos que o destroço
Onde o coração
arder.
Somos nós presos no fosso.
Não são os gestos
nem ritos,
Nem os dogmas
revelados,
São apenas nossos
gritos
De filhos
abandonados.
===============================================================================================
534
Penso como canto:
Sobreviver
Por
mera alegria
De
tudo encontrar.
Sobreviver é
criar
Compromissos em
cadeia.
Vasto é o mundo quanto
Não perde o orgulho
o
lugar,
Eu precisaria
Que se vai manter
na
teia,
P'ra me alimentar.
Basta recusar o
ar
Que respiro na
alcateia,
537
Seguir a Estrela
Polar
Aprender
Contra quem dela
me alheia.
Nada
neste mundo
Pior é falar sem
nada,
É simples nem claro.
Ter com outrem o
vazio
Julgamos que é raro
A entreter a
caminhada,
Não vermos a fundo:
Falar e perder o
fio
De
tudo me inundo,
E a mentira nos
manter
Preciso o declaro,
Apesar de nada
ser.
Em tudo reparo,
Julgo-me profundo...
535
Só
perto da morte
Notícia
Vemos
nossa sorte:
Não
sabemos nada
Se mais vende a
má notícia
Que vende a
notícia
boa,
E ainda, porém,
Torna-se o mundo
sevícia,
De
aprender se tem
Como haver lugar
à
loa?
Tudo desta estrada.
Troca então
qualquer pessoa
Pela dor uma
carícia,
538
Quando esta
embora
alcançou-a,
Vento
Quando até mesmo
ali disse-a.
É
um sopro de vento
Já com as asas
não
voa,
Um amor que vem
Suspeita em tudo
malícia,
E a maré contém
Só perigos
apregoa.
Vagas e tormento.
- Esta é a
Humanidade à
toa
Passa e o sentimento
(À boa a venda
desdisse-a)
À calma se atém,
Com que se nos
atordoa.
E ao saber também,
Aos dias atento.
536
Se o amor se visse
Cantam
Na
sabedoria
Talvez
de si risse:
Os pássaros
cantam
E ninguém
pergunta
- O saber, se disse
Por que a voz
lhes
junta
O que no amor via,
As notas que
encantam.
Via só tolice!
Se penso, nos
prantam
A questão que
assunta
Se é
voz-marabunta
Das vidas que
jantam.
===============================================================================================
539
E, tudo assim dito,
Senhor
Nem
é requisito
Que
haja amor ou não:
Senhor eu me
creio
Logo desde o
berço
O amor não é um dado
E apenas
receio
Sempre que o seu fado
Fique por um
verso
É o doutra questão.
Tudo o que
converso.
É apenas o
meio
542
De me tornar
terso
Honrado
E de peito cheio.
Num amor honrado
Senhor?! O que
sei,
Sempre o coração
Quando chego ao
fim,
Tem
atento à mão
É que não sou
rei
O que é o outro lado:
Nem sequer
afim:
Muita obrigação
Apenas
serei
Tem-no assinalado
O escravo de
mim.
Para,
descuidado,
Ser inteiro e são.
540
O amor descambado
Qualidade
No
prazer maltrata
O
que busca e mata.
Pela qualidade
Pauto a vida e
quis
O amor avisado
Com gestos
viris
Prepara os prazeres:
Testar-lhe a
verdade
- Trata dos deveres!
No cume a que ela
há-de
Subir de
raiz:
543
Só que em tramas
vis
Leão
Se evola, se
evade.
É um leão de força
Para além da
mágoa
E de decisão
O que
contaria
Um
homem que não
É a grandeza e
trago-a
Aceita o que o torça.
Em mim cada
dia.
E a muito orça
- E ao fim sobe
n'água
O custo em questão
Só o que é
porcaria!
Se
alguém luta, vão,
Luta que o esforça.
541
Porém, desconfio,
Conversado
Sem
qualquer desdoiro
Que
alguém tem-no à mão:
Escolheste bem
O teu
conversado,
- A mulher num fio
Que é
desempenado
De cabelo loiro
E atento
também.
Amarra um leão!
Escolheste mal,
Que é
desempregado
E um tostão
furado
Não tem, por
sinal.
===============================================================================================
544
Tarde descobrimos
Fruto
Que
aqueles malvados
Que
o medo repetem
É o amor um fruto
De muita
estranheza:
Ocupam os cimos:
Por fora é a
beleza,
- E é nos seus brocados
Da fome
conduto,
Que o porvir nos metem!
Tem a singeleza
De ser um
produto
547
Que não custa
muito,
Explosão
É o céu que mo
preza.
Fervem duas almas,
Não vejo ali
pranto
Explosão do amor.
Nem vislumbro
escolhos
A um canto, em temor,
Senão se nele
entro:
A razão acalmas.
Por fora é um
encanto
No atropelo, as palmas
Que me encanta os
olhos
Vão para o fervor.
- E é cinza por
dentro!
E o medo é maior,
Que
horas não tem calmas.
545
A razão, no amor,
Poupa
É
aquele bombeiro
Que
só vem se clamas
Emprega-te e
poupa,
Recorda a
velhice:
E foi já o melhor
Para quem
preguice
Da casa em braseiro
Nem lhe chega a
roupa.
Comido das chamas.
Velho, é a
pieguice
O que mais te
enroupa:
548
Tens sempre na
boca
Degrau
Quanto a infância
visse.
A mulher que tem
Lembrar o
futuro
Homem por degrau
Será
desvario:
Salta
a vida a vau,
Como é que o
apuro?
Não a vê, porém.
Nem há
desafio
Se o amor convém
Que te dê a
saber
Por servir de nau,
O tempo a
viver.
Quando o mar é mau
E chegar além,
546
Não é amor, é dote:
Medo
O
homem é escadote
Por
cima do qual
Quem nos mete a
medo
Espíritos
maus,
Cada vez mais alto
Na mente
calhaus
Se pretende o salto.
E na boca um
credo
- O amor? Nada vale!
É o que inculca
cedo.
E depois nos
vaus
Nem com
varapaus
Vemos o segredo.
===============================================================================================
549
Quem
viver a sério
Caçadas
Vive
sob o império
Do
que houver ali.
Se incómodo,
alguém
Estorva as
jogadas,
- Todo o seu sentido
Logo nas
caçadas,
É ficar perdido
De atalaia,
quem
Por dentro de si!
As presas
cortadas
Sente que
tem,
552
Esconso
mantém
Diabo
Armas aperradas.
Na Ascensão, o Diabo:
Se de si
segura
"É mais outro deus
A peça de
caça
A subir aos céus.
A si se
afigura,
Mais, ao fim e ao cabo,
A hipótese é
escassa
Uma fé que acabo
- Dita-o a
experiência
-
De ver que nos meus
De
sobrevivência.
Domínios ateus
Se me prende ao rabo.
550
Mas que bem vingado
Brutificadores
Fico
deste fado:
-
Pois quanto mais nédio
Brutificadores
Das massas, do povo,
O
cristão for sendo,
Lascivos dum
ovo
Descrente morrendo
De lucros
maiores,
Mais irá de tédio!"
O vosso renovo
Explora só
dores
553
De
consumidores.
Busco
Como é que o
aprovo?
Entro, pecador,
Podes tirar tudo
Num santo lugar,
Daqueles
frustrados
Não vou praguejar,
Em seus
baixos-ventres.
Busco
um redentor.
Repara,
contudo:
Uiva a fé no ar,
Terás filhos
nados
Férvida em redor:
Dos ventres em
que
entres.
Todos vão depor
A
féria no altar.
551
Fugi, aturdido,
Empenhado
Mas,
fora, engolido
Fui
por vendilhões.
O mais empenhado
Que alguém possa
estar
Repeli-os, rude.
Servindo o
lugar
Onde é que a virtude
Dos Homens ao
lado,
Esconde os portões?
De humanismo o
dado
Que o preocupar
Não leva a
esperar
Gratidão do fado.
===============================================================================================
554
Muitos
estremecem,
Rio
Que
os sons que acontecem
São
mais que expressivos,
O rio é a saudade
Eterna e
serena,
Palavra a ocorrer
Escorrendo
plena
São factos a ser:
Esta
liberdade
- Torna os que diz vivos!
De não ter idade.
O céu e a geena
São quem sempre o
drena:
557
Todo o além
invade.
Remédio
Corre entre as
ruínas
O melhor remédio
Das
religiões
Para uma arrelia
E das fés
divinas,
Que é só fantasia
Temo-lo à mão, vede-o:
Mouco a tais
sermões:
Conta-nos as
sinas
Matamos o tédio
Destas
ilusões.
Que no dia a dia
Dali se desfia
Ao
pequeno um nédio
555
Reino
Gesto contrapondo.
Nossa
melhor via
Em verdade vos
digo que
embalar
É voltar à estrada,
As almas no véu
Do reino do
céu
Lado
a lado opondo
Ignorar é fazer,
obliterar
Pequena arrelia
Com grande jornada.
O primário dever
de se encarar
Da Terra este
Reino,
É a lição do dia:
Único em que
treino
- O destino é grande,
Como será viver e
ter um
lar.
Que ele nos comande!
Esta Terra a ferros
Chora, grita aos
berros,
558
Parece que não
vai ser
consolada.
Dúvidas
Desta Pátria será
sempre traidor
Quem acreditar
Quem por um sonho
inerme ignore a
dor
Sem dúvidas ter
Onde a vida
nada.
É que nem sequer
Quer raciocinar.
556
Porém,
se de alvar
Palavra
Sorte não quiser,
Terá
de aprender
"Que o
sangue nos
caia
Como caminhar.
(Quando
derramado)
Na cabeça e,
dado,
Ao fim conseguir
Jamais daí
saia!"
Ter uma
certeza
Tem preço a pagar:
- A palavra é aia
Do que é
consumado,
No início erigir,
Acompanha o
fado
Com toda a firmeza,
Franjando-lhe a raia.
Ter de duvidar.
===============================================================================================
559
Traçar-lhe a
figura,
Dinheiro
Campos
demarcar.
Então,
com vagar,
A mais eficaz
De toda a
invenção
O sonho se apura
Que nos poupa a
mão
Perseguindo
a norma
Em quanto se
faz,
- E em mim tomo forma.
Que nos cria paz
E a
consolação
562
De ter um
serão Felicidade
Que não torna
atrás
A
felicidade
Não é
ferramenta,
Não é dom do céu,
Que não há
qualquer
Muito embora eu
Com poder
cimeiro,
Não queira a verdade.
O invento que o
tenta
Fruto
da vontade,
Continua a
ser
É o que aconteceu
Somente o
dinheiro.
Quando tornei meu
O destino que há-de
560
Derivar
da escolha.
Chave
O
que aqui recolha
É
que conta a prazo,
Em vez de se dar
Por
diplomacia
Não uma resposta
A chave que
abria
Que venha suposta
(E de par em
par)
Pela mão do acaso.
A todo o lugar
Que a cidade via,
563
Sem
demagogia
Armário
Vamos é mudar.
É o tempo um armário
Enquanto o
político,
Que tendes a mais,
Preso ao valor
mítico,
Por onde arrumais
Não dá pela
cura,
No
gesto diário
O tempo não sobra
A loiça que andais,
Para tão grande
obra:
Pelo itinerário,
- Troca a
fechadura!
Cumprindo fadário
Como
comensais,
561
A servir discretos.
Alguém
Nestas prateleiras
Do
tempo arranjamos
Sempre quis
alguém
Devir vida
fora
Sempre
alguns tarecos
Mas reparo
agora
Perdidos nas beiras:
Que é vago e que
quem
- Os dias que damos.
O destino aflora
Deverá também,
Como a tal
convém,
Prevenir a hora,
===============================================================================================
564
Dar
às emoções
Contabilista
Mais
que às soluções
Seu
primeiro olhar.
Voador do balão,
Se num campo
cais
Com gestos corteses,
E entre os
canaviais
Bastará, por vezes,
Se a um homem
então
Somente escutar.
Pedes os sinais
De qual é tal
chão;
567
Se responde em
vão:
Conjugal
"É o chão
onde estais",
Uma relação
É um
contabilista
Conjugal saudável
O homem em
vista.
À mulher fiável
A paciência
ferve
Será de antemão
Da resposta
pronta
Nesta condição:
Certa, exacta, em
conta,
O mais agradável
- Mas que a nada
serve!
Não é o sexo amável,
Harmónico e são;
565
O mais importante
Incentivo
Para uma mulher
É
o labor que aufere.
"Muito gorda
estou?
Estou mesmo
velha?
O
amor só garante
Quem é que me
espelha
Quem nisto mais brilha:
Por onde é que
vou?"
- Quem labor partilha.
Só quando amor
dou
O gesto
aconselha,
568
Nos cobre da
telha
Sempre
Do lar donde voo.
A princípio, filho,
O acto
positivo
Ia à tua frente,
Vai dar o
incentivo
Repuxando, crente,
A qualquer
mulher,
Desta
vida o brilho.
Ao cuidar do
aspecto,
Hoje, finalmente,
De ao romance um
tecto
Já me maravilho
Criar de se
ver.
Por a par meu trilho
De
teu dar semente.
566
Amanhã, porém,
Partilhar
Seguirás além
Sem
mais alibi.
Se um homem
quiser
Mesmo
partilhar
E eu irei, por mim,
Conversa e
falar
Lento, até ao fim,
Com uma
mulher,
Seguindo-te a ti.
Há-de à emoção
dar
A atenção que
houver
De lhe merecer
O que quer seu
par.
===============================================================================================
569
Anos quarenta que ao lado
Obrigado
São
dezanove em família,
De
afectos todo um passado
Obrigado à vida
Pela Terra e
Céus!
Em
que foi morta a quezília
Obrigado aos
meus,
E mais se lhe acendem brilhos
Que me são
guarida:
Quão mais crescem nossos filhos.
Quantos escarcéus
Rasgam de
fugida
572
A calma
erigida
Ciência
Em meus
coruchéus!
A ciência em nós se atira
Mas à raça
humana
Às perturbações fonéticas
Que por mim
dimana
Sem ver as muralhas éticas
Dando-me um
lugar
Contra que nunca se vira.
Sinto-me
obrigado
Constituída, retira
De haver-me
ensinado
Das seguranças estéticas
A sonhar,
sonhar!...
Benfeitorias poéticas
E, quanto ao mais, só delira.
570
Com medo que dela zombem,
Estrada
Deixa que no olvido
tombem,
Como
sonhos, fantasias,
Corro pela
estrada
Cem riscos à hora.
As realidades gritantes
Porém, não
demora,
Com que jamais lidou dantes.
Fica ultrapassada
- E assim mata as próprias vias!
A minha braçada
Da sorte que mora
Nas curvas de
fora,
Pela pressa dada
De cento e
cinquenta
Inconsciências
rápidas
Que ali me
ultrapassam.
Mas que é que
este tenta:
Sobremesas
sápidas
Se as curvas o
caçam?
571
Vestes
Foi de mim que te
vesti,
Já que me vestes
de vida
E um ano a mais
consolida
Quanta vida vem
de ti.
Vida que em mim
descobri
Da ternura que incontida
Mora nos gestos
da lida
Que vives num
frenesi.