SÉTIMO  TROVÁRIO

 

 

TAL  DO  COTIO  O  QUE  FOR

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Escolha um número aleatório entre 671 e 850 inclusive.

 

Descubra o poema correspondente como uma mensagem particular para o seu dia de hoje.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

671 – Tal do cotio o que for

 

Tal do cotio o que for

Em cantos mil celebrado,

Em quadras meras vou pôr

Aqui quanto tem valor,

Que ao acaso for topado.

 

Retratar o dia a dia

No modelo mais comum

Da popular quadra guia

Quem ouvido quer algum.

 

São lemas de cada hora,

De roteiros o resumo

Em que a vida se demora,

 

No termo breve eis o sumo

Que vida fora consumo.

 

 

672 – Metade

 

Se metade eu fora

Do que julgo ser,

Era o dobro agora

Do que era quenquer.

 

 

673 – Consistente

 

Ser consistente nos actos

Ao educar, isto ensina:

Faz a criança, ante os factos,

Ganhar auto-disciplina.

 

 

674 – Lembra-te

 

Lembra-te de que o respeito

É rua com dois sentidos:

Recebemos, neste pleito,

O que damos, comedidos.

 

 

675 – Menos

 

Aquele que for capaz

De resolver o problema

Sempre é menos eficaz

Que o que o evita por lema.

 

 

676 – Mostram

 

Serão as nossas escolhas,

Mais que as nossas aptidões,

Que mostram, entre as recolhas,

O que somos, sem senões.

 

 

677 – Requerido

 

Para ter conhecimento

É requerido estudar;

Se a sabedoria tento,

Então terei de observar.

 

 

678 – Silêncio

 

O silêncio é de oiro quando,

Apesar de toda a aposta,

Não nos ocorre, pensando,

Nenhuma boa resposta.

 

 

679 – Verdade

 

A verdade nunca vem

Bater à porta do tolo,

A verdade sempre tem

De cair em fértil solo.

 

 

680 – Poder

 

O poder do jornalista

Não é de pôr a pergunta

Mas o de a resposta em vista

Exigir que nela assunta.

 

 

681 – Poesia

 

É na admiração completa

Que as dúvidas se consomem:

Prova a poesia, repleta,

Toda a existência do Homem.

 

682 – Livre

 

O que fatal se impuser

Acolhe sereno, admite-o.

Livre é o mar de se mover,

Mas não de mudar de sítio.

 

 

683 – Cidadania

 

No canto a que pertencermos

A cidadania é o que há-de

Dar-nos a oportunidade

De a diferença fazermos.

 

 

684 – Tentando

 

Mais vale o mundo enfrentar

Em nome da consciência

Que esta enfrentar em carência

Tentando ao mundo agradar.

 

 

685 – Sabe

 

Nada é mais frustrante

Do que argumentar

Com quem sabe, instante,

Do que está a falar.

 

 

686 – Ocasião

 

Sempre que estiver no escuro,

Oportunidades reais

De excelência configuro

Para que a luz brilhe mais.

 

 

687 – Enérgica

 

Uma enérgica vontade

É garantia, de entrada,

Da esperança que me invade

Já meio realizada.

 

 

688 – Sorte

 

Uma sorte de momento

Vai ao fantástico alçar-nos.

De anos o desbastamento

Em úteis vai transformar-nos.

 

 

689 – Tempo

 

Sempre o tempo é como o vento,

Tudo o que é leve ele faz

Varrer da frente a contento,

Deixa o consistente atrás.

 

 

690 – Privado

 

Ser menos privado às vezes

É ter mais privacidade:

É sermos nós nos reveses

Com toda a autenticidade.

 

 

691 – Conquista

 

Do grande homem um favor,

Se não conquista um amigo,

Pode estar certo e supor

Que arranja muito inimigo.

 

 

692 – Lábio

 

Com vícios mui refinados

Decerto o lábio se apraz,

Mas tais cafés bem tirados

Deixam sempre borra atrás.

 

 

693 – Segundo

 

Quando alguém persiste, insiste

Contra qualquer argumento,

Muitas vezes não resiste

A um igual segundo intento.

 

 

694 – Multiplicas

 

Estás-me a fazer feliz

E a felicidade incides

No mistério que me diz:

- Multiplicas se divides!

 

 

695 – Descobre

 

Descobre o que te demora

Tanto e que te põe de pé:

A verdade apenas mora

No lugar onde houver fé.

 

 

696 – Entusiasma

 

Quando com alguém converso

E me entusiasma o assunto,

Falo até do que nem verso:

- Alguém fala em mim por junto!

 

 

697 – Esconde

 

Dele na sabedoria,

Deus ao Inferno, conciso,

Esconde, para vigia,

No meio do Paraíso.

 

 

698 – Escravos

 

Doutrem não busques abonos.

Somos, arroteando as lavras,

De nosso silêncio donos

Como escravos das palavras.

 

 

699 – Perigosa

 

Quando a verdade delira,

Se mentes, olha os extremos:

É perigosa a mentira

Que a nós próprios nos dizemos.

 

 

700 – Integridade

 

Integridade é fazer

Aquilo que estiver certo

Mesmo sem ninguém a ver

Nem de longe nem de perto.

 

 

701 – Política

 

A política melhor

É a melhor sinceridade

Mas ficar calado um ror

Às vezes mais persuade.

 

 

702 – Etiqueta

 

Em etiqueta quenquer

Não ter teme o que convém.

A sério classe é fazer

Os outros sentir que a têm.

 

 

703 – Igual

 

Àquele que honre e respeite

Os outros alguém convoca.

- Mas vai dar-lhe igual aceite,

Paga-lhe este o mesmo em troca?

 

 

704 – Ligar

 

Ser nesta vida feliz

É com o porvir demais

Não me ocupar e ao que fiz

Outrora não ligar mais.

 

 

705 – Vulcão

 

Do vulcão do mundo

Não temas as fissuras,

Quem não bate no fundo

Não trepa às alturas.

 

 

706 – Finjo

 

Eu finjo que me conheço

E, depois de fingir tanto,

Conheço que não conheço,

Do que conheço me espanto.

 

 

707 – Sombra

 

Nós da sombra precisamos,

Da treva que, em contraluz,

Mostre a espessura dos ramos,

Dê relevo à nossa luz.

 

 

708 – Essencial

 

Das coisas a natureza

Essencial que poucos gabam:

Têm começo, de certeza,

E, por isso, um dia acabam.

 

 

709 – Sensações

 

Caim e Abel todos conhecem,

De Seth ninguém irá falar:

Só sensações, pois, apetecem

Ao homem desde o madrugar.

 

 

710 – Furto

 

Se o pensamento condensa,

A furto, nossa matriz,

Não diga tudo o que pensa

Mas pense tudo o que diz.

 

 

711 – Meia

 

Se for meia liberdade

Quanto propugnar, em suma,

Acabo, em qualquer idade,

Sem liberdade nenhuma.

 

 

712 – Apure

 

Apure bem o que diz,

O que oferta na embalagem.

Oiça o cliente infeliz,

É a fonte da aprendizagem.

 

 

713 – Destrói

 

Mais atrás, mais adiante

De novo a questão se assunta,

A resposta interessante

É a que destrói a pergunta.

 

 

714 – Fama

 

A fama tem quatro letras,

Par de fita, cara ou vida.

De quanto nelas soletras

Dentro importa é o que em ti lida.

 

 

715 – Tu

 

És tu teu melhor amigo,

Teu mais próximo aliado,

Comparsa teu, leal abrigo,

E o consultor mais chegado.

 

 

716 – Tradições

 

As tradições são balizas

Instaladas dentro e fundo.

Mais poderosas as gizas

Se as nem suspeitas no mundo.

 

 

717 – Criança

 

A criança uma energia

Tem muito mais poderosa

Após brincar todo o dia

Que após o sono que goza.

 

 

718 – Portas

 

Na vida, quanto fizer

São portas que fecho ou abro,

Tudo só para conter

Tudo o que for descalabro.

 

 

719 – Escola

 

Todos nós matriculados

Na escola andamos da vida

Onde o tempo, em anos dados

De aula, é o mestre que em nós lida.

 

 

720 – Treina

 

Carácter é o que requeres

Da vida para os intentos.

Contrata então caracteres

Mas treina depois talentos.

 

 

721 – Génio

 

Um génio sempre contém

As próprias limitações.

Quanto à estupidez, porém,

Não sofre de tais senões.

 

 

722 – Acorrentada

 

Qualquer preocupação

Mora bem longe, afinal,

Acorrentada à emoção,

Da lógica racional.

 

 

723 – Garrafa

 

Garrafa meio vazia

Também fica meio cheia.

Mentira nunca seria,

Contudo, verdade meia.

 

 

724 – Recifes

 

A pobreza e a riqueza

São dois recifes no estreito.

Feliz de quem remar preza

Entre ambas no fundo leito!

 

 

725 – Algo

 

O que algo torna especial

Não é o que houver a ganhar

Mas também e por igual

O que a perder se arriscar.

 

 

726 – Atentar

 

A vida como depressa

Corre se não dou por ela

E quão devagar tropeça

Se lhe atentar na sequela!

 

 

727 – Esquecerem

 

Importa a funda memória

No bem e mal que perfila:

Aos que esquecerem a história

O fado é de repeti-la.

 

 

728 – Liberdade

 

Nunca saberá, nos cantos

Dos resignados assente,

Da liberdade os encantos

O escravo, mesmo contente.

 

 

729 – Precede

 

O instante delicioso

Precede a felicidade.

Felicidade que gozo

Não o alcança de verdade.

 

 

730 – Depressa

 

Quando vivo entre os pequenos

O que depressa me toca

É que dos grandes os trenos

São o que ao fim me sufoca.

 

 

731 – Fere

 

Não sinto o peso à grilheta

Se o carrasco a bem seguir,

Mas como fere, indiscreta,

Se eu resisto e vou fugir!

 

 

732 – Século

 

Vive teu século, vive,

Mas repara em que figura,

Não sejas só quem convive,

Dele apenas criatura.

 

 

733 – Naufrágios

 

A falta de rumo teme,

Que dali naufrágios colho,

Se à barca não rege o leme,

Então é que a rege o escolho.

 

 

734 – Promessas

 

As promessas custam menos

Que um presente e valem mais:

Jamais bens dareis mais plenos

Que quando esperança dais.

 

 

735 – Cultivada

 

Rapariga ajuizada,

Cultivada na ignorância,

É a que nunca sabe nada,

Sábia só da eterna infância.

 

 

736 – Olhando

 

Olhando o que fica em frente

Durante tempo demais

Já não vejo o que apresente.

Quem me dá dele sinais?

 

 

737 – Respirar

 

A boa conversação,

O ar fresco do pensamento,

É que vale a pena, são,

Respirar cada momento.

 

 

738 – Perigo

 

Sempre o perigo atraiu,

É vida que vale a pena.

A segurança é fastio,

À morte imbecil condena.

 

 

739 – Guerra

 

A guerra é sempre uma cobra

Que usa nossos próprios dentes,

À medida que se dobra,

A nos morder, entrementes.

 

 

740 – Inveja

 

Quem não tem nada não chama

Nunca a inveja de ninguém.

Melhor sentinela – clama –

É nem portas ter também.

 

 

741 – Ideias

 

As ideias pouco nascem

Na cabeça inteligente.

Rodam, fumos soltos, pascem,

Buscam sua própria mente.

 

 

742 – Pedra

 

Esta pedra em que me sento

Parece morta, mas não.

Vive escusa, lento e lento,

Tal qual eu no coração.

 

 

743 – Dor

 

A dor singela revela

A fundura da maleita:

A dor é aquela janela

Donde a morte nos espreita.

 

 

744 – Escoar

 

Vamo-nos chegando à morte,

Rio a se escoar no mar:

Ainda um nada nasce à sorte,

Já o resto ei-lo a se findar.

 

 

745 – Costura

 

Nenhum rio nos separa,

Antes costura os destinos

Dos vivos que alimentara

De fios de água cristalinos.

 

 

746 – Esperto

 

À esperteza não me liga

A fúria de nenhum credo.

Esperto é o mar, que não briga,

Antes abraça o rochedo.

 

 

747 – Nada

 

Numa terra de miséria

Um nada faz muita inveja,

Pois ao coxo inveja à séria

Quem paralítico seja.

 

 

748 – Riqueza

 

A riqueza é como o sal

A vida humana ao cruzar,

Não é por si bem nem mal,

Serve para temperar.

 

 

749 – Recomeçara

 

Se eu recomeçara a vida,

Queria-a tal como foi,

Mas abriria à medida

Os olhos ao que me rói.

 

 

750 – Lançado

 

Um termo lançado ao vento

Pode mudar uma vida.

Sei lá que poder invento

A influir noutro em seguida!

 

 

751 – Agnóstico

 

Um agnóstico concorre

A aclarar o que demande:

Quando um agnóstico morre

Vai para a dúvida grande?

 

 

752 – Raiva

 

Por dentro muito há quem arda.

Controlo a raiva por fora,

Mas tenho de pôr-me em guarda,

Que por dentro é que demora.

 

 

753 – Máscara

 

Não há máscara que gizes

Que não doa quando grade:

Há mentiras com raízes

Mais fundas do que a verdade.

 

 

754 – Pior

 

O que há de pior no mundo

É não haver outra vida

E passar esta, no fundo,

A arremedá-la em seguida.

 

 

755 – Tentação

 

O poder mata, real,

Mesmo aquilo que o não quer:

Das igrejas todo o mal

É a tentação do poder.

 

 

756 – Brade

 

Sobre os homens não há um erro

Profundo, que brade aos céus,

Que não se ligue, no aterro,

A um erro igual sobre Deus.

 

 

757 – Contrários

 

Não pode uma ocasião

Conter contrários sentidos:

Igreja que é de excluídos

Não pode ser de exclusão.

 

 

758 – Vivam

 

Que os homens vivam é glória

De Deus (são dele os exemplos),

Não que em perpétua memória

Lhe prestem culto nos templos.

 

 

759 – Luxo

 

Ninguém consegue impedir

Que ao luxo do rico veja

O pobre que há-de sentir

Que o rico ao lixo o despeja.

 

 

760 – Ateu

 

Um ateu de nobre exemplo

Liberta Deus das igrejas,

Da religião, do templo,

- Fica Deus tal como o almejas.

 

 

761 – Contraditor

 

Há o contraditor levado

A apagar a luz, a ver

Se não vai ser avistado

O que sombra lhe fizer.

 

 

762 – Sempre

 

Um poeta é sempre paz,

Como o pão é de farinha,

E sempre o lobo, tenaz,

A morder nele amarinha.

 

 

763 – Partem

 

Os que partem quando estamos

Do lugar longe onde morrem,

Morrem menos: continuamos

Tais  quais a ver que em nós correm.

 

 

764 – Humildade

 

Nunca aprendemos bastante

A humildade, que o orgulho

Se nos encastela diante,

Na humana dor não mergulho.

 

 

765 – Cientista

 

Dum cientista os anelos

Não são o real mas funções:

Deve construir modelos

Que expliquem observações.

 

 

766 – Precisas

 

Quanto mais coisas tiveres

Mais precisas, insaciável,

Para te crer, ao te veres,

Por inteiro confortável.

 

 

767 – Gerir

 

Gerir o tempo é fazer

Poucas coisas importantes

Em vez de muitas correr

Em menos, menos instantes.

 

 

768 – Dúvida

 

A verdadeira tragédia

É nunca termos certeza:

Cumpra a lei, tenha-me à rédea,

Sempre a dúvida ao fim lesa.

 

 

769 – Juncos

 

Como juncos nos vergamos

Ao vento que então soprar.

Travado o vento, voltamos

Logo a nos endireitar.

 

 

770 – Cura

 

Começa a sentir saudade,

A entender tudo por ti:

- A cura começa aí,

Sofrer traz-te sanidade.

 

 

771 – Passado

 

O passado foi melhor,

Não de menos coisas más

Mas de o tempo lhe antepor

O esquecimento que traz.

 

 

772 – Claro

 

O que me é claro, evidente

(Mostram-no dias constantes),

Nunca o é, já que o não sente

Nenhum de meus semelhantes.

 

 

773 – Realça

 

Aquele que é original

Realça a mediocridade

Dos outros que, bem ou mal,

Repetem sem novidade.

 

 

774 – Enrodilhada

 

Cuidar um lado é vaidade,

O mundo é muito maior.

Sempre anda a felicidade

Enrodilhada na dor.

 

 

775 – Missiva

 

Guarda ao menos por um dia

Qualquer missiva importante,

Até ver se se prenuncia

O efeito que ateie adiante.

 

 

776 – Trabalho

 

O trabalho, por momentos,

Livra das inquietações,

Sobrecargas e tormentos,

Do quotidiano os senões.

 

 

777 – Errado

 

Como é errado ambicionar

Coisas que nos outros lermos

Mas que não são, se calhar,

As certas para nós termos!

 

 

778 – Voz

 

Já nascemos a saber

Muita coisa que leveda,

Não sabemos é aprender

O que esta voz nos segreda.

 

 

779 – Desfazer

 

Urge desfazer os nós,

Não atar outros em cima:

A vida é tranquila após

E os bons momentos, em rima.

 

 

780 – Atropelo

 

Atropelo o sentimento

De consciência por falta:

À medida que a alimento,

Outra via acolho em alta.

 

 

781 – Culpa

 

Ai aquele mal-estar,

A culpa que nos invade,

A tirania ao ditar

O que for normalidade!

 

 

782 – Usar

 

Não deixes de usar um ror

Tuas asas, só por teres

Um tapete voador,

Ou perdes os dois haveres.

 

 

783 – Basilar

 

Quem o mundo há-de prover

Do basilar testemunho:

Viver a sério, viver

É um permanente rascunho?

 

 

784 – Delicada

 

Delicada, a consciência,

Que fácil é sufocá-la!

Mas é tão pura de essência

Que ninguém logra ignorá-la.

 

 

785 – Não

 

Dizer não a qualquer coisa

Tem muito mais força, ao fim,

Seja onde for que tal poisa,

Mais força que dizer sim.

 

 

786 – Feito

 

Não de átomos mas de histórias

É feito todo o Universo.

Aqueles são as memórias

De cada feito diverso.

 

 

787 – Leitores

 

Glória e fama de poeta

Vêm do fogo ou da apatia

Que em gerações despoleta

De leitores dia a dia.

 

 

788 – Impotência

 

Nunca tentes controlar

O que não te esteja à mão.

A impotência ao constatar

É que stressa o coração.

 

 

789 – Língua

 

Não se fixa a língua nunca,

Evolui sempre da seiva

Da raiz que o povo junca

E do meio onde ara a leiva.

 

 

790 – Cabeça

 

Na vida qualquer combate

Provocar sem ser viável

Vencer, que louco dislate

Do calcanhar vulnerável!

 

 

791 – Sono

 

O sono, na encruzilhada

Variegada das tensões,

O sono desata a meada

De nós das preocupações.

 

 

792 – Verdades

 

Todas as religiões

São verdades incompletas,

O brilhante tem clarões

De numerosas facetas.

 

 

793 – Governar

 

Governar com perfeição,

Mais que olhar a cada dia,

Há-de antes requerer não

Governar em demasia.

 

 

794 – Passeios

 

Passeios ao pôr-do-sol…

- Como sou tão grão de areia

Da terra na imensa mole

Que infinda ali se incendeia!

 

 

795 – Revolução

 

Da revolução a frágua

Não molda quem acorrer,

Que pedra debaixo de água

Não sabe que está a chover.

 

 

796 – Importante

 

É o homem tão ignorante

Como da criança o desnorte

Para o que é mesmo importante

Que respeita à vida e à morte.

 

 

797 – Caro

 

O mais caro a quem é esperto

Decerto é fazer de ignaro

Quando o ignaro, de olho aberto,

De esperto se faz e caro.

 

 

798 – Custas

 

Força as custas a pagar

Do curso a ser navegado,

Que recurso por pagar

É sempre desperdiçado.

 

 

799 – Grita

 

Aquilo que o ditador

Grita que é uma subversão

É da denúncia o rumor

Do Estado de podridão.

 

 

800 – Dói

 

Menos dói ser mesmo vil

Que vil ser considerado

Se, o não sendo, ao lado há mil

Que de o ser te hão acusado.

 

 

801 – Rir

 

É difícil para o guarda

Não ter por alguém respeito

Que lograr rir quando aguarda

Das mãos dele o fim do pleito.

 

 

802 – Termo

 

Um termo, quando é inventado,

Cria então novos sentidos.

Logo, porém, é gerado

Outro uso aos inatendidos.

 

 

803 – Tente

 

Se algo não logra entender

Do que alguém vive ou que fala,

Se a via não lhe acolher,

Tente ao menos respeitá-la.

 

 

804 – Riso

 

A vida tem muita cor,

Luz, sol e céu nebuloso

E não há nada melhor

Que o riso contagioso.

 

 

805 – Gastar

 

Decide as prioridades

E o tempo a gastar com elas.

Se a tal te não persuades,

Alguém o faz com sequelas.

 

 

806 – Problema

 

Problema sem solução

Já não é problema, é facto:

Não de ter resolução,

De com tempo ser transacto.

 

 

807 – Corrupção

 

À corrupção, ao favor,

Compadrios infamantes,

A luz do sol é o melhor,

Melhor dos desinfectantes.

 

 

808 – Mentir

 

Mentir não é falsidade

Calçar em pé que a não calça,

É contar como verdade

Nota que sabemos falsa.

 

 

809 – Acolhe

 

Bom e mau são de acolher:

De si quem acolhe a sorte,

Mais feliz do que quenquer,

É feliz até na morte.

 

 

810 – Lágrimas

 

As lágrimas que alguém chora

E não lê na fronte calma

São as melhores de agora:

Caem sempre a regar alma.

 

 

811 – Riqueza

 

A riqueza não é inútil,

Questão é ser bem empregue:

Para o feliz nada fútil,

Depende de aonde a legue.

 

 

812 – Lâmpada

 

Como a lâmpada esmorece

Contraposta à luz do Sol,

O saber desaparece

De Deus ante o sábio rol.

 

 

813 – Fixidez

 

Nunca a imutabilidade

É fixidez por inteiro,

Muda por propriedade,

É só dum momento argueiro.

 

 

814 – Escolha

 

Se a escolha for alterável,

Foco a mente nos defeitos.

Se, porém, é irreformável,

Nos ganhos me centro e aceito-os.

 

 

815 – Pesca

 

Não é o que convinha,

Mas o que sucede:

Pesca Deus à linha,

O diabo, à rede.

 

 

816 – Forma

 

Pensa de forma positiva,

Não penses:”nunca sou capaz,

Nunca serei, por mais que viva”,

Que isto é o que a vida então te traz.

 

 

817 – Teia

 

Na vida, a teia armada,

No fundo, é o que se quer:

Ninguém ao fim faz nada

Que não queira fazer.

 

 

818 – Inferno

 

Deus jamais nos punirá,

Mas nós podemos punir-nos

A nós próprios, desde já,

O inferno aqui ao servir-nos.

 

 

819 – Questionar

 

Vive as respostas que tens

E a questionar não te esquives,

Ao bem dar conta dos bens,

Estas respostas que vives.

 

 

820 – Jamais

 

Ao nível das evidências

Em que agem tuas acções,

Deus jamais faz exigências,

Deus só faz observações.

 

 

821 – Precisa

 

Não há nada que não seja

E o que não é não existe.

Deus, assim, nada deseja

Nem precisa, só persiste.

 

 

822 – Externo

 

De nada externo precisas

Para ser feliz a sério,

Mas crês que sim, nem divisas

Do erro quão te prende o império.

 

 

823 – Encara-o

 

Se ficas desapontado,

Encara-o como um presente:

Abre-o lá, para encontrado

O tesoiro ser que invente.

 

 

824 – Convosco

 

Não vim exercer poder

Sobre vocês, não me embosco,

Meu poder é de exercer

Mas como poder convosco.

 

 

825 – Lema

 

O que quiseres viver

(É um lema fundamental

Naquele que é racional)

Oferta a um outro qualquer.

 

 

826 – Pressão

 

A pressão de ir à frente,

Manter-se à tona de água,

É só medo premente,

Do insuficiente a mágoa!

 

 

827 – Ataque

 

Se te atacam ou condenam,

Vê que um ataque sofrido,

Da parte dos que o encenam,

Sempre é de ajuda um pedido.

 

 

828 – Símiles

 

Deus aos homens os criou

Símiles à sua imagem.

A religião Deus dotou

Dos homens com a paisagem.

 

 

829 – Fala

 

Como é que Deus fala e a quem?

Toda a gente a toda a hora

Novidades dEle tem.

- Quem O ouça é que demora!

 

 

830 – Divino

 

Divino é o sublime pensamento,

A palavra clara e mais distinta,

O teu mais grandioso sentimento;

O inferior é a fonte que to pinta.

 

 

831 – Vivenciar

 

O que queres, ter não podes nunca,

Mas aquilo que tiveres deves

Vivenciar, como a semente junca

A lavoira nas regueiras breves.

 

 

832 – Salvação

 

Na acção dum outro não é

Mas na forma como reages

Que a salvação pões de pé

Com que de vez te encorages.

 

 

833 – Pedido

 

É bom que a fúria se aplaque,

Vê quem dispara do morro:

Todo o ataque, todo o ataque

É um pedido de socorro.

 

 

834 – Falar

 

Há muito falar gratuito

E o que diz nada garante.

Quando não se falar muito,

Fala-se o mais importante.

 

 

835 – Esperança

 

A esperança, como o sal,

Não nos alimenta, não,

Mas um sabor dá real,

Um melhor sabor ao pão.

 

 

836 – Remorso

 

Remorso do que não fiz,

Que permiti se fizesse,

É o pior, toca a matriz

Onde alguém de ser se esquece.

 

 

837 – Próximo

 

Quem demais próximo fica

Dos centros de decisão

De miopia se complica,

O alcance encurta à visão.

 

 

838 – Ridículo

 

Pode arruinar um instante

De ridículo a carreira

Que se projectava diante

De toda uma vida inteira.

 

 

839 – Engano

 

A riqueza pessoal

Ou meio donde provém

É o engano principal

De alguém ao julgar alguém.

 

 

840 – Atirado

 

Se foste atirado ao chão,

Ergue-te, vê bem o clima,

Sacode o pó do torrão

E a volta após dá por cima.

 

 

841 – Entusiasta

 

Entusiasta a educar,

Todo criatividade,

É o que é bem preciso, a par

De aos mais dar esta verdade.

 

 

842 – Cérebros

 

Tal e qual os corações,

Cérebros iluminados

Vão ter sempre às regiões

Onde são apreciados.

 

 

843 – Cima

 

É proibido pisar

Alguém para lhe ir à frente,

Posso por cima saltar

Se em meu trilho se apresente.

 

 

844 – Artes

 

Nas artes vira e revira

Qualquer dado a identidade,

Qualquer arte é uma mentira

Que nos faz ver a verdade.

 

 

845 – Nascemos

 

Nascemos com a beleza

Que Deus nos dá mas morremos,

Não com a que ali se preza,

Mas com a que merecemos.

 

 

846 – Inchar

 

Que quer dizer a vaidade

Não é inchar meu peito a esmo,

Alterações de verdade

É proibir em mim mesmo.

 

 

847 – Mar

 

Anda o mar, o mar sem fim

Fundo em memórias que atraia…

- Se houver um céu para mim,

Tem de certeza uma praia.

 

 

848 – Sem

 

Não basta, se me proponho,

Ver e agir sem qualquer elo.

Ver sem agir era sonho,

Agir sem ver, pesadelo.

 

 

849 – Vira

 

Luz ou sombra, no teu rol,

Qual maior conta te faz?

Vira a cara para o sol,

Deixa as sombras para trás!

 

 

850 – Lista

 

Quanto mais bens alguém tem

Maior a lista que quer.

E ser feliz se mantém

Fora de alcance, até ver.