DÉCIMO QUARTO VERSO
EM MEIO AO
POVO, CORAÇÃO DA VIDA
Escolha um número aleatório entre
1403 e 1520 inclusive.
Descubra o poema correspondente
como uma mensagem particular para o seu dia de hoje.
1403
1409
Em meio ao
povo
Fraldas
Em meio ao povo,
Os políticos são fraldas
Coração da
vida,
Que são de trocar depressa:
Me
renovo:
O
tempo arma lá tais caldas
- Sou eterna
ida!
Que o fedor as atravessa!
1404
1410
Jornalista
Sortudo
Jornalista é uma
pessoa
Um
sortudo recusar
Que nada tem na
cabeça
Será fechar-se na toca:
Mas com uma coisa
boa:
- Atira o sortudo ao mar,
- Di-lo tão bem e
depressa!
Trará teu peixe na boca!
1405
1411
Cabeça
Rapinantes
É preciso ter
cabeça,
As pessoas têm ar
Pensa toda a
gente-bem.
De bichezas rapinantes,
Mas que importa aquela
peça?
Tão
voraz é seu olhar
- Até um alfinete a
tem!
Aos tachos dos circunstantes!
1406
1412
Cariz
Rapinagens
Por que é que quando alguém
diz:
A
intenção apaixonada
"Não sou bom a
discursar",
Da paixão nas criaturas
Desdiz logo tal
cariz,
É a colectiva apanhada
Pois logo o quer
demonstrar?
Das rapinagens mais puras.
1407
1413
Impacto
Atávica
Outrora um livro
valia
A mais atávica fome
Por seu impacto
afectivo.
Que nossa espécie alimenta:
Hoje é a ciência que
avalia:
-
Cada qual os demais come,
É um cadáver que foi
vivo.
Depois o pecado inventa!
1408
1414
Igual
Trabalho
Mortes, impostos e
partos,
Todo o trabalho é trabalho.
Entre eles que é que há de
igual?
Mas, trabalho, desesperas
- De todos nem sempre
fartos,
Quando aqui levanto o malho
Nenhum vem na altura
ideal.
A sonhar em ir às pêras!
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1415
1421
Cortesia
Animais
A cortesia não
custa:
Há maridos animais
Ar com que enchemos os
pneus,
Tais que aquelas com que vivem
Torna a viatura
robusta
Não estranham viver mais
Na viagem dos sonhos
meus.
Se com animais convivem.
1416
1422
Ambição
Vingarão
Que tristeza de
País
As meninas da vida
Se de todos é
ambição
Vingarão a moral
Na TV ter o
nariz
Limpando ao que as convida
A acenar-nos com a
mão!
Os cofres e o bragal.
1417
1423
Demo
Lisboa
O inferno é tão
aprazível
Que uma pocilga é Lisboa
Quando vem dum ente
amado,
De imemorial tradição
Que o demo não é
temível,
Não é presunção à toa:
Temo é lá não ser
lançado!
- Corvos, só na podridão!
1418
1424
Cheirar
Louco
Se é verdade que as
palavras
Do que eu gosto é de ser louco,
Nunca podem cheirar
mal,
Já que a pessoa normal
Cheira-as bem enquanto as
lavras,
Passa a vida a fazer pouco
Não vá o cheiro ser
real!
E nada tem de especial!
1419
1425
Atreita
Voador
Como se há-de
construir
Se um homem é um voador
Aqui o nosso
lugar?
Mas nem
sequer bacharel,
- Toda a gente é atreita a
rir
Ninguém vê nele o doutor,
Se alguém calha a
escorregar...
Montam-no como a um corcel.
1420
1426
Graça
Costas
Oferta a oração a
taça
Quem não tira ao ceptro o chão
De oiro cheia por
inteiro
É que lhe mediu os gozos:
- Como se Deus sua
graça
Há sempre compensação
Concedera por
dinheiro!
De
às costas ter poderosos.
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1427
1433
Riso
País
Por que é que Deus não
sorri?
É de paz este país
Será que o riso acabou?
Em
que ninguém vive ao murro
- Ou então caiu em
si,
E cada qual é feliz
Vê a vergonha que criou!
A pensar bem como um burro!
1428
1434
Banco
Perfumes
Um banco é uma
instituição
País de brandos costumes,
Que empresta dinheiro à
gente
Jardinado à beira-mar...
Com prova
suficiente
- Mas, se emana seus perfumes,
De que não tem
precisão.
É só vaca, é só lagar!
1429
1435
Pilhéria
Modernistas
Toda a vida é uma
pilhéria:
Há uns tantos modernistas
A quem nem sequer
sorria
Cujo elogio, afinal,
É que a ideia
parecia
Admiro assim nas revistas:
Coisa terrível de
séria.
"Que bem que escrevem tão mal!"
1430
1436
Gesticular
Preguiçoso
Ao gesticular
quenquer,
Quanto mais sou preguiçoso
As palavras que lhe
apuras
Mais desculpo os inventores:
São um martelo a
fazer
Aquilo que lhes dá gozo
Pontas nas sílabas
duras.
É a preguiça com motores!
1431
1437
Gostamos
Direito
Nós gostamos dum
cachorro,
"Ireis ganhar e perder",
Dum gato, dum
papagaio...
- Diz o mestre de Direito -
- Não pensam, senão
desmaio,
"Mas sois, importa saber,
Nem são livres, senão
morro!
Bem pagos de qualquer jeito!"
1432
1438
Patifes
Brigas
"Que patifes! Que
canalhas!"
Com minha mulher agudas
(Serão gritos que os
elidam?)
Brigas intérmino brigo:
"Com negociatas nas
calhas
- Quero férias nas Bermudas
E a mim nunca me
convidam!"
E ela então quer ir comigo!
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1439
1445
Fumador
Civilização
O fumador diz-nos,
grácil,
Nossa
civilização,
Comentando seus
reveses:
Cheia de telenovelas,
"Deixar de fumar é
fácil,
Não é a da televisão,
Fi-lo já um milhar de
vezes!"
É a vida a ir atrás delas.
1440
1446
Desconfiança
Controlar
Quando o teu
psicanalista
- Eu permitir-te não posso
Roi as unhas do que
alcança,
Que andes a controlar gente!
Se te propôe uma
pista
-
A ingratidão é o caroço
Mais propôe
desconfiança.
Que engasga um chefe inocente...
1441
1447
Atraso
Técnica
A vida que se não
goza
A
técnica não nos liga,
Não é um atraso de
vida;
Prende-nos a uma gavinha:
Mais o é uma
comedida
- À sua máquina diga
Parteira mui
vagarosa!
P'ra telefonar à minha!
1442
1448
Dinheiro
Desastre
Para os homens o
dinheiro
Casar-se é uma experiência
Corre em rio
permanente;
Única na ocasião:
Prà mulher é um
atoleiro,
Lembra
às vezes, na vivência,
Pode secar de
repente.
Um desastre de avião!
1443
1449
Preito
Gordo
Os homens com mais
idade
Contra a dor é que me engordo,
Tornam-se mais
gastadores:
Enxoto-a para diante:
No preito à
senilidade,
Quanto mais eu ficar gordo
Tontos, crêem-se os
maiores!
Mais a dor fica distante!
1444
1450
Sono
Futebol
Há um prazer
divinal
No país do futebol
Em se deixar
embalar
O nosso maior revés
Por um sono
especial...
É que a cabeça não bole
...Se for errado o
lugar!
E pensamos com os pés.
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1451
1454
Pobre
Casa
Quando o pobre segue em
frente
Depois dum dia cansado,
Alguém há que se
enganou
Chega a casa trabalhada,
Ou então, se o passo é
urgente,
A sonhar que tem ao lado
É que apenas
tropeçou.
Toda a loiça já lavada.
Quando entreabre a portada,
1452
Já o marido cozinhado
Adoro
Tem
o jantar e aprontada
A
mesa - tudo arrumado!
- Anda ver o futebol!
-Não tem piada
nenhuma!
É quando, feliz, no fim,
- Eu adoro, que é de
escol,
Bem relaxada ao serão,
É a vitalidade
suma!
Lhe apetece um duche afim,
- Para pô-lo no meu
rol
Que do banho no lugar,
Vai restar apenas
uma
Na banheira ali à mão,
Questão e que não se
evole:
- A loiça vê por lavar!
Tricotaste vez alguma?
- Tricotar?! - clama o marido.
-
1455
- Mas que raio de
piada!
Bruto
Num homem nem tem decoro...
Se és homem de bem
Isso faz algum sentido?!
E fores bem bruto,
- O tricô não paga
entrada...
És
mesmo o produto
E depois, também o adoro!
Tal como convém.
A fama se atém
1453
A teu contributo;
Causalidade
Do
poder conduto,
Chegas a Belém.
Da causalidade as causas
São nossa
fatalidade
Serás deputado,
De tal maneira que
pausas
Quiçá Presidente,
Não há de nenhuma
idade.
Teu
é todo o lado.
Se trepas uma
criança
País? - Toda a gente
Até ao pico do
monte
Com lugar guardado...
Onde eólica se
alcança
...Se for teu parente!
Dum gerador uma fonte,
Ante o vento que
fustiga
1456
De hélices o
corropio,
Refinadas
Logo ela os dois interliga:
As almas refinadas em poesia,
"Que vendaval!
Adivinhas
Empestadas, perdidas e sem tento,
Por que temos este
frio?
(Como entende quem tem bom sentimento,
- Por causa das
ventoinhas!"
Já que perdem a vida em fantasia)
As almas refinadas - quem diria? -
-
Não usam demonstrar em seu intento
A firmeza de quem convencimento
Naqueles sonhos tem por que se guia.
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Costumam conformar-se quando a
sorte
1459
Impõe que se resignem a um
consorte
Velhice
A que as une, com alma de aleijado,
Vai ser a velhice
Sob o peso arrasante de centenas
Hora de lazer,
De milhares de contos: estas
penas
Ou ela só quer
Matam as pobres com tão rico
fado!
Que o ser se esvaísse?
Que haja ou não sandice
1457
Irá depender
Porcos
Do
que me aprouver,
Não duma crendice.
Aos porcos nós estamos sempre expostos
Que impassíveis destroem a
existência
Não é, não, do Estado
Totalmente e com tal
eficiência
Nem do modo como
Que nem sequer sabemos nossos
postos.
Mente o seu cuidado.
Começamos perdendo nossos
rostos
Meu fado eu retomo
Da salarial miséria na
evidência.
Do Estado aos grilhões:
Eles, de mesquinhez numa excelência,
- Fujo-lhe aos ladrões!
Degradam-se no custo dos impostos.
Nós vendemos as mãos mais a razão,
1460
Vendemos horas, dias, coração,
Sogra
Até não restar mais nenhum momento...
Entre uma sogra e seu genro
Eles connosco estrumam suas
vidas,
Muito em comum há que reste.
Dão-nos as atenções que são
devidas
- Ambos queremos, - diz este -
A um qualquer banal monte de
excremento.
Não tanto ao bebé que é tenro,
Mas outro tipo de encontro:
1458
É que, enfim, minha mulher
Lusos
Afinal
pudesse ter
Mas é casado com outro!
Povos do Oriente,
As ocupações
Destes
furacões
1461
Do antigo
Ocidente
Ladrão
Já não são de gente:
- A minha mulher perdeu
Os lusos
falcões
De crédito seu cartão.
Nem fé de furões
- E o banco já preveniu
Conservam
ingente.
Antes
que haja uma sequela?
- Eu não! Sabe, é que o ladrão
Hoje um
ideal
Anda a gastar menos que ela!
Não vale um real,
O rei pobre adveio,
1462
Aluga-se à
esquina:
Consigo
- Às costas combina
Carregar o
alheio.
Se um gordo diz "não consigo!",
Põe-lhe uma beldade à porta
Que
com bons modos exorta:
"Ficarei sempre contigo
Se lograres apanhar-me!"
Fugindo-lhe
ela a correr,
Faz que ele de força se arme
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E que, largando o
talher,
Gritem, berrem - vencerão,
Corra, corra a
emagrecer.
Ganharão a confiança
Quando, alguns meses mais tarde,
De
todo o parlapatão!
Dezenas de quilos
menos,
É o que o político alcança:
Ele creia que o aguarde
A beldade em seus
terrenos,
O que tem mais audiência
Aprestando-se a
apanhá-la,
Terá mais cordas vocais
Põe-lhe à perna uma outra
gorda:
E jamais tem paciência
"Serás meu na minha
sala
Para argumentos, jamais!
Quando teu pescoço morda!"
Uma a fugir-lhe, esta
atrás,
É que não basta, sem pressa,
Verá de vez que é
capaz!
Colocar marcos na estrada:
- P'ra metê-los na cabeça
Desta gente é à martelada!
1463
Sustos
1467
Na vida tudo são
sustos,
Ar
Só que mudam de lugar:
Quando miúdo, os seus
custos
Nunca chega a haver bastantes
Sob a cama iam
morar;
Inquilinos num imóvel.
Em adulto,
assustador
E não é como era dantes:
É um ruído no
motor
Todos
têm automóvel!
Do automóvel com que eu ando.
- Viver é andar-me
assustando!
E o pobre do investidor
Com a moeda a perder
Sempre, sempre mais valor!
1464
Um prédio tem de crescer,
Especialista
Vamos à conquista do ar:
O especialista não
tem
O inquilino nacional
Jamais todas as
respostas.
Não
se queixa do lugar
Tem a certeza,
porém,
- E então, sim, o capital
Pagas as custas
propostas,
Muito ar tem onde empatar!
De as poder ir arranjar
- Do preço que lhas pagar!
1468
Manco
1465
Saúde
Já
que a corrupção domina,
O mundo coxeia, manco,
Para a saúde
manter
É
pouco digno de inveja:
Come-se o que se não
quer,
- A uma mente cristalina
Bebe-se o que se não
gosta,
Prefere a nota de banco,
Faz-se o que se não
queria...
Por mais imunda que seja!
Quem quer trocar de proposta?
- Ter esta saúde imposta
Não será uma
porcaria?
1469
Preferem
1466
As mulheres só preferem
Martelada
Os
magnates do dinheiro
Pelo que deles auferem,
O homem é um
animal
Não que os amem por inteiro.
Que requer ser empurrado:
Quem a voz eleva mal,
Mal ouvido, é mal amado.
==========================================================================================
Têm medo de os
perder
1473
Como, de qualquer
maneira,
Magro
Uma pessoa qualquer
Teme perder a
carteira.
À minha volta, a alegria
É a abastança da existência.
Um
magro é uma tropelia,
1470
É da tristeza a evidência.
Pai
Engorda e depois sorri,
É por ser pai que, enfim, posso
Que um esfomeado a rir
Ter as funções mais
dementes:
Não mora jamais aqui!
- Para meus filhos ser
osso
Parece estar a pedir
Em que, cachorros lactentes,
Podem afiar os
dentes!
Quando abre a boca, não riso,
Que neste gáudio não entro,
Mas que quem tenha o preciso
1471
Jogue uma côdea lá dentro!
Devorar
É só por uma unha
negra
1474
Que as pessoas se não
comem
Democracia
Umas às outras, em regra.
Pois aos gestos que
retomem
A nossa democracia
Funciona sempre bem
Um amor, uma
amizade,
Quando não é fantasia
No seu jeito
contraído,
O
barulho que contém.
Se lhes revelo a verdade,
Só lhes encontro um
sentido:
As instituições talhadas
Foram para entrechocar.
O anseio rudimentar
Há barulho nas estradas?
De não vir a ser
comido
- É a democracia a obrar!
Mas os demais devorar!
1475
1472
Ovelhas
Fuga
Guio
o rebanho de ovelhas
Fuga em massa do
País...
Pelos prados verdejantes
Mas que ofensa, gentes
vis!
A nascentes refrescantes.
Quem se sente mal
connosco
Seguem-me em becos e quelhas.
Não nos ama nem tem gosto!
Quem
sou eu? Quando o requeiro,
Fazem-nos ver outro
mundo?
Será resposta: - o pastor!
Sonham outras
perspectivas?
Mas não para o lavrador:
É que alguém outro horizonte
- Deverá ser o carneiro!
Lhes apontou mais rotundo.
É um inimigo que, vivas,
Recolhe e espalha na
fonte
1476
Ciúmes
As marcas da divergência.
Ah! Como em paz se
vivia
Quando Adão voltou a casa
Na homogeneidade sadia!
(Era
já de madrugada)
Mataram-lhes a
inocência...
Eva estava com ciúmes:
Que indecência! Que
indecência!
- Oh, mulher! - diz ele em brasa. -
- No mundo não há mais nada
Que eu e tu! Que é que presumes?!
Simulada, ela achegou-se
==========================================================================================
Junto dele, terna e
meiga,
Com aquilo em que a si visse
Piscando um olho às
estrelas,
E
que de si mais lhe traz:
E logo, atenta, então
pôs-se,
Os tolos com a toleima,
Com dedinhos de
manteiga,
Tais teimosos com a teima.
- A lhe contar as
costelas!
- Tão pouco é que assim se preza
No
bom-humor a esperteza!
1477
Conta
1481
Eu
Há, num povo primitivo,
Duas palavras
apenas
Eu confio, tanto monta...
Para do tempo dar
conta:
Se confias, eu, estrénuo,
De "agora" uma é o
distintivo;
Gritarei que és um ingénuo.
De "agora não" são as
cenas
E, se for ela, é uma tonta!
De quanto outro tempo aponta.
E quem uma
corrobora
Eu
sou calmo, a vida plana...
Logo a outra perde
então:
Se vens calmo do passado,
- O homem lá só quer
"agora"
Direi que és um apagado.
E a mulher, "agora
não"!
Se for ela, é uma banana!
Sou
sensível, em tal óptica.
1478
Se sentes por todo o lado,
Veado
Não
és mais que um agitado.
Ela, então, é uma neurótica!
Veado sou, cornos tenho
E toda a gente mos
vê.
Empenho-me a vida inteira.
Porém, disto o maior
ganho
Se te empenhas é por gozo,
É que os há de tal
tamanho
Não passas dum curioso.
Que o que os tem neles nem
crê
E
ela é uma bisbilhoteira!
E ainda há-de chegar o dia
Em que de tal
desconfia!
Sou poupado, somo a ementa.
Se poupas, velho jarreta,
És um chapado forreta.
1479
E ela é de vez avarenta!
Cornos
Não deixam de usar chapéu
1482
Todos os que têm
cornos,
Prisão
Não têm cabeça ao
léu,
Tão brandos são os
contornos.
Se entrares para a prisão,
Se lá tens de arrancar dentes,
Mais leves são de
trazer
Se, dentre outros acidentes,
Os cornos de quem
julgar
Perdes os dedos da mão,
Que no devido lugar
Jamais os deverão
ter.
Se o apêndice tirares,
O guarda, desconfiado,
Comentará para o lado:
1480
"Este
quer é tomar ares!
Atreitos
O melhor é vigiar:
Por que somos mais
atreitos
Que anda por trás destes fados?
A rir com uma
tolice
- Acho é que ele anda a tentar
Que com atilados
feitos?
Fugir daqui aos bocados!"
É que em nós tudo é sandice
E cada qual se compraz
==========================================================================================
1483
1487
Diferença
Empregado
Se a diferença
procuro
Não
há um empregado
Entre o
presidencialismo
Tão cheio de ideias
E o que é o
parlamentarismo,
A agir no lugar
Isto é o que no fim
apuro:
Como o que ouve ao lado,
Pelas
portas meias,
Naquele é o Ali
Babá
O chefe a chegar!
Que traz quarenta ladrões;
Neste são os malandrões
Que nos vêm dar o
chá.
1488
Infractor
1484
- Viu as setas, infractor?
Reprodução
Se
lho pergunto, são tretas
Os sinais da estrada, alinde-os
Falar de reprodução,
Ou
não para o condutor:
Para um
americano
- As setas?! Lançaram setas?!
É uma
estandardização
Eu nem sequer vi os índios!
De bens na cadeia do ano.
Para o alemão,
porém,
1489
Reprodução é o
produto
Chapéu
Da técnica que intervém
Nas cópias que lhe são
fruto.
Um homem que usa chapéu
Tem ideias abafadas,
Porém, se for um
latino
Abafa no solidéu
Que a reprodução
disser,
Eminências mal sonhadas.
Fala no jeito, no
tino
De possuir a
mulher.
Porém, quem endoideceu
Foi
quem o viu nas estradas:
Na condução, tal sandeu
1485
Não lhe valem nem as fadas
Chama
Nem
fogos de Prometeu!
A chama do amor
inflama,
Só com umas estaladas
À misericórdia
apela,
Que sejam, de bem puxadas,
Mas o amante que tanto
ama
De lhes tirar o chapéu!
Como por amor a chama
Não sofre nem duma vela?
1490
Honesta
1486
Casa
Ela
é uma mulher honesta:
De cada vez, só um amante
Nada obriga tanto um
homem
E sempre um homem que presta,
A fugir de sua
casa
Bem colocado, elegante!
Que as guerras que dentro a
tomem
E, se o marido é encornável,
Num casamento que a
arrasa.
Ao menos ela garante
Que
é dum homem respeitável!
Para alguém sentir
desejo
Gente há muita que não presta?
De ir para um país
estranho
Não, tal não se dá com esta!
Case-se ao mais vago ensejo:
- Logo a fuga é o maior ganho!
==========================================================================================
1491
1496
Almas
TV
Tanta gente cuidando
Não nos dêem a TV que queremos,
De nos salvar as
almas,
Por favor:
As nossas almas quando
- Nós merecemos
Ainda estão por
achar!
Melhor!
Isto vai merecer palmas...
...Quando alguém as encontrar!
1497
Feliz
1492
Manco
Um
casamento feliz
Repousa nalguns segredos.
Se um homem for manco duma
perna,
Se a jantar fora saís
Ainda pode
trabalhar.
Eis
como ambos ficais quedos:
Se for manco das duas, assente no
lugar,
À luz das velas, conversas
Ainda
governa.
Todas as quintas e terças,
Se for das
três,
E, depois, nenhum se cala,
Então é que é de vez...
Cada
qual como lhe aprouve,
Só que, quando um de vós fala,
- O outro não ouve!
1493
Sesta
1498
Uma sesta
regular
Siso
Melhora mesmo a atenção,
A energia sobe a
par
Às vezes será sozinho
E a boa
disposição.
Que preservarás o siso:
Quando
te encontra um dado vinho
Há tanta gente
famosa
Sai o juízo!
Que a sesta sempre cumpriu
Que até Churchill que a bem goza
A Guerra a dormir venceu!
1499
Disfarce
1494
Um ar submisso de benevolência
Fiscais
Mais
um toque paternal
São o disfarce da decência
O melhor é que não
ganho
Em
Portugal!
Para vir ser afectado
Pelas novas leis fiscais.
E o pior é que não
tenho
1500
Que chegue para de
lado
Metade
Pôr todas as leis que tais.
Da vida, metade
Estragam-na os pais.
1495
Mudamos de idade
Tolerância
Mas
não de sinais:
Os
sarilhos
Tolerância e ser humano
Da outra metade
Nunca ligam muito
bem:
São os filhos!
"Não lhe quero causar dano,
O senhor será bacano
Mas é uma besta
também!"
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1501
E possa então, à justa,
Disfarça
Ir
vivendo à tua custa
O entrevistador.
Se um dia Deus se
disfarça
Quem, afinal, fica de lado
De
preto
É o entrevistado.
E nas igrejas representa a farsa:
"Decreto
Que cada branco
vale
1505
Meio
preto.
Conclusão
Arranje-se cada qual
Para conseguir o
céu!"
Quando tiras a conclusão
Sempre isto atestas:
- Senhores, que
escarcéu,
- Como fazer uma revolução
Todos a mudar de
cara
Com
estas bestas?
Como se a cara se mudara!
1506
1502
Rico
Ordens
No mundo rico
Os cristãos criaram
ordens
Ser artista é criminoso:
Para resgatar
escravos
Em arte não verifico
Das mãos dos
infiéis.
Valores que ao rico entroso.
A tanto montam as desordens
Destes
bravos
Porém, algo de
nobre
Em quejandos
papéis:
Com arte ele ainda conota.
- Jamais as ordens
criaram
Agora, ser artista e ser pobre
Que das mãos dos fiéis os
resgataram!
É já de antipatriota!
1503
1507
Sucesso
Mal
Não há um
segredo
Paz à Terra no Natal:
Para o
sucesso
Cantiga de mão estendida
-
Professo,
Não
vão os abandonados,
Sem
medo.
O mal,
E comigo os
mais
Desencaminhar-se na vida,
Que fingem os
sinais
Cair bêbedos de estrados
Do puro
ócio,
Hoje
apenas elevados,
Não vades descrer deste
credo.
Ou tornar-se uns extremistas,
É que o segredo
Comunistas, terroristas,
É a alma do
negócio:
Fundamentalistas,
- Doutro modo, o que
haveria,
Enchendo demais as listas
Entrementes,
Que nos cobrem de pecados.
Em
demasia,
Os danados,
Seriam os
concorrentes!
Se nada houver que os impeça,
Sem
ao menos reparar,
Ainda nos virão cortar,
1504
A nós, tão bons, a cabeça!
Entrevistas
Na
televisão
1508
As
entrevistas
Armazéns
São uma ilusão.
Só dão nas
vistas
Para os grandes armazéns
Para que ligues o
comutador
Há bons natais, maus natais
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E dão sempre seus
améns
Impulsivos, na ressaca,
Aritméticos
demais,
Dá-nos a consciência um murro:
Entendendo, com fervor,
-
Adorámos uma vaca
Que isto reverte em
memória
Ou, pior ainda, um burro!
E glória
Do Salvador!
1513
Requinte
1509
Boca
Se
os mais ricos não houvera,
Que requinte faltaria,
Quem diz o que vem à
boca
Que subtileza morrera!
Fala como quem
despeja,
A
doença é uma alegria
Às baldadas, água suja.
A brotar luxuriante
Toca
No corpo dum homem rico.
Os sinos que houver na
igreja
Como a rosa é mais brilhante
Com dedos em que o
diabo
Do
cancro em corpo elegante!
Sobrepuja.
Qualquer salpico
Ao fim e ao
cabo,
Naquele monte de estrume,
Não é juízo que lhe
noto
Por mal que cheire, é perfume!
Nacabeça
Mais depressa
Parece um cano de
esgoto!
1514
Desculpas
1510
Na incerteza da política
Cotovelos
Há
sempre uma coisa certa:
Para além de toda a crítica
Quem fala por
cotovelos,
Esconde-se a porta aberta
Em lugar de criar elos,
Esbarra com tantas
trancas
A eximir de quaisquer culpas
Que vai dobrar pelas
ancas.
- É a parada
- E acabará, de
vez,
Duma dúzia de desculpas
A pensar com os
pés!
Para ninguém fazer nada!
1511
Fundamentalistas
Com bons
modos,
Sem qualquer gesto terrífico,
Tomemos os fundamentalistas todos
Pelas cidades e aldeias
E metamo-los no frigorífico
- Para arrefecerem as ideias!
1512
Passos
Às vezes,
Ao som duns passos divinos,
Prosternamo-nos, corteses,
Entoando sacros hinos.
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1515
Rico
O rico é um problema insolúvel. Quando quer algo caro para comprar, fica
frustrado:
Jamais encontra jóia nem consciência de estadista que lhe enfrentem a
fortuna!
Pobre rico!
1516
Macacos
Os macacos sempre conversafalaram entre si, na solidausência dos humanos.
Entre os homens, todavia, não macafalam, só guinchuivam
estridulachapadamente:
Desconfissabem que, se profalam uma só palmacacavra, surde logo um homem
que os põe a trabalhoucar.
1517
Verão
O Verão é o tempo em que bebencharcamos chá gelofrescante para nos
refregelarmos,
Por mor do fogalor da camisola que vestencaloramos por mor do frio
Do ar condiciclado que está trabaligado. Porque é Verão.
E porque somos inteligiparvos sem remédio!
1518
Vinho
"O vinho é o teu maior granimigo" - exorlamenta o paspadre.
"Mas o senhor recomanda-nos que amoremos os nossos inimigos..."
"É certade. Mas nunca vos mandei bebengoli-los!"
1519
Dirás
Entrarás em casa, encontrarás tua mulher com o outro, dirás
"desculpem!" e sairás - com todo o savoir-faire.
Ou dirás "desculpem, façam o favor de continuar!" - com maior
savoir-faire ainda.
Porém, se ele continuar depois disto, o savoir-faire dele será máximo
Ou é nenhum, que apenas tu atentas nos sinais que acenam de longe, os que
criam amanhãs.
1520
Políticos
Pesarás as declarações dos políticos quanto fogem à gravidade:
Serão sempre mais leveiras do que pelo volume crerias.
Por isso levam as massas a entrar em órbita: são da qualidade do vazio!
E nós a julgar que a astronáutica era um invento recente!