SEXTO  TROVÁRIO

 

 

RETOMO  A  PAUTA  DO  DEVER

 

 

 

 

 

 

 

Escolha aleatoriamente um número entre 682 e 834, inclusive.

Leia o poema correspondente como uma mensagem particular para o seu dia de hoje.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

682 - Retomo a pauta do dever

 

Retomo a pauta do dever

Em quadras soltas,

Com as rimas a prender

No verso a decorrer

O que é constante em meio às reviravoltas.

 

Em modo lapidar,

Claro e curto,

O verso singular

Reporta-me em que cais estarei surto.

 

E, em jeito adivinho,

Aponta-me, certeiro,

O caminho.

 

O poema em breve, arteiro,

Devém de meus actos um viveiro.

 

 


683 - Momento

 

Mal tu reparas, fatigado

Da demora,

O momento por que tens esperado

É agora!

 

 

684 - Conta

 

Conta de ti o envelhecimento

Tomará em breve

Se já não sentes o embriagamento

De atirar uma bola de neve.

 

 

685 - Poucas

 

Desde que não dês muitas abertas

Às erradas,

Bastam umas poucas coisas certas

Pela vida espalhadas.

 

 

686-Tempo

 

Se nascêramos a saber tudo,

Que faríamos, que faremos

Com todo o tempo miúdo

Que na terra temos?

 

 

687 - Eleva

 

Celebra o que conquistaste,

Mas eleva a fasquia

Quanto baste,

Quando a vitória te inebria.

 

 

688 - Segurar

 

O homem é refém

Da própria identidade:

Quando quer segurar alguém,

Tem de lhe dar liberdade!

 

 

689 - Aprendizagem

 

A aprendizagem ao que exorta

É ao caminho.

O professor abre a porta,

Mas terás de entrar sozinho.

 

 

690 - Pisadas

 

Respeita inteligente os chãos

Que inteligente te geraram:

Não procures as pisadas dos anciãos,

Procura o que eles procuraram.

 

 

691 - Fado

 

Ao fado a que me inclino

Que importa meu pró, meu contra?

Não procures teu destino

Porque ele é que fatal te encontra.

 

 

692 - Tarefa

 

A tarefa que está perante mim

É trabalhar pela vida apaixonado

Sem nunca me aprisionar, ao fim,

Ao resultado.

 

 

693 - Empolar

 

Empolar as grandezas da grei,

Orgulhar-me dos ramos?

- É difícil viver na terra do não-sei,

Mas é aqui que todos nós estamos.

 

 

694 - Existência

 

Não há existência que nos conforte

Se não temos medida:

O medo exagerado da morte

Leva ao medo exagerado da vida.

 

 

695 - Altura

 

Poderei concomitantemente

Viver e à morte me abandonar

Quando, finalmente,

A hora derradeira chegar.

 

 

696 - Objecção

 

Se toda a objecção possível

Antes houvera de ser superada,

O mais credível

É que ninguém faria nada.

 

 

697 - Pessimista

 

Pessimista que protesta e se defende

Não pode ser pessimista.

O optimista esperançado é que luta e se não rende

À adversidade que contra ele invista.

 

 

698 - Operam

 

Os que operam bem e do mundo bem auferem

São os que de manhã tentam

Encontrar as conjunturas que querem

E, se as não encontram, as inventam.

 

 

699 - Superar

 

Para superar a adversidade

É muito útil vasculhar no arquivo

Para encontrar nela, com veracidade,

Algum aspecto positivo.

 

 

700 - Remédios

 

Obre a droga quanto obrar

Dos remédios em virtude,

As ânsias de me curar

São metade da saúde.

 

 

701 - Acender

 

Não invejes uma estrela

Como inveja a multidão:

Melhor é acender a vela

Que culpar a escuridão.

 

 

702 - Brilha

 

É fácil rir dum abismo

Quando sobre ele tens rédea.

O verdadeiro optimismo

Brilha apenas na tragédia.

 

 

703 - Prazer

 

Se o melhor prazer será

Aquele que imaginamos,

Lembra-te que ocorre já

O mesmo no pior dos danos.

 

 

704 - Benefício

 

Benefício grande aguarda

Quem descobrir o segredo

Da oportunidade à guarda

Da crise que mete medo.

 

 

705 - Preso

 

Não faz bem nenhum

Viver preso ao passado:

Interessante é a vida demasiado

Para vivê-la em jejum.

 

 

706 - Contra

 

Quando contra nós mesmos nos viramos

É difícil não acreditar

Que toda a gente com quem nos damos

Também contra nós há-de estar.

 

 

707 - Bagagem

 

Viajar com pouca bagagem simplifica a vida:

Nunca devemos ligar-nos a nada

Que possa, em qualquer medida,

Vir a ser-nos uma jóia roubada.

 

 

708 - Mudar

 

Não podemos mudar nada do que ocorreu,

Não temos poder sobre nenhum outrora,

Apenas o do que farei eu

Com isso, agora.

 

 

709 - Desenfreado

 

Vigia bem como corres teu presente,

O que te ganha teu suor:

Afinal, desenfreado sempre em frente,

Perdes muito do que ocorrer em teu redor.

 

 

710 - Resto

 

Não fiques no lugar

Quando a vida te mantiver refém.

Quando algo mudar,

Todo o resto mudará também.

 

 

711 - Coragem

 

Quem tiver confiança bastante

Para alguma coisa tentar,

Tem de ter coragem suficiente, adiante,

Para fracassar.

 

 

712 - Dentro

 

Por que desperdiçamos

O que dentro de nós sempre há-de estar?

Por que tanto tempo esperamos

Para aceitar?

 

 

713 - Vive

 

Que teu dia seja nédio

Em gestos que desata.

Vive sem tédio,

Que o tédio mata.

 

 

714 - Morrer

 

À guerra jamais

Irás fadado:

És sempre jovem demais

Para morrer como soldado.

 

 

715 - Desembarca

 

Na vida embarcaste

E chegaste ao porto,

Ao cais abordaste:

- Desembarca, morto!

 

 

716 - Aprovação

 

Não prestes nunca atenção

À aprovação que vir pode

De quem nem satisfação

Consigo próprio lhe acode.

 

 

717 - Universal

 

Acolhe-te sob o tecto

Dum universal sentido:

O que é preciso é ser recto,

Não, ter de ser corrigido.

 

 

718 - Vigia

 

Vigia o que te falseia

E contra os mais te aconselha:

O que é inútil à colmeia,

Útil não é para a abelha.

 

 

719 - Golpe

 

Arte de viver com luta:

Um par que entre si se entrança,

Sempre em guarda, na disputa

Contra o golpe que o alcança.

 

 

720 - Importa

 

Acerca do homem de bem

Pouco importa discorrer,

Importa, bem mais além,

Antes deveras o ser.

 

 

721 - Fome

 

A fome já dá chicotadas

À miséria bastantes.

Por que é que lhe querem dar mais bastonadas

Os circunstantes?

 

 

722 - Moldam-se

 

Nunca os homens cidadãos

Hão-de nascer: com efeito

Moldam-se tais quais às mãos

De quem os molde a preceito.

 

 

723 - Depõe

 

Ninguém deve fazer guerra

Senão tendo em vista a paz:

Germinando esta na terra,

Depõe as armas, tenaz!

 

 

724 - Dominação

 

Todos os que se orgulharem

Com dominação temíveis

Devirão quando, ao se olharem,

Não temerem, de impuníveis.

 

 

725 - Sonhos

 

Em sonhos a divagar

Nada iremos resolver

Se esquecemos devagar,

Em vez deles, de viver.

 

 

726 - Mestres

 

Serão o trabalho duro

Mais um ror de sofrimento

Os mestres com que eu auguro

Que transponho o mau momento.

 

 

727 - Nome

 

Usa sempre o verdadeiro

Nome que as coisas tiverem:

Receando o nome me abeiro

Dos medos que nele ferem.

 

 

728 - Escolhas

 

Mais do que capacidades

São escolhas, ao invés,

Que mostram, pelas idades,

Quem na verdade tu és.

 

 

729 - Carácter

 

O carácter conhecer

De alguém com veros sinais

Do inferior seu trato é ver,

Não o trato com iguais.

 

 

730 - Pureza

 

Não paga a quem nela pasce

Pureza de sangue a jorna.

Que importa com que se nasce?

- Importa é no que se torna!

 

 

731 - Desprovido

 

Quem sem arrependimentos

Viver, mais do que incomum,

Desprovido é dos talentos

De qualquer senso comum.

 

 

732 - Embate

 

Limpa do embate as esquírolas,

Ruma em frente um passo mais.

A vida é série de vírgulas

E não de pontos finais.

 

 

733 - Lado

 

O nosso lado mais forte

Identificar é importante

Como o mais fraco: são norte

Do que nos ocorra adiante.

 

 

734 - Nunca

 

Quem diria que assente

A palavra que nunca cheguei a dizer

Tão pesadamente

Em quenquer?

 

 

735 - Valham

 

Que teus dias valham a pena!

Não invistas todo o esforço no ausente

Futuro que te acena:

Vais perder demasiado do presente!

 

 

736 - Princípio

Se quiseres receber,

Este é o princípio cimeiro

Do que aprende a bem viver:

- Hás-de ter de dar primeiro.

 

 

737 - Deixes

 

O que não podes mudar

Não deixes que, na demora,

Te acabe por arruinar

Aquilo que tens agora.

 

 

738 - Vadiar

 

É sempre melhor dizer

Na cabeça o que anda à solta

Do que deixá-lo quenquer

Vadiar perdido em volta.

 

 

739 - Saudáveis

 

Aquele que for saudável

Saudáveis pessoas forma.

Um líder que é bom, fiável,

Forma líderes por norma.

 

 

740 - Discrimino

 

Quando discrimino alguém,

Diminuo-o até ao fim;

Se o sobrevaloro além,

Diminuo-me é a mim.

 

 

741 - Palco

 

No palco, a cena ao abrir,

Entra com voz decidida:

Ninguém pode dirigir

Por ti a peça da vida.

 

 

742 - Líder

 

Abandona cada dia

A plateia, trepa ao palco

Da mente que te anuncia,

Sê o líder, tu, que decalco!

 

 

743 - Queixas

 

Todas as queixas acabam

Por se tornar um veneno

De auto-estima onde desabam,

Tornam o grande pequeno.

 

 

744 - Escravo

 

A beleza está nos olhos

Daqueles que a contemplarem.

Não seja escravo de abrolhos

Do que os média lhe inculcarem.

 

 

745 - Sono

 

Arreda-me o contratempo

De meu sono e meu lugar.

Dormir não é perder tempo,

Antes é meu tempo achar.

 

 

746 - Atitude

 

Amar e ajudar alguém

É uma atitude saudável;

Viver dele a dor, porém,

É doença inevitável.

 

 

747 - Senhor

 

Ser livre para pensar

E nunca de pensamentos

Ser o escravo singular

É ser senhor dos momentos.

 

 

748 - Gastar

 

Desgraça o mundo falaz

Mais gastar do que auferia.

Sábio é quem muito faz

Pouca gastando energia.

 

 

749 - Pouco

 

Pouco importará mudar

Todo o mundo exterior

Se o interior não trocar

Primeiro como em mim for.

 

 

750 - Liberte

 

Liberte a criança alegre

Que dentro de si morar

E que singela o integre

No verdadeiro lugar.

 

 

751 - Refém

 

Gerir a própria emoção

É ser livre de sentir,

Nunca refém sendo então

Do sentimento que haurir.

 

 

752 - Caixote

 

Nunca faças da emoção

O caixote de despejos

De teus problemas em vão:

- Protege antes teus harpejos!

 

 

753 - Radica

 

Dum homem sabedoria

Não radica em não errar

Mas em erro próprio usar

De alicerce a um novo dia.

 

 

754 - Liberta

 

Liberta a criatividade,

Da rotina sai das pistas:

Gesto simples que te invade

Traz-te então grandes conquistas.

 

 

755 - Crítica

 

Pouco a crítica contém

Sem outrem minimizar.

Nunca critique ninguém

Sem antes valorizar.

 

 

756 - Mostra

 

Não devemos ter vergonha

De nossas fragilidades:

O forte mostra a peçonha,

Só o fraco esconde as verdades.

 

 

757 - Ensina

 

A vida é uma grande escola

Mas pouco ensina se enfuno

De vento a minha sacola,

Se não sei ser bom aluno.

 

 

758 - Antecipa-te

 

Antecipa-te às mudanças,

Não deixes teus gestos perros.

Melhor que corrigir erros

É prevenir os que alcanças.

 

 

759 - Acontece

 

Em vez de ser sonhador,

Marca o ponto na cidade:

Se és um empreendedor,

Crias a oportunidade.

 

 

760 - Usá-lo

 

É muito fácil criar

Deus à imagem, semelhança,

E usá-lo a atemorizar

E controlar quem se alcança.

 

 

761 - Órbita

 

Em órbita doutrem não gravites

E na tua em que te enroles

Outrem que concites

Jamais controles.

 

 

762 - Antes

 

Antes de agir

Deves pensar, cada dia.

Quem sem pensar reagir

Dispara sem pontaria.

 

 

763 - Vítima

 

Seja o autor,

Não a vítima inglória

Ao sabor

Da própria história.

 

 

764 - Medo

 

O medo da dor aumenta

Qualquer dor que te ferir.

Antes, pois, a dor enfrenta,

Em lugar de à dor fugir.

 

 

765 - Morte

 

Do império findo o poder,

Na morte com nada fico.

Que é que me adianta ser

Do cemitério o mais rico?

 

 

766 - Escorço

 

Nada se faz sem esforço,

Mas o escorço que me apraz

Não se faz rasgando o torso:

O esforço, a sós, nada faz!

 

 

767 - Perde

 

Não se perde, nem longe nem perto,

Quem seguir com fugaz desatino.

Só se perde quem tem rumo certo,

Só se perde quem cumpre um destino.

 

 

768 - Ganância

 

De sobrevivência instinto

Nunca chega aos calcanhares

Da ganância no alto plinto

Que mundo fora encontrares.

 

 

 

769 - Omitir

 

Omitir a protecção

É malefício final

Tão enorme, tão malsão

Como praticar o mal.

 

 

770 - Luz

 

Pensa a luz, que quem luz pensa

Não sofre eterna recusa.

Nunca a sombra recompensa

Servos dela, antes os usa.

 

 

771 - Alegria

 

De armadilhas sob o império,

É triste viver à toa.

A alegria é o que é mais sério

Na vida duma pessoa.

 

 

772 - Dons

 

Quem cuide ganhar a vida

Por dons mentais alegados

De certeza que em seguida

Defrauda mil enganados.

 

 

773 - Atingir

 

Busca atingir excelência

Com a humildade da infância,

Que a sombra da competência

É a arrogância.

 

 

774 - Meio

 

O meio é que engendra o fim:

O objectivo imaculado

Só pode atingi-lo, assim,

O meio mais depurado.

 

 

775 - Desconfia

 

Desconfia das promessas,

Apenas crê nas acções,

Que as mentiras pedem meças

Das promessas aos festões.

 

 

776 - Vitórias

 

O melhor que haja a fazer

Com as vitórias mais belas

Humildemente há-de ser,

Muito à cautela, esquecê-las.

 

 

777 - Primor

 

Sempre o primor dos primores

Negro pormenor vai ter

E são sempre os pormenores

Que acabam por nos perder.

 

 

778 - Alarmes

 

Mil falsos alarmes são

Um bem deveras melhor

Que a sério nenhum, então,

Quando tudo a sério for.

 

 

779 - Conforme

 

A pena vale pregarmos

Nosso valor mais profundo:

É conforme acreditarmos

Que assim há-de ser o mundo.

 

 

780 - Retardar

 

Não tentes, contra o destino,

Retardar o sofrimento:

Só te condenas, mofino,

Ao dobro que evite o intento.

 

 

781 - Cuidado

 

Com aquilo que desejas,

Cuidado, toma sentido,

Pois há-de ser quanto almejas

De certeza concedido.

 

 

782 - Sombras

 

As palavras que dizemos

São sombras do que há-de vir:

Quando as dizemos, faremos

Que aconteçam a seguir.

 

 

783 - Pena

 

O mundo sempre há mudado:

Vale a pena revoltar-se

Pelo que petrificado

Não será nem que me esgarce?

 

 

784 - Reputações

 

Reputações de mil anos

Destruímo-las agora,

Do efeito dos desenganos,

Por condutas duma hora.

 

 

785 - Copo

 

As palavras me repito:

Tenho o copo meio cheio.

Para me lembrar, contrito,

De quanto bem me permeio.

 

 

786 - Lição

 

A vida, quando se apura,

Esta lição me há-de dar:

A única via segura

É arriscar.

 

 

787 - Inverter

 

Da vida o grande escopo

É o de inverter o mundo

Que enriquece no topo

E escraviza no fundo.

 

 

788 - Mal

 

Falar dum mal serve apenas,

Ao torná-lo assim desperto

Da vida por entre as cenas,

Para o chamar para perto.

 

 

789 - Mantém-te

 

Mantém-te a ti próprio fiel.

Se o coração que te sente

Conheces, de amigo o mel

Em ti tens que nunca mente.

 

 

790 - Caçador

 

Caçador que se elogia

Demais ao amanhecer

A panela vê vazia

Mais tarde ao anoitecer.

 

 

791 - Fogo

 

Os da ganância levados,

Treda e fria conselheira,

São dos do fogo ateados

Da liberdade a má leira.

 

 

792 - Seguro

 

Mais seguro, no conflito,

É nada dizer, calado.

Aquilo que não é dito

Não é jamais lamentado.

 

 

793 - Indubitavelmente

 

O que alguém merece neste mundo obter

Nunca o logrará ninguém,

Mas deve indubitavelmente merecer

Tudo aquilo que obtém.

 

 

794 - Vitórias

 

Pequenas vitórias são

Com que há que, às vezes, contar.

E tudo às vezes serão

De que iremos precisar.

 

 

795 - Correntes

 

Prisioneiro em qualquer norte,

Sonharei com não ter amos,

Mas as algemas mais fortes

São sempre as que nós forjamos.

 

 

796 - Actividade

 

O melhor dos tratamentos,

Aos do corpo bem contrário,

Do íntimo para os tormentos,

Da actividade é o rosário.

 

 

797 - Escolha

 

Se inviável for me opor,

Ir morrer inutilmente

É escolha de só propor

Quem é estúpido ou demente.

 

 

798 - Persigo

 

Sempre do castigo o medo

É mais eficaz abrigo,

Quando persigo o sossego,

Do que o é o próprio castigo.

 

 

799 - Esperar

 

Esperar demasiado

Ninguém deve nos covis,

Mas o agir mal precatado

É próprio só de imbecis.

 

 

800 - Dominar

 

Ninguém, pioneiro,

Pode o mundo dominar

Sem se dominar primeiro

A si próprio, pedra angular.

 

 

801 - Inútil

 

Se em alma não residir

Virgindade,

É inútil persistir

Em vigiar o corpo a que não agrade.

 

 

802 - Guerra

 

Apenas os que no coração e nos lábios

A guerra vivem a odiar e temer

São bastante sábios

Para a combater.

 

 

803 - Desonra

 

A desonra ao herói feita

Desonra quem a comete,

Não a vítima a que estreita

A glória que lhe compete.

 

 

804 - Tarde

 

Na pressa que nos atrasa

Não mora equilíbrio algum:

- Melhor é chegar tarde a casa

Que cedo a lugar nenhum.

 

 

805 - Simples

 

De coisas simples a vida

É feita e findo cansado

De tantos anos de lida

Buscando nem sei que dado.

 

 

806 - Entrega

 

Olha a razão de viver,

É tua entrega mais louca,

Aquela em que nem sequer

Vais desejar nada em troca.

 

 

807 - Vítima

 

Quem de vítima vestir

A pele de dor e de asco

De poder anda a investir

Quem se quer tornar carrasco

 

 

808 - Evitando

 

Quando alguém nos elogia

É que há que ficar atento,

Evitando a fantasia,

Ao nosso comportamento.

 

 

809 - Fugir

 

Qualquer pedrisco me ajuda

A fugir da realidade

Buscada, quando ela acuda,

Se eu a temer de verdade.

 

 

810 - Infinito

 

Devo ser como o deserto

Vazio, infinito e cheio

De vida: não longe, perto,

Não no arrabalde, no meio.

 

 

811 - Precisamos

 

Precisamos de esquecer

Aquilo que ser achamos

Para que deveras ser

O que nós somos possamos.

 

 

812 - Escuro

 

Não é olhando para a luz

Que devirei luminoso,

Mas no escuro, em contraluz,

Ao mergulhar doloroso.

 

 

813 - Encararmos

 

Se encaramos um problema,

Damos conta de ser mais,

Bem mais capazes, por lema,

Do que cuidámos jamais.

 

 

814 - Infalível

 

Infalível ninguém tem

De ser quando confiamos

Na boa vontade e, além,

Mutuamente a partilhamos.

 

 

815 - Fazer

 

Se a vida vos der limões,

Devem fazer limonada

E quem tem outras funções

Busquem para a desgarrada.

 

 

816 - Sê

 

Sê teu verdadeiro eu,

O que és tu, sem alibi,

Sem manto de fariseu,

- Não o que fazem de ti!

 

 

817 - Destruir

 

Um pequeno pormenor,

Mesmo bem intencionado,

Destruir pode em redor

Tudo quanto houver tocado.

 

 

818 - Atinge

 

Se algo quiser conseguir,

Olho aberto, alvo fisgado,

Saiba o que quer atingir:

- Nada atinge o olho fechado!

 

 

819 - Domínio

 

Se o domínio tem lugar,

Não é por força dum credo:

Para um homem dominar

Alguém fez que tenha medo.

 

 

820 - Continuar

 

Quanto mais vezes falhar

E continuar, decidido,

A tentar, tentar, tentar,

Mais será bem sucedido.

 

 

821 - Lutar

 

Será sempre decidir

Não lutar, furtando a cota,

A forma de garantir

Única a fatal derrota.

 

 

822 - Planeia

 

De cima a baixo

Planeia firme teu ano,

Mas sabe que o primeiro a ir abaixo

É teu plano.

 

 

823 - Regras

 

Para as regras esquecer

É conhecê-las primeiro,

Respeitar-lhes o saber,

Ir além, por derradeiro.

 

 

824 - Bicicleta

 

A bicicleta do intento

Tem veloz, na vida ao ir,

Que, se pára o movimento,

Vais acabar por cair.

 

 

825 - Mudança

 

A mudança só acontece

Se eu ao contrário fizer,

Contra o costume que tece

A teia que me tolher.

 

 

826 - Trepa

 

Mede o que perde e o que ganha

A pegada que te falta,

Ninguém trepa a uma montanha

Para saber que ela é alta.

 

 

827 - Surto

 

Fica o barco mais seguro

Quando está surto no porto,

Mas para quê tanto apuro

Para destino tão morto?

 

 

828 - Ofuscada

 

Ofuscada por inteiro

É toda a sabedoria

Pelo brilho traiçoeiro

Da vaidade que a esvazia.

 

 

829 - Força

 

Porque temos de escolher,

A força de que dispões

Em ti mora ou em quenquer

No poder das decisões.

 

 

830 - Escolhas

 

Embora na rua a andar,

Quem escolhas não fizer,

Pouco importa respirar,

- Acabou já de morrer.

 

 

831 - Medo

 

O medo vai até onde

O inevitável começa.

Depois requer que eu o monde,

Perde o sentido que meça.

 

 

832 - Tendência

 

Pouco importa se é credível,

Se te encaram com sarcasmo.

Como alcançar o impossível?

- Com entusiasmo.

 

 

833 - Perda

 

Nunca um homem apagar

A dor duma perda pode,

Mas supera-a ao se alegrar

Se um ganho fugaz lhe acode.

 

 

834 - Buscar

 

Todo aquele que é valente,

Em vez de buscar o gozo,

É mas é mais persistente:

Todo o valente é um teimoso.